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Código Logístico I000119 E M P R E E N D E D O R IS M O n a ed u cação N ágila C ristin a H in ck el Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-65-5821-048-1 9 7 8 6 5 5 8 2 1 0 4 8 1 Empreendedorismo na Educação Nágila Cristina Hinckel IESDE BRASIL 2021 © 2021 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito da autora e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Kindlena/Pand P Studio/Dave Pot/Sergey Nivens/TairA/Flas100/Shutterstock Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ H554e Hinckel, Nágila Cristina Empreendedorismo na educação / Nágila Cristina Hinckel. - 1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2021. 132 p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-65-5821-048-1 1. Educação. 2. Empreendedorismo. 3. Professores - Formação. 4. Gestão da qualidade total na educação. I. Título. 21-71701 CDD: 370.11 CDU: CDU: 37.017:005.336.3 Nágila Cristina Hinckel Doutora em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestra em Ciências da Linguagem pela Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul). Especialista em Educação e em Gestão Educacional pela Unidade de Educação de Santa Catarina (Uniesc). Licenciada em Pedagogia pela Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Atuou como palestrante, assessora e consultora educacional nas redes pública e privada. É autora de livros na área de educação e empreendedorismo. Atualmente é servidora pública, atuando como professora do ensino básico, técnico e tecnológico e como responsável pelo Centro de Educação a Distância (CEaD) no Instituto Federal Catarinense (IFC). SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! 1 Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 9 1.1 Contextualizando o empreendedorismo 10 1.2 Características do comportamento empreendedor (CCE) 13 1.3 Os tipos de empreendedorismo 19 1.4 Tipos e graus de inovação 24 1.5 Educação e empreendedorismo 27 2 Educação, inovação, tecnologia e sociedade 33 2.1 Sujeito e sociedade 34 2.2 A inovação e as tecnologias na sociedade 37 2.3 Criatividade e inovação 39 2.4 Empreendedor: o sujeito que inova 43 2.5 A inovação no sistema educacional brasileiro 46 3 As competências e o empreendedorismo na educação 52 3.1 Os pilares da educação 53 3.2 Educação empreendedora x Empreendedorismo educacional 61 3.3 Empreendedor educacional 66 3.4 O professor como empreendedor 69 4 O papel da mediação no desenvolvimento do perfil empreendedor 76 4.1 Mediação em Vygotsky 77 4.2 Feuerstein e a modificabilidade cognitiva 81 4.3 Mediação como princípio do desenvolvimento de competências 87 5 Orientação Empreendedora Educacional 95 5.1 Orientação Empreendedora Educacional 96 5.2 Professor como empreendedor educacional na prática 105 5.3 Framework de gestão das práticas pedagógicas 108 6 Resolução das atividades 123 7 anexo 132 Olá, seja bem-vindo ao universo do Empreendedorismo na Educação. Vamos acompanhar você no desafio de superar alguns paradigmas vinculados a este tema, que tem se tornando cada vez mais presente na sociedade e nos espaços educacionais. Muito embora existam práticas exitosas, ainda há um preconceito muito grande com relação ao uso do termo empreendedorismo no contexto educacional. Essa resistência, talvez, deva-se ao fato de que os discursos sobre o tema nunca foram abordados de maneira significativa e alinhada ao universo educacional, ou seja, com um olhar atento ao processo pedagógico e focado no desenvolvimento da aprendizagem e dos comportamentos empreendedores na prática e pela prática docente. A verdade é que o mundo da educação e o mundo do trabalho não podem mais ser percebidos de modo isolado e desconectado. E é justamente isso que propomos nesta obra: uma ampliação do seu olhar como sujeito, estudante e futuro profissional na área de educação. Para isso, organizamos esta obra em cinco capítulos. No capítulo 1, exploraremos os tipos de empreendedorismo, seus conceitos e os pontos de conexão entre o empreendedorismo e a educação, apresentando a inovação como elo entre essas duas frentes. Além disso, vamos buscar reconhecer as características do comportamento empreendedor e o modo com que elas se manifestam em quem empreende, quem inova e quem se propõe a ensinar. Com base na desconstrução de alguns mitos e preconceitos, damos sequência ao assunto no capítulo 2, convidando você a amplificar seu potencial de observação. Faremos isso explorando a perspectiva de simbiose entre sociedade e sujeito. Ou seja, apresentaremos a sociedade como o espaço de interAÇÃO dos indivíduos e a escola como ambiente de potencialização da criatividade e do desenvolvimento da aprendizagem nos sujeitos, que uma vez estimulados e mediados intencionadamente, serão APRESENTAÇÃO Vídeo os responsáveis pela inovação e pelo desenvolvimento de tecnologias na/para a sociedade. Nesse capítulo, faremos ainda uma breve análise sobre o sistema educacional brasileiro, seus limites e potencialidades em relação à inovação. Na sequência, no capítulo 3, debateremos as múltiplas possibilidades do empreendedorismo na educação, fundamentadas nas teorias educacionais. Exploraremos o perfil do docente como sujeito que medeia o desenvolvimento de competência no ambiente educacional. Para que você possa aproximar- se mais dos conceitos, apresentaremos algumas práticas e iniciativas já desenvolvidas. Por ser a mediação a base para o desenvolvimento do sujeito, no capítulo 4, abordaremos as teorias educacionais que sustentam esta perspectiva de desenvolvimento das competências e do perfil empreendedor, tanto no docente quanto no estudante. Esse ponto será a base para a compreensão e implementação prática da Orientação Empreendedora Educacional, tema do capítulo de fechamento desta obra. O capítulo 5 é o que chamaremos de “cereja do bolo”, a parte mais “desejada”, pois nele você receberá subsídios para compreender as implicações pedagógicas da OEE na educação e no desenvolvimento dos indivíduos para a sociedade. Ademais, receberá uma ferramenta para aplicação prática dessa perspectiva. Buscando tornar este estudo ainda mais significativo, apresentaremos um framework de gestão das práticas pedagógicas para potencializar sua jornada. E aí, preparado para iniciar sua jornada no universo do empreendedorismo na educação? Esperamos que sim. Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 9 1 Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas Com o estudo deste capítulo, você será capaz de: • compreender a inserção do empreendedorismo no contexto educacional, reconhecendo os pontos de conexão entre os con- ceitos e o papel da inovação nesse processo; • reconhecer características do comportamento empreendedor; • diferenciar os tipos de empreendedorismo e de inovação. Objetivos de aprendizagem Seja bem-vindoao primeiro capítulo de sua trilha de aprendizagem. Certamente, este texto não é um romance, mas o enredo deste capítulo abordará um pouquinho sobre duas “personalidades”, educação e em- preendedorismo, que têm muito em comum, mas boa parte da sociedade enxerga como uma “estranha” união. Você deve estar ansioso para dar início a essa jornada em busca do conhecimento, em que exploraremos aspectos importantes sobre o em- preendedorismo e os pontos de conexão, os quais levaram o tema a ser abordado no universo da educação. Será que realmente compreendemos o que é empreender e quais aspectos levam os sujeitos a empreenderem? Qualquer um pode empreender? Como o empreendedorismo, cuja base é a administração, pode estar presente no contexto educacional? Se em algum momento da vida você já se questionou sobre esses aspectos, é possível que se surpreenda com o quanto o empreendedorismo e as ca- racterísticas do comportamento empreendedor estão presentes na vida das pessoas e na sociedade como um todo. Se você nunca parou para pensar nisso, ficamos felizes de tê-lo aqui, pois juntos vamos desenvolver o seu potencial de reflexão e ação frente aos diferentes desafios da vida. Bons estudos! 10 Empreendedorismo na Educação 1.1 Contextualizando o empreendedorismo Vídeo Como nossa área “mãe” é a educação, vamos iniciar com uma breve contextualização do empreendedorismo para ficar mais fácil a com- preensão de como ele se conecta com a educação na sociedade. Quando você escuta a palavra empreendedorismo, qual é a primeira coisa que vem à sua cabeça? É comum que a grande maioria das pes- soas relacione empreender com o fato de o sujeito ter um negócio de sucesso e lucrativo. Mas será que empreender é só isso? Certamente não. Embora mui- tas pessoas relacionem empreendedorismo com enriquecimento rá- pido, vale a pena refletir e entender que esse não é um axioma, uma verdade absoluta, pois empreender corresponde a “construir valor a longo prazo em uma durável de fluxo de caixa” (DOLABELA, 2009, p. 171). Ou seja, empreender, ter um negócio de sucesso e ganhar mui- to dinheiro são coisas diferentes, que não necessariamente acontecem rápido nem ao mesmo tempo. O primeiro exemplo de empreendedorismo, segundo Dornelas (2001), foi creditado a Marco Polo 1 , pois este realizava contratos de risco, comprando e vendendo mercadorias, buscando obter lucro. Já, o termo empreendedor foi usado pela primeira vez, no século XVII, pelo economista Richard Cantillon (1680-1734), para designar os sujei- tos que tinham o hábito de assumir riscos (CHIAVENATO, 2012). Durante muito tempo, outros estudiosos se comprometeram a defi- nir esse termo. Confira a seguir algumas dessas definições: Quadro 1 Conceitos de empreendedorismo/empreendedor Ano Autor Conceito 1814 Jean-Baptiste Say Empreendedor é aquele que transfere recursos de um setor de produtivi- dade mais elevado e é importante para o bom funcionamento econômico. 