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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................ 3 2 INTRODUÇÃO AOS CONCEITOS DE ALFABETIZAÇÃO, LETRAMENTO E MULTILETRAMENTO ................................................................ 4 3 ENSINO E APRENDIZAGEM COM FOCO NO MULTILETRAMENTO .. 8 4 COMO TRABALHAR COM PRÁTICAS COMUNICATIVAS DO MULTILETRAMENTO ........................................................................................... 12 5 A FORMAÇÃO INICIAL DO PEDAGOGO PARA OS MULTILETRAMENTOS E ENSINO DE PORTUGUÊS ......................................... 13 6 NEURODESENVOLVIMENTO E LINGUAGEM ................................... 16 6.1 Atraso na linguagem....................................................................... 16 6.2 Bases neuroanatômicas da linguagem........................................... 17 6.3 Disfasias infantis ............................................................................ 18 7 O TEXTO LITERÁRIO, ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO .............. 19 7.1 Concepção de infância e criança ................................................... 20 7.2 Escola, letramento e literatura infantil ............................................ 21 8 LINGUAGEM ESCRITA E LEITURA .................................................... 23 9 A CLASSE MULTISSERIADA NO BRASIL ........................................... 25 9.1 Diversidade e interação .................................................................. 29 9.2 Ensino Multisseriado X Campo ...................................................... 30 10 Multiletramentos, leitura e escrita na web .......................................... 31 11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................. 36 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 2 INTRODUÇÃO AOS CONCEITOS DE ALFABETIZAÇÃO, LETRAMENTO E MULTILETRAMENTO Fonte: resvistapeng.com.br Alfabetizar e letrar são processos distintos, mas inseparáveis. Alfabetização e letramento se somam, ou melhor, a alfabetização é um componente do letramento. Sendo assim, o ideal é ensinar a ler e escrever de modo que a criança não apenas decodifique as palavras, mas entenda o que lê. A fim de alcançar esse ideal, o professor alfabetizador precisa reconhecer o significado de alfabetização e letramento no processo de ensino e aprendizagem (DOS SANTOS, 2019). Espera-se que uma criança seja alfabetizada ao frequentar os anos iniciais do ensino fundamental. Isso não depende exclusivamente de sua idade, mas sim de fatores importantes, que determinam a rapidez e a facilidade com que ela desenvolva a leitura e a escrita, por exemplo: a sua autoestima, o incentivo da família, do professor, os procedimentos didáticos e outros fatores que, no desenvolvimento do nosso trabalho, serão ressaltados. Sendo assim, é importante que a criança se aproprie da leitura e da escrita, pois vivemos em uma sociedade letrada. Além de codificar e decodificar as palavras, elas devem compreender os usos sociais da escrita (DOS SANTOS, 2019). Sabe-se que alfabetização não é um processo baseado em perceber e memorizar, para aprender a ler e escrever, o aluno precisa construir um conhecimento de natureza conceitual, ele não só precisa saber o que é a escrita, mas também de que forma a ela representa graficamente a linguagem. Alfabetização – processo de aquisição da “tecnologia da escrita”, isto é do conjunto de técnicas – procedimentos habilidades - necessárias para a prática de leitura e da escrita: as habilidades de codificação de fonemas em grafemas e de decodificação de grafemas em fonemas, isto é, o domínio do sistema de escrita (alfabético ortográfico) (MORAIS, 2007, p. 15). Considerando a alfabetização um processo de construção de hipóteses sobre o sistema alfabético de escrita, o aluno precisa participar de situações desafiadoras, que oportunizem a reflexão sobre a língua escrita. É por meio da interação com o objeto de conhecimento que as crianças vão construindo hipóteses de forma progressiva. São essas especificidades do processo de alfabetização que não podem ser esquecidas. Não basta apenas o convívio com o material escrito, é necessário ter uma direção e uma sistematização por meio de uma reflexão metalinguística, partindo de textos reais de vários gêneros que circulam socialmente (DOS SANTOS, 2019). Passamos a conceber a alfabetização como uma construção conceitual, contínua, desenvolvida simultaneamente dentro e fora da sala de aula, em processo interativo, que acontece desde os primeiros contatos da criança com a escrita. Tal compreensão enfatiza que o aprendizado da escrita alfabética não se reduz apenas a um processo de associação entre letras e sons. A convivência diária com rótulos de embalagens, símbolos, propagandas, cartazes, nomes de ruas, placas, avisos, bilhetes, receitas, cartas fichas, jornais, revistas, livros entre outros, faz com que o sujeito se familiarize com o texto escrito e estabeleça uma série de relações, levantando hipóteses e procurando compreender o significado. Mesmo antes de serem submetidas a um processo sistemático de alfabetização, as pessoas convivem com determinadas situações de leitura e escrita que contribuem para o aperfeiçoamento de seu processo de letramento (DOS SANTOS, 2019). FERREIRO e TEBEROSKY, ao pesquisarem a psicogênese da língua escrita, revelam a maneira pela qual a criança e o adulto constroem seu sistema interpretativo para compreender esse objeto social complexo que é a escrita. Mesmo quando ainda não escrevem ou leem da forma convencionalmente aceita como correta, já estão percorrendo um processo que os coloca mais próximos ou mais distantes da formalização da leitura e da escrita. O indivíduo, independentemente da classe social, percorre os caminhos para se apropriar da língua escrita, passando por níveis estruturais de pensamento (LIRA, 2006, p. 44). Esses níveis foram intitulados por Emília FERREIRO (1999) de nível pré- silábico, nível silábico, nível silábico-alfabético e nível alfabético. As primeiras ideias infantis sobre a escrita referem-se a variadas hipóteses que “reinventam” o sistema alfabético. Inicialmente, as crianças descobrem que escrever não é a mesma coisa que desenhar. Segundo Ferreiro (1999), essa diferenciação entre desenho e escrita geralmente já acontece mesmo antes da criança entrar na escola, pois ela está inserida em uma sociedade grafocêntrica. Para FERREIRO (2004, p.9) tradicionalmente, a alfabetização inicial é considerada em função da relação entre o método utilizado e o estado de “maturidade” da criança. Neste sentido, a criança tem o seu momento certo de aprender, isso nos leva a entender que nem sempre o momento de uma criança seja o mesmo momento de outra criança, é relativamente diferente o nível, pois cada 5 criança tem o seu momento de aprender,dependendo do grau de maturidade que ela tenha. A criança e o adulto em fase de alfabetização usam a estratégia fonológica (escrever como se fala). Nesta fase, a leitura e a escrita apoiam-se em estratégias diferentes. De acordo com SOARES citada por MORAIS e ALBUQUERQUE (2007, p. 47): Alfabetizar e letrar são duas ações distintas, mas inseparáveis do contrário: o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja, ensinar a ler e escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o indivíduo se tornasse ao mesmo tempo alfabetizado e letrado. Para uma pessoa se tornar letrada, ela precisa ter experiências culturais com práticas de leitura e escrita, práticas estas que são adquiridas antes da educação