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e-Book 1 Iara Pierro de Camargo TIPOGRAFIA E LETTERING Sumário INTRODUÇÃO ������������������������������������������������� 3 A HISTÓRIA DA ESCRITA ������������������������������� 6 BREVE HISTÓRIA DA TIPOGRAFIA (SÉCS� 15 AO 20) ������������������������������������������ 12 TIPOGRAFIA CONTEMPORÂNEA ���������������� 30 CARACTERÍSTICAS DOS TIPOS ������������������ 36 CONSIDERAÇÕES FINAIS ���������������������������� 49 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS & CONSULTADAS �������������������������������������������� 50 3 INTRODUÇÃO A tipografia é uma área que engloba tanto a pro- dução de tipos (design de tipos) quanto o design com tipos (composição tipográfica). Essa área, portanto, trata não apenas do desenho das letras, mas também da composição de textos em diversas superfícies e espaços. A tipografia é ainda uma técnica de impressão (letterpress) que, embora pouco utilizada hoje em dia, foi responsável pela popularização do material impresso, da leitura, pelo surgimento da profissão do tipógrafo e por sua especialização. Quando a impressão tipográfica foi criada, o tipógrafo era aquele que trabalhava desde o corte das punções para geração de matrizes, a fundição de tipos, a composição e a impressão. Atualmente, essas áreas são separadas e dese- nhar fontes, desenhar tipos (type design) é uma profissão bastante especializada. Todas as áreas do design gráfico necessitam de conhecimentos em tipografia, porém as que mais dependem do rigor tipográfico tendem a ser aquelas nas quais os textos são mais presentes, como design de livros, revistas e jornais (design editorial), design para portais de notícia, design de sinalização, entre outros. Os caracteres tipográficos podem ser obtidos a partir da escrita manual (caligrafia) ou de desenhos 4 (lettering). Pode haver, ainda, uma mistura dos dois processos, mas o que distingue a tipografia dessas outras formas de se obter letras é que a tipografia é um sistema para reprodução que pressupõe que todos os caracteres possuam um rigor e coerência formal. O profissional que trabalha com tipografia, o tipó- grafo pode ser tanto aquele que desenha e produz fontes digitais quanto aquele que usa as fontes, que cria projetos gráficos e diagrama (compõe textos). Antigamente, o tipógrafo era aquele que compunha páginas de texto com tipos móveis de metal ou aquele que desenhava e criava moldes para a produção dos tipos móveis. Trabalhamos hoje de forma bastante diferente em comparação ao tipógrafo de antigamente, muitos conceitos e procedimentos foram criados em meados do século 15, na época do surgimento da prensa de Gutenberg, considerado por muitos o pai da impressão tipográfica. Neste livro, iremos apresentar uma breve história da escrita para entendermos de onde veio nosso alfabeto e como ele foi mudando de aparência ao longo da história, para em seguida apresentar um breve panorama histórico da tipografia desde seu surgimento, no século 15, até o 20. Também vamos falar brevemente da tipografia contemporânea, da 5 tipografia digital, para compreendermos nosso lugar na história hoje, para em seguida apresen- tar as características dos caracteres: anatomia e proporções. Bons estudos! 6 A HISTÓRIA DA ESCRITA A escrita é uma das mais importantes invenções humanas. Antes da criação dos sistemas de escrita, o conhecimento era comunicado de forma oral. Os primeiros sistemas de escrita eram baseados em desenhos (pictogramas) e não em letras, como o sumério (cuneiforme) e o egípcio (hieróglifos). Esses sistemas, segundo Kate Clair (2009, p. 14), podiam representar “pessoas, lugares e coisas”, mas eram ineficazes para comunicar ideias abstratas. O primeiro sistema baseado em letras foi o fenício. Em vez de imagens para representar coisas, foram criadas letras para representar sons específicos. Figura 1: Alfabeto fenício. Inscrição do séc. 4 a.C. Fonte: RomanDeckert/Wikimedia. 7 Segundo John Kane (2012, p. 16): Antes dos povos fenícios (povo mercantil navegante que vivia onde hoje é o Líbano) desenvolverem um alfabeto por volta de 1.500 a.C., a linguagem escrita retratava palavras inteiras de uma vez só. A figura de um touro significava um touro, independentemente de sua pronúncia. Ser capaz de escrever – isto é, de documentar a fala – significava conhecer os milhares de sinais que representavam todas as coisas no mundo conhecido. Ao desenvolver um sistema dependente do som (“ah”) e não do objeto (touro) ou conceito (amor), os fenícios conseguiram capturar a linguagem por meio de vinte sinais, em vez de centenas ou milhares. Outras formas de escrita – cuneiforme, hieroglífica – foram praticadas durante vários milênios antes dos fenícios desenvolverem seu conjunto de sinais. Os povos gregos e etruscos tomaram conhecimento do alfabeto fenício e o adaptaram para seu uso. O alfabeto latino que usamos hoje é derivado do romano, que por sua vez deriva do alfabeto grego. Os romanos elaboraram um alfabeto de 21 letras. As letras com serifa que conhecemos hoje foram criadas pelos romanos. As serifas, pequenas terminações na base e no topo de letras, são de- correntes do movimento do calígrafo ao escrever com pincel ou pena. 8 Figura 2: Alfabeto etrusco. Fonte: Foto de Roger