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21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 1/26 TRABALHO E SOCIABILIDADE CAPI�TULO 3 - O TRABALHO NA SOCIEDADE CAPITALISTA Juliene Tenório e Marina Gondim 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 2/26 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 3/26 Introdução Nesta unidade, vamos abordar o trabalho na sociedade capitalista, a partir da crı́tica realizada por Karl Marx. Para entender os fundamentos metodológicos marxistas com relação ao tema, você precisa entender o materialismo dialético e o materialismo histórico estudado e utilizado por Marx na sua pesquisa sobre a sociedade capitalista. O materialismo dialético parte do princı́pio que nenhum fenômeno da natureza pode ser compreendido, se focalizado isoladamente, sem conexão com os fenômenos que o cercam, pois todo fenômeno, tomado de qualquer campo da natureza, pode se converter em um absurdo, se examinado sem conexão com as condições que o cercam, desligado delas; e pelo contrário, todo fenômeno pode ser compreendido e explicado, se examinado em sua conexão indissolúvel com os fenômenos circundantes e condicionados por eles. E, nesse sentido, �ica claro que Marx defende e realiza o estudo da realidade a partir da análise das suas múltiplas determinações. A partir do materialismo histórico, Marx e Engels, no “Manifesto Comunista”, buscaram estudar cada época histórica e explicar cada modo de produção. Você deve ter percebido que ao analisar toda a história da sociedade, desde a dissolução do regime primitivo da propriedade coletiva, todo esse caminho percorrido tem demonstrado a história de lutas de classe, de lutas entre classes exploradoras e exploradas, dominantes e dominadas, segundo as diversas fases do progresso social. A luta de classes chegou, na história da sociedade em que vivemos, a uma fase em que a classe explorada e oprimida (o proletariado) já não pode se emancipar da classe que a explora e a oprime (a burguesia) sem emancipar, para sempre, a sociedade inteira da opressão, da exploração e da luta de classes. Essa, na perspectiva de Marx e Engels, é um dos fundamentos da sociedade capitalista em que vivemos. Então, para entender a sociedade capitalista e a luta de classe, é necessário estudar sobre a natureza do trabalho no modo de produção capitalista, que servirá como base para que você compreenda as transformações contemporâneas no mundo do trabalho e analise sua inserção como integrante da classe trabalhadora. No cotidiano é comum o debate sobre o capitalismo. Há quem se posicione sobre a defesa e outros que se posicionam contrários ao sistema capitalista. Na maioria das vezes, motivados por juı́zo de valor, se é bom ou ruim. Pense sobre o que você já ouviu a respeito do capitalismo. Quais são os argumentos utilizados para defendê-lo? Você concorda com eles? Por quê? Quais os argumentos contrários? O que você já leu e estudou a respeito? Estudar sobre o modo de produção capitalista e o trabalho é compreender seus fundamentos, o que lhe sustenta, pois esse conhecimento é fundamental para que você tenha, enquanto estudante de Serviço Social, os elementos teóricos necessários para analisar o cotidiano, as mudanças e os desa�ios do trabalho na contemporaneidade. Para muito além de classi�icar em bom ou ruim, você terá a oportunidade de conhecer as caracterı́sticas do trabalho na sociedade capitalista, a partir dos estudos desenvolvidos no âmbito da teoria marxista. Bom estudo! 3.1 Organização do trabalho na sociedade capitalista: taylorismo, fordismo e toyotismo A erosão do feudalismo, sob in�luência da ação dos “burgueses”, comerciantes que se desenvolveram a partir da atividade mercantil, a partir do século XVI, possibilitou o estabelecimento de um novo modo de produção denominado de capitalismo. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 4/26 Esse modo de produção, que vamos estudar detalhadamente nesta unidade, se mantém contemporâneo, prevalecendo em paı́ses mais e menos desenvolvidos, con�igurando-se, no século XXI, como um “sistema planetário” (NETTO; BRAZ, 2011). Neste item, você compreenderá as caracterı́sticas do modo de produção capitalista e a forma como esse modelo econômico organizou o trabalho, a partir da criação e adoção dos modelos de produção propostos pelo taylorismo, fordismo e toyotismo, que provocaram mudanças na sociabilidade e nas relações sociais. 3.1.1 O trabalho no modo de produção capitalista Com o �im do feudalismo, um novo modo de produção foi gestado e se desenvolveu. Vamos entender como isso aconteceu e que mudanças produziram com relação ao trabalho? Com a expansão marı́timo-comercial na Europa, na época do modo de produção feudalista, para lugares cada vez mais distantes, a atividade mercantil de comerciantes e mercadores movidos pelo lucro foi impulsionada, contribuindo, a partir do século XVI, para o surgimento da burguesia que, ao se desenvolver enquanto classe, aliou-se aos reis para ampliar suas atividades econômicas e se fortalecer diante dos senhores feudais. Assim, iniciaram-se os Estados Nacionais Absolutistas, em que a centralização do poder foi fundamental para a padronização monetária, a formação de exércitos nacionais, a criação de leis que favorecessem a burguesia na conquista militar de outros mercados para expansão do comércio e domı́nio das colônias. Para os reis, a burguesia contribuiu para o �inanciamento dos exércitos nacionais, para aumento na arrecadação de impostos e fortalecimento de seu poder (VIEIRA et al., 2015). E� dessa forma que na Europa Ocidental, a uni�icação monárquica de Estados-nações e a expansão marı́timo- comercial, nos séculos XV e XVI, contribuı́ram para o enfraquecimento do feudalismo, a ascensão da burguesia e a colonização da América. De acordo com Vieira et al. (2015), o capitalismo concorrencial inaugurou o comércio em escala larga e intercontinental, integrando América, A� frica e A� sia com a nova ordem econômica europeia. A dominação pelo uso da força transformava em mercadorias as formas de produção das comunidades nativas ou faziam com que os produtos das mesmas mercadorias circulassem na economia capitalista, extraindo o excedente para a produção da acumulação primitiva do capital. Figura 1 - Expansão marı́timo-comercial na Europa e o fortalecimento da atividade mercantil. Fonte: Kostyantyn Ivanyshen, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 5/26 A acumulação primitiva do capital consistiu no processo histórico, realizado entre o �inal do século XV ao século