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3 UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais Professor Moacir Junior Carnevalle Plano de Estudo: • Do breve retrospecto histórico relacionado ao direito internacional; • Dos conceitos gerais e fundamentais relacionados ao direito internacional; • Dos sujeitos envolvidos no contexto do direito internacional; • Das características gerais. Objetivos de Aprendizagem: • Analisar como se deu a evolução histórica do Direito Internacional; • Compreender quais são os conceitos gerais e fundamentais do Direito Internacional; • Verificar quais são os sujeitos na seara do Direito Internacional; • Analisar as características gerais do Direito Internacional. ###################### ####################### &7@@@@@@@@@@@ %%%%%%%%%%%%%% $$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$ 55555555555555555555555 4UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais INTRODUÇÃO Bem-vindo(a), aluno(a), à primeira unidade de Direito Internacional. Iniciaremos nossos estudos por este ramo do Direito que, embora pareça distante do nosso dia a dia, se mostrará extremamente próximo de nós. O Direito Internacional ganha importância cada vez maior à medida em que a sociedade como um todo aumenta suas relações internacionais, seja através de viagens, negócios, compras, utilização da rede mundial de computadores dentre outras, fruto de um fenômeno chamado globalização. Nos dias atuais é muito mais comum, portanto, estabelecermos relações conecta- das com o exterior, por isso a importância cada vez maior de estudar Direito Internacional. Iniciaremos os nossos estudos analisando a evolução histórica do Direito Interna- cional, sendo possível verificarmos como se deu, ao longo do tempo, o amadurecimento desta ciência jurídica. Num segundo momento pontuaremos quais são os sujeitos de Direito Internacio- nal, ou seja, a quem o Direito Internacional é direcionado e quem possui legitimidade para exercer esse papel perante a comunidade internacional. Não menos importante, veremos em que consiste o Direito Internacional, ocasião em que falaremos a respeito da sua divisão mais importante. Por fim, abordaremos as características do Direito Internacional, veremos que pos- sui particularidades próprias suficientes para distinguir de outros ramos do direito. Bom estudo!!! 5UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais 1. DO BREVE RETROSPECTO HISTÓRICO RELACIONADO AO DIREITO INTERNACIONAL Caro(a) aluno(a), neste tópico abordaremos a evolução histórica do Direito Interna- cional. Os juristas, de maneira geral, reconhecem a existência de um Direito Internacional apenas após de 1648, quando foi celebrada a Paz de Vestfália, que é considerado o marco histórico do Estado-nação nos tempos modernos. Não obstante, os povos da Antiguidade também mantinham relações exteriores, seja através do comércio, do envio de embaixa- dores, da celebração de tratados ou de outras formas de obrigações (MAZZUOLI, 2020). Segundo Accioly (2019), até o Direito Internacional versava sobre a terra e o mar, razão pela qual era chamado de bidimensional. Posteriormente, passou a ser tridimensional, por também tratar do ar (invenção do avião por Alberto Santos Dumont). Após a Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945) passou a se preocupar também com o espaço ultraterrestre e os fundos marinhos. Mazzuoli (2020) ensina que o tratado mais antigo de que se tem registro foi cele- brado entre duas cidades da Mesopotâmia, Lagash e Umma e se referia à fronteira comum entre ambas as cidades. Aponta ainda que o tratado mais famoso da Antiguidade remota é, possivelmente, o de Kadesh, concluído entre Ramsés II, do Egito, e Hatusil III dos hititas no século XIII a.C. 6UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais Inicialmente, o Direito Internacional Antigo, ocasião em que era chamada Direito das Gentes, restringia-se à realidade da época, notadamente era dotado de normas que re- gulavam as relações entre comunidades. Esse período compreenderia desde a Antiguidade até a Idade Moderna. Não era propriamente um Direito Internacional, pois não se concebia a existência de Estado nacional, como temos hoje. Após esse período