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117772-Texto do artigo-217221-1-10-20160718

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12 Estilos clin., São Paulo, v. 21, n. 1, jan./abr. 2016, 12-29.
Resumo
Este estudo investigou os as-
pectos subjetivos paternos frente 
à amamentação e o desmame. 
Para tanto, um pai primíparo 
foi entrevistado no 6 o e 20 o mês 
de vida da filha. Os relatos do 
pai revelaram que ele rivalizava 
com sua filha pelo desejo de sua 
esposa. Simultaneamente, havia 
uma rivalidade entre o pai e sua 
esposa pelo bebê, aspectos esses 
associados à história paterna. Os 
relatos sugerem que, no processo 
de tornar-se pai, a amamentação 
e o desmame também ganham 
destaque, pois a amamentação 
pode estar associada à relação 
corporal mãe-bebê e às dificul-
dades experienciadas pelo homem 
enquanto terceiro.
Descritores: amamentação; 
paternidade; psicanálise.
A AMAMENTAÇÃO 
E O DESMAME NO 
PROCESSO DE 
TORNAR-SE PAI
Evandro de Quadros Cherer 
Andrea Gabriela Ferrari 
Cesar Augusto Piccinini
DOI: http//dx.doi.org/10.11606/issn.1981-1624.v21i1p12-29.
■ Doutorando em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília (UnB),
Brasília, DF, Brasil.
■ ■ Psicanalista. Docente do Departamento de Psicanálise e Psicopatologia e do
Programa de Pós-Graduação Psicanálise: Clínica e Cultura do Instituto de Psicologia da 
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS, Brasil.
■ ■ ■ Docente do Programa de Pós-Graduação em Psicologia do Instituto de
Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), 
Porto Alegre, RS, Brasil.
1212
Artigo
Uma das tarefas do homem no processo de transição para a
paternidade é a de abdicar de seu desejo de ser idêntico à sua mãe, 
bem como a de possuir com os filhos o mesmo tipo de relação 
que essa possuía. Todavia, alguns homens não conseguem parar de 
invejar as potencialidades criativas femininas, não admitindo serem 
excluídos desse processo (Brazelton & Cramer, 1992). Com isso, 
durante o processo de tornar-se pai, os homens passam por um rema-
nejamento psíquico pelo qual são reativados elementos femininos 
de sua bissexualidade, assim como identificações maternas (Lamour 
& Letronnier, 2003).
13
A respeito disso, conforme Parseval (1986), pode-se supor que 
ainda que o pai não leve o bebê no ventre, ele pode levá-lo subjetiva-
mente dentro de si. De qualquer modo, o pai ocupa uma posição dis-
tinta da materna na gravidez, assim como se relaciona diferentemente 
com o bebê durante a gestação (Piccinini, Levandowski, Gomes, 
Lindenmeyer, & Lopes, 2009). Entretanto, com o desenvolvimento 
da criança e, por consequência, menor dependência em relação à 
mãe, a maternidade e a paternidade tendem a ser mais igualitárias, 
aumentando a participação paterna na criação dos filhos (Shirani 
& Henwood, 2011). Com isso, os aspectos subjetivos associados à 
paternidade podem variar com o crescimento da criança (Eggebeen 
& Knoester, 2001), podendo ser influenciados pelo desenvolvimento 
das capacidades e necessidades dela (Palkovitz & Palm, 2009).
Nesse cenário, pode-se compreender que a mãe desempenha um 
papel essencial no processo de transição do homem para a paterni-
dade (Lamour & Letronnier, 2003), sendo o relacionamento conjugal 
um aspecto relevante para a relação do pai com seu filho (Zornig, 
2010). A respeito disso, compreende-se que a vida de uma mulher é 
modificada de diversas formas quando ela tem um bebê (Winnicott, 
1964/1982), especialmente devido ao estado de sensibilidade exacer-
bada que vivencia inicialmente (Winnicott, 1956/2000). Conforme 
Bydlowski (2002), com a gravidez a mulher passa a vivenciar um 
retraimento em relação ao mundo exterior, perdendo intensidade 
inclusive as relações afetivas, mesmo as passionais. Para essa autora, 
após o nascimento da criança, gradualmente a mulher passa a rein-
vestir mais em sua vida conjugal e social. Porém a manutenção do 
retraimento pode repercutir na relação entre a mulher e seu marido. 
Com isso, conforme De Neuter (2001), a chegada de um bebê pode 
transformar a relação de um casal, especialmente no que diz respeito 
à vida sexual, podendo também ocasionar a sensação de frustração 
no homem em relação à sua esposa.
Da parte do homem também pode haver um distanciamento 
concernente à sua esposa quando essa, mudando de estatuto, torna-
-se mãe. Com essa mudança, a associação entre a mulher e a relação 
incestuosa inconsciente pode tornar-se mais intensa, provocando 
uma cisão entre a mãe e a prostituta (Freud, 1912/1990). Desse 
modo, a chegada de um filho exige que cada cônjuge reorganize 
suas identidades sexuais, considerando-se que a intimidade do casal 
será afetada pelos novos papéis de mãe e pai, inclusive no que diz 
respeito à vida sexual (Lighezzolo, Boubou, Souillot, & Tychey, 2005).