XVIII, que propiciou, de acordo com Netto e Braz (2011), o surgimento e desenvolvimento do modo de produção capitalista a partir da existência e do confronto entre aqueles que possuem recursos para comprar a força de trabalho de outras pessoas como mercadoria e dos que dispõem apenas da sua força de trabalho como única mercadoria para vender, ou seja, a existência de duas classes sociais. Importante entender que não foi apenas o acúmulo do capital mercantil que contribuiu com a formação dos burgueses. Este foi um ladodo processo. O outro lado foi a expropriação dos camponeses de suas terras e seu deslocamento para as cidades, dispondo apenas de sua capacidade de trabalhar, assim como a expansão ampliada do capital a partir do saqueamento, extermı́nio, escravização dos povos e das riquezas da América, A� frica e A� sia (NETTO; BRAZ, 2011). Então, observe a complexidade do processo e a importância de compreender que a constituição da burguesia, enquanto classe social, foi resultado da expansão das atividades mercantis em larga escala e de forma intercontinental, utilizando a dominação, a escravidão e o saqueamento das riquezas dos povos originais daquelas terras, como aconteceu com o Brasil, mas também por meio do empobrecimento e expulsão dos camponeses das terras, resultando na migração para as cidades desses trabalhadores, que passaram a deter apenas a capacidade de trabalhar, da criação de leis de apoio à burguesia, dentre outros fatores. Por isso, Marx (1982) explica que dinheiro, mercadoria, meios de produção e de vida não são por si só o inı́cio do capital, eles passam pela transformação em capital, e isso ocorre sob circunstâncias bem determinadas que se condensam em duas classes bem diferentes, quais sejam: [...] possuidores de mercadorias têm de se pôr frente a frente e entrar em contato, de um lado proprietários de dinheiro, de meios de produção e de vida, aos quais o que interessa é valorizar a soma de valor por eles possuı́da por meio da compra de força de trabalho alheia; do outro lado trabalhadores livres, vendedores da força de trabalho própria e por isso vendedores de trabalho. (MARX, 1982, [s. p.]) VOCÊ QUER LER? Para aprofundar a compreensão do capitalismo moderno e as transformações que o atingiram, desde o fordismo e a crise da sociabilidade, passando pela globalização e pela emergência da problemática ecológica, o livro “Da grande noite à alternativa: o movimento operário europeu em crise” (1998), de Alain Bihr, é uma excelente indicação. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 6/26 E� essa polarização entre quem dispõe dos meios de produção e de vida dos que dispõem da força de trabalho que produz as condições para o surgimento e desenvolvimento do modo de produção capitalista, que para se fortalecer, amplia essa polarização. E� , dessa forma, que a acumulação primitiva ou original do capital consistiu no processo historicamente desenvolvido de separação dos trabalhadores dos meios de produção (MARX, 1982). Vamos entender melhor sobre capital e a relação que ele estabelece com o trabalho? O que você conhece sobre isso? O que é capital? Será que é apenas sinônimo de dinheiro? Apesar de muito usado no dia a dia como sinônimo de dinheiro, o sentido original do termo “capital” ainda parece desconhecido para muitas pessoas. Enquanto uma das categorias centrais do capitalismo, capital “[…] é uma categoria peculiar, especı́�ica do sistema capitalista, e, portanto, o quali�ica, o de�ine, o determina” (MONTAN� O; DURIGUETTO, 2011, p. 77), e deve ser entendido com base em duas dimensões: determinação econômica-polı́tica e relação social determinada. Com relação à primeira dimensão, a determinação econômico-política do capital, Montaño e Duriguetto (2011) explicam que o capital não se resume a dinheiro, maquinária, salário, bens, dinheiro guardado, ele se constitui a partir de um processo de valorização do dinheiro. Que processo é este? E� essa polarização entre quem dispõe dos meios de produção e de vida dos que dispõem da força de trabalho que produz as condições para o surgimento e desenvolvimento do modo de produção capitalista, que para se fortalecer, amplia essa polarização. E� , dessa forma, que a acumulação primitiva ou original do capital consistiu no processo historicamente desenvolvido de separação dos trabalhadores dos meios de produção (MARX, 1982). Vamos entender melhor sobre capital e a relação que ele estabelece com o trabalho? O que você conhece sobre isso? O que é capital? Será que é apenas sinônimo de dinheiro? Apesar de muito usado no dia a dia como sinônimo de dinheiro, o sentido original do termo “capital” ainda parece desconhecido para muitas pessoas. Enquanto uma das categorias centrais do capitalismo, capital “[…] é uma categoria peculiar, especı́�ica do sistema capitalista, e, portanto, o quali�ica, o de�ine, o determina” (MONTAN� O; DURIGUETTO, 2011, p. 77), e deve ser entendido com base em duas dimensões: determinação econômica-polı́tica e relação social determinada. Com relação à primeira dimensão, a determinação econômico-política do capital, Montaño e Duriguetto (2011) explicam que o capital não se resume a dinheiro, maquinária, salário, bens, dinheiro guardado, ele se constitui a partir de um processo de valorização do dinheiro. Que processo é este? 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 7/26 E� um processo de produção da mais-valia pelo trabalhador, que possibilita a valorização do dinheiro e sua transformação em capital. Essa mais-valia, no entanto, é apropriada pelo capitalista, sujeito que possui o dinheiro e os meios de produção (maquinário, estrutura etc.). Mas é um processo que só existe no modo de produção capitalista, sendo sua principal caracterı́stica a separação do produtor direto, o trabalhador, dos meios de produção, sob propriedade do capitalista. O que faz com que os trabalhadores tenham como única alternativa vender sua força de trabalho ao capitalista (MONTAN� O; DURIGUETTO, 2011). A segunda dimensão do capital corresponde à relação social que existe na medida em que tanto o capitalista quanto o trabalhador precisam estabelecer uma relação, pois o capitalista só consegue acumular incorporando a força de trabalho de outros e o trabalhador, por sua vez, só produz se estiver vinculado ao capital, “[…] assim, capital e trabalho, capitalistas e trabalhadores, precisam estabelecer uma relação (necessária e ineliminável no MPC)” (MONTAN� O; DURIGUETTO, 2011, p. 78). O que é essa força de trabalho ou capacidade de trabalho? Consiste no “[…] complexo das capacidades fı́sicas e mentais que existem na corporeidade, na personalidade viva de um homem e que ele põe em movimento sempre que produz valores de uso de qualquer tipo” (MARX, 2013, p. 242). Isto é, trata-se da nossa capacidade humana de pensar, planejar, elaborar, construir e usar o corpo e a mente para produzir, criar e executar uma ação. Essa força de trabalho, no modo de produção capitalista, se transformou em mercadoria, sendo colocada à venda pelo seu próprio possuidor para quem possui os meios de produção e o dinheiro para comprar a força de trabalho de outra pessoa. Nesse caso, ambos “[…] se encontram no mercado e estabelecem uma relação mútua como iguais possuidores de mercadorias, com a única diferença de que um é comprador e o outro, vendedor” (MARX, 2013, p. 242). Vejamos um exemplo. Você já conversou com alguém que é agricultor? Agricultores conhecem as sementes, a melhor terra, o perı́odo do plantio e da colheita, sabem as técnicas de manejo do solo, têm força e disposição para o trabalho na agricultura. Mas agricultores que não têm terra, matéria-prima, maquinários, ou seja, os meios de produção, não têm como comercializar produtos. Nesse caso, eles precisam vender sua força de trabalho, como mercadoria, para quem detém os meios de produção, em troca de um salário.Figura 2 - Processo de valorização do dinheiro constitui a determinação econômico-polı́tica do capital. Fonte: Artem Samokhvalov, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 8/26 Por isso, é fundamental que você entenda que a existência, no modo de produção capitalista, da separação e relação entre quem possui dinheiro e mercadorias, de um lado, e quem possui apenas sua força de trabalho, de outro, não é obra da natureza, nem mesmo existiu em outros perı́odos históricos. Ela é fundamentalmente “[…] resultado de um desenvolvimento histórico anterior, o produto de muitas revoluções econômicas, de destruição de toda uma série de formas anteriores de produção social” (MARX, 2013, p. 244). Mas e o trabalho? O trabalho consiste em um processo de que participam indivı́duos e natureza, sendo os indivı́duos aqueles que impulsionam, regulam e controlam essa relação, como também é uma atividade essencialmente humana, criadora teleologicamente orientada e que sua natureza se altera em cada modo de produção (MARX, 2013). Figura 3 - Venda da força de trabalho como mercadoria. Fonte: Blaj Gabriel, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 9/26 No modo de produção capitalista, o trabalho se realiza de forma subordinada ao capital e seus interesses, a partir da venda da força de trabalho do trabalhador ao capitalista, estabelecendo uma relação de emprego e salário. O importante de entender, neste momento, é que no modo de produção capitalista o capital comanda, subordina, sujeita o processo de trabalho na perspectiva de extrair o máximo de excedente possı́vel da atividade do trabalhador. Dessa forma, o processo de trabalho constitui o processo de criação de valor e um processo de valorização do capital. Assim explicam Netto e Braz (2011, p. 121): No processo de trabalho, o que interessa ao capitalista é justamente o processo de valorização: é nele que se produz a mais-valia (o excedente). Compreende-se, portanto, que o controle do processo de trabalho seja de fundamental importância para o capitalista, uma vez que é esse controle que lhe permite incrementar o excedente. O controle sobre o processo de trabalho, entretanto, não ocorreu de forma homogênea e em seguida à construção do capitalismo como modo de produção. Netto e Braz (2011) explicam que foi preciso mais de dois séculos (XVI ao XIX) para que o capital conseguisse instaurar a produção capitalista, tendo realizado os seguintes passos. Capitalistas reuniram trabalhadores assalariados num mesmo espaço fı́sico sob sua supervisão. Trabalhadores atuavam sob forma de cooperação, como controlavam as técnicas produtivas e detinham o conhecimento, nesse momento, o controle do capitalista sobre o processo de trabalho era apenas formal, o que Marx chamou da “[…] subsunção formal do trabalho ao capital” (NETTO; BRAZ, 2011, p. 121). Na segunda metade do século XVIII, o capital adota a manufatura no processo de trabalho, reunindo trabalhadores num espaço fı́sico e especializando suas atividades, destruindo a importância dos saberes de ofı́cio e transformando trabalhadores em meros executores de tarefas. Ao introduzir a divisão capitalista do trabalho no interior das unidades de produção, ocorrerá uma diferenciação da força de trabalho: de um lado, uma pequena parcela de trabalhadores especializados e, do outro, a desquali�icação dos demais trabalhadores, ao multiplicar atividades simples e abrir espaço para o trabalho feminino e infantil. Figura 4 - Trabalhadores atuando sob forma de cooperação. Fonte: Jeffrey B. Banke, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 10/26 Com a Revolução Industrial, iniciada no �inal do século XVIII, o capital instaura a grande indústria, subordinando por inteiro o trabalho pelo processo de trabalho, fazendo com que o trabalhador seja mero apêndice das máquinas, o que agrava sua desquali�icação e se aprofunda a divisão do trabalho entre quem pensa e administra os processos produtivos daqueles que executam. Figura 5 - Divisão capitalista do trabalho a partir da manufatura marcou o perı́odo da segunda metade do século XVIII. Fonte: Pete Niesen, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 11/26 A consolidação do capitalismo, impulsionada pela Revolução Industrial do século XVIII, que se iniciou na Inglaterra e expandiu para outros paı́ses, resultou em transformações importantes nos processos de trabalho diante da industrialização e urbanização, assim como contribuiu para a passagem do capitalismo concorrencial para o capitalismo monopolista, sustentada pela lógica imperialista do capitalismo, cujo processo de acumulação se baseia “[…] na proteção da propriedade privada e no aumento do poder polı́tico, sempre pensados em escala expansiva de forma a garantir hegemonia e valorização do capital” (GUIRALDELLI, 2014, p. 104). Ao �inal do século XIX, as atividades produtivas se complexi�icam cada vez mais provocando a necessidade de sistematização, administração e gerenciamento dos processos de trabalho no interior das indústrias, tendo destaque para a organização do trabalho nos modelos do taylorismo, fordismo e toyotismo, com impactos importantes na forma de sociabilidade e nas relações sociais, como veremos a seguir. Destacamos, entretanto, que