Prévia do material em texto
Matrizes energéticas Q uando o homem passou a dominar o fogo, percebeu que tinha em mãos uma importante fonte de energia, capaz de não só aquecê-lo nos perí-odos mais frios como também preparar o seu alimento. Notou também que o fogo poderia ser um importante aliado no manejo da vegetação natural para práticas de cultivo e criação de animais, além de utilizar o fogo como uma técnica de caça. O uso da energia transformou o poder de produção do homem, e conse- quentemente provocou uma série de impactos no ambiente. Dessa época até chegarmos à Revolução Industrial, na qual a energia ca- lorífica serviu para movimentar os primeiros motores a vapor, foi um pulo em termos tecnológicos. Curioso por natureza, o homem continuou buscando no- vas formas de energia, visando atender suas diferentes necessidades, agora num mundo em franca expansão tecnológica e industrial. No entanto, sabe-se que para gerar energia há um custo e esse custo não é baixo. Produzir cada vez mais em menos tempo é resultado do avanço tecnoló- gico. Mas qual o preço desse avanço? Até agora, pelo menos para o ambiente, o resultado foi extinção de espécies, ar poluído, chuva ácida, efeito estufa, desma- tamento. No final do século XX, começou a preocupação com a substituição das fon- tes de energia, pois estudos mostravam que as fontes de petróleo estavam se es- gotando. Novas fontes de energia foram desenvolvidas, mais limpas e renováveis. No entanto, as novas alternativas ainda não conseguiram substituir as antigas formas poluidoras de geração de energia. Os países industrializados, apesar de abrigarem apenas 21% da popu- lação mundial, consomem 70% das fontes convencionais de energia e 75% da eletricidade? “Quantos anos quei- mando combustíveis que poluem até que o homem percebesse o mal que vinha fazendo ao planeta?“ Matrizes energéticas 104 Quadro 1 – Matrizes energéticas mais utilizadas no Brasil Renováveis Não renováveis álcool (combustível) álcool anidro (aditivo na gasolina) lenha carvão vegetal bagaço da cana petróleo e seus derivados gás natural1 carvão mineral xisto As fontes renováveis ainda representam a menor parcela da produção ener- gética no Brasil: 38,4% da energia produzida e utilizada no país vem do petróleo e seus derivados, 29,7% das fontes renováveis, 9,3% de gás natural, carvão mineral e xisto e 15% de hidrelétricas. Petróleo C or el Im ag e B an k. O petróleo é uma substância oleosa, inflamável, menos densa do que a água, com cheiro característico, e de cor que varia entre negro e castanho escuro. Sua origem mais provável é da decomposição incompleta dos organismos marinhos em ambiente com pouca oxigenação, o que formou as reservas dessa substância, que é composta por grandes quantidades de carbono. Através de técnicas de des- tilação, craqueamento térmico, alquilação e craqueamento catalítico, o petróleo é refinado, derivando diversas outras substâncias, como combustíveis (gasolina e diesel), lubrificantes, plásticos, fertilizantes, medicamentos, tintas e tecidos. Os combustíveis derivados do petróleo, quando queimados, liberam uma grande quantidade de dióxido de carbono, além dos óxidos de enxofre, poluindo o ar atmosférico. Quando a queima acontece na presença de pouca quantidade de oxigênio, o resultado é a liberação de monóxido de carbono. Caso não haja oxigê- nio, haverá liberação de carbono na forma de fuligem. 1 Gás composto 85% de metano, retirado junto com o petróleo das reservas. Matrizes energéticas 105 Os combustíveis derivados do petróleo são atualmente a forma mais utiliza- da para gerar energia, sendo utilizadas para mover motores de automóveis e até na geração de eletricidade nas usinas termoelétricas. A extração do petróleo requer grandes investimentos, pois as reservas desse material ficam em locais bastante profundos da plataforma continental. Do local de extração até as refinarias e daí para os postos de distribuição e venda dos produtos, o transporte é feito por meio de navios, dutos e cami- nhões. Quando acontece um acidente que envolve uma das fases citadas, a degradação ambiental é bastante grande. Em janeiro de 2000, por exemplo, um rompimento de um duto no Rio de Janeiro lançou 4 mil toneladas de óleo na Baía de Guanabara, e para recuperar o ecossistema foram necessários