formal. Porque se uma convive em ambiente letrado, com pessoas que leem, que tem contato com revistas, jornais, gibis, qualquer coisa que a leve a pensar em leitura, certamente ela se motivará para ler e escrever, começando desde cedo a poder refletir sobre as características dos diferentes textos os quais tem acesso. De acordo com SOARES (2011), o termo letramento é uma tentativa de tradução do inglês Literacy, significando “o estado ou a condição de se fazer usos sociais da leitura e da escrita”. O letramento difere da alfabetização, que é o processo formal de ensinar a ler e a escrever. Kleiman citado por LIRA (2006), diz que o letramento ocasiona mudanças políticas, sociais, econômicas e cognitivas a partir da inserção dos indivíduos nas sociedades tecnológicas e, por isso, mesmo o analfabeto poderá ser letrado de acordo com seu convívio social. Portanto, o letramento extrapola o mundo da escrita. Letramento é um “conjunto de práticas que denotam a capacidade de uso de diferentes tipos de material escrito”. Ou seja, letramento é além de saber ler e escrever, entender o que se ler e se escreve, relacionando dessa forma com o contexto social, sua experiência cotidiana (ROJO, 2015). O termo múltiplos letramentos em seu conceito inicial pode ser compreendido em contestação ao Modelo Autônomo de Letramento, no qual a escrita seria uma espécie de tecnologia autossuficiente, neutra e independente de seu contexto de produção e de uso. A escrita estaria ligada a habilidades cognitivas individuais, e não, a práticas de natureza social2. (STREET, 2014). Para CAZDEN e outros pesquisadores do Novo Grupo de Londres/ NGL, os multiletramentos estariam associados a “formas múltiplas de letramento dentro de uma mesma cultura, relativas principalmente a canais ou modos de comunicação, como o letramento visual, o letramento no computador, entre outros”. (ROJO, 2015). De acordo com ORLANDO e FERREIRA (2013, p. 416), os multiletramentos têm por perspectiva acompanhar as mudanças favorecidas pelas “[...] novas tecnologias, dando conta dos complexos usos de linguagem”. Nesse sentido, o processo de produção dos textos que emergem na contemporaneidade não traz em si apenas uma base de linguística, fundada no sistema de escrita alfabética6 , mas também envolve outros sistemas como o som, as imagens estáticas e em movimento, os vídeos e outras múltiplas linguagens, conhecidas como textos multimodais. 3 ENSINO E APRENDIZAGEM COM FOCO NO MULTILETRAMENTO Fonte: metodista.br A alfabetização por meio do multiletramento assume uma nova configuração, ultrapassando mitos e princípios ideológicos incrustados na escola, fundamentados na normalização dos corpos e na exclusão de crianças, adolescentes e jovens que atendem aos requisitos do padrão estabelecido de corpo normal. Para que esse desafio de ensinar a todos aconteça em sua plenitude, sugerimos a extrapolação do uso do texto impresso ou escrito, para o uso de textos semióticos, considerando a identidade dos discentes com quem trabalhamos (BENTES, 2014). A expressão e recepção destes podem ser realizadas por diversas formas: pela visão, pelos gestos, pelos sinais, pelos desenhos, gravuras e pelo movimento do corpo. Dessa forma, ocorrerá o rompimento do docente com a pedagogia da alfabetização centrada no monolinguismo, na imposição da escrita alfabética baseada em regras normativas, no monoculturalismo, na normalização dos indivíduos (BENTES, 2014). A ideia de uma pedagogia do multiletramento, para nós, sintetiza as concepções de FLUSSER (2010) em relação a escrita e de BAKHTIN (2003) em relação a linguagem, ao sujeito e aos gêneros do discurso, pois, supera a correspondência letra-som e tira o foco em uma única linguagem, em que o ensino era visto como domínio de regras gramaticais para o bem escrever e o bem falar uma língua. Esta pedagogia fundamentada no multiletramento utiliza-se de uma variedade de linguagens e de modos de significação, uma variedade de recursos de ensino para diferentes fins culturais e de aprendizagem. São textos: escrito, auditivo, espacial, gestual, em língua de sinais, corporais, em desenhos ou gravuras, em ambientes digitais. Dois argumentos principais surgem: o primeiro é que o termo multiletramento está relacionado não apenas às formas oficiais de letramentos (as utilizadas na escola) mas também, as formas não incentivadas, desprezadas e marginalizadas. Dessa maneira, o multiletramento focaliza tanto a realidade local quanto a conexão com o global, abrangendo as variedades e situações diversificadas de linguagem e, também, as diferenças culturais e corporais. O segundo argumento, é que o significado está em diversas manifestações de linguagem. Quanto ao primeiro argumento há que se considerar a distinção entre o letramento dominante e o letramento local (BENTES, 2014). Os letramentos dominantes ou também chamados de institucionalizados se associam às organizações formais tais como a escola, o local de trabalho, a igreja, as burocracias. Neste campo, tem a ação de docentes, especialistas, pastores e advogados. Esses agentes são valorizados à proporção “do poder de sua instituição de origem” (HAMILTON, 2002. p. 180). Já os letramentos locais ou também chamados de vernaculares não são regulados nem sistematizados por instituições. Desse modo são desvalorizados e desprezados, apesar de terem práticas da vida cotidiana. Nos termos de ROJO (2009. p. 118-119): Podemos dizer que trabalhar com a leitura e escrita, na escola hoje é muito mais que trabalhar com a alfabetização ou alfabetismos é trabalhar com os letramentos múltiplos, com as leituras múltiplas – a leitura na vida e a leitura na escola – [...] Trata-se, então de garantir que o ensino desenvolva as diferentes formas de uso das linguagens (verbal, corporal, plástica, musical, gráfica etc.) e das línguas (falar em diversas variedades e línguas, ouvir, ler e escrever). Para participar de tais práticas com proficiência e consciência cidadã, é preciso também que o aluno desenvolva certas competências básicas para o trato com as línguas, as linguagens, as mídias e as múltiplas práticas letradas, de maneira crítica, ética, democrática e protagonista. Desta forma, o multiletramento amplia a noção de letramento da escrita alfabética para o campo da imagem, da música e de outras semioses. O multiletramento teria os seguintes componentes: a) o alfabético, o texto impresso; b) o auditivo e o oral; c) a dança, o teatro; d) o visual; e e) o gestual e o sinalizado (a LIBRAS). De acordo com esta proposição de componentes, a alfabetização está inserida no modo de letramento alfabético/do texto impresso. Uma das metodologias de ensino que se utiliza na alfabetização, inicia com o aprendizado das letras, depois (passa-se- -tirar) para a junção em sílabas e por fim, a formação de palavras para se chegar nas frases e textos escritos. Outra metodologia é a que parte do aprendizado dos gêneros textuais que circulam em sociedade para aprender as letras, sílabas, palavras e frases. Acrescem-se a essa metodologia algumas outras críticas ao ensinoda escrita: a insistência de que o ideal da escola é ensinar a modalidade escrita e, geralmente, as construções e as hipóteses dos discentes são ignoradas. A prioridade está na memorização de regras ortográficas e as atividades mais desenvolvidas são em torno de listas de palavras soltas ou de frases descontextualizadas que dão origem a textos improvisados, sem planejamento ou revisão, que serão lidos apenas pelo docente da turma (BENTES, 2014). É visível que esta não é a única modalidade do