1871 Carl Menger Aquele que antecipa necessidades futuras. 1934 Joseph Alois Schumpeter Alguém que faz novas combinações de elementos criando produtos, novos métodos de produção, identificando novos mercados de consumo ou fontes de suprimento, criando novos tipos de organização e sobrepondo aos anti- gos métodos, menos eficientes e mais caros. 1949 Ludwig von Mises Empreendedor toma decisões. 1959 Friedrich von Hayek Empreendedorismo envolve o risco e a descoberta de condições produtivas e das oportunidades de mercado pelos atores sociais. Fonte: Chiavenato, 2012 apud Hinckel, 2016, p. 29. Marco Polo foi um merca- dor veneziano, que viajava e se aventurava entre a Europa e a Ásia. Suas histórias foram narradas no livro As viagens de Marco Polo, escrito por Rusticiano de Pisa. Diz a lenda que Marco Polo teria sido o responsável por levar o macarrão, o arroz e o sorvete da China para a Itália. 1 Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 11 Tendo em mente esses conceitos, fica mais fácil começarmos a com- preender as diferenças entre os termos. De acordo com Dolabela (2009), o empreendedorismo é uma área, ou um campo de estudo, que não está vinculado a uma ciência ou a uma definição única. Pode ser compreendido como uma habilidade/capacidade do indivíduo em empreender, ou seja, de mate- rializar ideias com criatividade, comprometimento, planejamento e foco nos objetivos (COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS, 2007). Segundo Dornelas (2003), o empreendedorismo resulta das ações do sujeito que empreende: o empreendedor. Este, por sua vez, possui características que o diferenciam de outras pessoas, na ação de em- preender (Figura 1). Joseph Schumpeter era economista e foi o primeiro es- tudioso a relacionar o termo empreendedorismo à figura do empresário (LENZI, 2010). Na década de 1950 ele retoma as discussões sobre empreendedorismo, falando sobre o em- preendedor e o seu papel e a sua influência na economia. De acordo com Hinckel (2016, p. 30), considerando os conceitos e fundamentados na perspectiva schumpeteriana, “em um contexto mais amplo, o termo empreendedor é utilizado para falar dos sujeitos que se dedicam à geração de riquezas em diferentes perspectivas – produtos, serviços, tecnologia, inovação, mar- keting e organização.” Ou seja, aqueles que, com habilidades específi- cas, ocupam-se em gerar lucro financeiro em diferentes contextos de atuação comercial. Mais recentemente o termo empreendedor vem ganhando novas di- mensões. Isso porque os autores passaram a ressignificar o conceito, entendendo que o empreendedor é aquele que não só pensa, mas que também consegue materializar esse pensamento em ações concretas, articulando potencial de criatividade e inovação, buscando gerar valor, seja este individual ou coletivo (NAKAGAWA, 2013). Ratificando a percepção de Nakagawa, Hinckel (2016) afirma que é possível, ao empreendedor, empreender tanto na vida quanto na car- reira e que para empreender não é preciso necessariamente abrir um Agora que você observou alguns conceitos de em- preendedor e empreen- dedorismo, já consegue perceber a diferença entre os dois? Para refletir Figura 1 Escala relacional de termos Fonte: Elaborada pela autora. Empreendedorismo Empreendedor Empreender 12 Empreendedorismo na Educação negócio promissor, mas é imprescindível que o sujeito possua compor- tamentos que possam ser validados em seu dia a dia. Para entender melhor essa questão, analise a figura a seguir. Figura 2 Empreender na vida e na carreira Empreendedor Planeja sua vida. Cria um negócio inovador próprio. Procura novas formas de ser/agir. É um empreendedor dentro da empresa que trabalha (intraempreendedor ou empreendedor corporativo). Assume os riscos de mudar sua opinião e a sua ação. Em ambos os casos (negócio próprio ou funcionário), o sujeito busca criar oportunidades e soluções inovadoras, que contribuam com o desenvolvimento da sociedade e com o sucesso institucional. Vida Carreira Fonte: Hinckel, 2016, p. 31. Com base na Figura 2 apresentada, é possível perceber que, para empreender na vida ou na carreira, o sujeito precisa ter um conjunto de características relacionadas à personalidade que o façam agir de uma forma específica. Ao menos em tese, a sociedade espera que o sujeito seja capaz de empreender em sua vida, muito embora nem sempre as pessoas con- sigam se perceber como empreendedoras. Mas qual é a diferença entre um empreendedor e uma pessoa comum? Pessoas comuns, diante de dificuldades, de comentários negati- vos e cenários não promissores, tendem a desistir de suas ideias. Já os empreendedores são sonhadores. Eles geralmente possuem uma habilidade muito grande de materialização dos seus ideais. Além disso, são proativos, antecipam-se e tentam colocar suas ideias em prática Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 13 de diferentes formas, mesmo que o cenário não seja promissor. Dificil- mente se deixam levar pela opinião dos outros. E quando algodá erra- do, eles tentam de novo, tentam de outro jeito ou, ainda, tentam outra coisa. Ou seja, dificilmente desistem ou param de tentar transformar sonhos em realidade. Na seção a seguir, vamos explorar quais são as características que definem um empreendedor. Será que você se encaixa em alguma delas? 1.2 Características do comportamento empreendedor (CCE) Vídeo Ao longo desta obra estudaremos muito sobre o empreendedor, afinal sem ele certamente o empreendedorismo não existiria. Na década de 1970, quase 20 anos depois de Schumpeter relacionar o empreendedor ao empresário, David McClelland realizou um estudo com vários países e desenvolveu um programa de seleção e desenvol- vimento de empreendedores. Esse programa foi finalizado em 1985 e trazido para o Brasil, em uma parceria entre o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pe- quenas Empresas (Sebrae) e a Organização das Nações Unidas (ONU). A base desse programa é a aplicação de um questionário, associado a uma análise realizada por meio de uma entrevista. Essa combinação possibilitava perceber o quão empreendedor o sujeito era e, também, por meio das suas fragilidades, apresentar estra- tégias para o seu desenvolvimento. A base para a construção do questioná- rio, proposto por McClelland (1961), era a análise de conjuntos de comportamentos, que se distinguem pela natureza dos resul- tados obtidos, os quais estão descritos a seguir. Saiba mais David Clarence McClelland (1917-1998) é um psicó- logo norte-americano que publicou uma série de trabalhos entre os anos 1950 e 1990. De todas as suas publicações ao longo de sua trajetória, os principais temas eram a personalidade e a aplica- ção desse conhecimento para ajudar as pessoas a melhorar suas vidas. Para saber mais sobre McClelland, acesse o link a seguir. Disponível em: https:// topicosgestao2018.wixsite.com/ inicio/post/hist%C3%B3ria-de- david-clarence-mcclelland. Acesso em: 10 maio 2021. https://topicosgestao2018.wixsite.com/inicio/post/hist%C3%B3ria-de-david-clarence-mcclelland https://topicosgestao2018.wixsite.com/inicio/post/hist%C3%B3ria-de-david-clarence-mcclelland https://topicosgestao2018.wixsite.com/inicio/post/hist%C3%B3ria-de-david-clarence-mcclelland https://topicosgestao2018.wixsite.com/inicio/post/hist%C3%B3ria-de-david-clarence-mcclelland 14 Empreendedorismo na Educação Quadro 2 Conjuntos de comportamento Realização Poder Planejamento Busca de oportunidades e iniciativa Independência e autoconfiança Busca de informações Persistência Estabelecimento de metas Correr riscos calculados Exigência de qualidade e eficiência Persuasão e rede de contatos Planejamento e monito- ramento sistemáticos Comprometimento Fonte: Adaptado de McClelland, 1961 apud Hinckel, 2016. Veja, no Quadro 2, que McClelland (1961) organiza as características do comportamento empreendedor de acordo com cada um dos con- juntos de comportamento. O conjunto das realizações está relaciona- do com a habilidade do sujeito de fazer as coisas acontecerem. Já o conjunto do poder agrupa comportamentos que dão ao sujeito a ha- bilidade de influenciar as pessoas a seguirem seu ponto de vista. E, por fim, o conjunto do planejamento refere-se a comportamentos que contribuem para o sujeito visualizar antecipadamente os resultados, bem como definir estratégias para alcançá-los. Para ser considerado empreendedor, por meio do instrumento, o sujeito precisa articular os comportamentos empreendedo- res com frequência e intensidade adequadas, conside- rando cada uma das nove características expressas pelos conjuntos de comportamentos. Acompanhe essa relação entre os conjuntos de comportamentos e as características do comportamento empreendedor. alexdndz/Shutterstock Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 15 Quadro 3 Quadro teórico de McClelland (1961) Conjunto dos comportamentos empreendedores Características do comportamento empreendedor Comportamento empreendedor Realização Busca de oportuni- dades e iniciativa Faz as coisas antes do solicitado, ou antes de ser forçado pelas circunstâncias. Age para expandir o negócio a novas áreas, produtos e ser- viços. Aproveita oportunidades fora do comum para obter assistên- cia (financeira, física e de formação). Correr