cerca de dez anos. No mesmo ano, um outro acidente acontece no Paraná, lançando mais de 4 milhões de litros de óleo no Rio Iguaçu. Em abril de 2001, houve um acidente na plataforma marítima P-7, no Rio de Janeiro, que lançou no mar 26 mil litros de óleo. Um mês depois desse acidente, a plataforma P-36, uma das mais modernas em alto-mar, é destruída por explosões de seus dutos e a estrutura de 34 mil toneladas vai para o fundo do mar. O resultado desse acidente foi uma mancha de óleo de 60 quilôme- tros quadrados. Além de gerar impactos no seu uso, o petróleo é problemático desde a sua extra- ção. Além disso, esta é uma fonte de ener- gia não renovável, por isso a preocupação em desenvolver novas tecnologias com o uso de outras fontes energéticas. Usinas hidrelétricas O uso da água para geração de ener- gia aparentemente não causa problemas de poluição. No entanto, a implantação de uma usina hidrelétrica provoca vários problemas sociais e ambientais. O represa- mento do rio causa o alagamento de uma grande área ocupada por vegetação nativa, plantações, criação de animais, expulsando os moradores locais. Além disso, a inun- dação e o represamento do rio interferem drasticamente no regime hidrológico da região, afetando a vegetação, a fauna e as populações ribeirinhas. C or el Im ag e B an k. Matrizes energéticas 106 A maior barragem do mundo, a barragem de Três Gargantas (China), pro- vocou a relocação de 1 milhão de pessoas? No Brasil, a construção da hidrelétrica de Balbina, no Rio Uatumã, próxi- mo à capital Manaus, foi um desastre. Sua barragem inundou 2 360 quilômetros quadrados de floresta, mas hoje 30% de sua extensão tem apenas um palmo de profundidade. A produção dessa usina não é suficiente para abastecer Manaus e sua produção cai de 250 para 100 megawatts na estação seca. O Brasil tem inúmeras usinas hidrelétricas e, de acordo com a WWF-Brasil, o atual parque de hidrelétricas existentes no país pode produzir mais energia atra- vés da troca de turbinas e modernização de suas instalações, sem a necessidade de construir novas usinas. Hoje, 61,3% da eletricidade brasileira é produzida por usinas hidrelétricas, e o restante provém de usinas termoelétricas, usinas nucleares e eólicas. Biomassa O uso da biomassa para produção de energia sig- nifica o aproveitamento da energia solar, que foi ante- riormente utilizada na fixação do carbono através da fotossíntese, para gerar novamente energia. Convencio- nalmente, aproveita-se a energia fixada na fotossínte- se para alimentação, porém os resíduos das plantações podem ser utilizados para gerar outros tipos de energia. Através da fermentação, queima, carburação, pirólise, produção de metanol e etanol, síntese de hidrogênio, cé- lulas combustíveis, entre outros, converte-se a biomassa em energia. Na fermentação é produzido o biogás, aprovei- tando-se todo tipo de resíduo biodegradável jogado no lixo. Se esses resíduos ficarem a céu aberto, o metano proveniente da sua fermentação será todo lançado na at- mosfera, contribuindo para o aumento da temperatura global. O aproveitamento desses resíduos é total, pois o metano (biogás) é posteriormente queimado para gerar calor e energia, e a matéria orgânica decomposta é utili- zada como fertilizante. Em nosso país, a temperatura é adequada para que aconteça esse processo naturalmente, sem a necessidade de utilizar energia para aquecer a ma- téria orgânica e assim permitir a ação das bactérias. B . N av ez . Matrizes energéticas 107 No Brasil, a utilização do álcool combustível é uma inovação, pois polui menos que os derivados do petróleo. O álcool é derivado da cana-de-açúcar e a produçãobrasileira desse vegetal é de 520 milhões de toneladas por ano, sendo 52% desse total destinado à produção do combustível. A cana-de-açúcar é hoje alvo de pesquisa para melhoria de produção e aproveitamento dos subprodutos, como plástico biodegradável e derivados da cana para uso medicinal. Além do combustível, da cana ainda pode ser produzido um aditivo da gasolina, o álcool anidro, que substitui o MTBE (metil-tércio-butil-éter), derivado do petróleo e al- tamente tóxico. O valor energético contido em 300 milhões de toneladas de cana-de-açú- car equivale a 324 milhões de barris de petróleo? Com o uso do bagaço da cana, ainda é possível