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Acerca disso, na medida em que a paternidade pode inclusive 
estar associada a perdas, o pai pode acabar não se envolvendo com 
o filho, ou procurar distanciar-se do que diz respeito a ele. Bydlowski 
(2000) afirmou que apenas o homem ou o bebê podem ocupar sub-
jetivamente o lugar do objeto de desejo para a mãe. Além disso, a 
paternidade pode relacionar-se ao sofrimento e denegação na medida 
em que se associa a conteúdos recalcados. Entre estes estão aspectos 
femininos e homossexuais do homem que procuram ser recusados, 
mas, no entanto, são reativados ao fecundar sua esposa.
Nesse contexto, a mãe pode encontrar-se numa intensa relação 
incestuosa com o bebê, na qual o seio, mais do que ser apenas fonte 
de alimento, é inclusive indicador dessa relação corpo a corpo da 
qual o pai está privado (Queiroz, 2005). Assim, a amamentação pode 
ocupar intensamente a mãe, podendo levá-la a desinvestir de seus 
demais interesses (Middlemore, 1974). Acerca disso, em psicanálise, 
entende-se que a amamentação, para além de sua função nutrícia, 
consiste no período em que mãe e filho permanecem entregues a 
uma relação incestuosa (Queiroz, 2005), momento no qual está em 
operação todo o processo de satisfação da relação mãe-bebê (Sales, 
2005). Com isso, o pai pode sentir-se ciumento e excluído da íntima 
relação mãe-bebê, sendo que também pode ser tomado por senti-
mentos de inveja em relação às capacidades femininas de criar um 
bebê (Brazelton & Cramer, 1992; Raphael-Leff, 1997).
A respeito disso, segundo Freud (1940/1990), o seio materno é 
o primeiro objeto de uma criança, ainda que em um primeiro mo-
mento o bebê não diferencie seu corpo do seio. De fato, inicialmente, 
o bebê não faz distinção entre seu eu e o mundo exterior, sendo 
essa separação realizada gradualmente a partir dos estímulos que 
lhe sobrevém (Freud, 1930/2012). Entretanto, essa relação com o 
corpo materno é afetada na medida em que o pai passa a ser signi-
ficado pela criança como obstáculo à mãe. Com isso, a relação do 
pai com o filho adquire um caráter hostil (Freud, 1921/1990). Nesse 
contexto, a mãe ameaçaria o filho com a castração, conferindo ao 
pai a execução da ameaça, tornando essa mais crível e assustadora 
(Freud, 1940/1990). Desse modo, mediado pela mãe, o pai passa a 
ser um juiz cujo nome é invocado para ameaçar o filho (Aberastury 
& Salas, 1984).
Por sua vez, Lacan (1999) compreendeu que para a mãe o filho 
não se restringiria a uma criança. Se a mulher obtém satisfação em seu 
filho é porque esse efetivamente, em alguma medida, corresponde ao 
15
falo, objeto de seu desejo. A questão para a criança transitaria entre 
ser ou não ser o objeto de desejo da mãe. Nesse cenário, o pai seria 
aquele que intervém ao privar a mãe do objeto de seu desejo. Assim, 
Lacan (1999) concebeu que a função paterna ocorreria ao nomear o 
desejo materno, castrando a mãe de tomar a criança como o falo e, 
com isso, possibilitaria ao filho sair do puro e simples atrelamento da 
onipotência materna. O pai seria aquele que possui a mãe na medida 
em que teria o objeto de desejo materno, isso é, o falo.
Além disso, no que diz respeito à dialética existente na relação 
mãe-criança, Lacan (1995) propôs que inicialmente a mãe é instituída 
pelafunção do apelo, situando-se numa relação de presença-ausência 
com o bebê. No entanto, quando a mãe passa a responder conforme 
seus próprios critérios, podendo recusar tudo aquilo que o infans 
necessita, ela torna-se real para esse, sendo experienciada em sua 
potência. Com essa alteração, os objetos de satisfação advindos da 
mãe passam a simbolizar essa potência, sendo intitulados por Lacan 
(1995) como objetos de dom. Esses objetos podem ser concedidos ou 
recusados diante do apelo da criança. Nesse sentido, o objeto além 
de satisfazer a necessidade da criança possui um mais-além, ou seja, 
adquire o estatuto de signo do amor materno. É nesse cenário que 
o seio, assim como o leite, simbolizaria algo além da função nutrícia 
na dialética mãe-bebê, tornando-se, pois, objetos de dom.
Nesse contexto, a amamentação, mais do que se restringir a 
alimentação do bebê, pode ser compreendida como indicador de 
um modo de relação corporal no qual a mãe toma o bebê como seu 
objeto de desejo, isso é, o falo. Com isso, o desmame não estaria 
circunscrito ao fim da alimentação infantil por meio do leite materno, 
mas abrangeria a intermediação da relação mãe e filho pela linguagem, 
por meio da qual a mãe deixaria de tomar a criança imaginariamente 
como o seu falo (Lighezzolo et al., 2005). Revelando, dessa forma, 
que o desmame não se restringe à criança, mas precisa ser efetuado 
inclusive na mãe (Levin, 2005). É nesse contexto que se pode enten-
der que o desmame primitivo é efetuado a partir da função paterna 
(Lacan, 1999), operação simbólica que não está circunscrita ao pai 
da realidade, mas que pode se fazer operante por esse (Dor, 2011). 
Desse modo, a partir do entendimento de que a amamentação, bem 
como o desmame, possuem significados que transcendem ao bioló-
gico (Sampaio et al., 2010), este estudo visou investigar os aspectos 
subjetivos paternos frente à amamentação e o desmame. 