a divisão em subtópicos do taylorismo, fordismo e toyotismo foi feita para facilitar seu entendimento a respeito desses três modelos de organização do trabalho na sociedade capitalista. Não signi�ica que eles se desenvolveram e foram implementados em uma sequência, em etapas e de forma estática, pelo contrário, os três modelos se relacionam e têm re�lexos ainda nos dias de hoje. 3.1.2 Organização do trabalho na sociedade capitalista: taylorismo Você já trabalhou ou observou um local de trabalho onde existem diferenciação de valor e importância do trabalho, a partir da divisão entre gerentes e demais funcionários? Um trabalho em que os gerentes decidem e aos demais trabalhadores cabem apenas a execução, sem participar das decisões a respeito das metas e da rotina de trabalho? Você sabia que é uma divisão criada pelo taylorismo? Figura 6 - Aprofundamento da divisão capitalista do trabalho com a grande indústria. Fonte: Minerva Studio, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 12/26 Enquanto modelo de organização do trabalho da Escola da Administração Cientı́�ica, o taylorismo foi desenvolvido nos Estados Unidos, a partir dos trabalhos do engenheiro mecânico Frederick Winslow Taylor (1856-1915) buscando responder ao desa�io de aumentar a produtividade das empresas por meio do aumento da e�iciência dos operários, voltando a atenção para os métodos de trabalho, os movimentos que eram necessários para executar determinada tarefa, o tempo determinado para sua execução, criando a organização racional do trabalho (ORT), conforme explica Chiavenato (2008). No que consiste essa organização racional do trabalho? Ao estudar, observar, analisar o trabalho e seu cotidiano nas fábricas, Taylor (1990) identi�icouque os operários aprendiam suas tarefas a partir do repasse de informações e observação da dinâmica de trabalho de seus companheiros de trabalho, resultando numa diversidade de métodos de execução das atividades e processos de trabalho. Para ele, isso atrapalhava a produção, pois as atividades eram executadas de diferentes formas, ritmos e tempos. Por isso, Taylor buscou organizar de forma racional e cientı́�ica o trabalho, fundamentando-se nos seguintes aspectos: 1)Análise do trabalho e do estudo dos tempos e movimentos; 2) Estudo da fadiga humana; 3) Divisão do trabalho e especialização do operário; 4) Desenho de cargas e tarefas; 5) Incentivos salariais e prêmios de produção; 6) Conceito de homos economicus; 7) Condições ambientais de trabalho; 8) Padronização de métodos e máquinas; 9) Supervisão funcional. (CHIAVENATO, 2008, p. 6, grifos do autor) Figura 7 - A organização racional do trabalho na indústria propunha estabelecer o trabalho de forma racional e cientı́�ica. Fonte: VoodooDot, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 13/26 Você percebeu qual foi o caminho de Taylor? Ele fez uma análise e observação sobre o trabalho, identi�icando a realidade, as di�iculdades e construindo uma proposta que resolvesse o desa�io que as indústrias tinham na época, de aumento da produtividade, ou seja, da produção da mais-valia. Ao analisar esses aspectos, Taylor desenvolveu então a ORT com quatro alicerces. Vamos ver quais foram? O primeiro diz respeito ao comando e controle, cuja inspiração foi no modelo militar, para de�inir que a gerência funciona como uma ditadura ao pensar e mandar, cabendo ao trabalhador apenas executar. O segundo alicerce consiste em de�inir uma única maneira certa, sendo de�inida pelo gerente, devendo os operários executar sem qualquer objeção. O terceiro alicerce se voltou para a defesa de que a indústria tem mão de obra, não recursos humanos, por isso não lhe deve nada, embora exija lealdade dos trabalhadores à empresa. Por último, a defesa da segurança e a sensação de estabilidade dominando seus mercados (CHIAVENATO, 2008). Os alicerces do taylorismo focam, dessa forma, na diferenciação e hierarquização entre o trabalho intelectual e o trabalho manual, ou seja, entre quem pensa e quem executa a atividade de trabalho. Fizeram parte da organização racional taylorista do trabalho: de�inição de tarefas fragmentadas, movimentos repetitivos, controle do tempo, rotinização na relação dos trabalhadores com as máquinas, sendo enfatizada a disciplina no ambiente de trabalho e o adestramento aos princı́pios institucionais da indústria (GUILDARELLI, 2014). Conforme temos aprendido, desde o inı́cio desta disciplina, o trabalho é central para a sociabilidade humana, para a forma como nos organizamos e nos relacionamos em sociedade. O que essas mudanças na forma de gerir o processo de trabalho, conforme o taylorismo, impactam para os trabalhadores? Destacamos duas questões, acompanhe. A primeira consiste na diminuição do poder de negociação dos trabalhadores. Antunes (2017) chama atenção de que o objetivo fundamental do taylorismo, ao estudar os processos de trabalho restritos à classe dos proprietários dos meios de produção, alienando o trabalhador desse processo. Fazendo isso, o taylorismo minimiza a importância dos saberes-fazeres elaborados historicamente pela classe trabalhadora, reformulando-os e impondo-os como normas aos trabalhadores, de forma abstrata e alienada, quando limitou a atividade produtiva dos trabalhadores à execução de tarefas rotineiras e con�igurou VOCÊ QUER VER? O �ilme “Daens: Um Grito de Justiça”, de 1993, com direção de Stjin Coninx, se passa no �inal do século XIX, em Aalst, na Bélgica, e permite entender muitos aspectos da teoria marxista, e faz referência a temáticas como: desigualdades da sociedade capitalista, exploração do proletariado pela burguesia, exploração das mulheres e crianças nas fábricas, entre outras. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 14/26 uma “[…] educação puramente parcelar, hierarquizada e perpetuadora da nefasta divisão social entre trabalho intelectual e trabalho manual” (ANTUNES, 2017, p. 3). Você se lembra das capacidades humanas com relação ao trabalho: teleologia, re�lexiva, comunicação, escolha entre alternativas concretas, universalização, socialização? Imagine ter que trabalhar sem poder utilizar e desenvolver essas capacidades, limitando-se a atividades rotineiras, o quão nefasto pode ser na vida de um ser humano essa divisão entre o trabalho intelectual e o trabalho manual, estabelecida pelo taylorismo. A segunda questão diz respeito ao controle sobre a vida dos trabalhadores e suas famı́lias. A regulação, o controle e a dominação dos industriais não se detinham ao espaço de trabalho, se ampliava para o controle sobre a vida privada dos trabalhadores. Guildarelli (2014) a�irma que uma das estratégias para isso foi a criação das vilas operárias que possibilitavam a coerção, o consenso e a persuasão dos trabalhadores e familiares do controle sobre suas vidas. Os trabalhadores, ao receberem a chave da casa e a possibilidade de morar nela com sua famı́lia, enquanto trabalhavam na fábrica, eram submetidos a um processo de disciplinamento de suas vidas, rotinas, dinâmicas e valores em função do aumento de sua capacidade de produção. Por exemplo, ao analisar as vilas operárias no Brasil na Primeira República (1908-1909), Coutinho e Scheinvar (2015), a partir da rotina de um grupo de operários cariocas do setor têxtil que moravam em vilas operárias, evidenciaram uma lógica patronal e governamental de repressão e controle sobre o trabalho e a vida privada dos trabalhadores. Esse controle se materializava a partir do controle sobre o tempo e o caminho feito pelo trabalhador para chegar ao local de trabalho, o controle sobre que animais podiam ou não criar, assim como a proibição da comercialização de produtos nas vilas enquanto estratégia dos trabalhadores no aumento da renda familiar. As autoras concluem que os trabalhadores não recebiam apenas a moradia, recebiam também “[…] todo um ‘way of life’ baseado em padrões burgueses de ser e estar no mundo, considerados mais so�isticados e adequados para aqueles que cumprem a função de produzir a mercadoria” (COUTINHO; SCHEINVAR, 2015, p. 12, grifos dos autores). Isto é, um controle que se ampliava para além do corpo fı́sico, ao trabalho, atingindo subjetividades, relações sociais, processos educativos. Figura 8 - Vilas operárias foi uma das formas de controle sobre a vida dos trabalhadores. Fonte: Alexander Raths, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 15/26 O desenvolvimento do taylorismo, com suas estratégias de organização racional do trabalho, para aumento da produção industrial, foi fortalecido a partir da associação a outra proposta de organização do processo de trabalho, denominada fordismo, no inı́cio do século XX, como veremos a seguir. 3.1.3 Fordismo Você já parou para pensar sobre a quantidade de coisas que são produzidas, comercializadas e consumidas todos os dias? Já observou como essas mercadorias se tornam obsoletas de forma rápida? Por exemplo, ao comprar o último lançamento de uma TV, parcelada em 12 vezes no cartão decrédito, antes mesmo de concluir o pagamento das parcelas, ela já foi substituı́da por outro modelo de TV muito mais inovadora? Você sabia que isso consiste na proposta de produção e consumo em massa e apresenta relação com o fordismo? Vamos explicar. Como falamos anteriormente, a padronização e organização das formas e processos de trabalho pelo taylorismo foram incorporadas ao fordismo, no inı́cio do século XX. Idealizado por Henry Ford (1863-1947), o fordismo foi elaborado como um modelo de produção em massa, com padronização dos produtos, redução do tempo e custos gastos na produção, bem como na disponibilização deles para consumo em massa. Antunes (2017) explica que o fordismo possui quatro pontos centrais, quais sejam: �ixação dos trabalhadores nos postos, racionalizando processos e reduzindo desperdı́cios; con�iguração da linha de montagem, integrando as atividades de cada trabalhador, conforme a de�inição da gerência da empresa; descrição das tarefas com tempo e modo de execução, com exercı́cios repetitivos e padronizado; especialização das atividades com diferenciação entre trabalho intelectual de trabalho manual. A divisão do trabalho, no modelo fordista/taylorista, foi estabelecida da seguinte forma: em cada parte da produção, um grupo de operários executava determinada tarefa, sendo a interligação entre as partes da tarefa realizada por meio da esteira e o ritmo de trabalho de�inido pela gerência. Dessa forma, a divisão parcelar do trabalho proposta pelo fordismo se combinava ao ritmo de trabalho cronometrado de�inido pelo taylorismo, Figura 9 - Produção em massa era a proposta do fordismo. Fonte: Rainer Plendl, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 16/26 com separação entre a dimensão intelectual, responsável pela elaboração, e dimensão manual do trabalho, a quem cabia a execução (CUNHA, 2016). Assim como da manutenção da divisão sexual do trabalho, ou seja, a desigualdade entre homens e mulheres no ambiente de trabalho, sendo o trabalho feminino mais desvalorizado, precarizado e inferiormente remunerado (GUILDARELLI, 2014). O padrão de produção fordista/taylorista encontrou ressonância e foi amplamente difundido nas economias capitalistas centrais, após a Segunda Guerra Mundial, agregando-se ao liberalismo de John Maynard Keynes, que �icou conhecido como keynesianismo, enquanto expressão intelectual para a saı́da da crise dos anos 1929-1932, com a criação da proposta do Estado de bem-estar social, fundado nos pilares do pleno emprego e igualdade social, por meio da ação do Estado em duas vias: geração de emprego dos fatores de produção, através dos serviços públicos e privados; aumento da renda e promoção de igualdade, a partir do investimento em polı́ticas sociais (BEHRING; BOSCHETTI, 2011). Mas como essa relação acontece entre o fordismo/taylorismo com o Estado de bem-estar social e as estratégias do capital para enfrentamento e saı́da da crise, após a Segunda Guerra Mundial? Behring e Boschetti (2011) explicam que a combinação entre produção em massa e consumo de massa não exigia apenas um novo sistema de reprodução da força de trabalho, mas também a produção de um novo indivı́duo, cujo modo de vida e consumo precisava ser articulado à nova proposta da sociedade capitalista. Signi�ica que produzir em larga escala necessitava de que os produtos fossem comercializados e consumidos também em larga escala. Para isso, um novo modo de vida e consumo na sociedade precisava ser criado e estimulado. No que a educação, a ética, a disseminação de valores, legislação, organização e relações sociais passam a ser utilizadas como estratégias para esse �im. Importante registrar que tais mudanças não foram aceitas sem questionamentos, greves e protestos protagonizados pelo movimento operário, contribuindo também para alterações nas relações sociais entre burguesia e trabalhadores. No caso da burguesia, as altas taxas de lucro, como resultado da superexploração dos trabalhadores, pressionaram por concessões e acordos. Os trabalhadores, por sua vez, organizados no movimento operário, ainda que tendo atitudes mais corporativistas, contentando-se com acordos coletivos, ganhos relacionados ao aumento da produtividade e da expansão das polı́ticas sociais (BEHRING; BOSCHETTI, 2011). VOCÊ SABIA? Existem registros que, em 1916, Henry Ford contratou assistentes sociais para atuar no controle sobre o modo de vida e consumo dos trabalhadores inseridos em sua fábrica, com objetivo de promover padrões de consumo entre os trabalhadores de acordo com os interesses da empresa (BEHRING; BOSCHETTI, 2011). 