letramento, na proposição dos componentes há outros modos que agregam entre si formas alternativas de semioses tais como: o letramento áudio/oral, que pode acontecer por meio da dança, do teatro, das artes plásticas, das expressões visuais e gestual/de sinais. O fato que justifica a abordagem de multiletramento para pessoas deficientes é que a comunicação humana ocorre de diferentes maneiras. As possibilidades são variadas tanto no que diz respeito à expressão quanto à compreensão, ampliando as formas institucionalizadas da modalidade oral e escrita. Há outras tantas possibilidades, como por gestos, por sinais, por desenhos, por gravuras, pela dança, pelo teatro, pelo uso do computador e por outros instrumentos tecnológicos (BENTES, 2014). Quanto ao letramento áudio/oral: “há uma constitutiva imbricação entre fala/oralidade e escrita/letramento, mesmo quando se pensa que estamos ‘apenas falando’” (BENTES, 2009, p. 10). Há ainda que se considerar que a política predominante no Brasil, no que se refere ao ensino e propagação das línguas é o denominado monolinguismo. Isso vem sufocando há décadas, cerca de 170 grupos indígenas, principalmente localizados na região Amazônica, centenas de comunidades de imigrantes espalhadas por várias regiões do país e o que é pior, uma diversidade linguística de desprestigiados dialetos, convivendo em contextos bidialetais. Melhor seria se o Brasil, assim como todos os países do mundo, fosse considerado como multilíngue, para respeitar os diferentes agrupamentos populacionais. Além do preconceito linguístico, há o caso de pessoas deficientes que apresentam dificuldades de pronunciar as palavras ou de emissão de certos fonemas, provocando dificuldade no entendimento: somente uma convivência prolongada reverte em parte essa situação. Há ainda uma multiplicidade de manifestações da oralidade proibidas na sala de aula, como certas músicas da periferia, as gírias e o vocabulário pornográfico (BENTES, 2009, p. 10). O letramento da dança/do teatro: Com a dança e/ou com o teatro se alcança uma leitura múltipla de eventos sociais. Um dos objetivos dessas práticas de letramento é desenvolver a linguagem, a comunicação criativa, a potencialidade do uso do corpo como instrumento artístico e de leitura do mundo. O letramento visual: A imagem ocupa grande espaço na vida do homem contemporâneo e está presente em jornais, revistas, outdoors, nos sites da internet e até no corpo das pessoas que fazem tatuagens. Desse modo, as imagens constituem-se em uma forma de linguagem, o que permite uma multiplicidade de interpretações, no entanto, a utilização da imagem ainda está fora do ambiente escolar: os jogos eletrônicos são proibidos, a publicidade pouco explorada e as revistas em quadrinho ainda são pouco utilizadas na sala de aula. Isto comprova que o imaginário popular está se perdendo ao longo dos anos, incluindo-se aí os saberes populares (FLUSSER, 2010). 4 COMO TRABALHAR COM PRÁTICAS COMUNICATIVAS DO MULTILETRAMENTO O pressuposto é: o trabalho do docente é simular situações ou acontecimentos que ocorrem em práticas comunicativas, extrapolando o campo escolar. A título de ilustração: réplicas cotidianas de brincadeiras, de comentários, enfim, de situações de oralidade. Uma aula comum e repetitiva, que pode ser melhorada, é a chamada com crachá, as perguntas “que dia é hoje?”, “como está o tempo?” para preencher lacunas no flanelógrafo, que iniciam um dia de aula. Uma possível transformação desse cotidiano seria tentar obter dos discentes, situações comunicativas reais, em trabalho de pesquisa, em que é preciso se apresentar, dizer seu nome. A propósito, uma lista preliminar, pode conter as seguintes situações: a) Na portaria de um prédio residencial, o porteiro pede o nome do visitante para poder anunciar, pelo interfone, ao morador do apartamento; b) No telefone, o interlocutor se apresenta para poder falar com alguém; e, c) Na rua quando alguém quer fazer uma nova amizade (BENTES, 2014). É preciso que esta pessoa se apresente. Essas três situações de oralidade podem ser simuladas em sala de aula, depois transcritas para relembrar as situações em que foram criadas: o local e o momento que aconteceram, as regras da situação (o que se pode ou o que não se pode dizer e fazer), a variável de língua utilizada, o produtor, o interlocutor (BENTES, 2014).. Tudo isso para apreender o uso da língua. Depois desse uso, pode-se trabalhar o vocabulário, escolhendo uma palavra objeto de análise. Em termos, é possível partir dos gêneros mais cotidianos, como a conversa entre dois amigos, as poesias conhecidas, as piadas, o pedido de refeição em um restaurante, o pedido de informação de um desconhecido, o cumprimentar um amigo na rua, entre outros., para reconstituir a prática comunicativa e as circunstâncias contextuais em que ocorre o gênero (FLUSSER, 2010). Depois disso, conjugar e/ou conhecer gêneros mais formais, como os romances, a leitura pública, os debates, o discurso conclusivo de um advogado, entre outros. É preciso compreender que o docente deve aperfeiçoar a proposta e escolher a terminologia a ser usada em sala de aula e não simplesmente transpor conceitos teóricos (FLUSSER, 2010). Lembrar ainda que uma metodologia não é uma “receita” fechada: a metodologia envolve pessoas, interesses, realidades, momentos, forma de raciocínio e possibilidades diferentes de escolha na interação em sala de aula (e até na vida cotidiana). Afinal, todas as ações envolvem uma escolha metodológica, que se diferencia de pessoa para pessoa (BENTES, 2014). 5 A FORMAÇÃO INICIAL DO PEDAGOGO PARA OS MULTILETRAMENTOS E ENSINO DE PORTUGUÊS Empregar os recursos próprios fundados nas propostas dos multiletramentos na sala de aula para o educador é um desafio, pois, em grande parte, este é descendente de uma educação de modelo tradicionalista, já que pertence a uma geração que nasceu antes da internet, do smartphone e do tablet. Os professores de língua portuguesa contemporâneos ainda fundamentam sua prática a partir de metodologias que resumem-se a ensinar o aluno a ler e a escrever, por meio de tarefas e de propostas didáticas engessadas no conservadorismo, na exposição de nomenclaturas e classificações morfossintáticas, na memorização exclusiva de regras sem que se promova a reflexão concernente ao uso efetivo da língua no cotidiano das práticas sociais reais (SILVA, 2017). Diante das mudanças ocorridas nas sociedades pós-modernas e assinaladas por pesquisas científicas atuais, há necessidade de o professor buscar novos conhecimentos, o que se torna essencial, pois os estudantes ingressos na educação básica dominam as ferramentas tecnológicas com grande capacidade. Contudo, a escola ainda não acompanha essas mudanças na mesma intensidade e ritmo. É fato que, atualmente, as instituições escolares têm buscado adequar as novidades tecnológicas virtuais e comunicativas àquelas estão fora da escola, de modo a preparar seus alunos, na medida do possível, para novas práticas sociais, para novas formas de letramentos e de multiletramentos (SILVA, 2017). Sobre isso, o processo de formação inicial de professores necessita ser revisado, de modo a contribuir com um ensino de língua que ultrapasse os modelos convencionais de leitura e análise de textos e absorva novas formas de ensinar,como deixam claro Orlando e Ferreira: A formação de professores(as) envolve ainda a capacidade de lidar com a multimodalidade textual, ou seja, a capacidade de ler, produzir ou assistir textos tanto orais e escritos quanto digitais ou impressos, que combinem