conseguir a energia equivalente a 216 milhões de barris de petróleo. A energia elétrica produzida na usina canavieira é de 800 megawatts, podendo chegar a 3 mil megawatts sem precisar trocar os equipamentos. Só não se produz mais porque não há mercado para esse tipo de eletricidade. O biodiesel é outra proposta para o aproveitamento energético da biomassa. Esse produto é uma mistura de diesel comum, derivado do petróleo, com óleos de origem vegetal. Utiliza-se óleo de plantas, como amendoim, girassol, mamona, sementes de algodão e de colza, além de plantas brasileiras como a andiroba, o babaçu e o dendê. O problema do uso da biomassa é que sua queima também gera dióxido de carbono, que é liberado para a atmosfera, porém com a vantagem de não liberar o enxofre, que é liberado na queima dos combustíveis derivados do petróleo. As plantações de cana-de-açúcar também têm os impactos ambientais e os problemas sociais relacionados a ela. Uso extensivo do solo, necessidade de fertilizantes, mão de obra infantil são alguns dos problemas embutidos na produção da cana- -de-açúcar. Energia solar fotovoltaica A geração de energia elétrica através dos sistemas fo- tovoltaicos tem emissão mínima de dióxido de carbono. Po- rém, o investimento necessário para sua implantação é muito alto, desestimulando os interessados. A produção de eletrici- dade através da energia solar não traz retorno financeiro ao investidor. No entanto, seus benefícios são para a comunida- de e o meio ambiente. En ric o D ol ab el i. Matrizes energéticas 108 Hoje, essa fonte de energia é utilizada em locais distantes das linhas de transmissão e distribuição de eletricidade. Algumas fazendas possuem sistemas fotovoltaicos, pois os investimentos para trazer a rede elétrica até a fazenda são equivalentes à instalação das placas de coleta de energia solar. Algumas casas e edifícios também já aderiram a esse sistema, pois se produzindo a energia utiliza- da, essas construções têm autonomia energética. Em Israel, o uso de energia solar é obrigatório e faz parte do projeto de construção de casas. Energia eólica O vento é capaz de gerar energia de uma forma totalmente limpa e renová- vel. Em 2002, já eram produzidos cerca de 24 500 megawatts no mundo todo, sen- do que o mercado para energia eólica movimentava cerca de seis bilhões de dóla- res só com a fabricação dos aerogeradores. O custo da energia eólica em muitos países já alcançou os custos da energia gerada por hidrelétricas e termoelétricas. A capacidade geradora das usinas eólicas em regiões brasileiras, em que a média anual de velocidade dos ventos é de 8 metros por segundo, chega a 40%, sendo que em locais como o litoral nordestino essa capacidade chega a 60%. Atualmente, no Brasil, existem 360 usinas eólicas instaladas, o que corres- ponde a 8,98 gigawatts de capacidade de geração de energia. Em nosso país, os períodos mais secos coincidem com os períodos de mais vento, ou seja, quando os reservatórios das hidrelétricas ficam com menor capaci- dade, as usinas eólicas passam a produzir mais energia. Com a crescente demanda de energia no mundo aliada às necessidades de controle ambiental, preservação da natureza e crescimento autossustentado, o aproveitamento dos ventos é uma alternativa que deve ser explorada. Os avanços tecnológicos e redução dos custos desse tipo de energia fazem dela uma das tec- nologias que mais cresce em todo o mundo, cerca de 40% ao ano. Energia nuclear A energia nuclear não emite gases poluentes na atmosfera, sendo que em alguns países europeus ela fornece mais da metade da energia elétrica utilizada. No entanto, gera o lixo nuclear ou lixo radioativo que permanece ativo durante muito tempo, representando uma ameaça para o ambiente. A instalação de uma usina nuclear necessita de muito investimento. No Brasil, a primeira usina foi implantada em 1972, a Angra I, mais conhecida como “vaga-lume” por causa do fornecimento de energia frequentemente interrompido. Angra II recebeu seus equipamentos em 2000, 25 anos após o acordo de compra com a Alemanha. Para Angra III, já foram investidos 750 milhões de dólares em equipamentos, mas sua construção foi adiada por falta de recursos e por causa das críticas ao programa nuclear (conte-se aqui a ineficiência de Angra I). Em 2002, a França