Ulrich por Flickr. Kate Clair apresenta como exemplo de letras com serifas as inscrições feitas na coluna de Trajano, em Roma: Um belo exemplo da estrutura e força das letras romanas, compostas somente de capitais ou maiúsculas, é a inscrição na base da Coluna de Trajano em Roma, gravada por volta de 114 d.C. Esta inscrição é considerada o mais belo exemplo existente das letras gravadas a cinzel. Ela mostra a introdução das serifas (extensões horizontais na extremidade do traço de uma letra), que não eram vistas em exemplos anteriores. (CLAIR, 2009, p. 33). https://www.flickr.com/photos/roger_ulrich/4121632733 9 A fonte Trajan, desenvolvida para a Adobe por Carol Twombly e Robert Slimbach, é baseada nos desenhos das letras lapidadas na coluna de Trajano, em Roma. Como na época o alfabeto era composto apenas de letras maiúsculas, a fonte possui apenas letras maiúsculas e versaletes. A última versão dessa fonte distribuída pela Adobe possui variações com e sem serifa. As letras do nosso alfabeto possuem duas dife- rentes representações: maiúsculas e minúsculas. Por exemplo, o som da letra A se escreve “A” e “a”. No início não havia duas representações para uma letra, como temos hoje. No século 2 d.C., tínhamos apenas letras maiúsculas e demorou alguns sécu- los até o surgimento das primeiras minúsculas. As letras maiúsculas romanas, quadradas e as rústicas, eram destinadas à escrita de documentos importantes e religiosos, enquanto, segundo John Kane, para outros fins, por volta do século 4 d.C. era utilizado um estilo de escrita chamado cursivo, mais dinâmico e usado em situações corriqueiras: “Transações cotidianas, no entanto, eram geralmente escritas com letras cursivas, as quais possuíam formas simplificadas para favorecer a velocidade de escrita”. (KANE, 2012, p. 18). FIQUE ATENTO 10 Um outro tipo de escrita que influenciou nosso alfabeto foi o uncial (sec. 4). Esse alfabeto pos- suía letras mais arredondadas e misturava letras maiúsculas e outras com desenho que remete a minúsculas como, por exemplo a letra “a” e “p” com descendente. Com base nas unciais, surgem as semiunciais, escrita que trouxe mais letras minúsculas. O alfabeto carolíngio é o do qual deriva nossas letras. Ele surgiu no final do séc. 8, durante o Império de Carlos Magno. Segundo John Kane (2012, p. 19): Carlos Magno, primeiro unificador da Europa desde os romanos, determinou em 789 que todos os textos eclesiásticos fossem padronizados. Tal tarefa foi incumbida a Alcuíno de York, abade de São Martinho de Tours de 796 a 804, e sob sua supervisão um grande número de monges reescreveu praticamente todos os textos eclesiásticos e, posteriormente, textos seculares que existiam.Seu estilo – que incluía maiúsculas (caixa-alta) e minúsculas (cai- xa-baixa) – fixou um padrão da caligrafia durante um século, inclusive o uso de capitulares e sinais de pontuação. A escrita carolíngia se espalhou rapidamente por toda a Europa, com exceção de algumas regiões, 11 como parte da França e da Alemanha, nas quais se usava a escrita gótica. A escrita gótica do tipo textura foi utilizada como base para a confecção da primeira fonte tipográfica ocidental, aquela utilizada para imprimir a Bíblia de 42 linhas, enquanto a carolíngia e as maiúsculas romanas foram utilizadas para imprimir livros na região da Itália e passaram a ser adotadas, majo- ritariamente, em toda Europa. Quando escrevemos de forma cursiva, isto é, de forma caligráfica, em traços contínuos em letras minúsculas, escrevemos de forma mais rápida do que escrevendo letra a letra palavras com letras maiúsculas. Desse modo, dá para entender como o surgimento das letras minús- culas foi tão importante. Além disso, letras minúsculas são mais legíveis, pois são mais fáceis de identificar do que as maiúsculas. Leia o verbete sobre tipos romanos escrito por Paulo Nunes Heitlinger em seu portal www.tipografos.net. Disponível em: http://tipografos.net/tipos/letra-dos-ro- manos-1.html REFLITA SAIBA MAIS about:blank about:blank about:blank 12 BREVE HISTÓRIA DA TIPOGRAFIA (SÉCS. 15 AO 20) Figura 3: Gaveta de tipos de metal e texto composto em um componedor. Fonte: Willi Heidelbach/Wikimedia. Em meados do século 15, Johannes Gutenberg, da cidade de Mainz, hoje Alemanha, criou a técnica da impressão tipográfica. Gutenberg adaptou algumas técnicas e materiais já existentes, como a gravura em relevo (xilogravura), prensa de vinhos, papel, e buscou obter tinta com a viscosidade ideal para criar moldes para fundir letras (tipos) individuais em metal. 