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FICHAMENTO DE LEITURA – Andressa Christmann PROENÇA FILHO, Domício “A linguagem literária" Editora ática, São Paulo – SP, 6ª impressão, 7ª edição. 1-Texto literário e não literário Imaginemos que, na comunicação cotidiana, alguém nos diga a seguinte frase: — Uma flor nasceu no chão da minha rua! Conforme é dito, entendemos que se refere a algo que realmente ocorreu, corresponde a um fato anterior ao seu enunciado e de fácil comprovação. Mesmo diante de sua transcrição escrita, o que nela se comunica basicamente permanece. Uma flor nasceu na rua! Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego. Uma flor ainda desbotada ilude a polícia, rompe o asfalto. Desde logo, estamos diante de uma utilização especial da língua que falamos. O ritmo que caracteriza o texto, a natureza do que se comunica e, ao chegar até nós por escrito, a distribuição das palavras no espaço do papel justificam essa conclusão. É claro que os versos remetem a uma realidade dos homens e do mundo, mas para além da realidade imediatamente perceptível e traduzida no discurso comum das pessoas, li o que acontece com essa modalidade de linguagem, a linguagem da literatura, tanto na prosa como nas manifestações em verso. A fala ou discurso é, no uso cotidiano, um instrumento da informação e da ação. A significação das palavras, nesse caso, tem por base o jogo de relações configuradoras do idioma que falamos. O mesmo não acontece com o discurso literário. Este se encontra a serviço da criação artística. O texto da literatura é um objeto de linguagem ao qual se associa uma representação de realidades físicas, sociais e emocionais mediatizadas pelas palavras da língua na configuração de um objeto estético. O texto repercute em nós na medida em que revele marcas profundas de psiquismo, coincidentes com as que em nós se abriguem como seres sociais. O discurso literário traz, em certa medida, a marca da opacidade: Um tipo específico de descodificação ligado à capacidade e ao universo cultural do receptor. Já se percebe o alto índice de multissignificação dessa modalidade de linguagem que, de antemão, quando com ela travamos contato, sabemos ser especial e distinta da modalidade própria do uso cotidiano. Literatura, conceitos Literatura é uma arte verbal. O seu conceito não é uma matéria pacíficas entre os estudiosos que a ela se dedicam. Apesar das inúmeras variações significativas no decorrer da história. Há também o entendimento que obra literária envolve uma representação e uma visão do mundo além de tomadas de decisões diante dele. A linguagem é vista como um mero veículo da comunicação e, de acordo com Maurice-Jean Lefebve, “a beleza da obra resulta, então, de um lado, da originalidade da visão, e, de outro, da adequação de sua linguagem às coisas expressas”. É a chamda concepção clássica da literatura. Literatura e conhecimento Para revelar o que se consubstancia no poema, o autor, se valeu da língua portuguesa do Brasil e, buscou caracterizar uma realidade apoiada em vivências humanas. A arte é um dos meios de que se vale o homem para conhecer a realidade. Esta última se efetiva na constante relação entre homem e mundo, entre sujeito e objeto, como costumam lembrar os filósofos. Na dialética, o homem busca aceder à interioridade da sua essência, para melhor saber de si e situar-se. Todo conhecimento se caracteriza como uma representação, como um tornar de novo presente a realidade em que vivemos, para que dela tenhamos uma visão mais clara e profunda, que escapa à nossa percepção imediata. Toda representação, nesse sentido, configura uma interpretação. A linguagem converte-se, como destaca Eduardo Portella, na “fonte de toda e qualquer realidade; é precisamente a realidade mais livre, a mais aberta”. O texto literário repercute em nós, na condição de leitores ou ouvintes, na medida em que revele traços profundos do nosso psiquismo, coincidentes com o que em nós se abrigue como seres sociais. Nosso entendimento do que no texto se comunica passa a ser proporcional ao nosso repertório cultural. O texto literário pode ser lido, criticamente, considerada a polissemia que o caracteriza. O texto de literatura pode ser considerado como pretexto para a compreensão da língua, seu ponto de partida, procedimento bastante comum na realidade pedagógica brasileira. 