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Microbiologia e Imunologia Geral Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Dr.ª Diane Alves de Lima Revisão Técnica: Prof.ª Dr.ª Meire Silva Revisão Textual: Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira Imunidade Inata e Imunidade Adquirida Imunidade Inata e Imunidade Adquirida • Apresentar os mecanismos de reconhecimento de invasores; • Abordar o processo inflamatório e os diferentes tipos de imunidade. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Reconhecimento de Invasores; • Processo Inflamatório; • Vasodilatação e Aumento da Permeabilidade Vascular; • Imunidade Humoral; • Imunidade Celular. UNIDADE Imunidade Inata e Imunidade Adquirida Reconhecimento de Invasores Como vimos na unidade anterior, o sistema imune apresenta diversos mecanis- mos para enfrentar os microrganismos invasores. A partir de agora, vamos entender de que forma esses mecanismos atuam, começando pelo reconhecimento de micror- ganismos invasores. Os agentes infecciosos incluem vírus, bactérias, fungos e parasitas, tais como pro- tozoários e vermes. Após invadir o organismo, esses patógenos podem se multiplicar rapidamente. Por exemplo, uma bactéria que apresenta tempo de duplicação igual a 50 minutos, poderá gerar 500 milhões de descendentes em um período de 24 horas. Dessa forma, é fundamental que ocorra uma resposta de defesa rápida frente a tais invasores. Essa resposta inicial corresponde ao processo inflamatório agudo promovido pela resposta imune inata. A inflamação viabiliza uma rápida concentração de células e moléculas de defesa nos locais em que ocorreu invasão microbiana ou lesão aos tecidos. Esse processo envolve a ativação e o direcionamento de uma grande variedade de células aos sítios invadidos, especialmente neutrófilos e macrófagos. O processo inflamatório é desencadeado a partir do momento em que organismo percebe um agente agressor. Para isso, o corpo precisa reconhecer os sinais de pe- rigo produzidos pela invasão microbiana ou pelo dano tecidual. Há dois grupos de moléculas que realizam essa sinalização ao sistema imune. Um deles é composto por estruturas moleculares relacionadas a microrganismos invasores, eles são denomina- dos padrões moleculares associados à patógenos (PAMPs, do inglês pathogen- -associated molecular pattern). O outro grupo é constituído por moléculas próprias liberadas por células lesionadas e que recebem o nome de padrões moleculares associados ao dano (DAMPs, do inglês, damage-associated molecular patterns). Diferentes tipos de PAMPs são encontrados em diferentes microrganismos. Por exem- plo, o DNA bacteriano apresenta grande quantidade de dinucleotídeos citosina-guanina (CpG), enquanto alguns vírus possuem genoma composto por RNA dupla fita. Essas características diferem do genoma eucariótico e podem ser identificadas pelo sistema imune iniciando a inflamação. Outros exemplos de PAMPs são mostrados na Tabela 1. Tabela 1 – Exemplos de padrões moleculares associados aos patógenos PAMPS Ácidos nucleicos ssRNA Vírus dsRNA Vírus CpG Vírus e bactérias Proteínas Pilina Bactérias Flagelina Bactérias Lipídeos da parede celular LPS Bactérias Gram-negativa Ácido lipoteicoico Bactérias Gram-positiva Carboidratos Manana Fungos, bactérias Glucanas Fungos Fonte: Adaptado de ABBAS, 2019 8 9 Os DAMPs são produzidos em razão de lesões teciduais causadas tanto por microrganismos patogênicos quanto por agressões estéreis provocadas por quei- maduras, traumatismos ou toxinas. Células em processo de apoptose geralmente não liberam DAMPs. Entretanto, algumas dessas células produzem um subtipo de DAMPs chamadas de alarminas, as quais sinalizam ao sistema imune que algo está provocando a morte celular. Veja alguns exemplos de DAMPs na Tabela 2. Tabela 2 – Exemplos de padrões moleculares associados ao dano DAMPS Proteínas induzidas pelo