inicial, temos o denominado Direito Internacional clássico. Foi um período marcado por dois acontecimentos que serviram como uma afirmação histórica do Direito Internacional. Um desses acontecimentos, que seria de cunho doutrinário, foi o livro escrito por Hugo Grócio, chamado “O Direito da Guerra e da Paz”, em 1625. O outro foi a chamada Paz da Vestfália, em que foram assinados dois tratados que marcaram o fim da Guerra dos 30 anos, em 1648. Percebe-se, com isso, o início do surgimento do Direito Internacional como uma ciência autônoma e sistematizada, cujo objetivo inicial era regular as relações entre os Estados (MELO, 2017). A Igreja foi a grande influência no desenvolvimento do direito internacional durante a Idade Média. O Papa era considerado o árbitro, por excelência, das relações internacio- nais e tinha a autoridade para liberar um chefe de Estado do cumprimento de um tratado. A grande contribuição da Igreja durante o período medieval foi a humanização da guerra (MAZZUOLI, 2020). O fim da Primeira Guerra Mundial, com a assinatura do Tratado de Versalhes, em 1919, marcaria o início de uma terceira fase do Direito Internacional. Os Estados percebe- ram a necessidade de cooperarem para enfrentar problemas relacionados a fronteiras. É nessa época que surgem as primeiras Organizações Internacionais, tendo como destaque a Sociedade das Nações (1919), também conhecida por Liga das Nações. O Direito Internacional (Séc. XV a XVIII) nasceu, nos moldes que conhecemos hoje, a partir da Idade Moderna, o que se dá justamente pelo surgimento das noções de Estado nacional e de soberania estatal, conceitos consolidados pela Paz de Vestfália (1648). A partir de então, os Estados abandonariam o respeito a uma vaga de hierarquia internacional baseada na religião e não mais reconheceriam nenhum outro poder acima de si próprios (soberania). A Europa começou a adotar uma organização política centrada na ideia de que a cada nação corresponderia um Estado-nação (MAZZUOLI, 2020). A atual fase é denominada por alguns como o período de Humanização do Direito Internacional, conhecida também por Direito Internacional da Humanidade. É um traço sig- nificativo dessa fase a intensificação de um fenômeno denominado globalização. Através dele, os Estados perceberam a dificuldade que enfrentam caso resolvam viver isolados, 7UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais pois dificultaria o próprio desenvolvimento social e sobrevivência da humanidade. Inicia-se a percepção da necessidade dos Estados desenvolverem valores comuns, que interessariam não só à relação entre os próprios Estados, como também à proteção e o desenvolvimento dos indivíduos. Esses valores comuns são representados pelo jus cogens, que seriam obrigações internacionais aceitas mesmo sem terem a elas anuído expressamente. O jus cogens pode ser visto como o conjunto de normas imperativas de direito internacional público. Reflete padrões deontológicos sedimentados no âmbito da comu- nidade internacional, cuja existência e eficácia independem da aquiescência dos sujeitos de direito internacional. Deve ser observado nas relações internacionais e projeta-se, em alguns casos, na própria ordem jurídica interna (MAZZUOLI, 2020). Na Idade Contemporânea (Séc. XVIII até os dias atuais), inaugurada com a Revo- lução Francesa, é reforçado o conceito de nacionalidade, que viria, posteriormente, orientar as unificações italiana e alemã no século XIX. O Congresso de Viena (1815), que encerrou a era napoleônica, resultou em grande impulso para o direito internacional, na medida em que apontou na direção da internacionalização dos grandes rios europeus (Reno, Mosa etc.), declarou a neutralidade perpétua da Suíça e, pela primeira vez, adotou uma classifi- cação paraos agentes diplomáticos. O século XIX é o período em que ocorreu o florescimento do direito internacional moderno, marcado, por exemplo, com a criação dos primeiros organismos internacionais com vistas a regular assuntos transnacionais, a proclamação da Doutrina Monroe e a pri- meira das Convenções de Genebra, dentre inúmeras outras iniciativas. Durante o século XX, o direito internacional moderno foi aprofundado e consolidado com a criação da