16 Estilos clin., São Paulo, v. 21, n. 1, jan./abr. 2016, 12-29.
Paternidade, 
amamentação e 
desmame: evidências 
a partir de um 
estudo de caso1 
O caso aqui apresentado foi 
nomeado ficticiamente de Danilo, 
de 36 anos, com ensino superior 
completo e casado há seis anos. Ele 
foi selecionado de um estudo maior 
(Piccinini et al., 2012), pois oferecia 
uma oportunidade de aprendizado so-
bre aspectos subjetivos da paternidade 
(Stake, 1994). Quando sua filha tinha 
seis meses de vida, Danilo respondeu 
à “Entrevista sobre a gestação, parto e 
a paternidade”2. Por sua vez, quando 
sua filha tinha um ano e oito meses, 
Danilo respondeu à “Entrevista sobre 
a paternidade”3. A análise do relato 
paterno foi realizada a partir da teoria 
psicanalítica, sendo ilustrada a seguir 
por meio de vinhetas e discutida à luz 
da literatura.
Na primeira entrevista, quando a 
filha tinha seis meses, Danilo relatou 
que desde o nascimento do bebê ele 
tinha uma relação com ela mediada 
pela esposa, o que, aparentemente, era 
vivenciado de modo ambíguo por ele. 
Muitos dos cuidados, como colocar o 
bebê para dormir, trocar fralda e dar 
banho em sua filha eram realizados 
também por ele. Todavia, Danilo sen-
tia-se como que faltando algo em sua 
paternidade, relatando que gostaria de 
se envolver mais, o que era, em certa 
medida, impossibilitado pela relação 
corpo a corpo mãe-bebê, sobretudo 
devido à amamentação.
Embora Danilo tivesse dito que 
deveria ser mais participativo nos 
cuidados com a filha, ele eximia-se 
de um maior envolvimento na medida 
em que sua filha e esposa possuíam 
uma relação muito próxima, per-
meada pelo corpo. A amamentação 
era expressão desse modo de relação 
com a filha do qual biologicamente 
Danilo era privado: 
Como ela [esposa] tá amamentando no 
peito também e agora não tá trabalhando, 
até eu deixo mais pra ela assim, eu sei que 
tinha que melhorar nessa parte assim, apesar 
de eu ajudar bastante, mas ela tem mais 
trabalho que eu.4
Com isso, a mãe ocupava uma 
posição privilegiada em relação à 
filha, inclusive assumindo maiores 
responsabilidades em relação a essa: 
“Ela [esposa] tem que dar mamá no peito, 
né. Então eu até falo pra ela ‘não adianta 
eu e tu acordar, os dois né, tu vai ter que 
dar mamá no peito mesmo, então acorda 
tu’ (risos) ”. Nesse sentido, o delegar à 
esposa maiores cuidados com a filha 
esteve associado à amamentação e, 
por conseguinte, à relação corpo a 
corpo mãe-bebê, visto que a esposa 
se oferecia como a única intermediária 
da relação da criança com o mundo. 
Assim, esse modo de relação excluía, 
em alguma medida, Danilo, que indi-
cava ficar ressentido.
Inicialmente, a sogra e a esposa 
de Danilo eram a favor do desmame 
devido a dores e machucados no 
17
seio. Contudo, Danilo foi incisivo 
em querer que sua filha continuasse 
sendo amamentada ao seio, o que, 
no entanto, acabou excedendo a di-
mensão almejada por ele, passando 
o seio a ser empregado para além de 
sua função nutrícia: “Ela [filha] pegou 
vício de dormir no peito, até brincar com o 
peito, virou uma brincadeira pra ela, ela se 
acalma, mesmo ela não querendo mamar, 
assim. Aí é complicado né, agora pra tirar o 
peito da guria”. Nesse contexto, Danilo 
relatou ter a expectativa de sua filha se 
desmamar, diminuindo a dependência 
em relação à mãe, possibilitando, com 
isso, sua maior inserção e, por conse-
guinte, participação: “De repente daqui 
um ano eu vou estar cuidando muito mais 
da [filha] do que ela [esposa], depois que 
a [filha] parar de mamar, por exemplo. Na 
hora que ela começar a tomar mamadeira eu 
vou poder participar mais ”. Sendo assim, 
pode-se entender que ao longo dos 
primeiros seis meses do bebê, a ama-
mentação expressou o interesse da 
esposa de Danilo voltado, sobretudo, 
à filha, fazendo com que Danilo fre-
quentemente se sentisse negligenciado 
e com isso ansiasse pelo desmame de 
sua própria filha (Queiroz, 2005), ao 
mesmo tempo em que queria que a 
amamentação continuasse.
Ademais, Danilo sentia-se deven-
do em sua participação, tendo exposto 
acreditar que sua esposa esperava mais 
dele, debilidade essa que novamente 
Danilo associou à amamentação: “Eu 
não tô dentro da expectativa da [esposa], 
como pai assim. Porque ela [filha] ainda tá 
muito dependente da [esposa], por causa 
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do peito ”. Assim, Danilo indicou se sentir em falta com sua paternidade devido 
à relação que sua esposa tinha com sua filha. A respeito disso, pode-se pensar 
que Danilo invejava as potencialidades de sua esposa enquanto mãe, em especial 
no que diz respeito à amamentação (Brazelton & Cramer, 1992; Raphael-Leff, 
1997). Entretanto, diversas vezes, quando pôde assumir maiores responsabili-
dades com sua filha, Danilo se eximia ou reclamava, o que talvez possa indicar 
seu medo em deparar-se com conteúdos femininos de sua própria personalidade 
(Parseval, 1986), os quais procuravam ser recusados (Bydlowski, 2000). Desse 
modo, compreende-se que ao tornar-se pai, Danilo em alguma medida sofria em 
ocupar subjetivamente posicionamentos femininos (Lamour & Letronnier, 2003).