estresse HSPs Cristais Urato monossódico Matriz extracelular proteoliticamente clivada Peptídeos de proteoglicanas Mitocôndria e componentes mitocondriais Peptídeos formilados e ATP Proteínas nucleares HMGB1, histonas Fonte: Adaptado de ABBAS, 2019 Receptores de Reconhecimento Os PAMPs e DAMPs são reconhecidos pelo sistema imune inato através de recep- tores de reconhecimento de padrão. Esses receptores estão presentes em diferentes tipos celulares e em moléculas solúveis circulantes no sangue. Eles são expressos por neutrófilos, macrófagos, células dendríticas, mastócitos, células epiteliais de mucosas, dentre várias outras. Quando esses receptores encontram os PAMPs e DAMPs, ocorre a ativação de várias respostas celulares, incluindo funções antimicrobianas e pró-inflamatórias. Vejamos quais são as principais características dos receptores de reconhecimento de padrão. Os principais receptores envolvidos no reconhecimento de padrões são os recep- tores do tipo Toll (TLRs, do inglês, Toll- -like receptors). Os TLRs são glicoproteí- nas de membrana que estão presentes em diversos tipos celulares responsáveis pelo reconhecimento de PAMPs e DAMPs. Al- guns TLRs estão localizados na membrana celular e conseguem se ligar aos invasores extracelulares. Outros TLRs são encontra- dos no interior da célula, em endossomos, o que permite a identificação de patógenos intracelulares, tais como vírus (Figura 1). Adicionalmente aos TLRs, que identifi- cam microrganismos no meio extracelular e nos endossomos, o sistema imune possui receptores capazes de detectar sinais de in- fecção ou dano celular presentes no citosol. Figura 1 – Estrutura, localização e especifi cidades de TLRs de mamíferos Fonte: ABBAS, 2019, p. 63 9 UNIDADE Imunidade Inata e Imunidade Adquirida Esses receptores são divididos em três classes: receptores tipo NOD, receptores tipo RIG e sensores de DNA citosólico. Os receptores tipo NOD (NLR do inglês, NOD-like receptors) formam uma famí- lia diversa com várias proteínas capazes de reconhecer PAMPs ou DAMPs presentes no citoplasma. Receptores NOD ativam vias complexas de sinalização que promo- vem a inflamação. Os receptores tipo RIG (do inglês, retinoic acid inducile gene) reconhecem o RNA viral, o qual é diferente do RNA de eucariotos, possibilitando a identificação. Após se ligarem a esses agentes, os receptores RIG iniciam a resposta antiviral e a síntese de interferons. O genoma bacteriano presente no citosol é detectado por sensores de DNA cito- sólico (CDSs). Essas moléculas ativam as respostas antimicrobianas através da pro- dução de interferon do tipo I e autofagia. Outro tipo de molécula presente no citoplasma são os inflamassomos. Os infla- massomos são complexos proteicos que se formam em resposta à ligação com PAMPs ou DAMPs gerando formas ativas de interleucina (IL)- 1β e IL-18, as quais são citocinas inflamatórias. Moléculas Efetoras Solúveis de Imunidade Inata Além dos receptores encontrados nas células, existem outras moléculas solúveis capazes de reconhecer PAMPs. Essas moléculas são proteínas que circulam na cor- rente sanguínea e no líquido intersticial (localizado entre as células). Elas atuam na defesa inicial do organismo de duas formas: ligando-se aos agentes invasores, o que intensifica a fagocitose pelos neutrófilos e macrófagos; e atraindo maior número de fagócitos para os locais de infecção. As principais moléculas efetoras solúveis corres- pondem ao sistema complemento, as pentraxinas, as colectinas e as ficolinas. O sistema complemento corresponde a um dos principais mecanismos da res- posta imune inata. Ele é composto por várias proteínas encontradas no sangue, as quais promovem a marcação dos antígenos, o recrutamento de fagócitos e, em alguns casos, a destruição direta dos invasores. O sistema complemento pode ser ativado por três vias distintas, todas levando à produção de C3a, que induz à infla- mação (Figura 2). Uma dessas vias de ativação, conhecida como via clássica, ocorre pela simples exposição ao agente invasor. Outra possibilidade é a ativação pela via alternativa. A terceira forma de ativação do sistema complementorefere-se à via da lectina. O resultado final de qualquer uma dessas vias é a destruição direta dos microrganismos, ou a preparação desses antígenos para que sejam capturados e destruídos pelos fagócitos. 