diversos modos semióticos – linguístico, imagético, sonoro, gestual, espacial e de agir de maneira crítica frente à diversidade nos mais distintos contextos sociais (ORLANDO, 2013, p. 420). Com as transformações tecnológicas ocorrendo ao longo de décadas e acelerando neste início do século XXI, os gêneros multimodais, especialmente os virtuais, têm assumido um papel importante na vivência do aluno dentro e fora dos espaços escolares. As tecnologias vigentes e suas evoluções têm modificado o perfil do aluno e o seu modo de aprendizagem. Contudo, tais alterações pouco têm influenciado o educador na sua forma de ensinar e, por isso, este ainda se encontra distante das propostas que o mundo fora das escolas oferece para esse público (SILVA, 2017). Para ROJO (2014), somente a leitura do texto verbal escrito não é suficiente para o ensino, pois é necessária uma relação deles com outros modos de linguagens, como sons, imagens e vídeos. E isso pode ser integrado às práticas pedagógicas na escola através das novas tecnologias e ferramentas próprias do ciberespaço ou dos ambientes virtuais, ou seja, a partir dos novos letramentos. Contudo, ROJO (2014) evidencia que a aprendizagem escolar, embasada num currículo fechado e escolarizado, se difere da aprendizagem cotidiana, que está em todos os lugares. Claro que essa diferenciação é válida para o acesso ao conhecimento formal, mas é fato que a aprendizagem escolar e os valores curriculares do cotidiano devem ser integrados e melhor aproveitados pelas instituições de ensino, considerando a cultura e a identidade do sujeito num mundo digital, multimodal e multilinguístico. Para a autora, o aluno é o sujeito principal na concepção do conhecimento e é, a partir de […] novas formas de aprendizagem e, consequentemente, novas possibilidades de ensino contemporâneas, que se busque formular uma pedagogia para os multiletramentos, levando em conta ações pedagógicas específicas, que valorizem todas formas de linguagem (verbal e não verbal), cujo foco deve ser o aprendiz, que passa a ser o protagonista [...] (ROJO, 2014, p. 138). Desse modo, pode-se perceber que a escola, juntamente com professores capacitados, estimulados, em constante busca por novos conhecimentos nos cursos de formação inicial tratem seu aluno como um sujeito que traz seus conhecimentos socialmente construídos para a sala de aula, conhecimentos apreendidos na vida cotidiana e fundamentados em suas culturas de origem. É necessário que o professor reconheça que a construção e reconstrução do conhecimento devem ocorrer horizontalmente, certamente com uma proposta pedagógica focada nos textos multimodais e em novos modos de letrar. Sendo assim, […] práticas de letramento devem estar implicadas com a multiplicidade de linguagens na produção de textos multimodais e com a pluralidade e diversidade cultural construtivas dos sujeitos intermediados por esses novos textos presentes no dia a dia do cidadão […] (ROJO, 2014, p. 151). 6 NEURODESENVOLVIMENTO E LINGUAGEM Fonte: cienciasecognicao.com.br As alterações da aquisição da linguagem estão entre os mais frequentes transtornos do neurodesenvolvimento infantil com uma prevalência média de 5% da população pré-escolar. Não é só devido à alta prevalência que esses transtornos têm relevância na prática clínica, mas sobretudo pelo fato de estarem comumente associados a comorbidades neuropsicológicas e neuropsiquiátricas como os transtornos de atenção e hiperatividade, a ansiedade generalizada, os transtornos de conduta e os transtornos específicos de aprendizagem. Sabe-se, por exemplo, que crianças pequenas, com idade inferior a 5 anos e atraso na aquisição da linguagem irão apresentar importantes e persistentes anormalidades neuropsicológicas quando avaliadas com a idade de 9 anos, entre elas a dislexia (MUSZKAT, 2015). 6.1 Atraso na linguagem Crianças com atraso de linguagem podem apresentar dificuldades nas várias dimensões, como a fonológica, a morfológica, a semântica e a pragmática. A criança, inicialmente, desenvolve as palavras faladas (nível fonológico e morfológico) e atribui significado a elas (nível semântico). Esta função relaciona-se com a área de Wernicke e córtex de associação adjacente, localizado na região temporal superior e parietal inferior. Crianças com disfasia receptiva têm dificuldade na discriminação auditiva das palavras, bem como na atribuição de significado. Por outro lado, preferem interação não verbal para a comunicação, como a expressão gestual, a táctil e a visual (LAW, 2004). A linguagem receptiva segue um curso maturacional de acordo com as fases do neurodesenvolvimento. Assim, com aproximadamente 12 a 18 meses, conhecem o significado do não, entendem expressões como me dá, venha aqui, e, é apta para apontar partes do corpo. Aos 2 anos de vida, obedece a ordens simples sob comando e consegue apontar vários objetos nomeados. Com a idade de 3 a 4 anos já nomeia objetos e conhece preposições (MUSZKAT, 2015). A linguagem expressiva, por sua vez, tem curso mais lento do que a receptiva. Crianças com atraso de linguagem têm, de maneira geral, a recepção mais íntegra do que a expressão. Crianças com 10 e 12 meses adquiriram uma ou duas palavras específicas e o vocabulário desenvolve-se bastante aos 18 a 24 meses, sendo que a criança com 2 anos já é capaz de formular sentenças de 2 palavras e com 3 a 4 anos usa sentenças com quatro palavras, usando expressões verbais no passado e no futuro (MUSZKAT, 2015). 6.2 Bases neuroanatômicas da linguagem As áreas funcionais relacionadas com a linguagem são bem estabelecidas nos adultos e constam de sítios mais ou menos concêntricos localizados no hemisfério esquerdo. Tais áreas abrangem a área de Broca, situadas no giro frontal ascendente esquerdo, envolvida, principalmente, no planejamento motor da linguagem, na articulação e no ritmo da fala (MUSZKAT, 2015). A área de Wernicke, situada na porção medial e superior do lobo temporal, está envolvida na compreensão da linguagem, enquanto que o fascículo arqueado, que liga estas duas áreas, relaciona-se com a integração, compreensão e expressão. O chamado giro angular está localizado no lobo parietal, e faz a integração entre as funções gnósicas e práxicas da linguagem, tendo grande participação nos processos de escrita e leitura. Outra área envolvida nestas funções é a do giro parietal inferior, ou giro supramarginal (MUSZKAT, 2015). Fonte: afh.bio.br O papel do tálamo e de áreas cerebelares tem sido verificado como extremamente importante no desenvolvimento da linguagem, principalmente em estudos utilizando neuroimagem funcional. O giro do cíngulo e outras áreas mais límbicas do lobo frontal também implicam o aspecto motivacional da linguagem, enquanto que o hemisfério direito, não dominante, associa-se, principalmente, com os aspectos não verbais da linguagem, como a pragmática e a prosódia. Essas áreas estão em amplo desenvolvimento na criança e são suscetíveis à plasticidade e mudança funcional quando da presença de insultos cerebrais localizados, ou mesmo mediante a exposição a desafios culturais como o aprendizado de línguas ou estudo de um instrumento musical (LAW, 2004). 