Sociedade das Nações e, posteriormente, da Organização das Nações Unidas, o trabalho de codificação (por exemplo, a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados e a Convenção sobre Direito do Mar) e a proliferação de tratados nascida na ne- cessidade de acompanhar o intenso intercâmbio internacional do mundo contemporâneo. Pode-se destacar como características da evolução histórica da disciplina que as mudanças não são bruscas, o que significa que os rumos do Direito Internacional normal- mente ocorrem aos poucos e após período de tratativas entre os Estados na busca de um consenso. Além disso, nos últimos tempos é um ramo do direito que apresenta grande evolução, provocada pelas múltiplas relações que se estabelecem de maneira mais rápida entre Estados, Organizações Internacionais e, também, entre indivíduos. 8UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais 2. DOS CONCEITOS GERAIS E FUNDAMENTAIS RELACIONADOS AO DIREITO INTERNACIONAL Então, aluno(a), chegou a hora de esclarecermos afinal o que é Direito Internacional e qual ramo da ciência jurídica tutela. Este ramo jurídico é dividido entre Público e Privado. Cabe a cada uma destas ramificações tutelar uma seara das relações desenvolvidas no âmbito internacional. Figura 1 - Divisão do direito internacional Fonte: o autor. Direito Internacional Público Privado 9UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais O Direito Internacional Público pode ser definido como o conjunto de normas e princípios que regulam as relações entre Estados, organizações internacionais e outros entes no seio da comunidade internacional. Por sua vez, o Direito Internacional Privado também é um conjunto de princípios e regras, porém que visa tutelar as relações jurídico-privadas a nível internacional, resol- vendo, por exemplo, conflitos de jurisdição e objetivando definir qual o direito aplicável em situações que envolvam mais de um Estado, ou mais de um ordenamento. Diante disso, podemos concluir que o Direito Internacional é o conjunto de princí- pios e normas que regulam as relações a nível internacional entre os entes públicos, como, por exemplo, entre Estados; bem como relações entre privados, ou seja, indivíduos que transcendem as fronteiras nacionais e que definem as regras de aplicação do Direito no caso de conflito de jurisdição. O Direito Internacional destina-se, portanto, a regular a sociedade internacional e as relações estabelecidas em seu seio, ou que nela tenham algum impacto. 10UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais 3. DOS SUJEITOS ENVOLVIDOS NO CONTEXTO DO DIREITO INTERNACIONAL Então, aluno(a), chegou a hora de estudarmos quais são os sujeitos que fazem par- te da sociedade internacional, e como são os destinatários das normas desse importante ramo do direito. São vários os sujeitos de Direito Internacional admitidos atualmente. Pode se afirmar que os sujeitos do Direito Internacional, são todos aqueles que gozam de direitos e deveres previstos pelo direito Internacional Público e que possam atuar na esfera Internacional para exercê-los, direta ou indiretamente. O sujeito de Direito Internacional, para ser assim considerado, é preciso gozar de personalidade jurídico-internacional e de capacidade jurídico-internacional. A personalidade jurídico-internacional confere ao sujeito a capacidade de ser titular de direitos e obrigações internacionais, dependendo desses direitos e obrigações dos obje- tivos e funções atribuídos à organização, sejam eles enunciados ou implicados por seu ato constitutivo ou desenvolvidos na prática (MELO, 2017). Por sua vez, a capacidade jurídico-internacional diz respeito à capacidade do su- jeito ser titular de direitos na ordem internacional, bem como possuir reconhecimento pela comunidade internacional para o exercício desses direitos (MELO, 2017). Portanto, para ser sujeito de Direito Internacional é preciso gozar de direitos e deveres no plano internacional, bem como ter capacidade para exercê-los. 11UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais O primeiro desses sujeitos é o Estado, que é chamado de sujeito originário, justa- mente porque inicialmente somente ele era admitido como sujeito, e permaneceu sendo o único