se interessou em financiar o término de Angra III e fez um acordo com o Brasil de cooperação Matrizes energéticas 109 para uso pacífico, porém, apenas em 2004 um grupo de trabalho começou a estu- dar a viabilidade técnica, econômica e social dessa obra. Da mesma maneira que é necessário muito investimento para implantar uma usina nova, para desativar essa usina é necessário muito dinheiro também, pois é preciso isolar os materiais radioativos. O preço da desativação é dez vezes maior do que um reator novo. Os riscos gerados pelo lixo radioativo são muito grandes. Em 1986, houve o acidente em Chernobyl, na Ucrânia, que matou cerca de 30 mil pessoas. Hoje, os ucranianos enfrentam altos índices de câncer e mutações em consequência do acidente. Energia “limpa” ameaça camada de ozônio (ANGELO, 2003) As chamadas energias verdes também têm o seu lado cinzento. Um es- tudo publicado hoje indica que o hidrogênio, considerado o combustível do futuro por não poluir a atmosfera, pode trazer problemas até então não imagi- nados, como um resfriamento global e o aumento dos buracos na camada de ozônio sobre os polos. Embora ressalve que esses problemas não devem impedir o desenvolvi- mento de células de combustível2 para substituir a economia do petróleo – que, além do aquecimento global, também alimenta guerras –, o estudo diz que eles devem ser levados em conta quando se debatem medidas a serem adotadas, para evitar danos ambientais na transição para a economia do hidrogênio. Elemento mais abundante do universo, o hidrogênio é considerado a gran- de aposta entre as energias limpas no lugar dos combustíveis fósseis (como petróleo, gás natural e carvão mineral). Uma das razões para essa esperança é o fato de sua queima ter como subproduto apenas água (H2O), enquanto os de- rivados de petróleo produzem poluentes como enxofre e óxidos de nitrogênio, além de gás carbônico (CO2), o vilão do aquecimento global. Mas, claro, nada vem tão fácil. Primeiro, o hidrogênio precisa ser disso- ciado da água ou de outras moléculas, o que gasta energia. O estudo de cientistas do Instituto de Tecnologia da Califórnia, EUA, pu- blicado na revista Science (Disponível em: <www.sciencemag.org>), acende um segundo sinal amarelo: se o hidrogênio substituísse inteiramente os com- bustíveis fósseis, seria de esperar o vazamento de 10% a 20% do gás em usinas de força, tanques, células de combustível e gasodutos. Isso aumentaria as emissões de H2 em até oito vezes. Como o hidrogênio tende a subir para a alta atmosfera e a reagir com o oxigênio, produzindo água, o resultado previsível seria o crescimento da umidade na estratosfera. E até água, em excesso, faz mal. “Isso resultaria num resfriamento da baixa estratosfera e numa perturba- ção na química do ozônio”, escreveram os cientistas. 2 As células de combus-tível funcionam como uma grande bateria movida a hidrogênio, que reage com o oxigênio e produz água. Tecnologia ainda em desen- volvimento. Matrizes energéticas 110 Os pesquisadores,liderados por Tracey Tromp, usaram dois modelos de computador para simular o que aconteceria com a atmosfera do planeta em dois casos: com as concentrações de hidrogênio semelhantes às atuais e com concentrações quadruplicadas. No segundo cenário, a quantidade de água na estratosfera acima dos 40 quilômetros de altitude chegaria a 30%, com várias consequências indiretas. A principal seria o resfriamento estratosférico, o que aumentaria a quantidade de nuvens nos polos e “tornaria o buraco de ozônio maior (em área) e mais persistente (na primavera)”. A pior situação, afirma o grupo de Tromp, estaria no Ártico, onde a camada de ozônio ainda está relativamente intacta “e tem potencial para ficar como a da An- tártida”. Ali, a quantidade de ozônio diminuiria em até 8%. Como esse gás protege a Terra da radiação ultravioleta solar, que causa mutações – e câncer – em seres vivos, a perda da capa no Ártico, muito mais habitado que a Antártida, é motivo de preocupação. Apesar de a camada de ozônio estar se recompondo aos poucos, como resultado da proibição dos CFCs, gases que a destroem, a economia do hi- drogênio poderia atrasar essa recuperação. No entanto, para melhor prever o impacto, será preciso esclarecer o papel da tecnologia na redução dos vaza- mentos e dos solos como “ralo” do H2 humano. Uso racional das matrizes energéticas As reservas de energia do planeta irão durar por tempo determinado? Veja os exemplos a seguir: Petróleo – 42 anos Gás natural – 65 anos Carvão mineral – 165 anos Linhito – mais de 200 anos Urânio – 40 anos O consumo excessivo faz aumentar a demanda por usinas de produção de energia. Quanto maior a produção, maior é o gasto energético. Além de trocar as fontes de energia não renováveis por fontes renováveis, é necessário que haja a colaboração da sociedade na redução do consumo de energia. Para se ter uma ideia, o gasto de energia do stand-by, estado no qual o apare- lho eletrônico está ligado, porém não realiza sua atividade principal, corresponde a cerca de 10% do gasto de eletricidade em escritórios e domicílios. Matrizes energéticas 111 Observe o gasto dos aparelhos quando estão em stand-by: TV – 1 a 13W Videocassete – 5 a 19W Rádio relógio – 1 a 3W Forno de micro-ondas – 2 a 6W Recarregador de bateria – 2 a 4W Secretária eletrônica – 2 a 4W Telefone sem fio – 2 a 7W Micro system – 0 a 12W Som portátil – 0 a 5W Veja algumas formas de se economizar energia em casa: desligar a luz nos recintos não ocupados; degelar regularmente as geladeiras; usar a máquina de lavar roupa apenas com a carga máxima; reduzir o uso de torneira elétrica; não ficar abrindo e fechando a geladeira muitas vezes e observar se a borracha de vedação está bem conservada; diminuir o tempo de banho nos chuveiros, fechando-o enquanto se ensa- boa e lava o cabelo, pois além de economizar energia elétrica, economi- za-se água; não deixar a televisão ligada se não está assistindo; aproveitar ao máximo a luz do dia; utilizar lâmpadas fluorescentes; evitar o uso de secadora de roupa. O Brasil precisou importar cerca de 2 bilhões de dólares em petróleo no ano de 2002 para suprir o consumo dessa fonte de energia? Sessenta por cento foram utilizados na área de transportes, sendo que o Brasil é o país que mais consome combustíveis nessa área. Perspectivas futuras As fontes renováveis são uma forma de aumentar o acesso à eletricidade, ge- rar empregos, descentralizar a geração elétrica e reduzir os impactos ambientais. Cresce a compreensão de que uma boa diversificação e substituição de carvão, pe- Matrizes energéticas 112 tróleo, gás e da energia nuclear são pré-requisitos para o crescimento econômico sustentável, considerando-se o aumento de exigências no abastecimento. A redu- ção dos custos está deixando as energias renováveis cada vez mais competitivas. O Brasil tem um potencial eólico muito superior à Alemanha, campeã mun- dial de energia eólica. No sul e no litoral brasileiro, as zonas climáticas são propí- cias ao aproveitamento dessa energia. Além disso, a demanda industrial de ener- gia é considerável. Essas considerações valem também para o aproveitamento da energia solar no território brasileiro. A Eletrobras criou o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Ener- gia Elétrica (Proinfa), que prevê a inclusão das fontes renováveis, como as usinas eólicas e as usinas de biomassa, na produção de energia brasileira. As fontes renováveis ainda são uma pequena parcela da matriz energé- tica do Brasil. Para que elas passem a representar uma maior quantidade na geração de energia no país, Roberto Zilles, professor do programa de pós- -graduação em energia da USP, dá a dica: “criação de legislação que exija de cada concessionária a comercialização de um percentual mínimo anual de energia elétrica proveniente de fontes renováveis. Esse percentual estará associado ao volume total de energia elétrica comercializado, onerando assim equitativamente cada concessionária. Essa lei criaria os Créditos de Comer- cialização de Energias Renováveis – CCER que podem ser negociados entre concessionárias para fins de cumprimento das metas”. É preciso considerar que sem um incentivo inicial, as fontes renováveis não vão conseguir espaço em um mercado energético tão competitivo, pois o uso das fontes não renováveis ainda é mais barato. Na Alemanha, os custos iniciais para incentivar a produção de energia a partir de fontes renováveis representaram um milésimo do orçamento público anual, mas esse investimento já retornou na forma de energia poupada, cresci- mento econômico e empregos. Esse exemplo