3- A linguagem: Conceitos A linguagem é uma das formas de apreensão do real. O ser humano vive em permanente e complexa interação com a realidade e a apreende de várias maneiras, por exemplo, através dos sentidos. De acordo com Ernst Cassirer, linguagem é a faculdade que o homem tem de expressar seus estados mentais através de um conjunto de sons vocais chamado língua, que é ao mesmo tempo representativo do mundo interior e do mundo exterior. A linguagem é entendida como uma atividade que apresenta um aspecto psíquico (linguagem virtual) e um aspecto propriamente linguístico (linguagem realizada) que, por sua vez, o ato linguístico (realidade imediata) e o repertório dos atos linguísticos (material linguístico). No âmbito desse posicionamento, a língua é uma abstração, um conjunto organizado de aspectos comuns aos atos linguísticos. A linguística tem como objeto o estudo da linguagem falada e articulada, ou seja, aquela que se concretiza nas línguas naturais. De acordo com Tatiana Slama-Casacu, a linguagem é um conjunto complexo de processos — resultado de uma certa atividade psíquica profundamente determinada pela vida social — que torna possível a aquisição e o emprego concreto de uma língua qualquer Sistema, comunicação e signo. Sistema: conjunto organizado que apesar das múltiplas modalidades de linguagem, tenta conhecer esses princípios, se desejarmos dela nos assenhorear e assegurar a eficácia da comunicação pelo seu intermédio que se processa. Comunicação: É a troca de mensagens ou informações entre seres humanos. Pensando na etimologia de uma palavra podemos entender como a faculdade que o homem tem de tornar comum a outrem seus pensamentos e desejos daquilo que lhe cerca. Envolve também realidades técnicas da relação entre o homem e as máquinas (por exemplo, os computadores) e das máquinas entre si, além de se estender ao mundo animal e aos sistemas próprios do interior do indivíduo. Signo: De acordo com PEIRCE, Charles Sanders, signo é qualquer elemento que, sob certas medidas e aspectos representa o outro. O signo pode identificar-se em três modalidades, que são: Signo índice – Mantém relação direta com o que representa. Fatores do processo linguístico da comunicação e funções da linguagem O processo da comunicação implica fatores e funções que têm preocupado estudiosos, como Roman Jakobson, Para esse especialista, cada ato de comunicação verbal envolve, na linguagem comum, um remetente que envia uma mensagem por meio de um código a um destinatário, estabelecido entre os interlocutores um contato que envolve um canal físico e a necessária conexão psicológica. A mensagem enviada é compreendida porque se refere a um contexto extra verbal e a uma situação efetivamente existente anteriores e exteriores ao ato da fala. Remetente ou emissor, mensagem, código, destinatário ou receptor, contato e contexto são, portanto, os seis fatores do processo linguístico da comunicação. Temos então algumas funções de linguagem: a) função referencial ou denotativa b) função expressiva ou emotiva c) função conativa ou apelativa d) função fática e) função metalinguística f) função poética ou fantástica Linguagem, língua e discurso. A língua é um sistema de signos, ou seja, é um conjunto organizado de elementos representativos. Envolve dimensões fônicas, morfológicas, sintáticas e semânticas que, além das relações intrínsecas peculiares a cada uma, são também caracterizadas por um significativo inter- relacionamento. A significação global emerge, portanto, das relações fono- morfo-sintática semânticas que estãona base da organização desse complexo sistema. Já que estamos tratando de significação, vale lembrar que, em termos de palavra, esta resulta fundamentalmente, na sua condição de signo, da relação entre o significante e o significado, dois aspectos que o identificam: o primeiro, perceptível, audível; o segundo, produto dele, nele contido. E isso é ponto pacífico, desde os estudos pioneiros de Ferdinand de Saussure. Não