por um bom tempo. Um grande entrave que se relaciona em relação ao Estado como sujeito é a questão da soberania. A soberania já foi vista, em sua acepção clássica, como um poder absoluto do estado, que não admitia relativização (MELO, 2017). Não obstante, os Estados, ao se relacionarem com a sociedade internacional, pre- cisam fazer concessões, razão pela qual o conceito de soberania atualmente se apresenta bastante relativizado. Figura 2 - Soberania dos Estados versus Necessidade de Cooperação Fonte: o autor. Segundo Varella (2019), “o Estado é o principal sujeito do direito internacional”. Entre os sujeitos, é o único que possui plena capacidade jurídica. Os Estados soberanos são os principais sujeitos do Direito Internacional Público. São organizações de foco político e jurídico de uma sociedade (MELO, 2017). O exercício das prerrogativas estatais decorre da existência de três elementos constitutivos: população, território determinado, governo e a capacidade de manter relações com os outros Estados. No que tange a população, entende ser a coletividade dos indiví- duos que habitam o território, são eles nacionais e estrangeiros. No território determinado é a base onde a população se encontra. Por fim, e não menos importante, o governo e a Soberania dos Estados Necessidade de cooperação 12UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais capacidade de manter relações com outros Estados, em que se faz necessário um governo soberano que não seja subordinado a outra autoridade exterior. Hoje existem outros sujeitos de Direito Internacional, como as Organizações Inter- nacionais e os indivíduos, apesar de, em relação a estes últimos, haver discordância de uma parcela da doutrina. As Organizações Internacionais são uma criação relativamente recente do Direito Internacional Público. O seu surgimento teria se dado no fim da Primeira Guerra Mundial com a criação da Liga das Nações, também chamada de Sociedade das Nações (SDN). As organizações internacionais são uma associação formal e permanente de Esta- dos, que possui personalidade e capacidade jurídica internacional. Elas são constituídas de forma que tenham personalidade jurídica distinta da dos Estados membros que dela fazem parte. Possuem estatuto, sede e órgãos internos. As Organizações Internacionais, por serem uma criação do Estado, possuem uma personalidade jurídica decorrente. Podem ser criadas com uma finalidade específica, ou com fins gerais, podem ser duradouras ou temporárias, universais ou regionais (MELO, 2017). Exemplificativamente, podemos citar a Organização das Nações Unidas (ONU), o Mercosul, a Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) dentre outras. Outro sujeito de Direito Internacional seria o indivíduo. Quanto a este, entretanto, existe uma divisão da doutrina no tocante a sua aceitação como integrante deste rol. Os opositores à presença do indivíduo como sujeito de Direito Internacional susten- tam a sua tese alegando que não possuem personalidade jurídica, sendo apenas protegidos como destinatários das normas internacionais. Não obstante opiniões contrárias, o Direito Internacional atual demonstra cada vez mais uma preocupação crescente com a proteção da pessoa humana. Ou seja, apessoa humana hoje é portadora de direitos e obrigações internacionais, sendo dotada de capaci- dade, em alguns casos, de reclamar esses direitos perante organismos internacionais, da Corte Europeia de Direitos Humanos e da Comissão Americana de Direitos Humanos. Para Mello (2017), negar a personalidade jurídica do indivíduo no plano internacio- nal seria desumanizar o Direito Internacional, ou seja, não se pode falar na garantia dos Direitos Humanos pela Ordem Internacional se o homem não é reconhecido como sujeito de Direito Internacional. O Direito Internacional, principalmente pós Segunda Guerra Mundial, passou a demonstrar crescente preocupação com a proteção da pessoa humana, desenvolvendo 13UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais normativas internacionais voltadas para a salvaguarda dos Direitos Humanos, sendo este um dos seus principais objetivos (MELO, 2017). É possível destacar, ainda, algumas figuras outras, dotadas de características peculiares