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 17/26 Nesse contexto, o Estado tem papel fundamental para manutenção da produtividade e taxas de lucro, segundo padrões fordistas, assumindo uma série de obrigações, como controle dos ciclos econômicos e combinação de polı́ticas �iscais e monetárias, dirigidas para áreas de investimento público, como transporte e equipamentos públicos, como também complementação aos salários dos trabalhadores com gastos referentes à assistência médica, habitação, educação, dentre outros, e participação nos acordos salariais e direitos na produção dos trabalhadores (HARVEY, 2008). Por volta dos anos 1970, uma nova crise capitalista coloca em xeque a proposta keynesiana do Estado de bem- estar social e dos modelos de produção fordista/taylorista, abrindo para a criação de outras formas de gestão e organização do trabalho, a partir da experiência do modelo produtivo toyotista, que vamos apresentar a seguir. 3.1.4 Toyotismo Você já ouviu falar sobre a exigência de um trabalhador polivalente, multifuncional? Já leu reportagens sobre vagas de emprego que apresentam como uma das exigências o candidato ser um trabalhador polivalente? Sabia que essa exigência apresenta relação com a proposta do toyotismo? Vamos à explicação. Por volta dos anos 1960, uma série de acontecimentos contribuem para apresentar problemas sérios no fordismo. De acordo com Harvey (2008), alguns dos acontecimentos foram a recuperação no pós Segunda Guerra Mundial e a necessidade de expandir os mercados de exportação da Europa Ocidental e Japão; a queda da produtividade e lucratividade nos Estados Unidos a partir de 1966; a formação do mercado euro-dólar; as polı́ticas de substituição de importação nos paı́ses chamados, na época, do Terceiro Mundo, especialmente na América Latina; o desa�io à hegemonia dos Estados Unidos pelos paı́ses recém-industrializados, dentre outros, tornaram explı́cita a incapacidade do fordismo/taylorismo de conter contradições que são próprias do capitalismo, contribuindo com a profunda recessão de 1973, fortalecida pelo choque do petróleo. Novas experiências referentes à organização do trabalho e da vida foram gestadas, na perspectiva de recuperar os padrões de acumulação capitalista. Harvey (2008) denomina essa experiência de acumulação �lexível, sendo marcada pelo confronto com a rigidez apresentada pelo fordismo, apoiando-se na �lexibilidade dos processos e mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo da sociedade, bem como investindo na criação de novos setores produtivos e inovação comercial, tecnológica e organizacional. De acordo com Guildarelli (2014), o toyotismo apresenta a proposta de organização do trabalho, baseadana �iloso�ia de uma empresa enxuta e �lexı́vel, conforme foi adotado na Itália e no Japão. Nesse modelo, estão presentes os cı́rculos de controle de qualidade (CCQs), que agrupam trabalhadores para discussão sobre a qualidade do trabalho e gerar sentimento de pertencimento à empresa a qual estão vinculados; o desenho assistido por computador (CAD) e a manufatura assistida por computador (CAM), contribuindo para que parte da produção seja externa à fábrica; o sindicalismo por empresa, fragilizando o movimento operário de forma geral; a redução dos postos de trabalho; a terceirização; a dispersão da produção pelo mundo, dentre outros. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 18/26 Sem romper com a base taylorista/fordista, o toyotismo buscou responder às demandas de acumulação, reprodução e valorização do capital de�lagradas por perı́odo de crise de superprodução, provocada pelas metas do fordismo (HARVEY, 2008). Você se lembra que a proposta do fordismo foi de produção e consumo em massa? Pois bem, a partir da crise de�lagrada entre os anos 1960 e 1970, os trabalhadores vivenciam altas taxas de desemprego e o consequente enfraquecimento do poder dos sindicatos, o aumento da competição por uma vaga de trabalho, enquanto os patrões obtêm a redução das margens de lucro. Diante dessa conjuntura, a partir da acumulação �lexı́vel, explica Harvey (2008), o capital investe na reestruturação do mercado de trabalho impondo contratos �lexı́veis, trabalho em tempo parcial, temporário e subcontratado, podendo o trabalhador ser demitido sem ou com poucos custos quando consideram necessário, como também fortaleceu a vulnerabilidade dos grupos desprivilegiados pelas questões de gênero e raciais, como mulheres e população negra. A transformação da estrutura de mercado do trabalho ocasionou outras mudanças, como a formação de pequenos negócios, reavive-se o trabalho doméstico, familiar, paternalista, crescem as economias informais, aproveitamento da força de trabalho pouco remunerada dos paı́ses mais pobres, dentre outros (HARVEY, 2008). Ocorre, nesse perı́odo e se prolongando na atualidade, a substituição do trabalho contratado e regulamentado da era taylorista e fordista, resultado da luta histórica dos trabalhadores por direitos sociais, pelo empreendedorismo, trabalho intermitente, trabalho voluntário, capital humano, salários �lexı́veis, trabalho polivalente, trabalho digital etc. Tais formas de trabalho materializam a superexploração do trabalho, con�igurando “[…] a tendência crescente a precarização estrutural da força de trabalho em escala global” (ANTUNES, 2017, p. 5), impulsionados por metas e competências. Figura 10 - Cı́rculos de controle de qualidade levam trabalhadores a discutir melhorias e gerar sentimento de pertencimento às empresas. Fonte: Fizkes, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 19/26 Qual o resultado disso para a classe trabalhadora? De acordo com Antunes (2015, p. 6), “[…] terceirização, informalidade, �lexibilidade, desemprego, desemprego por desalento (que não entra nas estatı́sticas) e pauperização ampli�icada”, assim como a demanda por uma série de quali�icações comportamentais, educacionais e pro�issionais. No entanto, essas consequências são legitimadas e justi�icadas sob o discurso da culpabilização dos trabalhadores. No plano da subjetividade dos trabalhadores, as consequências vão desde a transformação em sujeito-objeto, que funciona para a autoa�irmação e a reprodução de uma força estranha, a autoalienação quando vende sua força de trabalho sob condições que lhe são impostas pela lei de mercado (ANTUNES, 2015). Você percebeu que a exploração faz parte do trabalho da classe trabalhadora no modo de produção capitalista, seja nos modelos de produção do taylorismo, fordismo ou toyotismo? Entendeu a con�iguração do trabalho no modo de produção capitalista? Então, vamos ao próximo item, tratar do que signi�ica a exploração e compreender a alienação como causa e resultado desse processo. Figura 11 - Trabalho digital, uma das tendências da precarização estrutural da força de trabalho. Fonte: Scyter5, iStock, 2020. 