13 Antes do surgimento da impressão tipográfica, os livros eram todos copiados à mão pelos monges “copistas”. O romance O nome da rosa, de Umberto Eco, adaptado para o cinema, traz uma trama que envolve monges copistas. O texto e a versão cinematográfica ilustram um pouco da Idade Média e desse ofício. O pesquisador Wilson Martins (1996, p. 133) explica que o invento da impressão tipográfica é baseado nas pranchas de impressão xilográficas, o que faz sentido, já que ambas são em relevo. Gutenberg, em vez de criar pranchas, utilizou letras individuais de metal produzidas a partir de matrizes (moldes) de metal. Essa técnica de se trabalhar com as letras in- dividuais, com tipos móveis, não é invenção de Gutenberg. Na China e na Coreia já haviam sido feitos experimentos com essa técnica, mas para as línguas orientais era pouco prático, pois elas possuem uma enorme quantidade de ideogramas, em comparação com a nossa escrita alfabética de 26 letras. O processo para a obtenção de letras em tipos móveis de metal ocorre da seguinte maneira: são esculpidas letras em um pedaço de metal (pun- ção) – o profissional que fazia isso era chamado SAIBA MAIS 14 de cortador de punções. A punção era então batida em uma chapa de metal da qual se extrai uma matriz. A matriz é posicionada em um molde para em seguida se colocar metal derretido para fundir o tipo. Observe a punção, a matriz e o tipo na ilustração abaixo. Figura 4: Punção, matriz e tipo. Fonte: Wikimedia. Gutenberg, assim, com sua nova técnica, entre 1450 e 1455 imprimiu o primeiro livro ocidental: a famosa Bíblia de 42 linhas contendo 1.282 páginas, nas dimensões de 30,5 x 40,5 cm. 15 Acredita-se que Gutenberg tenha procurado projetar a Bíblia de modo a se parecer com um manuscrito copiado manualmente: A famosa Bíblia de Gutenberg baseou-se no manus- crito. Emulando a densa e escura escrita manual conhecida como letra gótica, ele reproduziu sua textura errática criando variações de cada letra, bem como inúmeras ligaturas (caracteres que com- binam duas ou mais letras em uma única forma). (LUPTON, 2013, p. 9). Figura 5: Página da Bíblia de 42 linhas. Fonte: jmwk/Wikimedia. 16 Apesar de a Bíblia ter sido impressa com letras baseadas na caligrafia gótica, o estilo caligráfico que realmente influenciou a impressão tipográfica foi o utilizado pelo tipógrafo francês Nicolas Jenson (1420–1480), em Veneza, que trabalhou com um estilo baseado nas letras maiúsculas romanas e nas minúsculas carolíngias em 1476. Os caracteres tipográficos elaborados por Jenson influenciaram muitos dos impressores e tipógra- fos da época e muitas fontes, inclusive várias que usamos hoje em dia, como a Centaur de Bruce Rogers, baseiam-se nesses caracteres. É importante notar que Gutenberg inventou a técnica, porém a linguagem e o estilo tipográfico passam a se desenvolver mais na região do que seria posteriormente a Itália, por Jenson e em seguida Aldo Manuzio. Figura 6: Texto composto com as letras de Janson. Fonte: Atalanta/Wikimedia. 17 A nomenclatura caixa baixa para minúsculas e caixa alta para maiúsculas vem da tradição da composição por tipos móveis em que o impressor armazenava os tipos maiúsculos na gaveta superior e os minúsculos na inferior. Aldo Manuzio (1449-1515) foi um grande editor e impressor, responsável pela “popularização” dos livros impressos no final do século 15 e início do 16. Manuzio criou livros portáteis com margens menores do que os grandes livros como a Bíblia de Gutenberg, com tipos mais leves e legíveis. Manuzio encomendou a seu tipógrafo Francesco Griffo (1450-1518) a criação de caracteres cursivos para a impressão tipográfica, que conhecemos pelo nome de itálico atualmente. Quando foram criados, o intuito era sua utilização para compor textos inteiros, e não para destacar palavras ou trechos como os utilizamos hoje. FIQUE ATENTOFIQUE ATENTOFIQUE ATENTOFIQUE ATENTO 18 Figura 7: Le epistole di Santa Caterina, impresso em Vene- za por Aldo Manuzio em 1500. Fonte: Wladimiro Bedin/Wikimedia. O estilo tipográfico criado por Jenson e Manuzio pas- sou a ser difundido pela Europa e a ser incorporado na França, que antes usava letras góticas e pesadas. O francês Claude Garamond (1480-1561), segundo Kate Clair, trouxe caracteres mais refinados e menos caligráficos do que os de seus antecessores: Suas letras deixaram de imitar as formas tradicionais das letras feitas manualmente e tomaram a direção das formas refinadas, acuradas e consistentes que o metal possibilitava. Suas letras romanas foram apresentadas em Paris por volta de 1530. (CLAIR, 2009, p. 64). 19 Garamond foi também um dos primeiros profis- sionais dedicados exclusivamente ao design de tipos, cortando punções, criando matrizes. Seus desenhos inspiraram diversas versões de fontes. Figura 8: Página impressa por Robert Estienne com tipos de Claude Garamond. Fonte: Arminiuzz/Wikimedia. A Adobe Garamond é uma das versões digitais da Garamond desenvolvida pelo designer de tipos Robert Slimbach e pode ser utilizada por assinantes da Creative Cloud, da Adobe. Acesse em: http://fonts.adobe.com/ fonts/adobe-garamond#fonts-section. O desenho dos caracteres até o final do século 17 era bastante baseado na escrita manual, os tipos eram baseados em letras feitas à mão com traços contínuos. SAIBA MAIS http://fonts.adobe.com/fonts/adobe-garamond#fonts-section http://fonts.adobe.com/fonts/adobe-garamond#fonts-section 20 No fim do século 17, em 1692, por encomenda do rei Luís 14, foram desenvolvidos caracteres na Academia Francesa de Ciências por Phillippe Grandjean (1666-1714), baseados em fórmulas geométricas e feitos com régua e compasso, ou seja, tipos baseados em estruturas e não mais no traço manual, conhecidas pelo nome de Roman du Roi. Segundo Kate Clair: Uma comissão de eruditos e matemáticos desen- volveu uma detalhada teoria de design que tinha como estrutura uma malha de 2.304 quadrados. Em 1702 Philippe Grandjean, o puncionador real, talhou uma face de tipos denominada Roman du Roi (romana do rei) mantendo as proporçõesgeométricas estabelecidas pela academia. Esta foi a primeira face tipográfica que se registrou fundamentada em precisa análise e consistência matemática, comparada com os enfoques artísti- cos usados anteriormente pelos calígrafos. O tipo exagerava a diferença do peso entre a haste e os traços finos, reduzia a ligação da serifa com a letra e criava serifas finas, horizontais, com terminações retas. O tipo estava reservado para uso exclusivo da casa impressora real da França e qualquer outro uso era considerado crime. (CLAIR, 2009, p. 71). 