6.3 Disfasias infantis A classificação nas crianças é basicamente subdividida em três esferas: Disfasia expressiva: Caracterizada por dificuldade na articulação de fonemas, palavras, com percepção normal ou pouco afetada; Disfasia receptiva-expressiva: Que se caracteriza por agnosia verbal auditiva, na qual há grande dificuldade na compreensão auditiva verbal e preservaçãoda linguagem não verbal. Este tipo é o que se observa na chamada afasia de Landau-Kleffner, na qual a agnosia auditiva se associa a crises epilépticas. Ainda, neste grupo, temos a disfasia fonológico-sintática, na qual as crianças apresentam omissões, substituições e distorções fonológicas, com boa habilidade compreensiva ou leve dificuldade (LAW, 2004); Disfasias de processamento de ordem superior: caracterizam-se por dificuldades denominadas de semântico-pragmáticas, em que as crianças apresentam uma fluência verbal adequada, muitas vezes excelente memória verbal e musical, mas dificuldades nos aspectos pragmáticos e prosódicos da fala. Este tipo de anormalidade pode ser encontrado em crianças com transtorno invasivo do desenvolvimento (espectro autista), portadoras da síndrome de Asperger, crianças com hiperlexia e nas portadoras da síndrome de Williams. Ainda, dentro do grupo de processamento superior, temos a dificuldade léxico-sintática, em que as crianças têm dificuldades para encontrar as palavras, tendo preservadas as dimensões semântica, fonológica e pragmática da linguagem (LAW, 2004). 7 O TEXTO LITERÁRIO, ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Fonte: naveliteratura.com Alfabetizar alunos, numa perspectiva de letramento, associado ao uso de obras literárias, e os estudos do PNAIC, possibilitaram aprofundar o conhecimento sobre a variedade e qualidade dos acervos literários, inclusive, os provindos do Programa Nacional Biblioteca da Escola. Cabe à escola a função de inserir o aluno no mundo letrado. É preciso, portanto, estar atento à responsabilidade do professor como a pessoa que, de forma intencional e planejada, será a ponte dos primeiros contatos, na maioria das vezes, entre os alunos e a leitura propriamente dita (WERLANG, 2019). Tendo em vista um docente leitor essa pesquisa definiu como problema o seguinte enunciado: que contribuições a presença da leitura de obras literárias oferece ao processo de alfabetização e letramento? O objetivo geral desta pesquisa é investigar contribuições da interação com a leitura literária, mediada pelo professor, para a alfabetização e letramento. Para se efetivar a investigação, os objetivos específicos foram definidos da seguinte forma: a) Analisar obras do acervo disponibilizado pelo PNBE 2014; b) Selecionar 5 (cinco) obras desse acervo para compor propostas de leitura para leitor iniciante; c) Avaliar o processo de significação e apropriação da escrita das crianças, utilizando obras literárias do PNBE 2014 (BRASIL, 2014). Na construção da pesquisa, privilegiam-se, entre outros, estudos sobre infância, alfabetização, letramento, mediação e acervos literários. Para isso, se faz necessário compreender as concepções de infância e criança, partindo dos referenciais de ARIÈS (1981) e adensar os conceitos de alfabetização e letramento, buscando-se estudos de Magda SOARES (2013). 7.1 Concepção de infância e criança Segundo pesquisas realizadas por ARIÈS (1981), é possível afirmar que este sentimento era ausente até o século XVI, surgindo a partir dos séculos XVII e XVIII. Nas palavras de Ariès (1981), a ausência de representações da vida da criança na Idade Média ocorreu pelo desinteresse por esta fase da vida. A criança moderna é muito diferente daquela apontada por Ariès. No início do século XX, dizia-se que a criança, por meio da alfabetização e da educação, poderia se tornar um adulto civilizado. Nesse sentido, o papel da escola seria o divisor de águas entre a criança e o adulto. Para Neil POSTMAN (1999, p. 165), em relação à escola: [...] é ela a única instituição pública que nos resta baseada no pressuposto de que há diferenças importantes entre a infância e a idade adulta e que os adultos têm coisas de valor a ensinar às crianças. Por este motivo, otimistas ingênuos ainda escrevem livros aconselhando educadores sobre como devem conduzir-se, e em particular, sobre como poderiam levar a cabo atividades preservadoras. A partir do momento em que a criança entra na escola, ela passa a ser influenciada de diversas formas. Uma delas é a influência exercida pelo professor e pelos colegas. Cabe ao educador proporcionar momentos lúdicos, de leitura, que despertem o interesse da criança, que torne a leitura prazerosa. 7.2 Escola, letramento e literatura infantil Fonte: pedagogiaaopedaletra.com.br Legenda da foto: Literatura infantil, desenvolvendo a criança para a vida Na escola, promover o letramento é capacitar o aluno a se relacionar e interagir socialmente, por meio da leitura e da escrita, nos mais diversos contextos de atuação. Nessa perspectiva, o conceito de letramento também pode ser pensado em relação à literatura, a qual passa a ser compreendida como uma prática social relevante ao letramento. A apropriação da obra literária contribui efetivamente para a formação do indivíduo e, consequentemente, da sociedade (CANDIDO, 1972). Observamos, assim, o papel da literatura como uma ferramenta para formar culturalmente o indivíduo que nela se integra. Nesse sentido, a leitura da literatura pode ser considerada uma das práticas, única e singular, do processo de letramento. Contudo, apesar da maioria dos professores reconhecerem a importância da literatura no desenvolvimento infantil, grande parte dos encaminhamentos metodológicos adotados para o trabalho com o texto literário empobrece as possibilidades polissêmicas que o texto poderia proporcionar, pois a leitura das obras tem servido, apenas, como pretexto para abordar e explorar conteúdos ligados à língua; ou seja, um papel utilitário (FLECK, 2013). Sobre esse problema relacionado à sistematização do trabalho com os textos literários, Magda SOARES (2013) explica que é inevitável escolarizar a literatura, tendo em vista que ler literatura é uma atividade que precisa ser aprendida; portanto, é papel da escola encontrar os meios para que essa prática se efetive. Assim, o que precisa ser encarado e discutido não é “se a escola deve ou não escolarizar a literatura” (COSSON, 2012, p. 23), mas como sistematizar essa escolarização sem desconfigurar ou falsear o texto literário, desvalorizando suas especificidades estético artísticas. Para JAUSS (1994), a arte não existe para confirmar o que já é conhecido, e sim para contrariar expectativas. Assim, a literatura pode levar o leitor a uma nova percepção e compreensão de seu universo. Ao levarmos em conta tal possibilidade, compreendemos que essa escolarização da literatura só pode ser adequada se pensada e sistematizada a partir de fundamentos criteriosos, ou seja, baseada em uma teoria que sustente, tanto seus objetivos e perspectivas, quanto suas ações metodológicas. Por isso, desenvolvemos uma proposta pedagógica de trabalho com o texto literário para as séries iniciais. 