risco calculados Avalia alternativas e calcula riscos deliberadamente. Coloca-se em situações que implicam desafios ou riscos mo- derados. Age para reduzir riscos e controlar resultados. Exigência de quali- dade e eficiência Encontra maneiras de fazer as coisas melhor, mais rápido e mais barato. Age de maneira a fazer coisas que satisfaçam ou excedam os padrões de excelência. Desenvolve e utiliza procedimentos para assegurar que o tra- balho seja terminado a tempo, ou que atenda a padrões de qualidade previamente combinados. Persistência Age diante de um obstáculo significativo. Age repetidamente ou muda de estratégia a fim de enfrentar um desafio ou superar um obstáculo. Faz um sacrifício pessoal e despende um esforço extraordiná- rio para terminar uma tarefa. Comprometimento Assume responsabilidade pessoal por solucionar problemas que possam prejudicar a conclusão de um trabalho nas con- dições estipuladas. Colabora com seus empregados ou coloca-se no lugar deles, se necessário, para terminar uma tarefa. Esforça-se para manter seus clientes satisfeitos e coloca a boa vontade a longo prazo, acima do lucro a curto prazo. Planejamento Busca de informações Dedica-se pessoalmente a obter informações de clientes, for- necedores e concorrentes. Investiga pessoalmente como fabricar ou fornecer um produ- to. Consulta especialistas para obter assistência técnica ou co- mercial. Estabelecimento de metas Estabelece metas e objetivos que são desafiadores e que têm significado pessoal. Tem visão de longo prazo, clara e específica. Estabelece objetivos de curto prazo mensuráveis. (Continua) 16 Empreendedorismo na Educação Conjunto dos comportamentos empreendedores Características do com- portamento empreen- dedor Comportamento empreendedor Planejamento Planejamento e monitoramento sistemático Planeja dividindo tarefas de grande porte e subtarefas com prazos definidos. Constantemente revisa seus planos levando em conta os resultados obtidos e mudanças circunstanciais. Mantém registros financeiros e utiliza-os para tomar decisões. Poder Persuasão e rede de contatos Utiliza estratégias deliberadas para influenciar e per- suadir os outros. Utiliza pessoas-chave como agentes para atingir seus objetivos. Age para desenvolver e manter relações. Independência e autoconfiança Busca autonomia em relação às normas e controles de outros. Mantém seu ponto de vista, mesmo diante da oposição ou de resultados inicialmente desanimadores. Expressa confiança na sua própria capacidade de com- pletar uma tarefa difícil ou de enfrentar um desafio. Fonte: Adaptado de McClelland, 1961 apud Hinckel, 2016, p. 33-35. Conforme já mencionado, a frequência e a intensidade com que as CCE aparecem são fatores importantes para identificar o perfil em- preendedor. Assim como na medicina, um remédio pode ser tanto um antídoto como um veneno, ou seja, dependendo da dose aplicada e do motivo pelo qual foi utilizado, pode tanto salvar uma vida quanto acabar com ela. Com as características do comportamento empreendedor não é di- ferente. Acompanhe um exemplo. Vamos pensar em pessoas envolvidas com o mundo do crime, por exemplo, traficantes ou líderes de assalto a instituições financeiras. Se você analisar os conjuntos, as características e os comportamentos desses indivíduos poderá perceber o quanto eles têm presentes com- portamentos que são considerados “empreendedores”. A questão é que eles usam essas habilidades para cometer crimes e fazer o mal. Na maior parte das vezes são oportunistas, manipuladores, teimosos, me- tódicos, persuasivos para atingir seus objetivos e assumem riscos mui- to altos na busca por resultados. Uma pena,pois, com a dose correta, Depois de tanta teoria e informação, que tal uma pausa para relaxar e ainda continuar aprendendo? Selecionamos um filme que vai ajudá-lo a visualizar ainda mais cada uma das características do compor- tamento empreendedor, trata-se do filme Walt antes do Mickey. Certamente você já ouviu falar de Walt Disney. Ele, além de ter criado o personagem Mickey Mouse, foi um exemplo de que as pessoas não nascem 100% empreendedoras e que empreender pode levar tempo e muito esforço até os resultados começarem a aparecer. Direção: Khoa Lê. EUA: Conglomerate Media, 2014. Filme Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 17 poderiam facilmente usar seu potencial de liderança para empreender em suas vidas e em sua comunidade de modo honesto. McClelland (1961) não foi o único a mapear os comportamentos dos empreendedores. Souza (2006) realizou um estudo de diferentes auto- res, buscando identificar características e comportamentos apresenta- dos por eles e que representavam os sujeitos que empreendiam. O resultado desse estudo foi uma matriz de características do em- preendedor, demonstrada na tabela a seguir. Tabela 1 Matriz de características do empreendedor Características Autores Sc hu m pe te r M cC le lla nd W eb er Fi lio n M cD on al d D eg en D ru ck er La lk al a D ut ra Ba rr os e P ra te s M in tz be rg An ge lo Lo ng en ec ke r e t a l. Le ite Ca rla nd e t a l. Fr es e et a l. To ta l Buscar oportunidades x x x x x x x x x x x 11 Conhecimento do mercado x x x x x 5 Conhecimento do produto x x x x x 5 Correr riscos x x x x x x x x x x 10 Criatividade x x x x x x x x x 9 Iniciativa x x x x x x 6 Inovação x x x x x x x x x x x x x x x x 16 Liderança x x x x x x x 7 Necessidade de realização x x x x x 5 Proatividade x x x x x 5 Visionário x x x x x 5 Fonte: Souza, 2006, p. 17. Depois de analisar com atenção a matriz desenvolvida por Souza (2006), você foi capaz de identificar alguma similaridade? A inovação é a característica que esteve presente em todas as des- crições sobre empreendedores, como indicativo de comportamento do empreendedor, que é representado pela propensão por inovar. Assista ao filme Walt antes do Mickey e, partindo do que foi estudado até aqui, escolha três características de com- portamento empreendedor apresentadas no filme que você considera relevantes. Qual habilidade que ele precisava desenvolver? Desafio 18 Empreendedorismo na Educação De acordo com Schumpeter (1947, apud CHIAVENATO, 2012), o em- preendedor é a essência da inovação e, por esse motivo, torna obsoletas as formas antigas de se fazer negócios. Perceba que a inovação, inclusi- ve, é o elemento que diferencia administrador/empresário/proprietário de um empreendedor, pois os primeiros administram o negócio, e o segundo está especialmente motivado a inovar. Lembre-se de que o empresário, o proprietário e o administrador também podem ter características do comportamento empreendedor e as articular de modo a serem considerados empreendedores. Se você se propuser a fazer uma análise de empresários de sucesso, ficará im- pressionado em perceber o quanto essas pessoas articulam as caracte- rísticas do comportamento empreendedor para atingir resultados em suas vidas e lucro para os seus negócios. Alguns empreendedores de sucesso no Brasil são: • Alexandre Tadeu da Costa – Fundador da Cacau Show. • Silvio Santos – Fundador do SBT. • Ricardo Nunes – Fundador da Ricardo Eletro. • Miguel Krigsner – Fundador do O Boticário. • Luiza Trajano – Fundadora do Magazine Luiza. De acordo com Dolabela (2008), crianças que nascem em famílias cujos integrantes possuem potencial empreendedor têm mais chances de desenvolver esses comportamentos ao longo da vida. O aprofundamento nos estudos sobre as características do com- portamento empreendedor fez com que alguns pesquisadores, e até mesmo pessoas comuns, passassem a refletir e a se questionar sobre o fato de que empreender tivesse conexão apenas com os negócios e com o lucro capital. Isso se deu porque muitas pessoas tinham es- sas características com frequência e intensidade que as tornavam em- preendedoras. No entanto, não necessariamente tinham como foco inovar para gerar lucro capital para si ou para o seu negócio. A partir disso, começaram a ser mapeadas outras formas de em- preender e inovar. Está curioso? Vamos adiante! E você? Tem as caracterís- ticas do comportamento empreendedor? Existem muitos testes on-line que mensuram seu potencial para empreender. Faça o teste disponível no link a seguir e conheça qual é o seu potencial empreen- dedor. Importante: por mais que você acredite que não possua essas caracte- rísticas, todos temos potencial empreendedor em maior ou menor grau. Alguns têm essas carac- terísticas mais desenvol- vidas e outros menos, dependendo do meio social, cultural e educa- cional em que estiveram inseridos ao longo de sua trajetória. Disponível em: https:// novonegocio.com.br/teste-perfil- empreendedor/. Acesso em: 10 maio 2021. Saiba mais https://novonegocio.com.br/teste-perfil-empreendedor/ https://novonegocio.com.br/teste-perfil-empreendedor/ https://novonegocio.com.br/teste-perfil-empreendedor/ Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 19 1.3 Os tipos de empreendedorismo Vídeo Até a década de 1970, o termo empreendedorismo relacionava-se apenas com a ideia de gerar valor, vinculado ao lucro capital, por meio da inovação. Com o avanço dos estudos sobre os comportamentos em- preendedores e suas formas de manifestação nos sujeitos, foi possível perceber que outras pessoas também faziam parte desse processo, mas com um foco um pouco diferente. Ou seja, empreendiam sob uma outra perspectiva. A verdade é que essas pessoas já existiam e já empreendiam, no en- tanto não eram consideradas empreendedoras de fato, por não terem como foco principal a inovação