quando comparadas aos sujeitos vistos acima. Uma dessas figuras são os microestados, presentes em várias regiões do planeta, são Estados com pequena extensão territorial e, muitas vezes também, população reduzida. Esses microestados são dependentes de outros Estados para várias necessidades, como, por exemplo, a cunhagem e emissão de moeda, a segurança do seu território, a utilização de aeroportos etc. Embora possuam personalidade e capacidade jurídica-internacional, questiona-se a independência completa desses microestados em relação às suas decisões internacio- nais justamente por possuírem essa interdependência em relação a vários aspectos. São exemplos: Seychelles, Barbados, Mônaco, Andorra, San Marino dentre outros. Figura 3 - Superfície em km² de alguns microestados Fonte: o autor Outra figura anômala da sociedade internacional é a Santa Sé, que, embora não seja Estado, tampouco Organização Internacional, é dotada de personalidade e capacida- de jurídica de Direito Internacional de igual forma, razão pela qual pode celebrar tratados com diversos Estados, integrando muitas organizações internacionais. Alguns autores designam-na como uma coletividade não estadual. Está sediada no Estado da Cidade do Vaticano, em Roma, e possui um governo próprio, instituído pela Igreja Católica. A Santa Sé, ao contrário dos Estados, não possui um povo, e a sua finalidade é administrar a Igreja Católica no mundo, ou seja, é a cúpula da Igreja Católica no mundo (MELO, 2017). 14UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais Ainda merecem destaque as Organizações não-governamentais (ONGs). Embo- ra não possuam personalidade jurídica internacional, são importantes à medida em que “fiscalizam” a atuação dos demais sujeitos de Direito Internacional e “denunciam” práticas contrárias às normas internacionais relacionadas ao meio ambiente, desrespeito aos direi- tos humanos, crueldades praticadas a animais, além de muitas outras. Essas denúncias funcionam como forma de provocar uma reação da comunidade internacional contra o Estado que está praticando a irregularidade, o que tem proporcionado muitos resultados positivos. As ONGs internacionais acabam sendo verdadeiros representantes da sociedade para suprir as lacunas deixadas pela atuação estatal para a tentativa de solução de confli- tos sociais, ambientais, econômicos etc. Exercem forte influência sobre os entes estatais, auxiliando na tomada de decisões e até mesmo na celebração de tratados (MELO, 2017). Figura 4 - Organização Mundial da Saúde Em resumo: para ser sujeito de Direito Internacional é preciso ter personalidade jurídica internacional, o que somente é atribuído, de forma uníssona, aos Estados, microes- tados, Santa Sé e organizações internacionais. Os indivíduos, apesar de serem destinatá- rios das normas internacionais, ainda não são, unanimemente, considerados como sujeitos (MELO, 2017). 15UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais 4. DAS CARACTERÍSTICAS GERAIS É possível apontarmos várias características do Direito Internacional, muitas delas permitindo a diferenciação deste ramo do direito quando em comparação com o direito interno. Enquanto o direito interno caracteriza-se como sendo de subordinação, em que as normas são elaboradas e impostas pelo Estado e aplicadas de forma imperativa à popula- ção, o Direito internacional é um direito de coordenação. As normas do Direito internacional são elaboradas, em sua grande maioria, após período de negociação entre os Estados, que acordam sobre o tema sobre o qual negocia- vam. Além disso, a produção normativa não deriva necessariamente de um poder (legis- lativo como regra), como o direito interno. Apresenta a criação de normas a partir de acordos bilaterais, multilaterais, entre Estados, entre Organizações Internacionais, apresentando, portanto, descentralização. As normas internacionais também tratam dos mais variados temas, existindo acor- dos comerciais e normativos, apresentando uma considerável fragmentação de assuntos. Portanto, o Direito Internacional caracteriza-se como um direito de coordenação, devido à igualdade entre Estados. Não existe um governo central, como ocorre no direito interno, sendo as normas criadas a partir