Repetidamente, Danilo retomava sua queixa de solicitar sua esposa para si, 
o que era impossibilitado por ela estar ocupando-se da filha: “Tá presente com a 
[esposa] assim, né, ver um filme com ela, que a gente via. Então, não tem como agora, mas vai 
passar. Às vezes eu nem durmo com elas ali ”. A partir desse cenário, compreende-se 
que havia certa rivalidade entre ele e sua filha pelo desejo da esposa (Bydlowski, 
2000; Lacan, 1995, 1999), o que apesar de causar desconforto em Danilo, foi 
acatado por ele, retirando-se em diversos momentos e permitindo a relação 
incestuosa mãe-bebê: “Às vezes quando eu durmo no sofá, ela [filha] dorme na cama 
com a [esposa]. É mais fácil pra [esposa] pra dar mamá ”.
Nesse contexto, compreende-se que a filha de Danilo demandava de sua 
esposa intensa dedicação, exigindo constantes cuidados, que por sua vez foram 
relacionados às repercussões na relação do casal no sexto mês após o nascimentoda filha: “Mudou um monte de coisa, né. E em relação a mim e a minha esposa também, 
mudou bastante… a parte de casal mudou ”. A respeito disso, Danilo afirmou estar 
incomodado, que ele e sua esposa estavam nervosos e brigando com maior 
frequência, visto que não disponibilizavam mais de tempo para a relação con-
jugal: “Eu tô sentindo que eu tô mais pra vida de pai do que pra vida de marido, assim, 
tá bem afastado ”. Com isso, Danilo ressentia-se de estar afastado de sua esposa, 
lamentando não dispor de tempo para estar sozinho com ela, em virtude de 
sua filha sempre estar entre eles: “A gente não tem mais tempo pra ficar sozinhos, a 
[filha] tá sempre junto”.
Nesse sentido, entende-se que os primeiros seis meses de vida da filha foram 
expressos por Danilo como sendo de intensa relação mãe-bebê (Bydlowski, 2002; 
Winnicott, 1956/2000, 1964/1982), fazendo com que ele se sentisse excluído e 
negligenciado (Krob, Piccinini, & Silva, 2009), tanto da relação com sua esposa, 
como com sua filha: “Às vezes eu mesmo saio, parece que eu não consigo dormir se eu tô 
ali, sabe. Me dá um nervoso assim, não sei, fica uma insônia ”. Como exposto, Danilo 
relatou se incomodar em ficar na mesma cama que sua esposa e filha, não con-
seguindo dormir, o que foi relacionado por ele pelo fato de preocupar-se com 
a filha acordar a qualquer instante. No entanto, esse desconforto podia estar 
19
expressando a conflitiva que se desenvolvia nesse contexto, isso é, 
que Danilo parecia reviver a experiência infantil de ter sido preterido 
e negligenciado por sua mãe, como relatou em outro momento da 
entrevista: “Minha mãe não me acompanha muito. Faz muito tempo que a 
gente tá distante. Eu fui criado pelos meus avós ”.
Acerca disso, Danilo relatou ter vivido com sua mãe apenas 
durante seu primeiro ano de vida, tendo posteriormente permane-
cido com seus avós maternos até os cinco anos de idade. Após esse 
período, Danilo retornou a morar com sua mãe por mais dois anos 
e, em seguida, novamente com seus avós. A respeito de sua mãe, 
Danilo contou recordar-se pouco, mas essencialmente lembrava-se 
que ela ia muito a festas e que tinha muitos namorados, sendo que 
durante o segundo período em que viveu com ela, Danilo presenciava 
constantes brigas de sua mãe com seu padrasto. Já a respeito de seu 
pai, Danilo relatou ter pouco conhecimento, em vista de nunca ter 
convivido com ele.
Nesse cenário, pode-se pensar que o mal-estar de Danilo em 
ficar na cama junto com sua esposa e filha podia derivar de uma 
associação inconsciente de sua mãe com uma mãe. Nessa perspec-
tiva, a esposa de Danilo, enquanto mãe, poderia estar relacionada ao 
interdito do incesto, fazendo com que ele se afastasse dela, o que foi 
manifesto por meio de desconforto e insônia (Freud, 1912/1990). 
Esse mal-estar também pode estar associado às experiências infantis 
de separação, negligência e distanciamento de Danilo em relação à 
sua mãe. Pode-se supor que Danilo encontrou na relação de sua es-
posa e filha um modo de reviver os conflitos relacionados à relação 
com sua própria mãe, como se para Danilo sua esposa enquanto mãe 
também o abandonava, e ele revivia novamente o abandono realizado 
por sua mãe em sua infância. Assim sendo, o fato de sua filha ser 
tomada como objeto de desejo de sua esposa lhe era penoso, visto 
que simbolicamente apenas um dos dois poderia ocupar esse lugar 
frente ao desejo materno (Bydlowski, 2000).