na geração de lucro capital. E quais são os tipos de empreendedorismo reconhecidos? O pri- meiro tipo de empreendedorismo você já conheceu. Estamos falando sobre ele desde o princípio deste capítulo: o empreendedorismo ca- pital. Vale lembrar que essa foi a primeira forma de se compreender e de se definir essa modalidade. O segundo tipo é o empreendedorismo social, que, ao contrário do capital, tem como principal objetivo gerar lucro/impacto social. É um negócio com o propósito de melhorar a vida das pessoas, ou ainda dar oportunidades para que as condições de vida dessas pessoas sejam melhoradas. Vale ressaltar que, na maior parte das vezes, o lucro capital e o desenvolvimento econômico acabam sendo consequências desses empreendimentos sociais. O termo empreendedorismo social foi atribuído às práticas de em- preendedores com foco no desenvolvimento social, durante as dé- cadas de 1980 e 1990, por Bill Drayton e pelo escritor inglês Charles Leadbeater. O empreendedorismo social empenha-se em solucionar problemas por meio de ações, criando empreendimentos sociais voltados para a geração de oportunidades e suporte à sociedade, buscando melhorar a qualidade de vida das pessoas (SILVA et al., 2012). Mesmo que os ne- gócios sociais não visem ao lucro, precisam ser sustentáveis. Existem dois tipos de negócios na perspectiva do empreendedoris- mo social: o negócio de impacto e o negócio social. Não se esqueça de que o empreendedorismo capital está ligado à figura do empreendedor/em- presário de sucesso, que inova para gerar lucro financeiro para a empresa e para os acionistas. Lembrete Bill Drayton é o fundador da Ashoka, uma organiza- ção americana que apoia líderes sociais no mundo. Drayton defende o estí- mulo ao empreendedo- rismo entre adolescentes e jovens para promover transformações socioe- conômicas capazes de amenizar o crescimento do que ele chama de nova desigualdade. Ele acredita que “jovens preparados para criar soluções para problemas em suasescolas, famílias ou comunidades também saberão disputar um lugar ao sol no atual mercado de trabalho, rompendo barreiras que, na visão dele, são cada vez maiores” (DRAYTON, 2019). Para conhecer mais a respeito de Bill Drayton e da Ashoka, acesse o link a seguir. Disponível em: https://www. ashoka.org/pt-br/story/historia-da- ashoka. Acesso em: 10 maio 2021. Saiba mais https://www.ashoka.org/pt-br/story/historia-da-ashoka https://www.ashoka.org/pt-br/story/historia-da-ashoka https://www.ashoka.org/pt-br/story/historia-da-ashoka 20 Empreendedorismo na Educação • Negócio de impacto – gera impacto social, mas prevê distribui- ção dos lucros entre os acionistas. O foco principal ainda é inovar para o desenvolvimento social. • Negócio social – é um negócio que está entre a ação de uma empresa tradicional e o trabalho de uma organização não gover- namental (ONG). A empresa social surge para resolver um pro- blema social e/ou ambiental. Perceba que a empresa gera lucro, mas esse lucro é reinvestido, com o objetivo de aproximar a em- presa da sua missão social. Não existe uma divisão de lucros en- tre acionistas (O QUE..., 2021). Pode ser que você esteja se perguntado: qual é a diferença entre uma ONG e um negócio social? Na figura a seguir é possível perceber a rela- ção do negócio tradicional e das ONGs na criação de um negócio social. Figura 3 Compreendendo os negócios sociais Negócios sociais: unem o dinamismo do business tradicional com a consciência da filantropia. ONGs/Filantropia Negócios tradicionaisNegócios sociais Objetivo Metas Maximização do impacto social Autossustentável Maximização dos lucros AutossustentávelDoações Maximização do impacto social Fonte: O que..., 2021. Uma ONG geralmente depende de doações, já o negócio social é uma empresa criadora de serviços e de produtos que geram lucro, o qual é utilizado/reinvestido para atingir os objetivos e a missão social da empresa. Ou seja, é uma empresa autossustentável. Dess (2002 apud OLIVEIRA, 2004) indica as possibilidades para uma empresa se encaixar na perspectiva do empreendedorismo social: Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 21 1. Ser exclusivamente associada às ONGs sem fins lucrativos e que iniciam ou incentivam a abertura de empresas com esse mesmo fim. Um exemplo dessa modalidade é o Pimp my carroça 2 , um movi- mento que atua desde 2012 com outras ONGs e que tem como missão “tirar os catadores de lixo da invisibilidade, aumentando sua renda, por meio de arte, sensibilização, tecnologia e participação coletiva” (PIMP MY CARROÇA, 2020). Mais de 50 cidades em diversos países se uniram a esse propósito envolvendo mais de 20 mil pessoas na causa. 2. Qualquer sujeito ou grupo de sujeitos que inicie uma empresa sem fins lucrativos. Geralmente depende de recursos públicos, privados ou filantrópicos para garantir que suas ações sejam operacionalizadas. O Instituto Fazendo Acontecer 3 é uma entidade privada, sem fins lucrativos que começou a ser estruturada em 2009, pelo professor dou- tor José Dornelas, e que tem como principal objetivo desenvolver o po- tencial empreendedor de jovens de comunidades menos assistidas no Norte do Brasil. O professor Dornelas é um dos principais especialistas em empreendedorismo no Brasil. Outro exemplo interessante, relacionado com a educação, é o mé- todo criado pela médica italiana Maria Montessori. No período em que o método montessori foi criado, as crianças com síndrome de Down fi- cavam à margem dos processos educacionais, pois não havia nenhuma ação nesse sentido. Diante dessa problemática, ela desenvolveu uma metodologia de trabalho pedagógico para crianças com deficit cogniti- vo. Mesmo que o foco de sua ação não tenha sido o lucro, atualmente, muitas instituições se beneficiam dessa metodologia, gerando, além do lucro social, lucro capital para escolas que adotaram esse modelo. Os donos dessas escolas fazem parte do terceiro grupo de pessoas que podem ser consideradas empreendedoras sociais. Veja, a seguir. 3. Empresários que optam por práticas de responsabilidade social, buscando gerar impacto social como parte de sua missão. A empresa Moradigna 4 foi criada em 2015, por Matheus Cardoso, com apenas 19 anos, com base em uma dificuldade vivida por ele e sua família: a insalubridade na sua residência. Ele morava em uma co- munidade em São Paulo, conhecida como Jardim Pantanal, que sofria Para conhecer um pouco melhor esse superem- preendimento social, assista ao videocase da ONG em questão. Disponível em: http://youtu. be/0d86iIPNb0M. Acesso em: 10 maio 2021. 2 Para conhecer um pouco melhor o Instituto, acesse o vídeo com as principais ações do Fazendo Acontecer em 2020. Você pode fazer isso por meio do link a seguir. Disponível em: http://youtu. be/4jwCJh0x0Jg. Acesso em: 10 maio 2021 3 Para conhecer um pouco melhor a história de Matheus Cardoso e do Moradigna, assista ao depoimento dele para a Endeavor. Disponível em: http://youtu.be/ E8VfAoabYSE. Acesso em: 10 maio 2021. 4 http://youtu.be/0d86iIPNb0M http://youtu.be/0d86iIPNb0M http://youtu.be/4jwCJh0x0Jg http://youtu.be/4jwCJh0x0Jg http://youtu.be/E8VfAoabYSE http://youtu.be/E8VfAoabYSE 22 Empreendedorismo na Educação pelas cheias do Rio Tietê e os impactos ocasionados por elas. Ao fazer a faculdade de engenharia civil, Cardoso resolveu empreender tentando resolver uma problemática percebida em sua história de vida. Dessa forma, teve a ideia de criar uma empresa cuja missão era gerar impac- to, melhorar a vida das pessoas (impacto social), por meio de pequenas reformas, tornando as moradias mais salubres para que as famílias pu- dessem viver melhor nas comunidades. Nos cases anteriormente vistos, percebemos que os empreendedo- res sociais desempenham papel importante, considerando as lacunas deixadas pelos órgãos governamentais e pelas empresas com foco no lucro capital. Em cada um dos cases apresentados, os empreendedores sociais atuaram como agentes de transformação na sociedade, aprimorando contextos, criando soluções e abordagens, de modo a minimizar as problemáticas com as quais se depararam; aprimorando e/ou dando oportunidades para melhoria da vida das pessoas na sociedade. Cada um deles, dentro do seu nicho, propôs soluções para problemas so- ciais, colocando-as em prática e com potencial de escalabilidade, ou seja, de multiplicar essas ações em diferentes contextos e regiões. Acompanhe, no quadro a seguir, as principais características dos empreendedores sociais. Quadro 4 Características dos empreendedores sociais Ambiciosos Lidam com questões sociais importantes, com paixão por fazer a diferença. Podem trabalhar sozinhos ou no interior de uma ampla cadeia de organizações já existentes, incluindo as que misturam atividades lucrativas e não lucrativas. Motivados por uma missão Sua principal motivação é a geração de valor social, antes da riqueza, que até pode fazer parte do processo, mas não é um fim. Empreendedores sociais são extremamente perseverantes e incansáveis em sua busca de ideia social. Estratégicos Como empreendedores de negócios, eles veem e atuam sobre o que os outros consideram oportunidades para criar sistemas e soluções e inventam novas abordagens que geram valor social. Talentosos São hábeis em recrutar e mobilizar recursos humanos, financei- ros e políticos. Voltados para resultados São motivados pelo desejo de ver as coisas mudarem e produ- zirem um retorno mensurável. Os resultados que buscam es- tão essencialmente ligados à ideia de fazer do mundo um lugar melhor (qualidade de vida, acesso a recursos básicos, suporte a grupos desfavorecidos). Fonte: Adaptado de Bessant e Tidd, 2009. Se você estiver sem tempo para assistir ao vídeo, mas quer saber um pouco mais sobre o negócio do Matheus Cardoso, ouça o podcast, gravado em junho de 2020, com aproximada- mente 20 minutos, intitu- lado #4: Construção civil, com Matheus Cardoso, do canalFutura. Disponível em: https://podcasts.google.com/feed/ aHR0cHM6Ly9uZWdvY2lvcXVlZXVx- dWVyby5saWJzeW4uY29tL3Jzcw/ episode/YWNmYmQyYmEtZjY1OS- 00MTNlLWFmYTItNjUxYTFlY2ZjO- WE0?hl=pt-BR&ved=2ahUKEwiH- ksaN_r7vAhXrD7kGHWstAWcQjr- kEegQIBRAL&ep=6. Acesso em: 11 maio 2021. Podcast https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9uZWdvY2lvcXVlZXVxdWVyby5saWJzeW4uY29tL3Jzcw/episode/YWNmYmQyYmEtZjY1OS00MTNlLWFmYTItNjUxYTFlY2ZjOWE0?hl=pt-BR&ved=2ahUKEwiHksaN_r7vAhXrD7kGHWstAWcQjrkEegQIBRAL&ep=6 https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9uZWdvY2lvcXVlZXVxdWVyby5saWJzeW4uY29tL3Jzcw/episode/YWNmYmQyYmEtZjY1OS00MTNlLWFmYTItNjUxYTFlY2ZjOWE0?hl=pt-BR&ved=2ahUKEwiHksaN_r7vAhXrD7kGHWstAWcQjrkEegQIBRAL&ep=6 https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9uZWdvY2lvcXVlZXVxdWVyby5saWJzeW4uY29tL3Jzcw/episode/YWNmYmQyYmEtZjY1OS00MTNlLWFmYTItNjUxYTFlY2ZjOWE0?hl=pt-BR&ved=2ahUKEwiHksaN_r7vAhXrD7kGHWstAWcQjrkEegQIBRAL&ep=6 https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9uZWdvY2lvcXVlZXVxdWVyby5saWJzeW4uY29tL3Jzcw/episode/YWNmYmQyYmEtZjY1OS00MTNlLWFmYTItNjUxYTFlY2ZjOWE0?hl=pt-BR&ved=2ahUKEwiHksaN_r7vAhXrD7kGHWstAWcQjrkEegQIBRAL&ep=6 https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9uZWdvY2lvcXVlZXVxdWVyby5saWJzeW4uY29tL3Jzcw/episode/YWNmYmQyYmEtZjY1OS00MTNlLWFmYTItNjUxYTFlY2ZjOWE0?hl=pt-BR&ved=2ahUKEwiHksaN_r7vAhXrD7kGHWstAWcQjrkEegQIBRAL&ep=6 https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9uZWdvY2lvcXVlZXVxdWVyby5saWJzeW4uY29tL3Jzcw/episode/YWNmYmQyYmEtZjY1OS00MTNlLWFmYTItNjUxYTFlY2ZjOWE0?hl=pt-BR&ved=2ahUKEwiHksaN_r7vAhXrD7kGHWstAWcQjrkEegQIBRAL&ep=6 https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9uZWdvY2lvcXVlZXVxdWVyby5saWJzeW4uY29tL3Jzcw/episode/YWNmYmQyYmEtZjY1OS00MTNlLWFmYTItNjUxYTFlY2ZjOWE0?hl=pt-BR&ved=2ahUKEwiHksaN_r7vAhXrD7kGHWstAWcQjrkEegQIBRAL&ep=6 https://podcasts.google.com/feed/aHR0cHM6Ly9uZWdvY2lvcXVlZXVxdWVyby5saWJzeW4uY29tL3Jzcw/episode/YWNmYmQyYmEtZjY1OS00MTNlLWFmYTItNjUxYTFlY2ZjOWE0?hl=pt-BR&ved=2ahUKEwiHksaN_r7vAhXrD7kGHWstAWcQjrkEegQIBRAL&ep=6 Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 23 Observe que as características de empreendedores sociais apresen- tadas por Bessant e Tidd (2009) se encaixam também nas característi- cas dos empreendedores vinculados ao empreendedorismo de capital. O que os diferencia basicamente é o posicionamento e a intencionali- dade que possuem no momento de empreender. Quadro 5 Empreendedor empresarial x empreendedor social Empreendedor empresarial Empreendedor social • É individual. • Produz bens e serviços. • Tem foco no mercado. • Bom desempenho = lucro. • Visa satisfazer às necessidades dos clientes e ampliar as potencialidades do negócio. • É coletivo. • Produz bens e serviços para a comunidade. • Tem foco na busca de soluções para problemas sociais. • Bom desempenho = impacto social. • Visa respeitar as pessoas em situação de risco social e as promove socialmente. Fonte: Adaptado de Melo Neto e Froes, 2002, p. 11. Os mesmos mecanismos que direcionam o empreendedorismo e a inovação na perspectiva capital aplicam-se no empreendedorismo social e no sucesso de uma empresa com esse viés. A motivação para inovar, nesses casos, surge do desejo de fazer a diferença na/para sociedade. Muitos empresários encontraram no empreendedorismo social satisfa- ção pela criação de valor não capital, como foi o caso de Bill Gates, que migrou da direção da Microsoft, para administrar a Gates Foundation (BESSANT; TIDD, 2009 apud HINCKEL, 2016), no ano de 2000. A terceira forma de empreendedorismo é o educacional, o qual refere-se à percepção do empreendedorismo nas/pelas práticas peda- gógicas, partindo do mesmo pressuposto do empreendedorismo so- cial, no que concerne à geração de impacto social. No entanto, não há vínculo com participação ou composição em empreendimentos sociais, organizações sem fins lucrativos ou ações de responsabilidade social, desenvolvidas por empreendedores capitais. Esse modelo de empreendedorismo, assim como os demais tipos, apresenta sujeitos com comportamentos empreendedores e com a ha- bilidade de articulá-los, com a frequência e a intensidade necessárias para o desenvolvimento de uma cultura empreendedora, pautada no empoderamento dos sujeitos individual ou coletivamente organizados. Os modelos de pedagogia empreendedora definidos por Dolabela (2009) e de educação empreendedo- ra direcionados pelo Se- brae têm como principal característica desenvolver metodologias para formar empreendedores capazes de gerar lucro capital ou social, trazendo desen- volvimento econômico e sustentabilidade. Importante 24 Empreendedorismo na Educação 1.4 Tipos e graus de inovação Vídeo Paralelamente aos tipos de empreendedorismo, temos a inovação. Como já vimos na seção anterior, a inovação é um elemento primordial no processo de empreender. Assim, para toda forma de empreender, existem estratégias que promovem a inovação em cada uma das fren- tes do empreendedorismo. Figura 4 Frentes do empreendedorismo e estratégias de inovação Empreendedorismo Empreendedorismo social Inovação Inovação social Empreendedorismo educacional Inovação educacional Sh ut te rs to ck /T ok ar ch uk A nd rii Fonte: Elaborada pela autora. Assim como o empreendedorismo, o termo inovação traz consigo di- ferentes formas de interpretação e é importante conhecer essas diversas nuances antes de adentrarmos na perspectiva da inovação educacional. Descoberta, invenção e inovação. Pense em cada uma dessas palavras e tente descrevê-las ou ainda conceituá-las, com base na sua percepção, nas suas vivências até este momento. Registre em uma folha de papel e analise quais são as semelhanças e diferenças entre cada um dos termos. É incrível como boa parte das pessoas tende a tomar a descoberta, a invenção e a inovação como sinônimos. Compare os seus registros com as definições de Bessant e Tidd (2009). Descoberta: é algo que já existia no ambiente e que, por meio da observação do ser humano, passou a ser descoberto. Está na natureza e não foi feito pelo ser humano. Invenção: está relacionada com o potencial criativo do ser humano, que manipula ou interfere em elementos que já existem, buscando solucionar problemas específicos. Inovação: é traduzir ideias em produtos, processos ou serviços que sejam úteis, utilizáveis e diferentes do convencional, gerando valor. S ofi aV / O NY Xp rj/ R ve ct or /S hu tte rs to ck Qual é a diferença entre descoberta, invenção e inovação? Para refletir Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 25 Você conseguiu perceber a diferença entre cada um dos termos? Vale lembrar que a definição de inovação de Bessant e Tidd (2009) está vinculada ao lucro capital, ou ainda ao que Schumpeter chamou de destruição criadora, a qual é considerada uma transformação que des- trói o antigo e cria sucessivos novos elementos. Ou seja, alguma vez você precisou criar atrito entre rochas a fim de produzir fogo para cozinhar, aquecer a água ou ainda para acender uma vela? A menos que você esteja participando de um programa de sobrevivência na selva ou esteja de fato perdido, isso não se faz ne- cessário, pois as inovações criam facilidades para o cotidiano das pes- soas, mudando significativamente o jeito como nos relacionamos com as primeiras descobertas. Hoje, por meio da descoberta do fogo pelo ser humano, temos equipamentos que nos permitem ter fogo de modo muito mais fácil, por exemplo, por meio de isqueiro, fósforo, fogão etc. Quanto mais uma inovação muda a forma de as pessoas se relacio- narem no mundo e com os objetos, mais disruptiva ela é. Schumpeter (1985) define os graus da inovação, considerando o impacto que esta gera na sociedade. Assim, toda e qualquer inovação que mude completamen- te a ordem padrão de um comportamento ou uma ação do ser humano é considerada uma inovação radical. Já as demais inovações, vinculadas à inovação radical, são consideradas inovações incrementais. Para facilitar o entendimento, acompanhe o exemplo do telefone. O primeiroaparelho foi criado por Alexander Graham Bell, em 1876. Ele facilitou muito o processo de comunicação das pessoas que estavam distantes e as informações passaram a ser recebidas mais rapidamen- te. Note que, como mostra a Figura 4, ao longo dos anos, o telefone foi mudando e as funcionalidades dos aparelhos trouxeram mais conforto para o usuário. K3 St ar /S hu tte rs to ck Figura 4 Evolução do telefone disruptiva: que causa ruptura, rompimento e, consequentemente, mudança. Glossário 26 Empreendedorismo na Educação Mas e o smartphone? Ele é uma inovação radical ou incremental? Muitas pessoas têm dúvidas em relação a isso. Com o acesso à internet por meio de aparelhos celulares, os indi- víduos mudaram completamente a forma como passaram a se comu- nicar e a utilizar o próprio aparelho. A mudança foi tamanha e mexeu tanto com o comportamento das pessoas, que alguns acreditam que não sobreviveriam sem seus celulares. O telefone celular com acesso à internet deixou de ser utilizado para fazer chamadas. Hoje, inclusive, é a coisa que menos se faz com o celular. Por esse motivo, ele foi