da negociação entre os Estados soberanos. O fato de inexistir um governo central faz com que o direito internacional se apresente 16UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais fragmentado, pois um acordo entre dois Estados não impede que outros acordos sejam realizados com outros Estados, sobre o mesmo tema ou não. Além disso, as normas são heterogêneas à medida em que os temas são os mais variados possíveis, muitas vezes envolvendo dois sujeitos de Direito Internacional ou vários. No que tange ao eventual descumprimento dessas normas, são vários os mecanis- mos que podem ser invocados, como comissões, comitês e Cortes internacionais, inclusive com a possibilidade de aplicação de sanções. Outra característica é o fato de que as normas surgem essencialmente após o consentimento dos sujeitos de Direito Internacional, muitas vezes precedido de um amplo período de negociações. O princípio do livre consentimento é consagrado pela Convenção de Viena sobre o direito dos tratados de 1969 e pela Corte Internacional de Justiça. Porém, a criação do Direito Internacional pode, em certos casos, prescindir do consentimento dos Estados, pois a mesma Convenção de Viena reconhece a noção de norma imperativa e de obrigações essenciais que se impõem ao conjunto dos estados. Trata-se de normas que não podem ser derrogadas de um tratado sob pena de nulidade (MELO, 2017). Em relação à hierarquia das normas internacionais, existe verdadeiro dissenso na doutrina. Aos que entendem pela existência de hierarquia, exemplificam os tratados regionais de direitos humanos, que precisam obedecer às diretrizes globais sobre o mesmo tema (Convenção de Direitos Humanos). Além disso, as normas internacionais não devem ser obedecidas apenas no âmbito interno, ainda que os países prevejam que as normas internacionais precisem passar por um processo de incorporação para terem validade no âmbito interno. Uma terceira justificativa para a suposta hierarquia seria a necessidade de respeito ao jus cogens, cuja explicação já foi abordada anteriormente. Já outra parte da doutrina entende que as normas de Direito Internacional estão todas no mesmo patamar, sendo que um tratado não se sobrepõe hierarquicamente a ou- tro, ou seja, não estão em uma pirâmide. No entanto, admitem que, embora não haja uma hierarquização formal das normas jurídicas internacionais, pode-se dizer que, de acordo com sua natureza, existem normas taxativas e inderrogáveis, que se sobrepõem às demais. Importante destacar ainda a existência de uma verdadeira jurisdição internacio- nal e, consequentemente, de previsão de sanções. Como exemplo de algumas dessas jurisdições, podemoscitar a Corte Interamericana de Direito Humanos, o Tribunal Penal 17UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais Internacional e a Corte Internacional de Justiça, sendo que a competência no que tange a atuação de cada uma delas consta nos respectivos estatutos. A jurisdição internacional é responsável pela preservação e defesa das normas internacionais, foram criadas por meio de tratados e vinculam, em geral, os países que a ela aderiu. Atualmente, não só os Estados e Organizações Internacionais se subordinam a esta jurisdição, sendo que hoje também é possível que o indivíduo tenha essa vinculação, como é o caso da Corte Europeia de Direitos Humanos, em que o indivíduo teria legitimidade para processar um Estado. O mesmo acontece com a Comissão Americana de Direitos Humanos, que permite a petição individual, e o Tribunal Penal Internacional, responsável por julgar pessoas pela prática de crimes contra a humanidade, crimes de genocídio e crimes de guerra. Importante diferenciação entre as competências dessas cortes internacionais (ou dessa jurisdição internacional) é o fato de que que não existe um corte de competência glo- bal e as sanções aplicáveis aos Estados, por exemplo, podem ser uma suspensão ou até a expulsão do Estado-membro que estiver em desacordo com as diretrizes da Organização das Nações Unidas. SAIBA MAIS Que tal aprofundarmos nossos estudos em torno do Direito Internacional? A seguir deixo uma recomendação de leitura que irá enriquecer o aprendizado e reforçar o que foi es- tudado até aqui. O texto