10 11 Figura 2 – Vias de ativação do sistema complemento Fonte: ABBAS, 2019, p. 79 Pentraxinas Outro grupo de proteínas plasmáticas que se ligam às estruturas de fungos e bac- térias são as pentraxinas. Entre os membros dessa família está a proteína C reativa (CRP, do inglês C-reactive protein). Em indivíduos saudáveis, os níveis de CRP são baixos. Entretanto, na presença de infecção ou processo inflamatório, esses níveis podem atingir mais de mil vezes os valores de referência. A CRP é conhecida como reagente de fase aguda, pois é produzida no processo de inflamação aguda. Colectinas e Ficolinas As colectinas correspondem à outra classe de proteínas solúveis que atuam no sistema imune inato. Três membros são descritos nessa família: lectina ligante de manose (MBL) e as proteínas surfactantes pulmonares SP-A e SP-D. Conforme mostrado na Figura 2, a MBL atua como via de ativação do sistema complemento intensificando o processo de fagocitose dos patógenos. As ficolinas possuem estru- tura semelhantes às colectinas. Essas proteínas plasmáticas reconhecem e se ligam a componentes da parede celular de várias espécies bacterianas, levando à ativação do sistema complemento. Entenda como funciona o sistema complemento: https://youtu.be/BSypUV6QUNw Processo Inflamatório Após a invasão microbiana, os leucócitos circulantes no sangue são as primeiras células a serem recrutadas para o local de inflamação. Em seguida, os monóci- tos saem da corrente sanguínea em direção aos tecidos, onde se transformam em macrófagos. Os macrófagos produzem citocinas, como o fator de necrose tumoral α (TNF, de tumoral necrosis fator–α), que induzem o fígado a produzir as proteínas 11 UNIDADE Imunidade Inata e Imunidade Adquirida de fase aguda. Essas proteínas ativam a proteína C reativa e a lectina, entre outras, produzindo respostas locais e sistêmicas. Para que as células e proteínas do sistema imune cheguem até o tecido lesado, é preciso que ocorram algumas alterações reversíveis nos vasos sanguíneos. Essas mo- dificações incluem: o alargamento dos vasos sanguíneos (vasodilatação), o aumento da aderência dos leucócitos à parede dos vasos e o aumento da permeabilidade de fluidos e proteínas plasmáticas. Tais alterações são provocadas por citocinas e outros mediadores, as quais são descritas na Tabela 3. Essas substâncias são produzidas por diferentes células do sistema imune que residem no tecido, chamadas células sentine- las, e são liberadas em resposta à presença de PAMPs e DAMPs. Tabela 3 – Citocinas da imunidade inata Citocina Principal fonte celular Principais alvos celulares e efeitos biológicos Fator de necrose tumoral (TNF) Macrófagos, células T Células endoteliais: ativação (inflamação, coagulação) Neutrófilos: ativação Hipotálamo: febre Músculo, tecido adiposo: catabolismo (caquexia) Muitos tipos celulares: apoptose Interleucina 1 (IL-1) Macrófagos, células endoteliais, células T, fibro-blastos, plaquetas Células endoteliais: ativação (inflamação, coagulação) Hipotálamo: febre Fígado: síntese de proteínas de fase aguda Células T: diferenciação de Th17 Quimiocinas Macrófagos, células endoteliais, células T, fibro-blastos, plaquetas Leucócitos: quimiotaxia, ativação, migração para os tecidos IL-12 Macrófagos, DCs Células T: diferenciação de Th1 Células NK e células T: síntese de IFN-γ, atividade citotóxica aumentada Interferons do tipo I (IFN-α, IFN-β) IFN-α:macrófagos, DCs plasmacitoides