8 LINGUAGEM ESCRITA E LEITURA Fonte: cpt.com.br Outro aspecto importante da linguagem refere-se à linguagem escrita e leitura. Crianças com dislexia têm dificuldade na decomposição fonológica, mas a compreensão da fala é intacta e a leitura é geralmente lenta. Pessoas com dislexia também tem dificuldade em soletrar, em reconhecer rimas, em ler palavras não habituais mesmo que sigam as regras gramaticais da língua (pseudopalavras). A leitura e a escrita envolvem habilidades cognitivas complexas, além de capacidade de reflexão sobre a linguagem no que se refere aos aspectos fonológicos, sintáticos, semânticos e pragmáticos (LAW, 2004). O processamento linguístico da leitura, em que, através da via não lexical, é feita a conversão grafema-fonema e, pela via lexical, por meio da qual é feita a leitura global da palavra, com acesso ao significado, sé dá nas áreas associativas do cérebro. A atividade funcional dessas áreas permite que a criança reconheça que há letras que não representam o som da fala, já que a leitura alfabética associa um componenteauditivo (fonêmico) a um componente visual (grafema), o que é denominado de correspondência grafofonêmica (MUSZKAT, 2015). É necessária a conscientização da estrutura fonêmica da linguagem (decomposição das palavras) e das unidades auditivas, que são representadas por diferentes grafemas, e envolve diversas regiões cerebrais, entre elas a área parieto- occipital. Na região occipital, o córtex visual primário é o responsável pelo processamento dos símbolos gráficos, e as áreas do lobo parietal (giro angular e supra marginal) são responsáveis pelas questões viso-espaciais da grafia e da leitura (MUSZKAT, 2015). As informações processadas nessas áreas são reconhecidas e decodificadas na área de Wernicke, responsável pela compreensão da linguagem, e a expressão da linguagem escrita envolve a ativação de áreas do córtex motor primário e da área de Broca. Para todo este processo ocorrer, é importante que as fibras de associação intra-hemisféricas e calosas estejam funcionalmente íntegras. Para a escrita, além das áreas visuais e auditivas, são recrutadas as áreas motoras anteriores (MUSZKAT, 2015). É importante ressaltar que existe uma combinação dos fenômenos biológicos e ambientais no aprendizado da linguagem escrita, envolvendo a integridade motora, a integridade sensório-perceptual e a integridade socioemocional (possibilidades reais que o meio oferece em termos de quantidade, qualidade e frequência de estímulos). Além disso, o domínio da linguagem e a capacidade de simbolização também são princípios importantes no desenvolvimento do aprendizado da leitura e da escrita (MUSZKAT, 2008). 9 A CLASSE MULTISSERIADA NO BRASIL Fonte: portaldoprofessor.mec.gov.br Legenda da foto: Classes multisseriadas são adotadas em vários países A realidade multisseriada começou a se instalar no Brasil tempos após a expulsão dos jesuítas, quando, com ou sem o apoio do Estado, professores passavam de fazenda em fazenda ensinando crianças a ler e escrever. Tempos após, essa forma ambulante de ensinar se estende aos povoados quando pessoas já experientes convocavam crianças das vilas para ensiná-las a ler, escrever e fazer cálculos. Porém no ano de 1827 o governo imperial criou oficialmente as classes multisseriadas quando, pela Lei Geral do Ensino de 1827, artigo primeiro, afirmava que “em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos, haverá as escolas de primeiras letras que forem necessárias” (ATTA, 2003). Ainda no século XIX foi trazido para o Brasil o chamado Método Lancasteriano que foi considerado pelo governo brasileiro como uma grande novidade para o ensino pois permitia pessoas de diferentes idades estudassem juntas numa mesma turma e que pessoas mais experientes podiam ensinar os menos experientes através do que se chamava de “Ensino Mútuo” (NEVES, 2000). Esse método durou até a década de 1920 quando começaram a se difundir os grupos escolares nas cidades que adotaram o modelo ideal nos países em que a industrialização havia transformado a realidade das pessoas. Esse modelo se caracterizava não mais pela organização em casas e/ou galpões, uma vez que a escola já era um local específico de ensino nas cidades, mas sim com as crianças separadas em salas de aula por série, com crianças da mesma idade e do mesmo sexo. No entanto, nos povoados e vilas o ensino multisseriado não acabou, ficando apenas em segundo plano, uma vez que esse novo modelo de educação urbano trouxe o pensamento de que seria capaz de garantir a eficácia da aprendizagem em detrimento dos grupos rurais sem escola, sem separação por série nem sexo. Com isso é possível refletir sobre o que Felipe diz: Pode-se afirmar que as sociedades mudam e com elas mudam os processos de socialização das crianças. Entretanto, o risco iminente continua sendo universalizar o particular e tomar sua complexidade global. […] O sinal de alerta continua sendo não amalgamar as crianças em enquadramentos nos quais elas não cabem, implicadas que estão em outras relações sociais, em outros modos de organizar e gerir a vida. (FELIPE, 2013, p. 39) O primeiro Grupo Escolar criado no Brasil foi no Rio de Janeiro, sob a lógica do modelo educacional que copiava o sistema escolar fabril dos países industriais, uma vez que nessa época o Brasil ainda era um país essencialmente agrário. Moura e Santos dizem sobre essa organização da seguinte maneira: “uma arquitetura própria, especialmente edificada para fins de escolarização, baseada no princípio da racionalização do espaço; e a instituição de uma fragmentação e maior controle do tempo pedagógico nas escolas” (MOURA; SANTOS, 2010, pp. 41-42). Souza vem confirmar essa afirmação da seguinte maneira: (os grupos escolares) fundamentavam-se essencialmente na classificação dos alunos pelo nível de conhecimento em agrupamento supostamente homogêneo, implicando a constituição das classes. Pressupunha, também, a adoção de ensino simultâneo, a radicalização curricular, controle e distribuição ordenada dos conteúdos e do tempo (graduação dos programas e estabelecimento de horários), a introdução de um sistema de avaliação, a divisão do trabalho docente e um edifício escolar compreendendo várias salas de aulas e vários professores. (SOUZA, 2004, p. 183) Esses grupos escolares foram se difundindo pelas capitais do Brasil e chegando aos poucos nas cidades do interior. Também conhecido como “escolas reunidas”, algumas ainda em existência atualmente em cidades do interior da Bahia, esses grupos marcam a forte presença da escolarização moderna, e o previsível fim (como pensavam os políticos na época) das classes multisseriadas ou das “escolas isoladas”. Esses grupos foram os responsáveis pela implantação do modelo curricular seriado até a década de 1970, época em que ainda o governo dos estados era responsável pela educação pública, criando assim a distorcida imagem de que as classes multisseriadas representavam um ensino retrógrado e ineficaz. Na década de 80, ainda sob forte influência do movimento escolanovista, a Colômbia iniciou uma proposta para atender às escolas de classes multisseriadas. Essa proposta foi trazida para o Brasil e em 1997 foi implantada a estratégia metodológica do Programa Escola Ativa através de um convênio com o Banco Mundial com vistas à melhoria da formação de professores dessas classes e também a melhoria da infraestrutura das escolas. Isso aconteceu devido ao aumento em número e força dos movimentos sociais de luta dos povos do campo com o objetivo de disseminar projetos contra-hegemônicos. Apesar das inúmeras críticas ao Programa, determinando-o como “pacote educacional” ou “proposta construída com pouco diálogo com os sujeitos e contextos para o qual é dirigida” (GONÇALVES, et al., 2010, p. 50), em uma década o programa já “existia em mais de 10 mil escolas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste” p. 5), garantindo formação continuada para professores, material didático e melhorias na estrutura física das escolas. Por fim, ao final de 2011 o Ministério da Educação extinguiu o Programa Escola Ativa e, em Nota Técnica 002/CGEC/SECADI/MEC, anunciou o seguinte: Em 2011 foram realizadas reuniões técnicas para implantação das ações previstas no Decreto 7.352/2011, que institui a política de educação do campo. Nesse processo, novos programas e ações serão desenvolvidos a partir do