nos esqueçamos também de que a língua, além de ser um conjunto organizado de valores, é, simultaneamente, uma instituição social, é a linguagem de urna sociedade. É constituída de elementos que têm um valor em si e um valor em relação aos demais; o signo linguístico, como explicita Barthes nos seus Elementos de semiologia, é como uma moeda: cada peça vale pelo seu poder aquisitivo, mas vale também em relação às outras moedas de valor maior ou menor. A língua pode ser entendida ainda como a realização de uma linguagem, um sistema de signos que permite configurar e traduzir a multiplicidade de vivências caracterizadoras do ser de cada um no mundo. Em sentido restrito, alguns linguistas a consideram um sistema de sons vocais peculiares ao uso da linguagem pelo ser humano. Outros, como Celso Cunha, por exemplo, em sua Gramática do português contemporâneo, a definem como "um sistema gramatical pertencente a um grupo de indivíduos" e, como expressão da consciência de uma coletividade, como o meio pelo qual esta concebe o mundo que a cerca e age sobre ele. Podemos, ainda mais, entender saussurianamente com o citado Barthes que a língua (langue) é "a linguagem menos a fala (parole), é, ao mesmo tempo, uma instituição social e um sistema de valores. Como instituição social, ela não é absolutamente um ato; escapa a qualquer premeditação: é a parte social da linguagem"7. Língua e fala, diz ainda o semiólogo francês, "retiram sua definição do processo dialético que as une: não existe língua sem fala, não há fala fora da língua".8 Criação social, a língua vive em permanente mutação, acompanha as mudanças da sociedade que a elege como instrumento primeiro de comunicação. Nesse processo, o exercício da linguagem produz uma espécie de depósito sedimentário que ganha valor de instituição e se impõe ao falar individual por meio do dicionário e da gramática. Discurso e estilo Se a língua envolve uma dimensão social e se caracteriza por ser sistemática, a utilização individual que dela fazemos, ou seja, a fala ou discurso, é um conglomerado de fatos assistemáticos e, em relação a ela, Entende-se também, o discurso como um enunciado ou um conjunto de enunciados ditos e escritos por alguém na direção de um destinatário. Enunciado, segundo alguns linguistas, é, em função da significação, a unidade elementar da comunicação verbal, uma palavra ou sequência de palavras dotadas de sentido. Assumindo o discurso, o indivíduo busca escolher os meios de expressão que melhor configurem suas idéias, pensamentos e desejos. O estilo admite uma dimensão coletiva, vinculada aos estilos de época. Os conceitos de discurso e enunciado variam em função do enfoque. A respeito da literatura, só pode ser avaliada "pelas contribuições dos estilos individuais, ambíguas em si mesmas, que aparece em diferentes narrativas e autores da mesma era e parece informada pelos mesmos princípios perceptíveis nas artes vizinhas". Dimensões da linguagem O texto literário envolve dimensões universais, individuais, sociais e históricas. A linguagem, de acordo com Coriseu, é uma atividade humana universal, que se realiza individualmente, mas sempre segundo técnicas historicamente determinadas (línguas) 4- Literatura, mimese e universalidade. A literatura é uma forma de linguagem tendo a língua como suporte onde o texto literário tem presente uma comunicação em forma de discurso que por revelação pode-se compreender a configuração mimética do real, levando a afirmação a um importante conceito ligado a arte literária: Mímese (texto literário = discurso = real - mímese). Para Aristóteles, mimese pode ser entendida como imitação, onde imitar significa muito mais do que “fotografar” o real, porém a acepção da palavra passou por diversos séculos mudando seu significado. Após anos passou a ser entendida como revelação da essência do real. A literatura se configura quando, ao tratar desses fatos ou situações, dimensiona lhes elementos universais [...] Se a linguagem verbal caracteriza uma "desrealização" da realidade ao transformá-la em signos-símbolos, a mímese poética leva ainda mais longe esse desrealizar-se, quando, a partir do fingimento do