21 Figura 9: Roman du Roi, 1700. Fonte: De Rochefort/Wikimedia. As imagens acima mostram como as letras podem ser desenhadas usando como parâmetro a mate- mática ao invés do olho e do gesto do calígrafo. O inglês John Baskerville (1707-1775), em meados do século 18, desenvolveu uma tipografia que também se distanciava da caligrafia, porém ela era menos sistemática e matematicamente mais rigorosa do que a Roman du Roi. Baskerville foi um grande tipógrafo e impressor, preocupando-se com todo o processo. Além de criar formas tipográficas leves e legíveis, procurou desenvolver um papel mais liso e adequado para a delicadeza de seus tipos, que possuíam mais con- traste entre traços finos e grossos do que outros 22 tipos feitos anteriormente. Baskerville também criava layouts arejados, com bastante espaço em branco e com letras bem espacejadas, como podemos notar nas imagens abaixo: Figura 10: Página de rosto da Bíblia de 1763 e página de rosto das obras de Virgílio. Fonte: John Baskerville e Catsmeat/Wikimedia. O trabalho de Baskerville foi bastante difundido na Europa e inspirou o estilo de outros tipógrafos no final do século 19, como Firmin Didot (1764-1836) na França e Giambattista Bodoni (1740-1813) na Itália. Notem como os tipos possuem bastante variação entre traços grossos e finos. 23 Os tipos criados pelos dois é bastante parecido, pois ambos desenvolveram uma serifa ultrafina e que não possuía apoios nas hastes. Os tipos dos dois tipógrafos são muito bonitos, mas esse estilo foi mal utilizado por muitos impressores de livros da época, pois sem o devido cuidado o texto pode ser difícil de ler devido ao grande contraste das letras. Figura 11: Código Civil Francês impresso por Firmin Didot em 1804 e Aminta de Torquato Tasso impressa com tipos de Bodoni. Fonte: Wikimedia. A maior preocupação dos tipógrafos e impressores até o final do século 18 e início do século 19 era o de criar melhores tipos e aprimorar as técnicas para 24 a impressão de livros. A atividade, era, até o fim do século 18, uma técnica de impressão artesanal. A tipografia deixa de ser artesanal e passa a ganhar aspectos industriais no século 19, quando surgem as primeiras prensas mecânicas, as primeiras pren- sas rotativas, o processo de estereotipia (moldes com páginas inteiras compostas) e especialmente as máquinas de composição mecânicas, como linotipo e monotipo. As máquinas de composição a quente, como a linotipo e a monotipo, revolucionaram a forma de compor páginas por serem máquinas que fun- diam tipos, ou na sequência e individuais, como a monotipo, ou em linhas inteiras, como na linotipo. Procure assistir ao documentário sobre a linotipo (Lino- type), ele apresenta uma boa introdução ao processo de composição com máquinas e sobre a mudança do processo de composição em metal para a composição fotográfica (fotocomposição). Assista ao trailer nesse link: https://www.youtube.com/watch?v=avDuKuBNuCk. Além da criação de novas tecnologias, com a Revo- lução Industrial veio a criação de tipos adequados às mais novas necessidades de comunicação da época: os cartazes de publicidade. Assim, no SAIBA MAIS 25 século 19 surgiu uma enorme variedade de tipos excêntricos e decorativos para uso em anúncios e cartazes. O desenvolvimento desse estilo de letras só foi possível com o surgimento de tecnologias como o pantógrafo, que facilitou a produção de grandes tipos detalhados de madeira, e a litografia, que permitia a impressão de letras desenhadas. Esse material publicitário da época, como o da imagem abaixo, apresentava uma mistura de di- versas fontes de estilos diferentes em tamanhos grandes, muitas vezes completando toda a largura da página. O estilo carregado é conhecido pelo nome de estilo vitoriano, em homenagem à rainha Vitória da Inglaterra. No final do século 19 e início do século 20, o estilo rebuscado da era vitoriana, somado à baixa quali- dade de produção e da impressão do fim do século, que se preocupava mais com a quantidade do que a qualidade, fez surgir movimentos de contestação e retomada de procedimentos artesanais para a boa produção tipográfica, como foi o Movimento das Artes e Ofícios (Arts and Crafts) e o Movimento da Imprensa Particular (Private Press Movement). 