Todas as células: estado antiviral, expressão aumentada de MHC de classe I IFN-β: fibroblastos Células NK: ativação IL-10 Macrófagos, células T (principalmente, células T reguladoras) Macrófagos, DCs: inibição da expressão de IL-12, coestimuladores e moléculas de MHC classe II IL-6 Macrófagos, células endoteliais, células T Fígado: síntese de proteínas de fase aguda Células B: proliferação de células produtoras de anticorpo Células T: diferenciação de Th17 IL-15 Macrófagos, outras Células NK: proliferação Células T: proliferação (células CD8+ de memória) IL-18 Macrófagos Células NK e células T: síntese de IFN-γ IL-23 Macrófagos, DCs Células T: manutenção de células T produtoras de IL-17 IL-27 Macrófagos, DCs Células T: diferenciação Th1; inibição de células Th17 Células NK: síntese de IFN-γ Fonte: Adaptado de ABBAS, 2019 12 13 Na inflamação aguda, o processo inicia-se rapidamente, dentro de alguns minutos ou horas, e pode durar alguns dias. Um exemplo disso é a formação de um abcesso causado por Staphylococcus aureus. A inflamação crônica, por outro lado, ocorre de forma prolongada, porém com menor intensidade. Como exemplo podemos citar a tuberculose, causada pela bactéria M. tuberculosis. A inflamação crônica poderá ser mediada também pelo sistema imune adaptativo, uma vez que células T liberam potentes citocinas indutoras da inflamação. Para um melhor entendimento, vamos dividir o processo inflamatório em três etapas: a) vasodilatação e aumento da permeabilidade, b) migração de fagócitos e c) reparo tecidual. Vasodilatação e Aumento da Permeabilidade Vascular A vasodilatação promove um aumento do volume de sangue no local afetado levando ao surgimento de eritema (vermelhidão). O aumento da permeabilidade pos- sibilita que fluidos e proteínas plasmáticas passem da corrente sanguínea para o tecido, resultando no edema (acúmulo de fluido). A principal substância responsável por esses processos é a histamina, liberada sobretudo por mastócitos e basófilos. Outras moléculas que quando ativadas causam vasodilatação e aumento da permeabilidade vascular são as cininas. Além disso, elas ajudam a atrair os neutrófilos ao sítio de inflamação, efeito chamado de quimiotaxia. O efeito das cininas é intensificado pela ação das prostaglandinas e dos leuco- trienos. As prostaglandinas são liberadas pelas células danificadas e facilitam a aderência de leucócitos à parede dos vasos sanguíneos. Os leucotrienos são produ- zidos por mastócitos e basófilos. Além de aumentar a permeabilidade dos vasos, eles atraem os fagócitos e intensificam a fagocitose. Migração de fagócitos Após a etapa inicial, os fagócitos iniciam o processo de adesão à superfície interna do vaso sanguíneo (marginação). Em seguida, os fagócitos iniciam a migração para o sítio da lesão através de movimentos ameboides, processo denominado diapedese. A partir disso, inicia-se a fagocitose dos microrganismos invasores (Figura 3). A pre- sença constante de leucócitos nas áreas afetadas é garantida através da produção de novas células pela medula óssea vermelha. Após granulócitos e macrófagos terem ingerido a maior parte do tecido danifica- do e dos microrganismos, eles morrem. Como consequência desse processo, ocorre a formação de pus. 13 UNIDADE Imunidade Inata e Imunidade Adquirida Figura 3 – Fagocitose e destruição intracelular de microrganismos Fonte: ABBAS, 2019, p. 87 Reparo Tecidual O último estágio da inflamação corresponde ao reparo final. Nesse processo, as células mortas ou danificadas são substituídas por outras. A capacidade de reparo depende do tipo de tecido lesionado. Por exemplo, a pele possui maior capacidade de regeneração do que o músculo cardíaco. Em alguns casos, o reparo tecidual na inflamação crônica pode provocar danos importantes aos tecidos. Isso porque as citocinas liberadas pelos macrófagos ativados induzem à produção de fibras