pode ser acessado no seguinte endereço eletrônico: https://jus.com.br/artigos/59325/a-importancia-do-direito-internacional-na-atualidade REFLITA Embora estejamos iniciando o nosso estudo de Direito Internacional, você já parou pra pensar quantas relações exteriores desenvolvemos através da rede mundial de compu- tadores (internet)? Reflita sobre o assunto. Para lhe auxiliar deixo uma indicação de leitura: https://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/32792-40572-1-PB.pdf https://jus.com.br/artigos/59325/a-importancia-do-direito-internacional-na-atualidade https://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/32792-40572-1-PB.pdf 18UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais CONSIDERAÇÕES FINAIS Chegamos ao final da nossa primeira unidade didática. Através desta unidade você pôde aprender conceitos fundamentais da disciplina em que estamos trabalhando. Vimos como se deu o desenvolvimento histórico do Direito Internacional, e pudemos perceber que somente após o surgimento dos Estados é que teria surgido efetivamente esse ramo do Direito. Percebemos que o Direito Internacional atualmente apresenta um ex- pressivo desenvolvimento, fruto do aumento cada vez mais significativo das relações inter- nacionais. Quanto mais as relações internacionais se desenvolvem é maior a necessidade de serem regulamentadas. Portanto, o Direito Internacional se ocupa de criar mecanismos e regulamentar as mais variadas situações que essas relações geram. Analisamos, ainda que brevemente, conceitos gerais e fundamentais do Direito Internacional, e a divisão que o tema apresenta entre público e privado. Foi possível determinarmos, também, quais são os sujeitos de Direito Interna- cional, iniciando com o estudo do Estado, considerado sujeito originário, e progredindo para a análise das Organizações Internacionais, e a importância que possuem no cenário Internacional. Analisou-se também a discussão doutrinária acerca da inclusão do indivíduo como sujeito internacional, sendo que atualmente há uma consistente inclinação para a sua aceitação como tal. Por fim, verificamos as características gerais do Direito Internacional, e concluímos que estamos diante de um direito baseado na coordenação entre os Estados. A produção normativa que regulamenta o Direito Internacional não deriva de um poder legislativo, inexiste um governo central em âmbito mundial e as relações entre os Estados estão anco- radas na igualdade. As normas são fruto do consentimento entre os Estados e não existe uma jurisdição internacional centralizada. 19UNIDADE I Do Direito Internacional: Aspectos Iniciais MATERIAL COMPLEMENTAR LIVRO Título: Manual de Direito Internacional Público. Autor: Hildebrando Accioly et. al. Editora: Saraiva. Sinopse: O Manual de Direito Internacional Público de Accioly e Nascimento e Silva, atualizado por Paulo Borba Casella, Titular da cadeira de Direito Internacional Público da USP, acompanha as profundas transformações conceituais e estruturais em curso no direito internacional pós-moderno. A obra tem a proposta de manter um “texto responsável” e atualizado de uma visão geral e didática da disciplina, mas sempre respeitando o legado dos autores. Incorporou análises e questionamentos contemporâneos sobre direito internacional, levando em consideração a tradição reflexiva deste manual que se mostram fundamentais para for- necer subsídios novos para o ensino do direito internacional em faculdades de direito ou de relações internacionais. FILME/VÍDEO Título: Casablanca. Ano: 1942. Sinopse: Durante a Segunda Guerra Mundial, muitos fugitivos tentavam escapar dos nazistas por uma rota que passava pela ci- dade de Casablanca. O exilado americano Rick Blaine (Humphrey Bogart) encontrou refúgio na cidade, dirigindo uma das principais casas noturnas da região. Clandestinamente, tentando despistar o Capitão Renault (Claude Rains), ele ajuda refugiados, possibilitan- do que eles fujam para os Estados Unidos. Quando um casal pede sua ajuda para deixar o país, ele reencontra uma grande paixão do passado, a bela Ilsa (Ingrid Bergman). Este amor vai encontrar uma nova vida e eles vão lutar para fugir juntos.
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