pode ser seguido por outros países, principalmente o Brasil, que tem condições climáticas favoráveis ao uso de ener- gias renováveis. O petróleo ainda é a fonte energética mais barata e, por enquanto, a mais fácil de ser conseguida. A grande maioria dos motores de automóveis são movi- dos a combustíveis derivados do petróleo, sendo boa parte da poluição atmosféri- ca causada por esse uso de energia. Outras matrizes energéticas já estão em fase de pesquisa e desenvolvimento, mas por enquanto poucos automóveis que estão rodando funcionam com algum tipo de combustível alternativo. A próxima fase é o desenvolvimento de motores e de toda uma infraestrutura de abastecimento de combustíveis de outras fontes, renováveis. A geração de energia elétrica também precisa ser substituída totalmente por maneiras menos impactantes, ao invés de queima de combustíveis fósseis e alaga- mento de grandes áreas para a construção das barragens das hidrelétricas. Como foi visto nesta aula, já existem várias formas de se produzir energia elétrica sem que haja a necessidade de poluir mais o ambiente. Matrizes energéticas 113 Outro ponto crucial na questão das matrizes energéticas é o padrão de con- sumo de energia cada vez maior, com uma quantidade maior de aparelhos eletrô- nicos em todos os setores da sociedade. A redução do consumo e a substituição das fontes energéticas não renováveis por fontes renováveis e menos poluentes são fatores decisivos para um ambiente mais saudável. Brasil um potencial gigante de produção de energia eólica (MELO, 2014 – Presidente da ABEEólica) A energia eólica é a energia produzida através da força dos ventos, que transforma energia cinética em energia elétrica. Muito recente no Brasil, esta fonte de energia já vem contribuindo em grande grau para o desenvolvimento do país, abastecendo nos dias de hoje cerca de 4 milhões de lares brasileiros, ou 12 milhões de pessoas o que corresponde a uma cidade do tamanho de São Paulo. Embora venha sendo pesquisada há mais de 50 anos, a energia eólica economicamente viável é relativamente nova, não possui mais de 20 anos e teve como seu principal percursor os países europeus com destaque para a Dinamarca e Alemanha. Foram esse países que no início da década de 1990 fizeram grandes esforços em tecnologia com o objetivo de produzir energia a partir de fontesrenováveis e, portanto, de recursos naturais como o vento e o sol. A Europa, a partir da segunda grande crise do petróleo, ocorrida no final dos anos 70, per- cebeu a sua forte dependência energética na medida em que utilizava para a produção de energia elétrica o carvão e os derivados do petróleo, sendo esses insumos importados. No início dos anos 90, com o objetivo de reduzir essa dependência e ter mais autonomia na produção de um insumo vital para qualquer economia, a energia elétrica, os países europeus fizeram grandes investimentos na produção de tecnologia das até então chamadas fontes alternativas. Tais fontes trariam natu- ralmente por um lado a independência desses países em termos energéticos e, portanto, maior segurança nacional e, por outro, a possibilidade de produção de energia a partir de fontes limpas e renováveis contribuindo para a redução da emissão de CO2 e o consequente aquecimento global. Por possuir um drive diferente e um tempo diferente, o Brasil por sua vez iniciou fortes inves- timentos na fonte eólica a partir do final da década de 2010, uma vez que a produção de energia do país sempre obedeceu o quesito de independência energética e de baixa emissão CO2, dada a grande fatia da produção de energia elétrica do Brasil proveniente de uma fonte renovável, a hidroeletricidade. Em tempos que os grandes potenciais hidrelétricos estão se tornando cada vez mais escas- sos e que a necessidade de aumentar a oferta de energia para atender o mercado brasileiro muito crescente, em termos de consumo de energia, o Brasil vem diversificando fortemente sua matriz elétrica, construindo um mix de geração de energia com forte predominância hidrelétrica e inse- Matrizes energéticas 114 rindo cada vez mais outras fontes renováveis. É neste contexto que a indústria de energia eólica brasileira, que teve seu início a partir de 2009, vem ocupando capa vez mais espaço no país, sendo hoje a segunda fonte mais competitiva