3.2 Trabalho na sociedade capitalista: exploração e alienação Como você pôde observar, no modo de produção capitalista, o trabalho sofre e promove alterações com relação a sua organização e execução, as relações sociais, as condições de vida das pessoas, a sociabilidade. Nesse modo de produção, o trabalho é subordinado ao capital para extração do excedente, criação de valor e valorização do capital, conforme explicamos anteriormente, o que caracteriza a exploração do trabalho. Vejamos como isso acontece. O capitalista, ao contratar o trabalhador para uma determinada jornada de trabalho, paga um salário que corresponde ao valor da força de trabalho. Durante essa jornada, a força de trabalho produz mais valor que o valor que se necessita para a reprodução, sendo esse valor excedente, denominado por Marx (2013) de mais- valia, que o capitalista se apropria sem qualquer despesa ou custo adicional (NETTO; BRAZ, 2011). 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 20/26 Dessa forma, na jornada de trabalho, o tempo de trabalho dos trabalhadores se desdobra em duas partes. Na primeira parte, há o tempo de trabalho necessário, em que os trabalhadores produzem o valor que corresponde aos seus salários, cobrindo sua reprodução. Esse tempo de trabalho é necessário tanto para trabalhadores quanto para capitalistas, visto que “[…] ele é necessário ao trabalhador, porquanto é independente da forma social de seu trabalho, e é necessário ao capital e seu mundo, porquanto a existência contı́nua do trabalhador forma sua base” (MARX, 2013, p. 293). Na segunda parte, há o tempo de trabalho excedente, que signi�ica a produção pelos trabalhadores do valor excedente (mais-valia), ou seja, “[…] o trabalhador trabalha além dos limites do trabalho necessário, custa- lhe, de certo, trabalho, dispêndio da força de trabalho, porém não cria valor algum para o próprio trabalhador” (MARX, 2013, p. 293), visto que lhe é extraı́do pelo capitalista. Isso ocorre porque a força de trabalho possui um traço que a torna única e diferente de outras mercadorias: “[…] ela cria valor ao ser utilizada, ela produz mais valor que o necessário para reproduzi-la, ela gera um valor superior ao que custa” (NETTO; BRAZ, 2011, p. 110). Dessa forma, a marca da produção capitalista é a seguinte: “[…] o capitalista paga ao trabalhador o equivalente ao valor de troca de sua força de trabalho e não o valor criado por ela na sua utilização (uso) — e este último é maior que o primeiro” (NETTO; BRAZ, 2011, p. 110). Vamos assistir à uma videoaula para entendermos melhor sobre a mais-valia? Vejamos um exemplo. Imagine um padeiro contratado para uma jornada de trabalho de 8 horas diárias que devem ser executadas de segunda a sábado. Mensalmente, esse trabalhador totaliza, em média, 192 horas trabalhadas na produção de pães, bolachas, bolos etc. Conforme explicamos acima, parte dessa jornada consiste em tempo de trabalho necessário, cuja venda dos produtos produzidos subsidia o salário desse trabalhador e os custos da produção; e o restante da jornada produz o valor excedente que �ica para odono da padaria. Entendeu? 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 21/26 E� essa relação entre trabalho necessário e trabalho excedente que resulta, segundo Netto e Braz (2011), na taxa de mais-valia e, consequentemente, na taxa de exploração do trabalho pelo capital. A relação capital/trabalho, personalizada na relação capitalista/proletário, que tratamos anteriormente, consiste basicamente “[…] na expropriação (ou extração, ou extorsão) do excedente devido ao produtor direto (o trabalhador)” (NETTO; BRAZ, 2011, p. 111), sendo essa relação de exploração o fundamento do modo de produção capitalista. Ou seja, a extração da mais-valia é a forma especı́�ica que assume a exploração no capitalismo, como a�irma Bottomore (1988), em que o excedente assume a forma de lucro e a exploração se materializa quando os trabalhadores produzem mercadorias que são vendidas por valores maiores que seus salários. Figura 12 - Na jornada de trabalho, há o tempo de trabalho necessário e o tempo de trabalho excedente. Fonte: Kheng Guan Toh, Shutterstock, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 22/26 Essa extração da mais-valia apresenta duas formas: absoluta e relativa. Para produção da mais-valia absoluta existem as estratégias da ampliação da jornada de trabalho sem alteração do salário e/ou da intensi�icação do ritmo de trabalho. Ao ampliar para 10, 12 ou mesmo 14 horas a jornada de trabalho ou mesmo intensi�icar o ritmo da produção de mercadorias, preserva-se o tempo de trabalho necessário e se amplia o tempo de trabalho excedente, o que resulta em crescimento da produção do excedente, ou seja, da mais-valia. Já a mais- valia relativa é obtida através da introdução de inovações tecnológicas e conquistas cientı́�icas, potencializando a produtividade sem alterar a jornada de trabalho (NETTO; BRAZ, 2011). Dedicar parte signi�icativa de seu dia à jornada de trabalho implica que o trabalhador tenha comprometido a maior parte do tempo do seu cotidiano com o tempo de trabalho, restando pouquı́ssimo tempo para o ócio, o tempo livre, o tempo de produção da arte, do belo, do afeto, do sono, do descanso. No caso das mulheres, por exemplo, que vivenciam o acúmulo do trabalho externo com o trabalho doméstico, se agrava mais ainda provocando adoecimento, estresse, ansiedade, dentre tantos outros. Compreendendo que a exploração do trabalho está presente no modo de produção capitalista, com as devidas particularidades, Marx (2013) chama atenção para o fato de que a diferença entre o trabalho no modo de produção escravista e o trabalho assalariado do capitalismo está na forma como a mais-valia é extraı́da. Para os escravos, a compreensão da exploração era imediata e