colágenas, as quais se agrupam formando uma cicatriz (fibrose). Dependendo da extensão de fibrose, poderá ocorrer alteração na função do órgão, já que o tecido fibroso não é funcional. Antígenos e Anticorpos Como discutimos anteriormente, a imunidade inata proporciona uma resposta rápida e sempre pronta para agir contra diferentes tipos de invasores ou substâncias estranhas ao organismo.Por outro lado, a resposta imune adaptativa é induzida por um agente específico e responde com maior intensidade, conforme ocorrem exposições repetidas ao mesmo antígeno (componente do microrganismo invasor). Os principais “atores” da imunidade adaptativa são os linfócitos e os anticorpos. 14 15 Vamos relembrar o que são anticorpos? Anticorpos são proteínas secretadas por linfócitos B e altamente específicas no reconhecimento de antígenos. Existem duas formas de anticorpos: aqueles que atuam como receptores antigênicos ligados à membrana de linfócitos B, e os anticorpos produzidos contra microrganismos. As moléculas de anticorpos, também chamadas de imunoglobulinas, apresen- tam forma de Y. Todas elas compartilham características comuns em sua estrutura básica, porém são amplamente variáveis nas porções que se ligam aos antígenos. As imunoglobulinas apresentam duas cadeias pesadas e duas cadeias leves. A por- ção do anticorpo envolvida na ligação ao antígeno é a região Fab, enquanto a região envolvida nas funções efetoras é a região Fc (Figura 4). Figura 4 – Estrutura de uma molécula de anticorpo Fonte: ABBAS, 2019, p. 100 As imunoglobulinas são divididas em classes e subclasses de acordo com a estru- tura e as diferenças antigênicas que apresentam em suas cadeias pesadas. As classes IgM, IgG e IgA são os principais tipos de imunoglobulinas produzidas, enquanto IgD e IgE representam menos de 1% da quantidade total de imunoglobulinas produzidas. A Tabela 4 apresenta as classes das imunoglobulinas, a localização e suas funções. Tabela 4 – Classe, localização e funções das imunoglobulinas Classe de Anticorpo Localização Funções IgA Lágrimas, saliva, muco, leite, intestino, sangue e linfa Imunidade de mucosa IgD Superfície das células B Receptor antigênico da célula B. Atua como iniciador da resposta imune IgE Ligada a mastócitos e basófilos Defesa contra parasitas helmínticos, reações alérgicas IgG Sangue, linfa e intestino Intensifica a fagocitose, neutraliza toxinas e vírus, protege o feto e o recém-nascido IgM Sangue, linfa, superfície das células B Primeiros anticorpos produzidos em resposta à infecção inicial Fonte: Adaptado de TORTORA, 2017 15 UNIDADE Imunidade Inata e Imunidade Adquirida Numa segunda exposição ao mesmo antígeno, a resposta imune mediada por anticorpos é mais intensa em razão da memória imunológica. Alguns linfócitos B se transformam em plasmócitos, enquanto outros tornam-se células de memória de vida longa. Anos mais tarde, se as células B de memórias forem ativadas pelo antíge- no específico, elas podem induzir à produção de plasmócitos rapidamente. A quantidade de anticorpos circulantes (título de anticorpos) é responsável pela intensidade da resposta imune humoral. Nos primeiros 4 a 7 dias após contato inicial com um antígeno, o indivíduo não apresenta anticorpos detectáveis no soro. Após esse período, há um aumento lento do título de anticorpos da classe IgM. Posteriormente, dentro de 10 a 17 dias, ocorre um pico de anticorpos da classe IgG, que cai gradualmente com o passar do tempo (Figura 5). Esse perfil é característico da resposta primária a um antígeno. Figura 5 – Resposta imune primária e secundária frente a um antígeno Fonte: MURRAY, 2017, p. 76 Memória imunológica, disponível em: https://bit.ly/2ZGRjAf Imunidade Humoral A imunidade humoral refere-se à resposta imune mediada por anticorpos. A pro- dução de anticorpos inicia quando as células B identificam antígenos livres e extrace- lulares. Ao se