particular, atinge espaços da universalidade. O fenômeno literário se efetiva na inter-relação autor/ texto/leitor. Já se percebe por que a obra literária sempre admite diferentes interpretações. (p. 29). A linguagem é ambígua e vinculada ao caráter conotativo. Abertura e conotação A conotação, processo linguístico das funções de linguagem é definida por Mattoso Câmera, “a parte do sentido de uma palavra que corresponde à sua capacidade de funcionar para uma manifestação psíquica ou um apelo”, então, a conotação depende de fatores vários: a) de aspectos fônicos do vocábulo, que podem "impressionar pela harmonia ou pela cacofonia"; b) "da associação com outras palavras, num dado campo semântico ou em frases usuais e frequentes"; c) da própria denotação, que evoca sensações agradáveis ou desagradáveis; d) "de pertencer a palavra a uma dada língua especial, como uma língua profissional, a língua literária ou a gíria"; e) "de se situar entre os arcaísmos ou os regionalismos"; f) "de impressões emocionais coletivas ou mesmo individuais, caracterizando o estilo individual, como as coletivas caracterizam o estilo coletivo de uma dada época"(p. 30) pode compreender-se por denotação a parte da significação linguística na função referencial ou representativa da linguagem. Cultura e arte literária A literatura só existe onde tem presença de um povo e, consequentemente, de uma cultura. A caracterização cultural, em termos sociais, admite ampliações e setorizações que permitem tratar, entre outras, de cultura ocidental, cultura europeia, cultura grega, cultura romana, cultura brasileira etc. Consequentemente, de literatura ocidental, literatura europeia, literatura grega, literatura romana, literatura brasileira etc.(p. 34). Cultura, língua e literatura estão, portanto, estreitamente vinculados. Literatura e especificidade Se literatura é uma arte, ela é um meio comunicativo, envolvendo uma linguagem também especial. Diante do mistério do fenômeno literário, o maior desafio é caracterizar a especificidade. Identificar certos traços peculiares do discurso literário tem se mostrado possível. Ainda não conseguiu se definir, o índice de chamada literariedade. Estudiosos vinculam a interpretação desta literariedade a uma conotação sócia cultural e sua variação no tempo e espaço humanos. Complexidade O discurso da literatura se caracteriza por sua complexidade. O texto literário ultrapassa os limites da simples reprodução, as informações vão além do nível semântico, tal que em sua comunicação se torna impossível através das estruturas elementares do discurso cotidiano. No dispositivo verbal da obra de arte literária, revelam-se realidades que, atingem espaços de universalidade. A linguagem literária produz e a não literária reproduz (sentido imediato).O texto literário é um objeto linguístico e um objeto estético. Multissignificação o texto literário tem um uso específico e complexo da língua, os signos linguísticos, as frases, as sequências assumem, significado variado e múltiplo. Assim, afastam-se, por exemplo, da monossignificação típica do discurso científico, para só citar um caso. Assim, estudiosos situam que a linguagem literária assume a relação que chamam grau zero da escritura. Esse grau zero é entendido como discursoe clareza da comunicação nele veiculada e de acordo com as normas da língua. A literatura cria significantes e funda significados. Apresenta seus próprios meios de expressão. A multissignificação é o traço que permite as múltiplas leituras existentes da obra de João Cabral de Melo Neto, de Guimarães Rosa... A permanência de determinadas obras se prende ao seu alto índice de polissemia, que as abre às mais variadas incursões e possibilita a sua atemporalidade (como é o caso de Grande Sertão: Veredos-publicado em 1956). Predomínio da conotação A linguagem literária é eminentemente conotativa. O texto literário resulta de uma criação, é do arranjo das palavras que emerge o sentido múltiplo. O texto literário pode abrigar a presença de elementos identificadores de um real concreto, que apresenta uma imagem desse real a outros elementos que fazem o texto. Este reside na conotação. (p.40) Liberdade