26 Figura 12: Anúncio da segunda metade do século 19. Fonte: I. Evening/Wikimedia. Recentemente, tem-se visto muitas iniciativas para resgatar o processo de impressão tipográfica no Brasil, como, por exemplo, A Oficina Tipográfica São Paulo, que promove cursos, a editora Quelônio, que imprime seus livros utilizando uma máquina de composição linotipo e tipos móveis, A tipografia do Zé (MG), que também produz livros e cartazes entre outras iniciativas. É importante lembrar que prensas tipográficas ainda são usadas na indústria gráfica para acabamentos especiais, como alto e baixo relevo e para corte especial. SAIBA MAIS 27 No início do século 20, surgem diversas associa- ções profissionais e escolas de artes, e em 1919 é fundada a Bauhaus, escola responsável pela renovação da estética tipográfica baseada na lim- peza, neutralidade, racionalidade e simplicidade. Na Bauhaus passou-se a adotar o uso de fontes sem serifa em vez de fontes serifadas. Essa abor- dagem se espalhou pela Europa. Nas primeiras décadas do século 20 foram criadas algumas das mais conhecidas fontes sem serifa da história, como Futura (criada por Paul Renner em 1927) e Gill Sans (finalizada por Eric Gill em 1930). Com o fechamento da Bauhaus, em 1933, muitos de seus professores e ex-alunos precisaram imigrar para os Estados Unidos, tornando o estilo muito difundido por lá também. Após a Segunda Guerra e com a retomada econômica na Alemanha, outra escola de design bastante influente foi criada, a Hochschule für Gestaltung Ulm (1953-68). Nessa escola, retomou-se alguns dos princípios da Bauhaus e, novamente, o uso racional da tipografia passou a ser dominante na Europa. Na Suíça, surgiu o movimento que conhecemos por Estilo Tipográfico Internacional, que defendia o uso de tipos sem serifa, como Helvetica, criada por Max Miedinger em 1957, e Univers, criada por Adrian Frutiger em 1957. Também era quase obrigatório 28 o uso de grids (diagramas), como o apresentado por Josef Müller-Brockmann no livro abaixo. Figura 13: Capa do livro Grid Systems de Josef Müller-Bro- ckmann em que foi utilizada a fonte Helvetica. Fonte: Josef Müller-Brockmann/Wikimedia. O livro Sistemas de grelhas: um manual para designers gráficos de Josef Müller-Brockmann foi publicado em SAIBA MAIS 29 língua portuguesa e fornece um rico manual de como projetar e trabalhar com grids, seguindo-se a linha dos designers modernistas suíços. No final da década de 1960, alguns designers pas- saram a se rebelar contra a rigidez e a neutralidade do estilo internacional e o uso extensivo de fontes sem serifa, pois acreditavam que aquela linguagem era muito rígida e monótona. A crítica ao design moderno e ao estilo internacional deu origem ao design pós-moderno e design contemporâneo. Procure assistir ao documentário Helvetica, de Gary Hustwit, que mostra de forma bastante ampla o mo- dernismo no design gráfico e o surgimento da fonte Helvetica, seu sucesso comercial e a crítica e rejeição dos designers contemporâneos. Assista ao trailer aqui: https://www.youtube.com/ watch?v=X80kSDxF4rg. SAIBA MAIS https://www.youtube.com/watch?v=X80kSDxF4rghttps://www.youtube.com/watch?v=X80kSDxF4rg 30 TIPOGRAFIA CONTEMPORÂNEA A composição tipográfica em metal, tanto feita com tipos móveis quanto feita com linhas de tipos de metal, é inflexível, ou seja, é um pouco difícil de fugir do layout “quadradinho” e retinho, pois todas as peças precisam ter um encaixe perfeito para a impressão ser bem-feita. Apesar dessas restrições técnicas, isso não impediu que alguns artistas de vanguardas artísticas, como o futuris- mo e o dadaísmo, experimentassem composições irregulares. Estas provavelmente inspiraram outros experimentos que vieram a seguir, com o surgi- mento de formas de composição mais flexíveis, como a fotocomposição, na década de 1950, e a computação gráfica, na década de 1980. Com a fotocomposição, composições com so- breposição de camadas (textos e imagens sobre- pondo-se uns aos outros), espaços entreletras e entrelinhas negativos e algumas distorções tipográficas tornaram-se possíveis e diante disso, alguns designers, especialmente durante a década de 1970 e 1980, passaram a experimentar essas novas possibilidades, tornando a tipografia muito mais dinâmica. 31 Entre os designers que fizeram experimentos usando a fotocomposição estão Wolfgang Weingart, Dan Friedman, Katherine McCoy, Ed Fella, entre outros. Com o surgimento dos primeiros computadores, as possibilidades de composição tipográfica e de manipulação de fontes que antes eram objetos físicos (tipos de metal) ou imagens para colagem e decalque (fotocomposição), tornaram-se instru- ções matemáticas no computador (fontes digitais), sendo completamente editáveis e manipuláveis. Precisamos lembrar, no entanto, que os compu- tadores das últimas décadas do século 20 eram muito mais limitados do que os atuais. O computador pessoal foi criado pela Apple, que lançou a primeira versão em 1976. Os primeiros computadores não tinham interface gráfica e funcionavam por linhas de comando. A partir de 1984 a situação muda e os computadores da Apple passam a ter uma interface amigável, e logo em seguida surgiram os primeiros softwares gráficos. Apesar de a interface gráfica ter sido criada, as primeiras fontes para o computador eram bitmaps e não serviam para a produção de projetos gráficos. Zuzana Licko, da Emigre, fez experimentos e criou fontes com essa linguagem. 