Entretanto, ainda na primeira entrevista, realizada aos seis meses 
de sua filha, Danilo relatou já pensar que a licença maternidade de 
sua esposa terminaria e ela retornaria ao trabalho. Nesse cenário, ele 
teria que assumir maiores responsabilidades na criação de sua filha. 
Assim, ele contou ter cogitado que sua esposa poderia demitir-se 
do emprego a fim de cuidar exclusivamente da filha; porém, devido 
aos benefícios conquistados por tempo de trabalho essa hipótese foi 
recusada. Desse modo, a filha, com seis meses, já estava passando 
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pelo período de adaptação à creche, o qual mesmo sendo gradual, 
estava sendo muito difícil, visto a dependência que a filha tinha da 
mãe e a dificuldade em se separar dela, assim como em ser desma-
mada: “É difícil, porque ela [filha] não quer largar o peito. Ela não quer 
mamadeira de jeito nenhum, grita e grita e dá tapa, mas não toma mamadeira 
de jeito nenhum ”. Além disso, a creche era vista por Danilo de modo 
ambivalente. Por um lado, Danilo sentia-se receoso de que sua filha 
passaria a ter cuidados alternativos aos parentais. No entanto, a 
creche também representava a possibilidade de sua filha ficar mais 
independente, principalmente em relação à mãe, aspecto que agra-
dava Danilo: “Eu não queria deixar na creche, mas ao mesmo tempo ela vai 
ficar mais independente ”.
Na entrevista realizada quando sua filha tinha vinte meses, ao 
ser perguntado acerca das atividades que fazia em relação à sua filha, 
Danilo afirmou que se ocupava de quase todas, excetuando-se a 
amamentação: “Eu assumo quase todas, é mais só a parte de mamar mesmo 
que é com a mãe que ainda mama no peito ”. A partir da fala de Danilo, 
pode-se inclusive supor a postura materna ativa em ainda deixar-se 
mamar (Levin, 2005), mantendo a amamentação, modo de relação 
com a filha da qual Danilo era privado e o qual despertava senti-
mentos ambivalentes nele. Ademais, como na entrevista realizada aos 
seis meses, o seio, mais do que um objeto pelo qual a filha obtinha 
alimento, estava associado a um modo de relacionamento mãe-filha, 
o qual ainda era mantido nesse período: “Fazer dormir também é mais a 
mãe dela que ela viciou em dormir no peito também . . . tem que ser com a mãe 
dela, mamando no peito ”. Novamente Danilo implicou com sua esposa 
quanto ao emprego do seio para além da pura função alimentar, 
respon sabilizando-a por ter suscitado essa dependência, que, de 
algum modo, pode-se supor que era inclusive materna.
No entanto, diferentemente de quando a filha tinha seis meses, 
aos vinte meses, a amamentação já estava sendo alternada com 
outros alimentos, possibilitando que Danilo pudesse se inserir de 
algum modo na função alimentícia de sua filha: “Quando eu tô em casa 
eu dou comidinha pra ela ”. Entretanto, mais do que apenas alimentar, 
o aumento da participação expressava a maior inserção na relação 
mãe-bebê enquanto terceiro, além da crescente apropriação de um 
lugar em que poderia corresponder melhor às demandas de amor 
do bebê (Lacan, 1999) e, com isso, sentir-se menos em falta com 
sua paternidade. Nesse sentido, Danilo relatou participar de diversos 
cuidados em relação à criança, contando dar banho, trocar fraldas e 
21
trocar sua roupa. Essa maior inserção 
de Danilo esteve associada ao trabalho 
da esposa fora de casa, possibilitando 
que ele se responsabilizasse em as-
sumir sua filha integralmente nesses 
momentos: 
Eu que acordo a [filha], coloco a roupa 
nela, levo ela pra creche toda quinta! Toda 
quinta e uma vez por mês que a mãe dela 
trabalha de manhã no sábado e no domingo 
também. Eu fico com [filha] de manhã 
assim, só eu e a [filha].
Nessa etapa do desenvolvimento, 
Danilo estava conseguindo participar 
mais ativamente dos cuidados com 
a filha, relatando gostar de interagir 
com ela: “Eu gosto de ficar conversando 
com ela, interagindo assim, beijando ela ”. 
Entretanto, no tocante aos cuidados 
com a filha, apesar de serem descritos 
como prazerosos, eles também foram 
relatados como cansativos: “Me sinto 
bem assim (risos). Gosto de fazer, apesar 
de ser cansativo ”. Entre esses cuidados 
estava a alimentação, da qual ele estava 
se responsabilizando, na medida em 
que sua filha deixara de ser alimentada 
exclusivamente ao seio. Com isso, ele 
pôde aumentar sua participação, uma 
vez que sua filha estava adquirindo 
maior autonomia diante do corpo 
materno.
Em contrapartida, Danilo ainda 
sentia-se em dívida com sua pater-
nidade, o que aparentemente basea-
va-se em sentimentosambivalentes. 
Esses eram permeados pelo desejo 
de assumir uma posição privilegiada 
em relação à sua filha e ao mesmo 
tempo retomar a intimidade com 
sua mulher, assim como preservar 
seus demais interesses pessoais. No 
entanto, compreende-se que naquele 
momento Danilo já conseguia reco-
nhecer a ambi guidade de seu desejo, 
assim como as limitações que existiam 
em seus posicionamentos: “Às vezes a 
gente quer participar, mas a gente também 
quer um pouco de privacidade né?! ”.