na criação Manifestações literárias envolvem adesão, transformação ou ruptura em relação à tradição linguística. A literatura se abre pela criatividade do artista. Não existe uma "gramática normativa" para o texto literário. Seu único espaço de criação é o da liberdade. [...]O artista da palavra tem uma sensibilidade mais apurada do que a do comum das gentes, e essa acuidade mobiliza-lhe a criação progressora. No texto literário a criação estética autoriza qualquer transgressão nesse sentido. E em termos de história literária, múltiplos e vários têm sido os percursos nessa direção, seja em termos individuais, seja em termos de movimentos de época. (p. 41-42) Ênfase no significante O texto não-literário confere destaque ao significado, já o texto literário tem o seu sentido apoiado no significado e no significante. Num poema como o "Soneto de separação", de Vinícius de Moraes, por exemplo, os fonemas bilabiais de certos vocábulos parecem contribuir para o sentido dominante no texto. A questão é facilmente compreensível: basta substituir os vocábulos de um texto por sinônimos, para aquilatar a relevância do significante. Pensemos na fala famosa do Hamlet, de Shakespeare: To be or not to be: that is the question (Ser ou não ser: eis a questão) Evidentemente, perde-se muito do efeito estético com as expressões substitutas, levando-se em conta, obviamente, o contexto em que as palavras do teatrólogo se inserem. Variabilidade O texto literário se vincula, a um universo sociocultural e dimensões ideológicas; as línguas acompanham as mudanças culturais, assim como a linguagem, a literatura, manifestação cultural, acompanham as mudanças da cultura. A literatura traz a marca de uma variabilidade específica, seja em relação aos discursos individuais, seja em termos de representatividade cultural. E não nos esqueçamos de que, na base da literatura, está a permanente invenção. (p.44) modos de realização O texto literário-imediatamente comprovável - se faz de manifestações em prosa e de manifestações em verso. Manifestações em prosa: Envolvem as modalidades da narrativa de ficção.- significa invenção, construção da imaginação, fingimento, simulação, imaginação, Caracteriza-se de histórias fictícias ou simuladas, nascidas da imaginação. As principais modalidades são o conto, o romance e a novela. O conto é uma amostra da vida, por meio de um episódio, ou um momento singular e representativo. Constitui-se de uma história curta, simples, com economia de meios, concentração da ação, do tempo e do espaço. As visões da narrativa: A narração pode se dar por um narrador não participante ou por um personagem que convive com os outros na história narrada. A visão da narrativa também pode ser chamada de ponto de vista, foco ou enfoque narrativo... A história pode também ser contada em primeira pessoa por um dos personagens ou a história contada em terceira pessoa por um narrador que se situa fora dos acontecimentos e pode: a) saber tudo a respeito de tudo (visão totalizadora); b) conhecer plenamente apenas um dos personagens (visão limitada); c) conhecer superficialmente os personagens (visão restrita). O crítico francês Jean Pouillon, no seu O tempo no romance, ao tratar dos "modos de compreensão" em relação ao romance, admite três modalidades básicas de visão: a visão "com" (vision "avec"), a visão "por trás" (vision "par derrière ") e a visão "de fora" (vision "du dehors"). Na visão "com", tudo se centraliza num personagem e é a partir dele que nós vemos e "vivemos" os acontecimentos narrados e percebemos também o que com ele se passa no âmbito da ação do romance. A diferença entre a visão "com" e a visão "por trás" é a que se verifica entre a pura e simples consciência e o conhecimento à luz da reflexão. Os personagens: “eles vivem na história”. Os personagens "são", no que "representam" ou no que "fazem", privilegiando, assim, dimensões aspectuais. Daí a variada tipologia que os considera: a) por sua natureza — quando podem ser: seres humanos, coisas , e, por extensão, elementos da natureza. b) pela variedade — quando podem ser: individuais, ao se identificarem com seres nitidamente caracterizados em sua