consi- derado uma inovação radical. Características atuais como tamanho da tela, qualidade da imagem e velocidade são melhorias, ou seja, inova- ções incrementais ao smartphone. Além da classificação por grau/impacto, é possível classificar a ino- vação por tipologia. Essa classificação foi definida a partir de 2005, quando o Manual de Oslo foi editado, apresentando as diretrizes e definições sobre inovação e dividindo-a em: inovação em produtos e serviços, inovação em processos, inovação em marketing e inovação organizacional. Por mais que essas tipologias não sejam o foco desta obra, citamos a seguir alguns exemplos para que você diferencie cada uma dessas formas de inovar. Inovação em produto ou serviço: qualquer produto ou serviço que tenha sido criado e que tenha uma aceitação no mercado. Exemplos: re- frigerantes, sabão em pó e líquido, computador, serviços de delivery etc. Inovação em processos: refrigerantes como Coca-cola diet, Coca-cola zero. Um novo procedimento para criação do produto, que venha a atender às necessidades dos consumidores, reduzir custos ou, ainda, aumentar a produtividade. Inovação em marketing: em 2015, a Coca-cola lançou uma cam- panha para inserir nomes nas latas e com isso aumentar o número de vendas. Ou seja, as pessoas não compravam mais um refrigerante apenas para bebê-lo, passaram a comprá-lo para colecionar as latas ou presentear. Outro exemplo de inovação em marketing é das Havaianas: durante muito tempo a marca não era vista com prestígio, no entanto, depois de todo um investimento em marketing, com estratégias de mu- dança do slogan para “Havaianas: todo mundo usa” e com a utilização de personalidades nas campanhas publicitárias, houve um reposicio- Para conhecer mais a fundo a percepção de inovação, desenvolvida pleos 30 países mais ricos do mundo, consulte o Manual de Oslo. Disponível em: http:// www.finep.gov.br/images/ apoio-e-financiamento/manualoslo Leitura Para que você possa se inspirar e transportar os conceitos de inovação para a vida, sugerimos dois filmes. O primeiro é Joy: o nome do sucesso, o qual aborda a trajetória de uma mulher lutadora e com grande potencial empreendedor, que em um processo de reinvestir em si mesma, criou o Magic Mop. Direção: David O. Russell. EUA: Fox 2000 Pictures, 2015. O outro filme é Steve Jobs, que conta a história do cofundador da Apple, falando da sua geniali- dade, mas também dos conflitos pessoais e de comportamento que im- pactaram sua vida, desde o início de sua trajetória. Direção: Danny Boyle. EUA: Universal Pictures, 2015. Filme Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 27 namento da marca, melhorando os pontos de venda e ampliando o portfólio de produtos. Inovação organizacional: quando se implantam novos meios para estruturar rotinas e métodos de trabalho. Como exemplos dessa mo- dalidade temos Netflix, Uber, Cirque du Soleil, Booking etc. Segundo Dornelas (2003), a inovação implica mudar algo, agir ou fazer diferente do que já se fazia; criando algo novo ou simplesmente mudando o ambiente com base no que já existe. O conceito de inova- ção é muito importante, em especial na conexão entre a educação e o empreendedorismo, que é o assunto da próxima seção. 1.5 Educação e empreendedorismo Vídeo Vamos iniciar esta seção com um texto de Paulo Freire (Figura 5), que reflete de modo muito pontual a forma como essas duas áreas tão importantes precisam ser encaradas. Não há possibilidade de um discurso só, sobre os diferentes as- pectos do tema. Um discurso que agrade em absoluto, a gregos e a troianos. Em verdade, este não é um tema neutro, cuja inteli- gência e cujas consequências práticas sejam comuns a todas e a todos que dele falem. Isso não deve significar, porém, que as di- ferenças de opiniões que marcam os distintos discursos, devam afastar do diálogo, os sujeitos que pensam e sonham diversa- mente. Não há crescimento democrático, fora da tolerância. O importante é que a pura diferença não seja razão de ser decisiva para que se rompa ou nem sequer se inicie um longo diálogo através do qual pensares diversos, sonhos opostos, não possam concorrer para o crescimento dos diferentes e para o acrescen- tamento dos saberes. (FREIRE, 1991, p. 47) É fato que, quando Freire escreveu esse texto, não falava es- pecificamente de educação e empreendedorismo. Ele se referia apenas aos temas que aparentemente mostravam-se contradi- tórios e que inviabilizavam o diálogo e a perspectiva de cone- xão entre as áreas. Lembre-se: Tudo está conectado! Talvez você apenas não tenha, ainda, conseguido identificar essa conexão. Segundo Morin (2008), é necessário mudar o pensamento, substituindo os termos por aqueles complexos, no sentindo eti- mológico da palavra, que corresponde a “tecer junto”. Figura 5 Paulo Freire em 1977 wi ki m ed ia c om m on s. 28 Empreendedorismo na Educação Educação e gestão são conceitos próximos em quase tudo o que pro- duzimos na humanidade. Afinal, tanto a educação quanto a gestão estão na sociedade e são formadas por pessoas. No entanto, no senso comum e até no meio acadêmico, é corriqueiro escutar comentários que distan- ciam as áreas e até mesmo as colocam em campos opostos. Percebemos isso em afirmações como: a escola não é uma empresa; estudantes e professores são pessoas e não números etc. Uma hipótese para esse tipo de comentário e percepção talvez seja reflexo da característica humana de querer generalizar tudo. O contex- to e as vivências de cada pessoa, desde a infância, contribuem para que sua forma de aprender se torne automatizada, em decorrência de me- canismos biológicos do ser humano. Só que isso pode ser tanto positivo quanto negativo, pois, ao mesmo tempo que favorece a aprendizagem, a generalização pode permitir também ao ser humano criar teorias e antecipar resultados, pela repetição de alguns elementos/situações se- melhantes, só que, às vezes, de modo incorreto. Para Moran (2011, p. 26), “diante de novas perspectivas, a tendência será enquadrá-las rapi- damente nos padrões anteriormente fixados” e que não correspondem à realidade. Diante disso, fica um pouco mais fácil entendermos que a maior parte das críticas decorre dos autores da área educacional, princi- palmente quando o assunto é empreendedorismo e competência. Isso porque muitos dos estudos e discursos sobre esses temas os re- lacionam a uma perspectiva ideológica, capitalista e neoliberal, que responsabiliza/culpa o sujeito pelo seu fracasso (HINCKEL, 2016). Isso faz com que muitas pessoas da área educacional generalizem o termo e todo o processo, sentindo “calafrios” só de escutar a palavra empreen- dedorismo no contexto educacional. Outro fator que contribui para esse cenário é que boa parte dos estudos que relacionam esses temas o fazem sob o ponto de vista da gestão. São empresários,economistas, empreendedores de diferentes áreas que falam sobre a importância da educação para o desenvolvi- mento do empreendedorismo. É o caso da pedagogia empreendedora, proposta por Fernando Dolabela (estudioso da área da administração), e da educação empreendedora, desenvolvida pelo Sebrae. Perceba que eles não estão errados, mas, sob o ponto de vista edu- cacional e da prática pedagógica propriamente dita, ficam algumas Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 29 lacunas que não conseguem ser preenchidas e que dão margem ao processo de generalização. Em outras palavras, como seres humanos que são, alguns profissionais da educação, em vez de estarem abertos a testar diferentes possibilidades, agarram-se aos conceitos e expe- riências anteriormente vivenciadas, para encontrar formas – generali- zadoras – de fechar as lacunas. Só que esse tipo de atitude não cabe mais, pois as transformações que acompanhamos na sociedade, principalmente as relacionadas ao uso das tecnologias e aos seus impactos nas formas de comunicar, de ensinar, de aprender, de ser e de conviver, em toda a cadeia social, es- tão cada vez mais perto da escola. E isso vem acontecendo também de- vido ao fato de haver uma crítica muito grande sobre o perfil do sujeito que a sociedade requer e aquele que, de fato, a escola vem ajudando a desenvolver. Conforme afirma Hinckel (2016, p. 17), na “ formalidade prática do mundo da educação é necessário reconhecer que a maioria dos estu- dantes é fruto da modernidade líquida e muitos professores são o pro- duto de uma sociedade marcada pela solidez”. O sociointeracionismo, uma corrente pedagógica desenvolvida e fundamentada por Vygotsky, afirma que a aprendizagem acontece em decorrência das relações que estabelecemos e do meio em que estamos inseridos. Se a aprendiza- gem e as habilidades desenvolvidas pelos estudantes são o reflexo das práticas pedagógicas e se as competências desenvolvidas por eles, ao sair dos espaços educacionais, estão distantes daquilo que a sociedade almeja e precisa, é sinal de que os processos formativos precisam ser ressignificados. Infelizmente, a escola tem estado muito atrasada em relação aos avanços sociais. Se antes o cenário apresentado esperava convite, hoje ele vem atropelando os processos educacionais e promovendo um ver- dadeiro “arrombamento” dos muros conceituais presentes na escola. De acordo com Hinckel (2016), esse tema já permeia todas as ins- tâncias formadoras, criando tensionamentos sobre a atuação e a fun- ção do professor, bem como as implicações dessa demanda no fazer pedagógico. Além disso, é possível observar constantes estímulos de diversas direções, de que é preciso aprender a aprender 5 sempre. O empreendedorismo fundamenta-se no empoderamento e na li- bertação do sujeito frente aos mecanismos ideológicos dominantes na Um filme bem inte- ressante e que ilustra a importância das práticas do professor no desenvolvimento do espírito inovador dos sujeitos é A sociedade dos poetas mortos, estrelado por Robin Williams, em 1989. Apesar de antigo, o filme aborda de maneira bem atual os dogmas e resistências existentes no contexto educacional, em especial quanto às práticas inovadoras (que fogem ao modelo con- vencional) e seus impac- tos no desenvolvimento do potencial de inovação e visão dos estudantes. Direção: Peter Weir. EUA: Walt Disney Studios, 1989. Filme Aprender a aprender é um dos pilares da educa- ção, apresentados pela Unesco. 