Diante da ausência materna, 
ocasionada pelo trabalho, Danilo 
pôde ocupar-se mais intensamente da 
filha, deixando de ter a esposa como 
intermediária nesses momentos. 
O trabalho materno proporcionou 
um para-além na relação mãe-bebê, 
fazendo com que a mãe se ocupasse 
de sua atividade profissional e, por 
conseguinte, possibilitando a maior 
inserção paterna: “Ela acorda, ela quer 
colo e já quer sair pra ver, pra olhar a casa 
toda pra ter certeza que a mãe dela não 
tá ”. No entanto, ainda que houvesse 
a ausência materna física, a mãe se 
fazia presente na relação de Danilo 
com sua filha. Embora Danilo tenha 
conseguido ocupar-se mais de sua 
filha, ele permanecia insatisfeito com 
sua participação, queixando-se da 
dependência da filha para com a mãe: 
“Queria participar mais, que ela fosse mais 
tranquila pra dormir assim comigo né, não 
fosse tão dependente da teta da mãe dela 
né, do seio (risos), mas ela é dependente, 
viciada ”.
Com isso, em outro momento 
da entrevista, Danilo descreveu sua 
filha como sendo muito agitada e 
brava, associando essas características 
22 Estilos clin., São Paulo, v. 21, n. 1, jan./abr. 2016, 12-29.
à percepção da filha quanto à ausência materna: “Quando ela acorda 
assim e ela vê que a mãe dela não tá por perto ela fica bem braba ”. Em se-
guida, Danilo expôs seu desconforto diante de situações nas quais 
não saberia como acalmar a filha, revelando ficar estressado, o que, 
por sua vez, fazia com que ele gritasse com ela. Nesse sentido, 
Danilo indicou que possuía dificuldades para lidar com a filha nos 
momentos em que ela mais se colocava enquanto sujeito. Assim, 
Danilo relatou que acalmá-la era a tarefa que mais o incomodava 
em relação à filha, uma vez que ela geralmente apenas se acalmava 
com o seio materno: “Normalmente não tem uma manha pra acalmar ela, 
a mãe dela é mais com o peito”.
Além disso, seu desejo em ocupar novamente um lugar notório 
no desejo da esposa, assim como adentrar na relação quase que exclu-
siva mãe-bebê, aparentemente também fomentava as discordâncias e, 
por consequência, críticas à sua esposa enquanto mãe. Desse modo, 
Danilo apontava o que considerava falhas na maternagem, esperando 
que sua esposa se desocupasse minimamente da filha e se voltasse 
para a relação conjugal, bem como liberasse a filha para ele: “É mãe 
de primeira viagem. Até faz uns erros assim, mas eu acho que ela tenta fazer 
o melhor. Eu acho que ela podia me escutar um pouco mais ”. Embora ele 
também fosse um pai de primeira viagem, desejava ser escutado, o 
que aparentemente se tornava difícil devido à imersão materna nos 
cuidados com o bebê.
Sua esposa, apesar de ter sido descrita como sustentando a re-
lação de dependência da filha, também se queixava da amamentação 
em alguns momentos. Amamentar implicava em sacrifícios por parte 
dela, contexto em que Danilo sentia-se incapacitado em auxiliar: 
“Reclama muito que ela [esposa] não dorme de noite porque a [filha] acorda 
e tem que dar teta né, mamá, mamá. Mas na parte da noite assim eu ajudo 
pouco, eu… porque já não tem muito o que fazer ”. De fato, em relação 
à dinâmica relacionada à amamentação, Danilo não tinha muito o 
que fazer, sentindo-se limitado, uma vez que não se sentia capaz de 
substituir sua esposa em relação à sua filha: “Eu tenho dificuldade pra 
fazer ela dormir mesmo e… deixar ela sem a mãe dela também ”.
A amamentação, como discorrido anteriormente, era expressão 
do modo de relação e dependência estabelecido entre a mãe e a filha, 
privando inclusive Danilo de sua esposa. Raramente Danilo e sua 
esposa disponibilizavam de tempo sozinhos, dependendo do auxílio 
da sogra para cuidar do bebê brevemente: “Quando sai só eu e a [esposa] 
é tudo meio correndo assim porque minha sogra também dorme cedo, sair na 
23
noite eu não saio mais ”. Desse modo, referindo-se à sua experiência da 
paternidade aos vinte meses de sua filha, Danilo relatou: “Tá sendo 
gratificante, tá sendo bom! De entre pai e filha tá sendo bom, mas entre assim, eu 
e minha esposa assim né, já a relação piorou um pouco”. Com isso, no tocante 
à sua filha, apesar dos sentimentos ambivalentes, Danilo encontrava 
satisfação, porém, no que diz respeito à relação com sua esposa, 
Danilo expressou haver insatisfação: “Piorou a intimidade minha e dela 
. . . a gente briga mais . . . a gente continua se gostando assim, só não tem muito 
tempo assim pra conversar em função da [filha]”. Posteriormente, indo ao 
encontro dessas formulações, Danilo acrescentou: “Diminuiu o tempo 
pra eu e a [esposa] se curtir mais né, como casal assim, como namorados.”