ligar em um epítopo específico, o linfócito B é ativado. Consequentemente, ocorre uma proliferação desse linfócito, efeito chamado de expansão clonal (Figura 6). Em geral, as células B necessitam de uma célula T auxi- liar (T helper). A maior parte dos antígenos encontrados em vírus, bactérias e hemá- cias são chamados de antígeno T dependente e requerem uma célula T helper para produção de anticorpos contra si. Após entrar em contato com as imunoglobulinas na superfície da célula B, o an- tígeno T dependente é processado no interior da célula e combinado ao complexo 16 17 principal de histocompatibilidade (MHC, de major histocompatibility complex). O MHC classe I identifica antígenos próprios do organismo, impedindo que o siste- ma imune gere uma resposta contra o hospedeiro. O MHC classe II é encontrado na superfície das moléculas apresentadoras de antígenos. Os antígenos processados pelo linfócito B são apresentados através das moléculas do MHC classe II. Essa exposição atrai as células T helper até as células B. A célula T helper produz citocinas que induzem à expansão clonal das células B. Alguns desses linfócitos B produzidos tornam-se plasmócitos, outros se diferenciam em células de memória, as quais são responsáveis pela resposta secundária frente a esse antígeno. Na resposta primária, a IgM é a primeira imunoglobulina gerada. Posteriormente, inicia-se a produção de IgG e diminui consideravelmente a produção de IgM. Entre- tanto, as células B também são capazes de produzir diferentes tipos de anticorpos, como IgA ou IgE. Os antígenos T independentes, como as cápsulas bacterianas, podem se ligar a vários receptores das células B. Em geral, eles provocam uma resposta mais fraca quando comparados aos antígenos T-dependentes e não induzem à produção de células de memória. A interação antígeno-anticorpo marca as células estranhas ao organismo para que possam ser destruídas pelo sistema complemento e por fagócitos. Figura 6 – Seleç ã o clonal e diferenciaç ã o de cé lulas B Fonte: TORTORA, 2017, p. 476 Imunidade Celular Os anticorpos atuam contra microrganismos que estejam circulando livremente, onde os anticorpos possam ter acesso a eles. Entretanto, os antígenos encontrados 17 UNIDADE Imunidade Inata e Imunidade Adquirida das células não são identificados por imunoglobulinas. Esses antígenos são identifi- cados por células T. A partir dessas células, os microrganismos reconhecem também as células anormais do organismo, como as células cancerosas. Da mesma forma que a célula B, as células T reconhecem um antígeno especí- fico. Porém, em sua superfície são encontrados receptores de célula T (TCRs, de T cell receptors). Após estarem maduras no timo, as células T migram para os tecidos linfoides através da corrente sanguínea, onde a probabilidade de encontrarem o an- tígeno é maior. Grande parte dos patógenos ingressa no hospedeiro através do trato gastrintesti- nal ou dos pulmões, onde encontram células epiteliais da mucosa (Figura 7). Alguns patógenos intestinais invadem o hospedeiro através das células M presentes na mu- cosa intestinal. Essas células estão situadas próximas as Placas de Peyer, um órgão linfoide secundário. As células M possuem a função de absorver antígenos e permitir que células apresentadoras de antígenos e linfócitos reconheçam os microrganismos invasores. Figura 7 – Locais de entrada de antígeno no organismo Fonte: ABBAS, 2019, p. 121 Além dos linfócitos T, outras células são associadas à resposta imune celular. Essas são as células apresentadoras de antígenos (APC, de antigen-presenting cell) e incluem as dendríticas e os macrófagos ativados. As células dendríticas são encon- tradas em locais como a pele e o trato gastrintestinal (onde recebem o nome de cé- lulas de Langherhans). Também são encontradas no baço, timo, linfonodos, sangue e vários outros tecidos. As células dendríticas