personalidade; típicos, quando trazem características que os identificam com um grupo social, nacional, regional, profissional etc. Certos personagens típicos acabaram tornando-se universais; c) pela função que desempenham — quando podem ser: protagonistas, as figuras principais da história, antagonistas, os que se opõem à figura principal. Nessa área funcional há que considerar ainda o narrador, caracterizado como tal. A ação: A narrativa, que integra ação e narração, caracteriza uma sequência, simples ou complexa, de conflitos ou tensões que se resolvem ou não. A ação se situa, assim, no nível da trama, intriga ou enredo, que envolve o que ocorre com os personagens, o conjunto de seus atos ou reações. Entende-se por narração a sucessão de fatos e acontecimentos em sequência ordenada. É a forma de como a narrativa se organiza. O tratamento do tempo: O homem é um ser temporal. O tempo cronológico. Admite padrões fixos ao movimento de rotação e translação da Terra. É um tempo objetivo, que se opõe à subjetividade do tempo psicológico, interior e relativo, situado no âmbito da experiência individual, que avalia a partir de padrões variáveis. A duração (durée) é anacrônica. O pensamento bergsoniano, notadamente a teoria da durée, está na base da concepção de personagem,especialmente no romance. [...] Enquanto a narrativa linear exprime a continuidade do tempo exterior, a associação dinâmica pode revelar a continuidade emocional. Esse posicionamento envolve relações da narrativa, instalando- se no âmbito da consecução e da consequência. O ambiente: envolve condições materiais ou espirituais em que se movimentam os personagens e se desenrolam os acontecimentos. O estilo: Estudos relacionados com o estilo envolvem, em síntese, dois posicionamentos: há aqueles que o consideram como resultante de um conjunto de escolhas em relação à língua; outros entendem que se trata de um desvio em relação à norma gramatical. Vossler compara a forma que usamos ao falar com a forma que vestimos: segundo ele, o modelo nos é imposto pela vida prática, mas a decisão é nossa. O estilo tende a se confundir com o idioleto, ou seja, "o sistema de expressões de um indivíduo isolado" ou, "o nome dado pelos linguistas americanos à língua tal como é observada no uso de um indivíduo". “Pode- se também entender estilo como “fenômeno de elaboração, que consiste em substituir a natural linearidade da linguagem em razão de um objetivo mais ou menos intuitivo ou inconsciente que deve resultar das escolhas sucessivas”. Como quer que seja, para efeito operacional, entenda-se o estilo na definição adaptada de Hatzfeld que se vincula a uma organização específica: o estilo passa a integrar um objeto estético e assume dimensãorelevante. O mais se situa no espaço de muitos problemas ainda não resolvidos plenamente na área dos estudos da linguagem e da literatura. Manifestação em verso: Como registra Mattoso Câmara, "a frase ou o segmento frasal em que há um ritmo nítido e sistemático". Se nos limitarmos apenas à área fônica, podemos dizer, como Todorov, que um verso é formado por uma sequência métrica de sílabas. O ritmo do verso é consequência dessa regularidade (ritmo silábico) e dessa disposição (ritmo intensivo). O final do século XIX assiste ao aparecimento de um novo tipo de verso, o verso livre, que deixa de ter na sílaba a sua unidade. Por entoação entende-se a linha melódica que caracteriza o enunciado: é a escala de elevação da voz com que se enuncia uma frase. Três elementos interdependentes costumam ser apontados como relevantes na caracterização tradicional do verso: o metro, a rima e as formas fixas. O metro: Apoia-se na repetição de três fatos linguísticos: a sílaba, o acento, a quantidade. A sílaba se constitui de um fonema-núcleo, chamado silábico, acompanhado ou não de outros fonemas, chamados não silábicos. Em termos de verso, a sílaba só se converte em realidade linguística na leitura particular que se chama metrificação ou escansão, por exemplo: A / mor / é / fo / go / que ar / de / sem / se / ver /; É / fe / ri /da / que / dói / e / não / se / sen / te (Camões) Essa escansão envolve algumas normas que apresentam pequenas