Nesse contexto, entende-se que sua esposa, como mãe, ocu-
pava -se da filha, tomando-a como objeto de seu desejo. Por sua vez, 
Danilo intervinha de modo a solicitar que sua esposa demarcasse 
existir algo para-além do próprio bebê, isso é, que sua esposa também 
o desejasse como marido. As diversas intervenções e reivindicações 
de Danilo aparentavam ser tentativas para ocasionar uma separação 
na relação mãe-bebê e, com isso, ocupar novamente um lugar impor-
tante no desejo de sua esposa (Lacan, 1995, 1999). Entretanto, nessa 
rivalidade com sua filha pelo desejo de sua esposa, Danilo estava 
inicialmente sendo preterido. Além disso, como dito anteriormente, 
essa experiência parecia remetê-lo à sua própria mãe. Com isso, na 
entrevista dos vinte meses, Danilo também se lembrou do período 
em que morou com sua mãe e com o homem com quem ela havia 
se casado, sendo que eles tiveram outro filho. Ele retomou as recor-
dações das brigas que sua mãe tinha com esse homem, incluindo 
momentos em que ele batia nela. Por fim, Danilo afirmou ter ido 
morar com seus avós, ficando sua mãe associada a experiências de 
abandono e negligência, visto ser preterido por ela em relação às 
festas e romances com outros homens.
Além do mais, como indicado por Danilo, pode-se pensar na 
dificuldade de sua filha, assim como de sua esposa, em realizar o 
desmame. Sua filha, principalmente aos seis meses, permanecia bas-
tante vinculada à relação corporal com a mãe, sendo difícil tolerar 
a ausência materna, o que acontecia ainda aos vinte meses de vida. 
Da parte de sua esposa, o desmame implicaria em renunciar o desejo 
fusional ao nível imaginário, substituindo a relação corpo a corpo 
por um modo de relacionar-se baseado em um prazer a distância, 
o qual seria intermediado pela linguagem (Lighezzolo et al., 2005). 
Com isso, Danilo indicava ressentir-se por sua filha ser tomada 
24 Estilos clin., São Paulo, v. 21, n. 1, jan./abr. 2016, 12-29.
como correspondendo ao desejo de 
sua esposa, assim como da posição 
privilegiada dessa em relação ao bebê. 
Nesse contexto, Danilo frequente-
mente resignava-se, expressando sua 
exclusão do romance incestuoso entre 
mãe e filha (Feliciano & Souza, 2011).
Quanto a esses aspectos, com-
preende-se que é por meio da ação 
do pai simbólico, o qual nomeia o 
desejo da mãe para além da criança, 
que ocorre o desmame primitivo, 
permitindo ao infans sair do puro 
e simples atrelamento com a oni-
potência ma terna (Lacan, 1995). 
Essa possibilidade permite a mãe 
reorganizar seu desejo (Levin, 2005), 
renunciando a extrema relação de 
poder e dependência do bebê com ela 
(Sales, 2005). Desse modo, também 
se pode compreender que além de 
desejar ocupar-se mais de sua filha, 
Danilo também reivindicava sua 
mulher, querendo privá-la de tomar 
excessivamente a filha como objeto 
de desejo (Lacan, 1999). Com efeito, 
segundo Lighezzolo et al. (2005), a 
funçãopaterna de separação apenas 
é operante por meio do pai na medida 
em que esse é objeto de desejo da mãe, 
mantendo, assim, seu valor atrativo. 
Considerações finais 
O caso de Danilo ilustra algumas 
questões colocadas pela psicanálise 
concernente aos aspectos subjetivos 
da amamentação e desmame, além de 
25
trazer conteúdos referentes ao lugar do pai nas relações iniciais. Desse modo, nas 
entrevistas, Danilo relatou, sobretudo, o conflito vivenciado por ele enquanto 
terceiro na relação mãe-bebê. De fato, com a paternidade, Danilo passou a ser 
o terceiro para sua mulher, sendo que ela estava, especialmente na primeira 
entrevista, muito dedicada ao bebê. Com isso, Danilo rivalizava com sua filha 
pelo desejo de sua esposa, tendo expressado enfaticamente a insatisfação com 
sua relação conjugal.
Quanto à sua filha, Danilo expressava querer envolver-se mais com ela e, em 
alguma medida, invejava a relação mãe-bebê, principalmente no que diz respei-
to à relação corpo a corpo experienciada com a amamentação. Assim, Danilo 
ansiava pelo desmame, na medida em que isso representava a possibilidade de 
sua maior inserção no desejo da esposa, assim como em sua relação com a filha. 
Diante disso, pode-se pensar que a rivalidade com sua esposa pela relação com a 
filha baseava-se essencialmente no desejo de destituir a mãe de sua maternidade, 
convocando-a novamente a ocupar o lugar de esposa.
Nesse contexto, a relação conjugal com sua esposa passava por problemas 
desde o nascimento da filha, o que havia afetado especialmente a relação íntima 
do casal e que evidenciava sua dificuldade em conservar um lugar no desejo de 
sua esposa e, por conseguinte, operar a função paterna. Apesar disso, a entrada 
da criança na creche, o trabalho materno, a gradual separação da relação corpo 
a corpo mãe-bebê e, por consequência, a maior inserção de Danilo, inclusive 
no que diz respeito à alimentação de sua filha, podem ser entendidas como 
manifestações da função paterna. Com isso, pode-se compreender que em certa 
medida Danilo também foi representante dessa função, possibilitando o corte 
simbólico do laço primordial do bebê com a mãe.