32 As primeiras fontes, lançadas nos anos 1980, emulavam a tecnologia e a baixa resolução das primeiras telas de computador e eram destinadas à impressão em impressoras de baixa resolução, como as matriciais. Com a popularização das tecnologias para a com- posição tipográfica no computador (desktop pu- blishing) e softwares para geração de fontes (como o Fontographer, criado em 1985), surgiram muitos desenhos de letras extravagantes. Muitos deles, inclusive, desafiavam princípios da legibilidade, A tipografia, em certo momento do final do século 20 e início do século 21, passou a se aproximar cada vez mais da ilustração. Priscila Farias explica: Ao colocar em cheque os pressupostos do racio- nalismo, alguns experimentos tipográficos contem- porâneos chegam mesmo a questionar a própria razão de ser das práticas tipográficas. Muitas das fontes distribuídas pela revista FUSE – editada pelo tipógrafo inglês Neville Brody – por exemplo, não foram concebidas para serem utilizadas na diagra- mação de textos, e sim como reflexões a respeito da tipografia enquanto linguagem, através das possibilidades geradas pelas tecnologias digitais. (FARIAS, 2001, p. 32). 33 Surgiram então muitas fontes extravagantes, mas também muitas fontes de qualidade para as novas tecnologias digitais. A Microsoft encomendou fontes bem-feitas para a leitura em tela, como a Georgia e a Verdana, por Mathew Carter, e a Adobe também teve um programa de criação de fontes, muitas delas baseadas em desenhos clássicos, por designers como Robert Slimbach (Minion, Adobe Garamond e Myriad) e Carol Twombly (Trajan, Charlemagne). Com a popularização da tecnologia para criação de fontes digitais e com a facilidade de distribui- ção de fontes na internet, muitas vezes é difícil de escolher as fontes, devido à ampla variedade de oferta. As fontes digitais são softwares e, como tais, precisam ser bem-feitas e programadas de modo adequado. Há muitos desenhos de letras “bonitinhos”, mas que funcionam mal como fontes, desenhos mal projetados, falta de acentos em língua portuguesa e em outras línguas, falta de sinais de pontuação (ou sinais malfeitos) e fontes com uma proble- mática programação de espaços. Há sites pouco confiáveis para a busca e o download de fontes gratuitas, como o Dafont, pois qualquer pessoa 34 pode colocar fontes lá, ou seja, não há muito cri- tério ou curadoria. Projetar fontes é uma atividade bastante traba- lhosa e os profissionais de tipografia precisam ser remunerados. Muitas vezes eles sobrevivem graças aos direitos autorais das vendas de suas fontes. Há fontes que são muito caras e outras mais baratas, mas não se deixe levar por esse critério. Caso queira usar uma fonte paga de fundidoras de tipos digitais renomadas (type foundries), como a Hoefler&Co, Commercial Type, Lineto, FontFont entre outras, coloque o valor da fonte no trabalho do cliente e cobre por ele, não use versões piratas. Lembre-se de que a tipografia é um dos elementos mais importantes do design gráfico e o investimento pode valer a pena. Há fontes muito boas para uso na plataforma Adobe Fonts e seu uso é liberado para assinantes do pacote Creative Cloud. Há também, hoje, muitas fontes gratuitas, feitas por profissionais de fundidores renomadas (type foundries) como a Dalton Maag, Huerta Tipográfica, Omnibus Type, Sorkin Type, Christian Robertson, entre outros, na Google Fonts. Apesar de muitas dessas fontes terem sido feitas para uso em telas de celular ou computador, diversas delas funcionam igualmente bem em impressos. 35 O termo “type foundry”, em português “fundidora de tipos” remete a tradição da fundição de tipos móveis. SAIBA MAIS 36 CARACTERÍSTICAS DOS TIPOS As medidas tipográficas baseiam-se ainda na tipografia em metal. O tamanho do corpo de uma letra é baseado na altura total daquela pecinha de metal em chumbo. O corpo de uma fonte, então, é a altura total dos caracteres, começando da linha dos descendentes até a linha dos ascendentes. As letras maiúsculas se iniciam na linha de base e seguem até a linha das versais (maiúsculas). A maioria das letras minúsculas começam na linha de base e vão até a linha média (a, c, e, m, n, o, r, s, u, v, x, z). Algumas letras minúsculas se iniciam na linha de base, mas suas hastes se projetam para baixo, chegando até a linha das descendentes (g, j, p, q, y) e outras iniciam na linha de base e se proje- tam até a linha das ascendentes (b, d, f, h, i, k, l, t). Figura 14: Altura dos tipos. Fonte: Elaborada pela autora. Notem que há fontes nas quais as ascendentes são mais altas do que as maiúsculas e há fontes em que as ascendentes possuem a mesma altura. 37 Figura 15: Diferenças de altura entre ascendentes e letras maiúsculas. Fonte: Elaborada pela autora. Os corpos dos tipos são medidos em pontos. Com a tipografia em metal existiam dois sistemas de medidas, o Didot, baseado em pontos didot e cíceros, e o sistema anglo-americano, baseados em pontos, paicas e polegadas. O sistema de pontos Didot era muito usado no Brasil em oficinas tipográficas, pois a maior par- te do material de impressão era importado da Europa, onde esse sistema era empregado. Com a fotocomposição o sistema anglo-americano se tornou mais usado no Brasil e, hoje, praticamente só se usa esse sistema, pois as fontes digitais são baseadas nessas medidas. Nenhum desses sistemas possui correspondên- cia com nosso sistema decimal, mas essa não é uma grande dificuldade, pois é fácil se acostumar com as medidas tipográficas em pontos. Como estudamos, a tipografia em metal era