baseada na violência, visto que tudo que produziam e, até mesmo a sua vida, era subtraı́da, roubada, expropriada. CASO Em reportagem do Fantástico (2014), intitulada “Funcionários do setor de telemarketing relatam uma série de abusos” �ica evidente a relação de exploração no trabalho, por meio do relato de assédio moral, de humilhações por não cumprir metas (inalcançáveis), a de�inição de escala para as funcionárias engravidarem. A pro�issão de operador de telemarketing está entre as mais insalubres na atualidade. A reportagem demonstra que o trabalhador de call center está sujeito a vários problemas de saúde, como laringite, perda de audição, tendinites e danos psicológicos causados por uma atividade estressante. O grande estresse, a pressão de atingir metas e intervalo para comer só de 15 minutos leva a muitos casos de gastrite. Esse processo de adoecimento se amplia no contexto de acumulação �lexıv́el, em virtude do alto ıńdice de desemprego, das exigências e metas inalcançáveis, do enfraquecimento dos sindicatos, das perdas dos direitos trabalhistas, materializando a superexploração do trabalho (ANTUNES, 2017). 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 23/26 No caso do trabalhador assalariado e denominado de livre, no entanto, a compreensão sobre a exploração é menos perceptı́vel, visto que no cotidiano há essa divisão entre tempo de trabalho necessário e tempo de trabalho excedente e a ideia de que o salário remunera todo o seu trabalho reforçada pela continuidade da jornada de trabalho, do fato de que os meios de produção e o espaço fı́sico pertencem ao capitalista. Por isso, os trabalhadores de forma geral, sentem a exploração, mas nem sempre alcançam a sua compreensão (NETTO; BRAZ, 2011). Relacionada à exploração, reside outra questão importante a respeito do trabalho no modo de produção capitalista: a alienação, sendo esta uma ação na qual indivı́duos, grupos, instituições ou sociedade se tornam estranhos, alheios, alienados ao produto ou resultado de sua atividade, ou à natureza na qual vivem, ou a outros seres humanos (BOTTOMORE, 1988). Figura 13 - Exploração e alienação fundamentam o modo de produção capitalista, inclusive a exploração do trabalho infantil. Fonte: Paul Prescott, Dreamstime, 2020. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 24/26 Em “Manuscritos Econômicos-Filosó�icos”, Marx (2017) explica a relação que existe da alienação com o modo de produção capitalista, partindo sua análise da realidade econômica concreta, identi�icando que a alienação do trabalhador se manifesta da seguinte forma: quanto mais o trabalhador produz, tanto menos ele tem para consumir; quanto mais valor ele cria, tanto mais ele se torna sem valor e indigno; quanto mais seus produto é elaborado, tanto mais ele deforma-se; quanto mais seu produto é civilizado, tanto mais bárbaro torna-se o trabalhador; quanto mais poderoso o trabalho, tanto menor poder tem o trabalhador; quanto mais engenhoso o trabalho, mais pobre de espı́rito e servo da natureza torna-se o trabalhador. (MARX, 2017, p. 194- 195) E como ocorre essa alienação? Marx (2017) explica que o capitalismo oculta o fato de que a alienação se encontra na essência do trabalho quando não considera que existe uma relação imediata entre trabalhador, trabalho e produção. Ele a�irma que ao produzir obras maravilhosas para os ricos, o trabalho produz privação para o trabalhador, ao produzir palácios para os ricos, produz cavernas para os trabalhadores, produz beleza, por um lado, e mutilação, por outro, ao inserir as máquinas, coloca trabalhadores na barbaridade. Para facilitar o entendimento, você conhece a música “Cidadão”, cantada por Zé Ramalho? Na música, um trabalhador relata que participou da construção de um edifı́cio, todo o sofrimento da locomoção, da rotina de trabalho e que, após construı́do, nem tem o direito de �icar parado na frente do edifı́cio olhando, porque, logo, alguém pergunta se ele quer roubar. Também menciona que trabalhou na construção de uma escola, na qual a �ilha nem pode estudar. Essa música se relaciona diretamente com a alienação no modo de produção capitalista. O fato de não possuir os produtos de seu trabalho e nem autonomia com relação à atividade produtiva é o que gera a alienação, ou seja, o que o trabalhador produz, a forma como produz, os instrumentos e máquinas com os quais produz não lhe pertencem, lhe são estranhos, pois pertencem ao capitalista. E� nessa perspectiva que VOCÊ O CONHECE? O�ilósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel, �iloso�icamente, tratou pela primeira vez o conceito de alienação. Os hegelianos de esquerda, chamados jovens hegelianos, interpretaram Hegel em um sentido revolucionário, o que os levou a se aterem ao ateıśmo na religião e ao socialismo na polıt́ica. Entre os hegelianos de esquerda, encontram-se Ludwig Feuerbach, David Friedrich Strauss, Max Stirner e, o mais famoso, Karl Marx. 21/10/2023, 19:40 Trabalho e Sociabilidade https://codely-fmu-content.s3.amazonaws.com/Moodle/EAD/Conteudo/SAU_TRASOC_20/unidade_3/ebook/index.html# 25/26 Marx (2017) trata sobre alienação e justi�ica que a propriedade privada só existe por ser produto e consequência desse trabalho estranhado, alienado, sendo a alienação causa e resultado do processo de exploração que o trabalho sofre no modo de produção capitalista. Conclusão Chegamos ao �inal desta unidade, que abordou o tema do trabalho na sociedade capitalista, oportunizando que você aprendesse a natureza do trabalho no modo de produção capitalista, diante das transformações contemporâneas. Nesta unidade, você teve a oportunidade de: compreender as características do modo de produção capitalista e a forma como organizou o trabalho, a partir da criação e adoção dos modelos de produção: taylorismo, fordismo, toyotismo, que provocaram mudanças na sociabilidade e nas relações sociais; entender o que é e como se dá a exploração do trabalhador da sociedade capitalista através da expropriação do excedente de seu trabalho; identificar a alienação na ação na qual indivíduos, grupos, instituições ou sociedade se tornam estranhos, alheios, alienados ao produto ou resultado de sua atividade, ou à natureza na qual vivem. • • • Bibliografia ANTUNES, R. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 16. ed. São Paulo: Cortez Editora, 2015. ANTUNES, R. Da educação utilitária fordista da multifuncionalidade lio�ilizada. In: REUNIA�O NACIONAL ANPED, 38, 2017, São Luı́s. Anais [...]. São Luis: UFMA, 2017. 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