Além disso, no relato de Danilo, sua mãe esteve associada a festas, namo-
rados, brigas e separações. Desse modo, ao se deparar novamente diante de 
um desejo materno, Danilo pode ter se remetido às suas questões edípicas e à 
sua própria mãe (Freud, 1912/1990). Por não ter vivido suficientemente uma 
relação de amor com sua mãe, é plausível supor que Danilo revivia com sua 
esposa essa experiência de abandono, tendo insônia e sentindo-se mal em ser 
novamente apenas o expectador do romance alheio, do qual ele era excluído. É 
nesse contexto que o seio, bem como o leite, em seu valor de objeto de dom, isso 
é, signo do amor materno (Lacan, 1995), toma especial importância. Com isso, o 
intenso apoio à amamentação de sua filha também pode ser visto a partir de sua 
tentativa em vincular a filha à esposa, impedindo que sua companheira fizesse 
como sua mãe. Todavia, a amamentação passou a representar a reatualização de 
um abandono experienciado quando Danilo era criança. Diante disso, percebe-
-se a dificuldade de Danilo em exercer a função paterna e privar a filha, assim 
como a esposa, dessa relação incestuosa. Essa dificuldade foi presente desde o 
26 Estilos clin., São Paulo, v. 21, n. 1, jan./abr. 2016, 12-29.
início, quando ele procurava desautorizar as decisões de sua esposa 
como mãe, entre essas o próprio desmame.
Os relatos e vivências apresentadas neste artigo ilustram as 
eventuais dificuldades com as quais o homem pode deparar em seu 
processo de tornar-se pai, tendo em vista que esse momento pode 
convocá-lo a uma reconstituição psíquica a partir de sua própria his-
tória (Chevalerias, 2005). Assim como evidenciado no caso de Danilo, 
é plausível se pensar que, em alguma medida, outros pais também 
possam vivenciar experiências de exclusão e/ou inveja da relação 
corpo a corpo mãe-bebê, particularmente durante a amamentação, 
e encontrem dificuldades na paternidade. Com isso, sugere-se que 
novos estudos sejam realizados contemplando a perspectiva paterna 
com relação aos aspectos subjetivos da amamentação e desmame e 
que os pais sejam mais acompanhados nesses momentos de transição, 
contribuindo para a relação pai-mãe-bebê e, especialmente, para o 
desenvolvimento do próprio bebê. 
BREASTFEEDING AND WEANING IN THE PROCESS OF BECOMING 
A FATHER 
AbstRAct 
Through a case study of a primiparous father, who was interviewed in the 6th and 20th month 
of his daughter’s life, this study investigated the fatherly subjective aspects regarding breastfeeding 
and weaning. His reports revealed that the father and his daughter vied for maternal desire, at 
the same time as the father and his wife vied for the child, which was associated with the father’s 
history. The reports suggest that in the process of becoming a father breastfeeding and weaning 
are also important, because breastfeeding can be associated to the mother-infant body relationship 
and the difficulties experienced by the man as a third party.
Index terms: breastfeeding; fatherhood; psychoanalysis. 
LA LACTANCIA MATERNA Y EL DESTETE EN EL PROCESO DE 
CONVERTIRSE EN UN PADRE 
Resumen 
En este artículo se analizó la perspectiva paterna en relación a los aspectos subjetivos de la lactancia 
y del destete, a partir de una entrevista con un padre primíparo, en el 6o y 20o mes de vida de su 
hija. Desde los informes se observó que el padre rivalizaba con su hija por el deseo de su esposa. 
Al mismo tiempo, existía una rivalidad entre el padre y su esposa por el bebé, aspecto que fue 
asociado con la historia paterna. Así, se entiende que, en el proceso de convertirse en padre, la 
lactancia y el destete también se destacan en función de que la lactancia puede asociarse con la 
relación corporal madre-bebé y con las dificultades experimentadas por el hombre como tercero.
Palabras clave: lactancia materna; paternidad; psicoanálisis. 
27
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NOTAS
1. O caso retratado neste artigo foi descrito 
em detalhes na dissertação de mestrado de 
Evandro de Quadros Cherer, intitulada 
Tornar-se pai: a experiência subjetiva da 
29
paternidade no sexto mês e ao final do segundo ano de vida do bebê, defendida no 
PPG-Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em 2014. Os 
dados de identificação do caso foram modificados. A pesquisa foi aprovada pelo 
Comitê de Ética da UFRGS (Protoc. nº 2010070) e pelo Comitê de Ética do 
Hospital de Clínicas de Porto Alegre (Protoc. n° 100553). 
2. “Entrevista sobre a gestação, o parto e a paternidade”. Instrumento não publi-
cado, elaborado em 2011 pelo Núcleo de Infância e Família (Nudif ) do Instituto 
de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 
3. “Entrevista sobre a paternidade”. Instrumento não publicado, elaborado em 
2011 pelo Núcleo de Infância e Família (Nudif ) do Instituto de Psicologia da 
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 
4. Todas as citações em itálico são fruto de entrevista (comunicação pessoal). 
 
quadroscherer@gmail.com
Departamento de Psicologia Clínica e Cultura – Ala Sul 
70910-900 – Brasília – DF – Brasil. 
ferrari.ag@hotmail.com
Rua Ramiro Barcelos, 2600/139
90035-003 – Porto Alegre – RS – Brasil. 
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Rua Ramiro Barcelos, 2600, sala 111
90035-003 – Porto Alegre – RS – Brasil. 
 
Recebido em junho/2015.
Aceito em novembro/2015.
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