e também a mais contratada. Foram contratados desde 2009, a partir do primeiro leilão competitivo com participação eó- lica, mais de 12 GW de capacidade eólica instalada, isto significa cerca de 10% do que o Brasil possui hoje somando todas as demais fontes, como nuclear, hidrelétrica, carvão, biomassa e ou- tras. A energia eólica hoje já instalada representa cerca de 4% do total de energia para o sistema e vai crescer fortemente nos próximos anos podendo chegar a cerca de 10% em 2018. Em termos de potencial, a possibilidade de produção de energia eólica no Brasil é quase infinita, temos potencias eólicos de altíssima qualidade no Nordeste e Sul do país, e, mais recente- mente, os estudos eólicos têm apresentado potenciais em São Paulo, Minas Gerais, Espirito Santo e outros estados que estiveram fora da rota da energia dos ventos no passado. Com essa velocidade de crescimento, em breve, o país vai estar entre os líderes mundiais na produção e no investimento em energia eólica. O Brasil encerrou o ano de 2013 como 13.º colocado no ranking mundial de par- ques eólicos instalados, sendo neste ano o sétimo país que mais instalou novos parques de energia eólica, abaixo, somente, da China, Alemanha, Reino Unido, Índia, Canadá e EUA. Para 2014, estimamos encerrar o ano entre a nona e décima posição do ranking, sendo um dos cinco primeiros em termos de novos parques instalados e, consequentemente, em investimentos. A energia eólica é uma fonte limpa e renovável, que gera empregos e renda para o Brasil. Até hoje, considerando a capacidade já instalada, foram criados mais de 70 mil empregos. Do ponto de vista socioeconômico, a geração de empregos e renda em regiões carentes demonstram um papel relevante das externalidades positivas decorrentes da geração eólica. Embora venha enfrentando grandes desafios, a indústria, hoje em franco processo de conso- lidação, ainda precisa superar alguns entraves, como os problemas de logística para o transporte de equipamentos. Esses desafios podem ser considerados como “bons desafios”, pois estamos os enfrentando a fim de avançar para cumprir uma próxima etapa desta indústria virtuosa, alcançan- do a sua sustentabilidade de longo prazo. 1. Pesquise quais as fontes de energia utilizadas na sua cidade. Inclua na sua lista todos os estabe- lecimentos que utilizam energia e de onde vem essa energia que eles usam. Matrizes energéticas 115 2. Quais os impactos que essas fontes causam em sua cidade e nos arredores? 3. Quais as condições climáticas de sua cidade? Com base em sua resposta, liste as fontes de ener- gia renovável que poderiam ser implementadas. Matrizes energéticas 116 Imagine que você saiu para jantar com o pessoal do escritório, todas as 100 pessoas do seu departamento. Você está numa fase difícil de dinheiro, mas... Como a conta vai ser dividida por igual, por que não pedir lagosta? Se todo o resto do departamento pedir filé com fritas que custa 10 reais, e você pedir a lagosta de 40 reais, todos pagarão R$10,30. Sua vantagem então será de R$29,70, contra um acréscimo de módicos R$0,30 para cada um dos outros colegas. Genial, não? (MARINHO, 2002) O que você acaba de ler é um exemplo da tragédia dos comuns, que hoje precisa ser combatida para impedir que o planeta seja destruído. O Protocolo de Kyoto e outros protocolos já postulados pelo homem são meios para se evitá-la. A não adesão dos Estados Unidos e da Austrália ao Protocolo de Kyoto, por exemplo, pode ser considerada uma atitude igual a quem pediu lagosta no exemplo an- terior, da mesma forma que pensar que a não substituição das fontes de energia em um país pequeno não faria a menor diferença na poluição do planeta. ORTIZ, Lúcia Schild (Org.). Fontes Energéticas de Energia e Eficiência Energética: opção para uma política energética sustentável no Brasil. Campo Grande: Fundação Heinrich Böll/Coalizão Rios Vivos, 2002. 208p. O livro documenta o Seminário Internacional, de mesmo título, que aconteceu em 2002 na capi- tal brasileira. O acontecimento reuniu pesquisadores, representantes da indústria de energia, ambien- talistas, líderes de movimentos sociais, sindicalistas, membros de cooperativas de eletrificação rural e parlamentares no intuito de ampliar e descentralizar o debate sobre a matriz energética brasileira.