lançamento do Programa Nacional de Educação do Campo – PRONACAMPO, e os que estão em curso estão sendo reestruturados. O Programa Escola Ativa está sendo finalizado e será substituído pelo Programa Escola da Terra, ampliando seu alcance para escolas seriadas, contemplando mudanças na concepção pedagógica. Considerando este contexto definem-se as seguintes orientações referentes às questões que estão sendo levadas pelos Estados, Municípios e IPES. Distribuição de materiais: Paraque o trabalho pedagógico não seja interrompido, neste momento de transição para o Programa Escola da Terra, os Estados e Municípios poderão continuar suas atividades com a proposta pedagógica do Programa Escola Ativa, até o lançamento e adesão do novo Programa. Microcentros: As reuniões dos microcentros poderão ter continuidade sob a coordenação dos professores multiplicadores, para apoio aos educadores no processo de ensino e aprendizagem, sem pagamento de bolsas do Programa, pois já é uma ação pedagógica e uma atribuição do técnico a realização dessas atividades, objetivando a melhoria dos resultados da aprendizagem dos educandos das classes multisseriadas. Através desta última Nota, o Ministério da Educação deixa nas mãos dos municípios a responsabilidade de continuar gerindo a Educação do Campo através de ações de responsabilidade com a qualidade necessária. Com a autonomia garantida na Lei de Diretrizes e Bases, e enquanto o Programa Escola da Terra seria implantado, cabia a cada município pensar estrategicamente suas ações, o que em poucos casos isso de fato aconteceu. Ainda na década de 1970, os municípios começam a assumir gradativamente a educação municipal, recebendo, principalmente na constituição de 1988, autonomia para criarem seus sistemas de ensino, o que foi culminado com a Lei de Diretrizes e Bases n° 9.394/96 e com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF) “que instituiu uma política de municipalização induzida” (MOURA, 2010, p. 43), fazendo crescer o número de matrículas e também aumentando as responsabilidades dos municípios com a educação local, o que acabou por direcionar os Setores de Educação, transformados em Secretarias Municipais de Educação, pra uma atenção maior às escolas existentes no campo. A essa altura muitas dessas escolas já haviam sido destruídas e seus alunos sem oportunidade de estudos. As classes multisseriadas possuem condições de ensino diferentes das encontradas nas salas de aula padrão, já que se caracterizam por agrupar alunos que estão cursando diferentes séries ou anos de sua escolaridade, sob responsabilidade de um mesmo professor. Bastante presentes na zona rural, as classes multisseriadas estão presentes sobretudo em áreas de difícil acesso, já que algumas escolas têm um número pequeno de matrículas e a mudança para outras escolas nem sempre é possível, pela distância. Enquanto alguns profissionais preferem planejar atividades diferentes para cada idade, outros buscam aproveitar as oportunidades da diversidade para incentivar a troca de conhecimentos e a aprendizagem mútua. 9.1 Diversidade e interação As Classes Multisseriadas em Escolas do Campo, apresenta diversas propostas pedagógicas a partir de relatos de experiências em várias regiões do país, que ajudam a compreender a dinâmica de aprendizagem no dia a dia escolar. O conteúdo pode servir de inspiração para educadores e profissionais lançados ao desafio de se trabalhar em salas com esse perfil. Em um caderno da coleção voltado à matemática, as atividades relatadas apostam em jogos e brincadeiras interativas, que servem como instrumentos capazes de propor problemas matemáticos, promovendo entre as crianças de várias idades o encontro de distintos pontos de suas escolaridades e saberes. “Do ponto de vista da matemática, o contexto de compra e venda (que envolve pagamentos e trocos) é um meio propício para propor diferentes tipos de problemas, envolvendo as operações básicas para as crianças dos anos iniciais, situações de proporcionalidade para os alunos dos anos intermediários e aspectos mais complexos, como as compras a prazo com porcentagens de juros ou de desconto para os alunos dos anos mais avançados. 9.2 Ensino Multisseriado X Campo Trabalhar em turmas multisseriadas consiste num enorme desafio para professores que lecionam no campo. Esses profissionais da educação sentem o peso de carregar a responsabilidade de exercer suas práticas docentes dentro de salas de aula com alunos de faixa etária e séries diferentes, sendo alunos de 1º ao 5º ano. Existe toda uma organização do sistema de ensino para as classes multisseriadas, algo que vai bem além da necessidade educacional, que traz como resultado uma escola voltada para a realidade da separação de classes sociais assim como afirma ROSA (2008, p.228), (...) a classe multisseriada é organizada, na maioria das vezes, pelo número reduzido de alunos para cada série, o que a caracteriza como mais do que uma simples classe. Ela representa um tipo de escola que é oferecida a determinada população e remete diretamente a uma reflexão sobre a concepção de educação com que se pretende trabalhar. Falar sobre a educação no campo, ou melhor, nas escolas rurais, nos remete a refletir sobre um descaso ainda existente no sistema de ensino que é oferecido para as camadas sociais mais pobres, que habitam locais “isolados”; as salas de aulas são superlotadas, ficando a cargo de o professor exercer suas práticas docentes diante de tal situação. Alguns autores ao falar de educação no campo passam a relatar casos em que professores tendem a fazer várias atividades, cada uma específica para cada série, tomando bastante tempo da aula, tempo que poderia ser utilizado para tirar possíveis dúvidas dos alunos, o que também não seria algo simples. Imaginemos a seguinte situação. Numa única sala ter de tirar dúvida ao mesmo tempo de alunos das diversas séries do ensino fundamental I. Lembrando que as escolas rurais recebem grande parte dos alunos do campo, ou seja, as salas de aula ultrapassam o número adequado de crianças. FERRI (1994, p. 67) em meio a uma pesquisa em escolas rurais destacou que nas classes multisseriadas o professor sofre algumas limitações, afirmando que a própria escola é um ambiente isolado devido a distância e a própria locomoção dos alunos e, por isso, há dificuldade de atendimento individual por aluno, além das dificuldades de acesso ao material didático e às bibliotecas; Ferri leva em conta ainda que atender quatro séries ao mesmo tempo é muito trabalhoso; ressaltando também que as crianças de 1ª série, no processo de alfabetização, são muito prejudicadas, pois não têm a atenção de que necessitam; e outra limitação está voltada para o planejamento, elaborar diariamente quatro planos de aula, cada plano para sua respectiva série. O ensino multisseriado ainda é tratado como uma anomalia na educação, algo que já deveria ter sido extinto, para ceder lugar para as classes seriadas que segue o modelo educacional urbano. Para HAGE (2005), as classes multisseriadas podem contribuir para a permanência dos sujeitos no campo por lhes oferecer uma escolarização no lugar em que vivem, basta acabar com a experiência precarizada da educação efetivada nessas escolas. 