bastante inflexível e o tipógrafo precisavacompor tudo com medidas bastante rígidas. Isso não acontece com a composição digital, embora existam designers 38 que gostam de trabalhar com todos os elementos proporcionais. O que é preciso saber é que, em geral, tamanhos de tipos para leitura em textos variam de 9 a 12 pontos. Os espaços entre linhas também são medidos em pontos e devem ser, no mínimo, 20% maiores do que o tamanho dos tipos. Por exemplo, em um texto composto em uma fonte em corpo 10, a entrelinha deve ser no mínimo 12. Uma forma de representar o corpo e a entrelinha é escrever os números separados por uma barra, dessa forma: 10/12 pts. 1 ponto tipográfico anglo-americano equivale a 0,353 mm. 12 pontos tipográficos anglo-americanos equivalem a 4,233 mm. 12 pontos tipográficos anglo-americanos equivalem a 1 paica 6 paicas equivalem a 1 polegada 1 ponto didot equivale a 0,376mm 12 pontos didot equivalem a 4,512mm 12 pontos didot equivalem a 1 cícero 4 cíceros formam 1 furo, que equivale a 18,044 mm SAIBA MAIS 39 Os corpos das fontes são medidas relativas, pois podem possuir diferentes proporções internas em relação à altura das minúsculas e suas projeções ascendentes, descendentes e letras maiúsculas, como podemos verificar na figura abaixo. Figura 16: Diferenças de altura x entre as fontes Times New Roman e Arial. Fonte: Elaborada pela autora. As diferenças entre as proporções das fontes, a altura x em relação às ascendentes e descendentes de uma fonte fica em bastante evidência quando compomos textos. Observe na figura abaixo as colunas compostas em Times New Roman e Arial. Os textos compostos em Times New Roman pa- recem possuir mais espaços entre as linhas. Isso acontece porque a altura x da Times New Roman é menor. Fontes para livros, jornais e revistas, em geral possuem uma altura x menor do que fontes para outros usos, como fontes para telas (computador e celular), para títulos, sinalização, entre outros. 40 Figura 17: Textos compostos em mesmo tamanho de corpo e entrelinha, nas fontes Times New Roman e Arial. Fonte: Elaborada pela autora. A largura das letras não é rente ao seu desenho, sempre é calculado um espaço extra. Observe abaixo na representação da Arial e da Times (Figura 18). Assim como a letra x serve de base para medir a altura das letras minúsculas, a letra M maiúscula, que é a letra mais larga do alfabeto, serve de base para definir unidades e parâmetros de medida hori- zontais. Os traços que utilizamos como travessão, hífenes, entre outros, são ou frações ou unidades de M (também conhecido por quadratim). Em fontes serifadas o espacejamento parece mais uniforme, pois as serifas quase esbarram no limite da largura dos caracteres. 41 Figura 18: Larguras das fontes e medida “eme” em Times New Roman e Arial. Fonte: Elaborada pela autora. Note que os tipos em metal também possuem um respiro horizontal para que as letras não fiquem completamente grudadas: Figura 19: Tipos móveis de metal. Fonte: France3470/Wikimedia. O quadratim é sempre relativo ao tamanho do corpo, um quadratim de uma fonte de corpo 12 é 12, de uma fonte em corpo 9 é 9 e assim por diante. Logo, um travessão de uma fonte de corpo 9 possui aproximadamente 9 pontos de largura. 42 Segundo Joaquim da Fonseca: Um quadratim, ou eme, tem sua largura dividida em 18 partes iguais. Assim, metade de eme é igual a 9 divisões de eme (não confundir com os pontos, que pertencem a outro tipo de medida). Um terço de eme equivale a 6 divisões. Metade de eme pode também ser denominada ene. O eme e suas divisões são usados para controlar o espaço entre caracteres e entre palavras, bem como o espaço de caracteres especiais, como, por exemplo, o travessão ou o hífen. Também são usados particularmente para medir espaços de indentações em inícios de parágrafos. (FONSECA, 2008: p. 98). Passe a observar mais as fontes e suas estruturas e proporções, o olhar atento aos detalhes tornará mais fácil a escolha dos tipos. Escolha cinco das fontes que você mais usa e, com a ajuda de um programa de ilustração vetorial, trace as linhas de base, média, ascendentes, descendentes e largura e compare as proporções. É muito importante conhecer a terminologia das partes das letras, isto é, sua anatomia, tanto para comparar fontes quanto para poder projetá-las. REFLITA 43 As hastes são os principais traços dos caracteres. Há fontes em que as hastes possuem quase a mesma espessura e fontes nas quais as hastes possuem es- pessuras bastante diferentes e contrastantes. Quando a fonte possui bastante diferença de espessuras de traços finos e grossos, dizemos que ela é mais contrastada. Alguns caracteres das letras minúsculas possuem hastes que podem subir acima da linha média, como o b, d, f, l, ou descer abaixo da linha de base, como o p, q, j. as hastes que sobem chamamos de ascendentes e as que descem, de descendentes. A união de duas hastes é conhecida como vértice. Ob- serve na imagem abaixo nas letras M, N e V. Quando a união das hastes é no topo da letra, como em A, M e N, o melhor termo a se utilizar é ápice. Quando duas hastes (ou uma reta e uma diagonal, ou duas diagonais) se encontram, temos vértices (base) ou ápices (topo). Note a diferença entre o ápice pontiagudo da letra A da Minion e o reto da