5 30 Empreendedorismo na Educação sociedade para que, mesmo imerso nessa atmosfera, busque ter visão amplificada, enxergando não somente o óbvio, mas principalmente aquilo que poucos veem. E que essa habilidade promova no sujeito o potencial proativo e inovador de buscar soluções e caminhos, indepen- dentemente do cenário desanimador ou da opinião de massa, assumin- do os riscos conscientes e calculados de suas escolhas na sociedade, sejam elas quais forem. Quando esses mecanismos e essas habilidades forem acionados no ambiente escolar, seja para desenvolvimento do sistema educacional em um contexto mais amplo, ou para o aprimo- ramento intencional dessa cultura empreendedora no/pelo processo pedagógico, chamamos de empreendedorismo educacional 6 (HINC- KEL, 2016). Essa percepção de empreendedorismo vai ao encontro do desen- volvimento de sujeitos com potencial empreendedor e complementa o empreendedorismo social, pois tem a intenção de, também, aperfei- çoar os sujeitos sob essa perspectiva. CONSIDERAÇÕES FINAIS Empreendedorismo e educação coexistem na sociedade e mais do que nunca precisam ser compreendidos isolada e coletivamente, discipli- nar e transversalmente, no intuito de superar paradigmas que, no cenário atual, fazem cada vez menos sentido. Compreender o empreendedorismo sob o viés da administração e perceber a inovação como elemento de conexão entre as formas de empreender inicia o tensionamento para o processo de aceitação do empreendedorismo e da necessidade de desenvolvimento das caracte- rísticas do comportamento empreendedor, por meio da educação, como elemento importante para integração dos indivíduos na sociedade. Esperamos que, ao final dos estudos deste capítulo, você tenha con- seguido compreender a inserção do empreendedorismo no contexto educacional, reconhecendo os pontos de conexão entre os conceitos e o papel da inovação nesse processo, bem como esteja apto a identificar as características do comportamento empreendedor e diferenciar os tipos de empreendedorismo e inovação. Caso tenha ficado com dúvidas em relação a algum desses pontos, retome a leitura do capítulo. Vale lembrar que alguns poucos autores tratam o empreendedorismo educacional como a ação de abrir um negócio na área da educação. É importante que você não faça confusão. Empreen- der no ramo de negócios educacionais também é uma possibilidade, mas não se trata do foco prin- cipal de desenvolvimento desta obra. 6 Educação e empreendedorismo: desconstruindo paradigmas 31 ATIVIDADES 1. O empreendedorismo está presente na sociedade, mas se manifesta especialmente por meio das práticas dos sujeitos. Reflita sobre o que é empreender e quais são as possibilidades de se empreender. Na sequência, faça uma análise sobre a presença do empreendedorismo na sua vida e na das pessoas que estão próximas a você, descrevendo, em forma de tópicos, em que períodos isso aconteceu. 2. Bill Gates foi o criador da Microsoft e ganhou muito dinheiro empreendendo. Em determinado momento, ele cria a Fundação Bill Gates e passa a investir no empreendedorismo social. O que leva um empreendedor com foco exclusivo em lucro capital a migrar para o empreendedorismo social? 3. Tudo o que existe ao nosso redor e que não é a própria natureza representa uma inovação. Observe o ambiente em que você se encontra estudando neste momento. Olhe para si próprio, para suas roupas e acessórios... Tudo é inovação! Tudo foi criado pelo ser humano e passou a ser consumido/utilizado, facilitando nossa vida. Como vimos, existem dois graus de inovação quanto ao impacto que produzem na sociedade. Escolha alguns objetos do ambiente em que você está e defina se são inovações radicais ou incrementais. 4. Durante muito tempo, o empreendedorismo foi um tema quase que exclusivo para empresários e acadêmicos da área de gestão. Com o tempo, a inovação trouxe avanços para os diversos segmentos da sociedade, que passaram a demandar por novos perfis de sujeito e, também, a requerer novas competências para atuação no mundo do trabalho. Como você pôde perceber ao longo deste capítulo, empreendedorismo e educação são áreas que se conectam, no entanto, as pessoas têm certa dificuldade para perceber essas conexões. Considerando os estudos realizados, aponte duas hipóteses que favorecem essa dificuldade de conexão. REFERÊNCIAS BESSANT, J.; TIDD, J. Inovação e empreendedorismo. Porto Alegre: Bookman, 2009. CHIAVENATO, I. Empreendedorismo:dando asas ao espírito empreendedor. São Paulo: Manole, 2012. COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS. Documento de trabalho dos serviços da comissão – Escolas para o século XXI. Bruxelas: Comissão das Comunidades Europeias, 2007. Disponível em: https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/847/2/20101_ulsd_ dep.17852_tm_anexo1a.pdf.pdf. Acesso em: 19 abr. 2015. Vídeo 32 Empreendedorismo na Educação DOLABELA, F. Quero construir a minha história. São Paulo: Sextante, 2009. DOLABELA, F. Oficina do Empreendedor. São Paulo: Sextante, 2008. DORNELAS, J. C. Empreendedorismo corporativo: como ser empreendedor, inovar e se diferenciar na sua empresa. Rio de Janeiro: Campus/Elsevier, 2003. DORNELAS, J. C. Empreendedorismo: transformando ideias e negócios. Rio de Janeiro: Campus, 2001. DRAYTON, B. Jovem deve ter habilidade de mudar sua realidade. O Globo, 19 maio 2019. Disponível em: https://www.ashoka.org/pt/story/bill-drayton-jovem-deve-ter-habilidade- de-mudar-sua-realidade. Acesso em: 11 maio 2021. FREIRE. P. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1991. HINCKEL, N. C. Educação, inovação e empreendedorismo: implicações pedagógicas da orientação empreendedora educacional. 2016. Tese (Doutorado em Educação e Comunicação) – PPGE. LENZI, C. et al. Ação empreendedora: como desenvolver e administrar o seu negócio com excelência. São Paulo: Editora Gente, 2010. MELO NETO, F. P. de; FROES, C. Empreendedorismo social: a transição para a sociedade sustentável. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002. MCCLELLAND, D. The achieving society. 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Os ThunderCats eram um grupo de seres meio gatos e meio humanos que lutavam contra o mal. Seu líder, Lion, tinha uma espada justiceira que continha o chamado olho de Thundera acoplado, e que dava a ele visão além do alcance. Neste capítulo, vamos ativar a sua “visão além do alcance” e desenvol- ver sua capacidade de observação. Ou seja, vamos dar a você subsídios para analisar e compreender as relações entre os sujeitos e a sociedade e como esse movimento impacta a inovação e é impactado por ela, pela tecnologia e educação. Enxergar além do que os olhos podem ver é uma habilidade que pode ser desenvolvida. Essa habilidade é fundamental para que qualquer su- jeito na sociedade possa intervir na sua realidade ou no meio onde está inserido, identificando formas de superar desafios, buscando e propondo soluções de maneira crítica e fundamentada. Primeiro, vamos compreender as relações entre sujeito e sociedade para que você possa reconhecer os sujeitos como agentes de transforma- ção social. Na sequência, trataremos de inovação; como ela surge, de que forma faz parte da essência do ser humano e por que, algumas vezes, ela não acontece. Para isso, abordaremos os conceitos de criatividade e inova- ção, relacionando essas duas vertentes e identificando suas relações com as ações de quem empreende. Por fim, vamos abordar um pouco o sistema educacional brasileiro e compreender como essa organização contribui para a presença da inova- ção e da tecnologia na sociedade. Vamos adiante? 