10 MULTILETRAMENTOS, LEITURA E ESCRITA NA WEB Fonte: multiletramento.digital Imagem: LSE Learning Technology and Innovation É óbvio que diferentes tecnologias (e culturas tecnológicas) sempre estiveram a serviço de diversas práticas sociais. Para nos mantermos no âmbito da escola e do ensino, podemos pensar que a lousa e giz, típicos da cultura da escrita (ou mesmo a lousa digital e o toque na tela, ou o notebook conectado ao datashow e projetado na tela, típicos da cultura digital) estão a serviço de uma prática letrada de ensino de um para muitos, que “transmite” conhecimento a um receptor almejado como passivo e com o “conteúdo” sob controle do professor (ROJO, 2017). Neste caso, estamos no campo de um currículo estabelecido, de um ensino nos moldes tradicionais, ainda que esses se utilizem de tecnologias digitais de ponta. Já os livros didáticos, apostilas e materiais didáticos impressos – tecnologias da cultura do impresso –, assim como os laboratórios de informática escolares e, muitasvezes, o uso individual que se dá a tablets na escola destinam-se a um suporte à aprendizagem, em geral individual, de conteúdos que podem introduzir, complementar ou fixar o ensino “de um para muitos”. Essas são práticas ligadas a um ensino que podemos considerar “tradicional” e, em geral, a um currículo estabelecido, a partir de uma pedagogia de “transmissão” do conhecimento (ROJO, 2017). Como diz LEMKE (2010, p. 7), a serviço das tradições logocêntricas escolares. LEMKE (2010) distingue dois paradigmas de aprendizagem – um ligado à modernidade e outro ligado à modernidade tardia: o paradigma da aprendizagem curricular e o paradigma da aprendizagem interativa. Segundo o autor, o paradigma de aprendizagem curricular é dominante em instituições tais como escolas e universidades. O paradigma curricular assume que alguém decidirá o que você precisa saber e planejará para que você aprenda tudo em uma ordem fixa e em um cronograma fixo. Este é o paradigma do capitalismo industrial e da produção de massa baseada na fábrica. Desenvolveu-se simultaneamente a eles e em acordos filosóficos muito próximos; dá suporte às suas redes mais amplas de emprego e carreira e se assemelha a eles em autoritarismo, planejamento de cima para baixo, rigidez, escala econômica e incompatibilidades gerais ao novo mundo baseado no 'capitalista veloz' (veja abaixo). Por parte dos alunos, há ampla recusa e resistência, e seus resultados finais promovem pouco mais de utilidade demonstrada no mundo não acadêmico do que promovem alguns letramentos textuais e certificados de membro da classe média. O paradigma da aprendizagem interativa domina instituições como as bibliotecas e os centros de pesquisa. Assume-se que as pessoas determinam o que elas precisam saber baseando-se em suas participações em atividades em que essas necessidades surgem e em consulta a especialistas conhecedores; que eles aprendem na ordem que lhes cabe, em um ritmo confortável e em tempo para usarem o que aprenderam. Este é o paradigma da aprendizagem das pessoas que criaram a internet e o ciberespaço. É o paradigma mais do acesso à informação do que da imposição à aprendizagem. É o paradigma de como pessoas com poder e recursos escolhem aprender. Seu resultado final é geralmente satisfatório para o aprendiz e frequentemente útil para os negócios ou para a academia. Este é talvez também o paradigma do 'capitalismo veloz', em que as economias baseadas na produção e circulação de informações favorecem a mudança rápida de grupos de trabalho de indivíduos flexíveis engajados em projetos que produzem resultados na hora certa [Just in time] para consumidores de nichos mercadológicos. E tende a produzir menos 'aprendizagem comum' entre os membros da sociedade, favorecendo a especialização em educação de artes liberais (LEMKE, 2010, pp. 9-10). A menção do autor a “indivíduos flexíveis engajados em projetos que produzem resultados” chama a atenção para uma aprendizagem ensejada por projetos de trabalho visando a um fim, muitas vezes colaborativos e quase sempre transdisciplinares. Esse tipo de aprendizagem exige uma mudança das relações entre professores e alunos (que deixam de ser de transmissão e passam a ser de colaboração), designando ao professor um papel mediador de aprendizagens autônomas e colaborativas. Exige, pois, uma outra pedagogia. COPE e KALANTZIS (2006[2000]) chamam a essa pedagogia “pedagogia dos multiletramentos”14 que definem como sendo uma pedagogia por design, na qual os estudantes precisam se apropriar dos designs digitais disponíveis, isto é, precisam, é claro, ter conhecimento prático e competência técnica para ser um “usuário funcional”, mas somente isso não basta: é preciso também ser um leitor, um analista crítico desses designs disponíveis (textos, infográficos, vídeos de diversos tipos, esquemas, imagens estáticas, games entre outros.). Mas uma pedagogia dos multiletramentos não se esgota nos designs disponíveis: ela busca conhecê-los e analisá-los criticamente para, a partir deles, chegar ao redesign, isto é, a uma produção que se apropria do disponível conhecido para “criar sentidos transformados e transformadores”. Fonte: COPE, B., KALANTZIS, M., 2006 Mapa dos multiletramentos O segundo tipo de aprendizagem também impacta o currículo, que deixa de ser uma lista de conteúdo a serem ensinados e que se julga que contribuirão para a vida no trabalho, na vida pessoal e na vida cidadã (currículo estabelecido) e se constituirá de uma série de projetos com finalidades e circulação efetivas, que exigem colaboração, produção própria (e não reprodução) e circulação dos resultados úteis à finalidade visada. Finalmente, o segundo tipo de aprendizagem impacta o tipo de presença e uso das tecnologias digitais na escola e na sala de aula. ALMEIDA (2014), em entrevista ao “Educar para Crescer” (movimento em favor da educação ligado à Editora Abril), vai defender um Webcurrículo, ou seja, o currículo que: se desenvolve por meio das tecnologias digitais de informação e comunicação, especialmente mediado pela internet. Uma forma de trabalhá-lo é informatizar o ensino ao colocar o material didático na rede. Mas o webcurrículo vai além disso: ele implica a incorporação das principais características desse meio digital no desenvolvimento do currículo. Isto é, implica apropriar-se dessas tecnologias em prol da interação, do trabalho colaborativo e do protagonismo entre todas as pessoas para o desenvolvimento do currículo. É uma integração entre o que está no documento prescrito e previsto [currículo estabelecido] com uma intencionalidade de propiciar o aprendizado de conhecimentos científicos com base naquilo que o estudante já traz de sua experiência. O webcurrículo está a favor do projeto pedagógico. Não se trata mais do uso eventual da tecnologia, mas de uma forma integrada com as atividades em sala de aula. (ALMEIDA, 2014, pp. 1-2) No caso de um conjunto tecnológico escolar voltado a um webcurrículo e a uma aprendizagem interativa, colaborativa e protagonista, ele não poderá ter as características que imperam em um laboratório de informática escolar, por exemplo, com suas máquinas individuais, baixas bandas de conexão (quando existentes) e dispositivos instalados em linha e coluna que impedem a interação. Seria mais adequado ter smartphones, tablets, netbooks ou notebooks, um ou dois por grupos, com uma banda boa de conexão e um professor que disponha de algum meio de totalização, seja um datashow, uma TV ou uma lousa digital. E uma disposição espacial dos mobiliários que favoreça o trabalho coletivo (ROJO, 2017). 11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, M.E.B., A tecnologia precisa estar presente na sala de aula. Entrevista concedida ao portal Educar para Crescer. SP: abril S/A, 2014. ARIÈS, P., História social da criança e da família. 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