Myriad. Figura 20: Hastes, vértices e ápices de fontes Minion e Myriad Fonte: Elaborada pela autora. As barras são traços horizontais que unem duas hastes ou pontos ou que cruzam uma haste. A barra pode ser um elemento bastante expressi- 44 vo. Há fontes com a barra do “e” em diagonal e fontes em estilo art déco, com barras bem baixas ou bem altas. Figura 21: Barra. Fonte: Elaboração própria Segundo Priscila Farias (2004), braços são “traços horizontais, ou inclinados em direção à linha das capitulares, em caracteres como as letras ‘K’ (par- te superior direita), ‘X’ (parte superior) e ‘L’ (parte inferior)”. Pernas são “traços horizontais ou incli- nados em direção à linha de base em caracteres como ‘K’ (parte inferior direita), ‘X’ (parte inferior) e ‘R’ (parte inferior direita)”. (FARIAS, 2004). As pernas e braços também podem trazer bastante personalidade a uma fonte. Vejam que bonita a perna da letra R da fonte Minion. Figura 22: Braços e pernas nas fontes Minion e Myriad. Fonte: Elaborada pela autora. 45 As áreas brancas em volta e dentro das letras são tão ou mais importantes do que as partes pretas dos desenhos. Letras muito fechadas e com olhos e miolos muito pequenos são mais difíceis de ler. Os espaços internos das letras também influenciam nos espaços entreletras, pois letras com olhos muito fechados necessitam de mais espaços entreletras para serem mais legíveis. Figura 23: Olho e miolo nas fontes Minion regular, Myriad regular, Minion Italic e Myriad Italic. Fonte: Elaborada pela autora. As aberturas são elementos muito importantes para a legibilidade da tipografia. Perceba como a Arial e a Times são bem mais fechadas do que a Minion e a Myriad. Fontes mais abertas são mais agradáveis de ler. Figura 24: Abertura em diferentes fontes (Minion, Myriad, Times e Arial). Fonte: Elaborada pela autora. 46 Faça um teste, componha um texto em Myriad em uma folha e em outra folha em Arial e pergunte a cinco pes- soas qual elas acham a mais agradável. Depois repita o teste com Minion e Times New Roman. As aberturas são elementos muito importantes para a legibilidade da tipografia. Observe como a Arial e a Times são bem mais fechadas do que a Minion e a Myriad. Fontes mais abertas são mais agradáveis de ler. Figura 25: Gancho, cauda, ligação e orelha em diferentes fontes (Minion e Bell). Fonte: Elaborada pela autora. Selecione pelo menos cinco das suas fontes favoritas, observe e compare esses elementos anatômicos. Você vai perceber como esses pequenos detalhes mudam bastante entre as fontes. Conhecer em profundidade esses elementos formais é fundamental tanto para a escolha quanto para aanálise crítica da tipografia. REFLITA REFLITAREFLITAREFLITA 47 Um outro elemento muito importante relativo ao desenho das letras são as serifas. Nem todas as fontes possuem serifas. Segundo definição de Priscila Farias (2004): Os traços de uma face de texto podem terminar com pequenas projeções para um ou ambos os lados de suas extremidades, geralmente paralelas ou ligeiramente inclinadas em relação à linha de base, chamadas serifas. De forma geral, isso é mais comum em hastes, braços e pernas. Serifas, quando presentes, costumam ser duplas quando em contato com a linha de base, e simples, apon- tando para a esquerda, quando nas extremidades de ascendentes. Projeções menores, geralmente apontando em direção à linha de base, como na parte inferior esquerda do ‘b’ e na parte inferior direita do ‘G’ de algumas fontes são chamadas de esporas. Caudas, ganchos e traços curvos em geral raramente terminam com serifas, e suas extremi- dades são chamadas de terminais. Figura 26: Serifa e esporas na fonte Minion. Fonte: Elaborada pela autora. 48 Fontes com serifas possuem mais detalhes do que fontes sem serifa. As serifas são muito mais do que enfeites das letras, elas ajudam bastante a leitura por criarem linhas virtuais na página. Fontes com serifa são muito usadas para a composição de textos longos. Leia o artigo Notas para uma normatização da nomen- clatura tipográfica, de Priscila Farias, para complementar seus conhecimentos e usar a terminologia correta da área tipográfica. O artigo está disponível na internet. A distribuidora Fontshop possui um bom glossário visual de termos tipográficos. Disponível em: https:// www.fontshop.com/glossary SAIBA MAIS https://www.fontshop.com/glossary https://www.fontshop.com/glossary 49 CONSIDERAÇÕES FINAIS Estudamos, neste e-book, como a escrita se alterou ao longo dos séculos e como sua história influenciou as formas de letras que temos hoje. A impressão tipográfica, além de um grande marco da história mundial e popularizar a leitura e a aparência das letras, foi mudando sutilmente ao longo dos sé- culos. Verificamos que durante o século 19 houve uma grande proliferação de tipos excêntricos, o que pode provocar um paralelo com a contempo- raneidade, na qual temos uma ampla variedade de fontes devido a facilidades de reprodução, o que nos faz perceber que diferentes tecnologias afetam as linguagens tipográficas. Analisamos também como as partes das letras mudam de acordo com as fontes e como essas sutilezas precisam ser observadas pelos designers na hora de escolher suas fontes de trabalho. 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