34 Empreendedorismo na Educação 2.1 Sujeito e sociedade Vídeo Com o estudo deste capítulo, você será capaz de: • reconhecer o sujeito como agente de transformação social; • relacionar criatividade e inovação; • compreender o conceito de inovação; • identificar a inovação como característica de quem empreende; • identificar a presença da inovação e da tecnologia na organiza- ção educacional brasileira. Objetivos de aprendizagem Relacionar sujeito e sociedade parece algo óbvio, no entanto o óbvio, às vezes, é tão evidente e natural que pode passar despercebido. Para que você compreenda melhor essa afirmação, vamos estabelecer uma metáfora. Quando não conhecemos algo, ou desconhecemos como fun- ciona a prática de uma ação que teremos de executar, nossa mente ana- lisa e problematiza a situação tentando dominá-la. Um exemplo disso é a prática da direção de um carro. Saber dirigir é uma tarefa complexa, envolve conhecimento das leis, habilidade prática, psicológica e destreza para realizar diferentes ações ao mesmo tempo. Quando começamos a dirigir, é normal nos preocuparmos e pen- sarmos os mínimos detalhes, como ajustar o retrovisor e o banco do carro, colocar o cinto, dar a partida, passar a marcha, acelerar, frear, observar o espaço, parar, dar seta, dar ré, estacionar, manobrar, en- fim, uma infinidade de ações em um contexto de incertezas, visto que no trânsito existem outros carros e pedestres que estão fora de nossa zona de controle. Com o passar do tempo e o ganho da habilidade na ação de diri- gir, passamos a automatizar e a naturalizar algumas práticas comuns. Não precisamos mais pensar antes de fazer, simplesmente realizamos a ação. Você dirige, dá seta, freia e troca marchas naturalmente e, às vezes, até sem perceber que fez todas essas coisas. O mesmo acontece com relação ao ser humano na sociedade. Quando somos crianças e iniciamos o processo de exploração do mun- do, por volta dos 2 anos e meio aos 4 anos de idade, passamos por Educação, inovação, tecnologia e sociedade 35 uma fase de descoberta de tudo que nos cerca. A criança entra em um período chamado pelo senso comum de fase dos porquês. A criança tem uma forma peculiar de ver o mundo. Poderíamos até dizer que nasce com um “olho de Thundera” em desenvolvimen- to. Contudo, com o passar do tempo e em decorrência do contex- to em que está inserida, ocorre a acomodação de alguns esquemas mentais, criando personalidade, padrões de comportamento e hábi- tos. Então, com o tempo, ela passa a não questionar mais, por exem- plo, o motivo pelo qual meninos e meninas são diferentes ou por que existe dia e noite. Se a criança recebe respostas simplistas, dotipo “porque sim” ou “porque não”, ou ainda se recebe mais respos- tas do que perguntas, ficará propensa a esperar pelas coisas prontas e a não pensar ou refletir sobre elas. De acordo com Vygotsky (2008), criador da teoria sociointeracio- nista, somos o resultado do contexto em que estamos inseridos e das relações que estabelecemos ao longo da vida. Nesse sentido, nossa forma de ser e de ver o mundo acaba sendo moldada pela forma de ser e ver o mundo dos nossos agentes primários de mediação, que são representados quase sempre pela família. Evidentemente, isso pode se modificar ao longo da existência do sujeito, afinal, à medida que o tem- po vai passando, temos acesso a outros espaços e vamos estabelecen- do relações com outras pessoas, que também podem ser escolhidas por nós como agentes de mediação. Quando crescemos, esses padrões que criamos quando crianças nos permitem generalizar e naturalizar algumas situações e fatos, pois, em tese, já passamos pelo processo de assimilação e entramos na aco- modação. É muito mais fácil, em algumas situações, não problematizar, não se questionar e não refletir sobre o que estamos ouvindo, falando ou fazendo. Afinal, isso já faz parte da nossa vida, já tem um efeito de sentido construído em nossa mente. Essa naturalização também acontece com a ideia de sermos sujei- tos; de que estamos presentes na sociedade e de que agimos sobre ela, modificando-a e ao mesmo tempo sendo modificados, em um processo cíclico e contínuo. Por mais evidente que isso seja, entramos no “piloto automático” e, muitas vezes, esquecemos disso enquanto vi- vemos em sociedade. Entre os 2 e os 7 anos, a criança está na fase, definida por Piaget, de pré-operacional. Nesse período, a criança começa a desenvolver a habilidade de criar esquemas men- tais, inteligência simbólica e representativa, desenvol- vimento da fala etc. Nessa fase, a criança busca compreender o que a cerca, construindo seus esquemas mentais e desenvolvendo suas ha- bilidades cognitivas pelos processos de assimilação e acomodação. Para saber mais sobre os es- tágios do desenvolvimento, assista ao vídeo Estágios do desenvolvimento, publicado no canal Didatics. Disponível em: http://youtu.be/ CRokAZi_RWM. Acesso em: 25 maio 2021. Saiba mais https://www.youtube.com/watch?v=CRokAZi_RWM https://www.youtube.com/watch?v=CRokAZi_RWM http://youtu.be/CRokAZi_RWM http://youtu.be/CRokAZi_RWM 36 Empreendedorismo na Educação É importante entendermos que quanto mais questionamos a rea- lidade a respeito daquilo que é evidente, as problemáticas que nos rodeiam, buscando compreendê-las de diferentes perspectivas, mais ativamos nossa visão além do alcance e mais perto de minimizar ou solucionar os problemas estaremos. Você deve estar se questionando: o que tudo isso que estudamos até o momento tem realmente a ver com as relações entre sujeito e sociedade, afinal? Como já mencionamos, sujeito e sociedade estão intimamente co- nectados. Pêcheux (2009) entende o sujeito pelas suas relações históri- cas e aponta a forma-sujeito como o resultado das formações sociais, discursivas e ideológicas, que representam o pré-construído do sujeito e que o constituíram em sua forma de ser, agir e pensar. Assim, ao mesmo tempo que os sujeitos constituem a sociedade e a modificam, acabam sendo modificados por ela, de acordo com a historicidade vinculada ao contexto vivenciado por eles. Por esse moti- vo, muitos têm a ilusão de que suas ações e palavras são apenas suas, tendo origem neles mesmos, quando na verdade são o resultado das experiências e vivências compartilhadas por aqueles que fizeram parte de sua formação. Esse pensamento também vai ao encontro do que Freire (2014, p. 93) acreditava: “ninguém nasce feito. Vamos nos fazendo aos pou- cos, na prática social de que tomamos parte”. Isso significa que vamos nos constituindo como sujeitos sociais à medida que vamos nos apro- priando das formas de ser e agir em sociedade. Você já parou para pensar em si mesmo como sujeito social? Ou seja, de que maneira sua forma de ser, agir e pensar foi impactada ao longo de sua vida e de que modo hoje você cria impacto no modo de ser e agir das pessoas que estão à sua volta e, consequentemente, na sociedade? Às vezes, afastamo-nos dos conceitos e falamos dos sujeitos e da sociedade como se estivéssemos alheios a eles. Elias (1994) nos incen- tiva a perceber sociedade e indivíduo não como distintos e distantes, mas como indissociáveis e determinantes entre si. Para compreender verdadeiramente essa relação, precisamos mudar a forma de “pensar em termos de substâncias isoladas, únicas e começar a pensar em ter- Para ilustrar a relação entre os sujeitos e a sociedade, bem como o impacto do contexto so- cial na forma de pensar, ser e agir, indicamos o filme O doador de memó- rias, de 2014. Com base no livro de mesmo título, trata-se de uma aventura misturada com suspense que narra a história de um garoto que, até então, vive em um mundo perfeito. Ao completar 12 anos, ele é escolhido para ser um receptor de me- mórias da “comunidade” onde mora e passa a ser ensinado por um homem mais velho: o “Doador”. Com isso, o rapaz passa a problematizar situações que até então naturali- zava e precisa enfrentar os desafios diante das escolhas que fará com relação à sua vida e ao seu futuro. Esperamos que goste! Direção: Phillip Noyce. EUA: Walden Media, 2014. Filme Educação, inovação, tecnologia e sociedade 37 mos de relações e funções” (ELIAS, 1994, p. 23). Justamente o que esta- mos propondo nesta seção! Morin (2008) afirma que o indivíduo é o resultado de um processo reprodutor constante. Assim, a sociedade “com sua cultura, suas nor- mas, retroage sobre os indivíduos humanos e os produz enquanto in- divíduos sociais dotados de cultura” (MORIN, 2008, p. 119). Portanto, na condição de sujeitos sociais, somos produto e produtores da sociedade na qual vivemos. Com base em todas as considerações apresentadas, relacionan- do sujeito e sociedade, podemos afirmar que a forma com que os sujeitos se posicionam em/na sociedade está diretamente conecta- da com os avanços e retrocessos sociais e com as práticas coletivas (HINCKEL, 2016) representadas pelas instâncias educacionais, políticas, econômicas, culturais, religiosas e sociais. O professor tem um papel fundamental no desenvolvimento dos sujeitos para a sociedade. Ter consciência disso e compreender a relação entre a ação docente, suas práticas pedagógicas e as modificações que esperamos na sociedade é fundamental para que os professores possam ter sua visão “Thundercat” potencializada e, com isso, criar práticas pedagógicas significativas e intencio- nais, que sejam capazes de transformar os sujeitos e, consequentemente, a sociedade. Importante 2.2 A inovação e as tecnologias na sociedade Vídeo Você já parou para pensar na presença da inovação e das tecnolo- gias na sociedade? Em uma linha do tempo – do ser humano primata ao contemporâneo –, a inovação e a tecnologia sempre estiveram pre- sentes na história, com a caça, o cultivo, a criação de utensílios, ferra- mentas, meios de transporte e medicamentos e com novas formas de ensinar e aprender técnicas para viver em sociedade. O ser humano foi do fogo às bombas nucleares motivado pela curiosidade e seu espírito empreendedor. Isso o levou a alcançar um desenvolvimento mais especializado e potencializado, considerando a evolução das demais espécies de animais (LANZER et al., 2012 apud HINCKEL, 2016, p. 53). Já vimos que não existe empreendedorismo sem inovação, afinal, a propensão para inovar é uma característica de comportamento muito forte nos sujeitos que empreendem. As tecnologias, por sua vez, são inovações criadas pelos seres hu- manos com o intuito de facilitar suas vidas em sociedade. É importante reconhecermos que o avanço tecnológico e científico transforma de maneira muito rápida a forma como os sujeitos devem atuar. 38
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