alterações de idioma para idioma. Em português, a divisão silábica do verso é semelhante à divisão silábica da prosa, com as seguintes especificidades: Contam-se as sílabas somente até a última tônica, como nesse verso de Cecília Meireles: Ai / pa / la /vras / ai / pa / la / vras (sete sílabas métricas) O encontro de duas vogais idênticas obriga o uso da crase, como nesse outro verso de Cecília Meireles, sequência do exemplo anterior: Que‡es / tra / nha / po / tên / cia‡a / vos /sa! (crases: e + e = e; a + a = a). Também se considera uma só sílaba a elisão, ou seja, no encontro de vogais átonas ou de vogai átona com vogai tônica entre vocábulos, a primeira deixa de ser pronunciada: sois / o / so / nho‡e / sois / a au / dá / cia (elide-se o final de sonho e lê-se sonhe sois). Em alguns casos, no encontro de uma vogai nasal com uma vogai oral entre vocábulos, desnasaliza-se a primeira, para efeito de metrificação. A princípio, é possível distinguir três tipos de metro: o silábico, o acentuai e o quantitativo, cada um apoiado, respectivamente na repetição regular do número de sílabas, de acentos, de quantidades. O fim do verso é dado por uma pausa métrica. Quando o final do verso caracteriza discordância sintática ou separação de palavras de um grupo fônico, estamos diante do recurso estilístico chamado cavalgamento ou "enjambement”. Em outros termos, o enjambement é a não-coincidência entre a pausa métrica e a pausa verbal (gramatical ou semântica). Admite, portanto, duas leituras: uma métrica; outra, semântica. A rima: Contribui para o ritmo do verso. É a coincidência de fonemas em lugares do verso. Essa coincidência se dá no final do verso, mas pode aparecer no meio ou no início. A rima é um fenômeno fonético. Se há identidade ou semelhança de todos os fonemas a partir da vogai tônica, diz-se que a rima é soante, também conhecida como rima consoante ou consonância. Ex.: tanto / encanto. Coincidem-se apenas as vogais tônicas ou as vogais a partir da tônica, incluída esta, tem-se a chamada rima toante ou assonante ou assonância. Há também a coincidência das consoantes no início dos termos; é a chamada rima aliterada ou aliteração. Versos que não rimam são chamados soltos ou brancos. As formas fixas: As formas fixas chama-se estrofe a sucessão de dois ou mais versos que resultam na combinação de estrofes, que nos levam a exemplos como o soneto, a balada, a lira etc. Verso, Prosa, gêneros literários. Manifestações em verso envolvem dimensões líricas, épicas e dramáticas. Já o romance, a novela e o conto são manifestações literárias em que predomina o épico. Lembrança que diz um grande problema da teoria literária: os gêneros literários. Começa nas áreas da semântica abrangida pelo termo: a designação gênero ora se restringe a três grandes divisões tradicionalmente fixadas— lírica épica e drama e, logo, gênero lírico, épico e dramático. Platão, não trata sistematicamente da literatura, escreve sobre tragédia, comédia, ditirambo e poesia épica, fazendo referências, nos seus Diálogos, que permitem depreender uma preocupação com a unidade e a universalidade da arte e uma propensão para abolir divisões. Aristóteles refere-se à épica, ao drama e à poesia lírica como gêneros poéticos fundamentais. Estabelece distinções apoiadas na natureza dos assuntos tratados e nos elementos formais, como a métrica e a linguagem figurada. “A poesia lírica é a ‘pessoa’ do próprio poeta; na poesia épica, o poeta fala em primeira pessoa, como narrador, e em parte faz falar seus personagens em estilo direto (narração mista); no teatro, o poeta desaparece através da distribuição de papéis”. O filósofo italiano Benedetto Croce, que confere à teoria dos gêneros significação secundária, como um elemento extrínseco da obra; para ele, esta deve ser estudada em si mesma, como expressão única de realidades. A validade estética da obra de arte literária independe, segundo Croce, de sua subordinação a este ou àquele gênero arbitrariamente caracterizado. Outras perspectivas para o estudo dos gêneros literários colocam o centro das atenções na estrutura linguística da obra; é o caso da posição de Roman Jakobson. Em resumo, os