presentes nesses tecidos atuam como 18 19 sentinelas. Elas capturam, transportam e apresentam os microrganismos invasores aos linfócitos T. Os macrófagos podem ser ativados por ingestão de antígenos ou por citocinas liberadas pelas células T helper. Após ativados, eles atuam de forma mais eficaz tanto na fagocitose quanto na apresentação de antígenos às células T. Após a captura do antígeno, as APC migram dos tecidos para os linfonodos ou cen- tros linfoides, onde apresentam os antígenos para as células T presentes nesses locais. Assim comovimos com as imunoglobulinas, existem diferentes classes de célu- las T. As células T helper auxiliam na produção de anticorpos e na imunidade celular. As células T helper podem se diferenciar em linfócito T citotóxico (CLT, de cytotoxic T lymphocyte), o qual provoca a destruição da célula-alvo durante o contato. Os prin- cipais tipos de células que atuam na imunidade celular e suas funções estão resumidas na Tabela 5. Outra classificação das células T refere-se a glicoproteínas presentes em sua super- fície, chamadas grupos de diferenciação (CD, do inglês clusters of differentiation). Tais moléculas são importantes na ligação aos receptores. Há dois tipos de CDs que apresentam maior interesse, o CD4+ e o CD8+. O CD4+ representa as células TH e possuem afinidade pelo MHC classe II presentes nas células B e nas APCs. Já as moléculas CD8+ correspondem às células CTL e se ligam ao MHC classe II. Para finalizar esse tópico, discutiremos a função das células natural killer (NK). Embora não sejam imunologicamente específicas, as células NK podem destruir tanto células infectadas por vírus quanto células tumorais. As células NK identificam as células alteradas das células normais. Essa diferenciação é feita através do contato com a célula alvo, onde as células NK verificam se estão sendo expressos antígenos próprios através do MHC classe I. Caso os antígenos próprios não estejam sendo expressos, as células-alvo são destruídas. No caso de algumas células tumorais que expressam poucas moléculas de MHC classe I, as células NK provocam poros em sua superfície resultando em apoptose ou lise celular. Tabela 5 – Principais células que atuam na imunidade celular Cé lula Funç ã o Cé lula T auxiliar (T Helper) Ativa cé lulas relacionadas à imunidade celular: macró fagos, cé lulas TC e cé lulas natural killer Linfó citos T citotó xicos (CTLs) Destroem cé lulas-alvo durante o contato; geradas a partir de cé lulas T citotoxicas (TC) Cé lula T reguladora (T reg) Regula a resposta imune e auxilia na manutenç ã o da autotolerâ ncia Macró fago ativado Atividade fagocitá ria intensa; ataca cé lulas tumorais cancerosas Cé lula natural killer (NK) Ataca e destró i cé lulas-alvo; participa da citotoxicidade celular dependente de anticorpo 19 UNIDADE Imunidade Inata e Imunidade Adquirida Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Vídeos Leucócitos – os defensores das células https://youtu.be/4GvOqiiyQFM Anticorpos – ajudando os Leucócitos https://youtu.be/L3gdYm2Y9Uc Leitura Imunologia – Capítulo Quatro https://bit.ly/2ZKzi42 Memória Imunológica https://bit.ly/33ydObZ 20 21 Referências ABBAS, A. K.; LICHTMAN, A. H.; PILLAI S. Imunologia celular e molecular. 9. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2019. MALE, D. et al. Imunologia, 8. Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014. MURRAY, P. R.; ROSENTHAL, K. S.; PFALLER, M. A. Microbiologia médica. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. PLAYFAIR, J. H. L. Imunologia básica: guia ilustrado de conceitos fundamentais. 9. ed. Barueri, SP: Manole, 2013. TIZARD, I. R. Imunologia Veterinária. 8.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. TORTORA, G. J.; FUNKE, B. R.; CASE, C. L. Microbiologia. 12. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. 21
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