estudos sobre a matéria envolvem duas teorias: a) a teoria clássica, e b) a teoria moderna. Questões em aberto A questão do referente: Para alguns estudiosos, o texto literário não tem referente, pois ele liga-se ao contexto extra verbal estando fora da linguagem; A tese ainda é pensada em termos de mímese das aparências e só essa ausência de referente quiser significar que ele é fictício ou imaginário. Podemos acreditar que o texto literário é uma desrealização do real que remete à profundidade desse real; ou aceitar o texto como concretizador de uma mímese das essências; ou pensar em textos autobiográficos, ou narrativas contemporâneas, em que as fronteiras do real e do imaginário parecem diluir-se; entender que os traços literários envolvem não apenas a totalidade do texto de literatura, mas podem ser configurados em fragmentos e passagens. O problema continua quando muitos consideram que o texto literário é um simulacro de referente e de outros a entender que algo da realidade abriga-se nos espaços do ficcional. Intertextualidade: O termo "intertextualidade" foi dado por Mia Kristeva como substituto de dialogismo Em oposição a Saussure, que privilegia a língua em sua dimensão ideal, Bakhtin concentra suas atenções na fala (ou discurso), que considera ligada às condições da comunicação. As palavras de um enunciado são vinculadas a inúmeros contextos vividos, e a comunicação envolveria a interação de um falante, um destinatário e um "personagem" envoltos por um horizonte comum que possibilita a compreensão dos elementos ditos e não ditos. Ainda segundo sua teoria, a realização de qualquer comunicação ou interação verbal tem uma troca de enunciados, situa-se na dimensão de um diálogo. O discurso literário envolve um cruzamento, um diálogo de vários textos, que se dá em nível horizontal e em nível vertical: em termos de horizontalidade, a palavra, no texto, pertence, ao mesmo tempo, a quem escreve e ao destinatário; verticalmente, é orientada na direção do corpus literário anterior ou do contemporâneo. A caracterização da intertextualidade permite "ler", por exemplo, em Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa, a presença de Os sertões, de Euclides da Cunha, e do discursoda Bíblia; o texto bíblico, aliado ao texto da mitologia clássica e ao texto da história do Brasil, aparece em Esaú e Jacó, de Machado de Assis. Fechamento: O texto literário tem um começo, um meio e um fim. É uma história narrada, com abertura a imaginação para resolução de algumas tensões apresentadas. O discurso será fechado quando ele manifestar seu próprio finalizar-se, do tipo "agora aplaudam", ou quando sua natureza o indicar, por exemplo, com os poemas de forma fixa, como o soneto. Discurso é compreendido como o encadeamento das unidades propriamente linguísticas (do fonema à frase) que tornam o texto manifesto. O fechamento da narrativa se dá "quando o conjunto de suas sequências está implícito na primeira sequência dentre elas" ou quando se explicita na última sequência. Nos textos em que a ação da última sequência admite o prosseguimento para além do discurso acabado, a narrativa permanece aberta. Citações de autores T. Hall (p.33) “Uma cultura constitui um corpo complexo de normas, símbolos, mitos e imagens que penetram o indivíduo em sua intimidade, estruturam os instintos, orientam as emoções”. Lefebve (p.35) diz, portanto que a linguagem literária, abre-se sobre o mundo e coloca diante dele “uma questão que não é daquelas que podem ser respondidas pela ciência, pela moral ou pela sociologia”. Síntese geral, Conclusão. O autor enfatiza aspectos da literatura, por exemplo, o que é uma literatura, o que deve conter nela, focando aspectos como a coesão e coerência de um texto. No capitulo cinco, o autor da uma grande ênfase na parte da escanção demonstrando as mais variadas normas e padrões para que tudo saia como deve. Fala também sobre os diferentes gêneros literários dando ênfase na poesia mostrando exemplos com diferentes autores. O livro busca trazer o quão uma leitura é importante e quantas coisas têm em nosso dialeto que nem sempre sabemos.
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