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AS_TRES_ORDENS_OU_O_IMAGINARIO_DO_FEUDAL

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AS TRÊS ORDENS OU O IMAGINÁRIO DO FEUDALISMO 
 
Emílio Sarde Neto 
 
 
Georges Duby pode ser considerado como um historiador da chamada história 
moderna, pois o mesmo procura em suas obras analisar não só a as questões políticas e 
econômicas como também procura analisar o imaginário. Esta obra faz parte da coleção 
Nova História, onde, além desta, o autor possui mais duas, a saber: “Guerreiros e 
Camponeses” e “O Tempo das Catedrais”. 
As Três Ordens ou O Imaginário do Feudalismo é fruto de uma reflexão 
realizada pelo autor com alguns companheiros, entre eles Jacques Le Goff, sobre a 
imagem da sociedade trifuncional. Este trabalho, ou reflexão teve início em dezembro 
de 1970, quando o autor começa a lecionar em Paris e termina em 1973, quando 
Georges Dumézil aceita que numa sessão final lhe seja apresentada as conclusões. O 
autor tentou reunir os resultados do inquérito, e surge o livro. 
Além de apresentar o campo de investigação, o autor divide a obra em cinco 
partes, a saber: Revolução, Gênese, Circunstâncias; Eclipse e Ressurgência. 
No campo de investigação, Georges Duby analisa algumas semelhanças entre o 
discurso de Charles em 1610 e do senhor Torquat em 1957, ele começa logo de inicio 
mostrando o quanto isto ainda esta presente no mundo contemporâneo, a questão do 
menino sentado em seu lugar em sala de aula, um atrás do outro, a questão do mundo 
ordenado, hierarquizado, porém, o autor quer ir à gênese e vai buscar onde começa esta 
ideia de ordem de função. Para tanto, o autor vai neste inquérito usando o por que? o 
como?, o onde? e quando?. Entretanto, Georges Duby sabe das dificuldades, pois o 
historiador só interroga despojos, e estes geralmente são de quem esta no poder. 
O nosso autor usa de um conselho do seu companheiro Le Goff, que a questão é 
por corretamente os termos dos problemas, por exemplo, por três funções é uma forma, 
porque ou com o isolar ou não do seu contexto, examinar as circunstâncias, o sistema 
ideológico que ela encontra-se encaixada, ela não foi construída, mas atualizada, é 
preciso observar a sua gênese descobrir o porquê e como a imagem tripartida funcional 
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foi escolhida, em tal momento e em tal lugar, é preciso todavia deixar claro que esta 
existência jamais pôde ser provada, pois na realidade, estamos falando de uma 
ideologia, e ideologia não é reflexo do vivido, mas um projeto de agir sobre ele. O que o 
nosso autor fez foi observar o sistema das três ordens se revelando no reino da França 
entre 1025 e 1225, ele colocou aquilo que podemos chamar do defrontar de uma das 
questões centrais que hoje se põem à ciência das relações entre o material e o mental na 
evolução das sociedades. 
A grande dificuldade esta na dialética do imaginário concreto, homens – 
símbolos; símbolos que lhes ditaram as condutas e justificaram a seus olhos? A 
pergunta colocada necessita de uma resposta. Estará nas mãos do historiador despojar 
inteiramente as sociedades antigas do seu revestimento ideal? Esta questão traz outra 
pergunta, poderá o historiador vê-las de uma maneira diferente daquelas como elas 
próprias se viam, se sonhavam? Além disso, podemos fazer uma última pergunta, não 
estaremos nós, dominados por esta ideologia que o autor pretende desmistificar? 
Depois de percebermos a grande dificuldade, analisemos a revelação, para isso o 
autor encontra dois bispos que em suas pesquisas ele conclui que, são estes a fazer os 
primeiros enunciados desta questão um é Adalberão, este considerado traidor, pois 
responsável pela transferência da coroa da França dos Carolíngios para os Capetíngios. 
O outro bispo é Gerardo, ambos saíram da mesma camada social, Gerardo servia ao 
imperador Henrique II, queria restaurar na Lotaríngia, o poder dos reis da Germânia. 
Neste ponto se faz necessário esclarecer que o bispo é o responsável pelo seu 
rebanho, é preciso salientar, que na tradição carolíngia o episcopado é o produtor 
natural da ideologia, outra coisa, apesar do bispo Adalberão ter traído os carolíngios, 
tanto ele como Gerardo eram descendentes dos antepassados de Carlos Magno. 
Todos os documentos e as notícias conseguidas por Georges Duby revelaram 
que existia uma agitação nas relações sociais nesta época e de certa forma esta agitação 
é causada pelos denominados heréticos que procuravam fugir do real, ao contrario o dos 
defensores da paz de Deus e dos Monarquismos que também representaram modelos 
ideológicos. 
Nesse ponto, o autor vai até o tempo dos monges, ele procura mostrar que existe 
ai uma ideologia de igualdade, pois os mesmos aceitam pessoas iletradas em seus 
monastérios, procuraram inclusive participar das lutas, coisa que os bispos censuram, 
pois no mundo da ordem, das funções isto era incorreto. 
SARDE NETO, Emílio. Meu Acervo Digital, 2014 [2000]. 
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Neste contexto, o primeiro a observar a possibilidade de fragmentação, da 
desordem é Gerardo de Cambrai, mas o fato é que tanto ele como o Adalberão 
considerava-se mestres do rei Roberto o piedoso, de França. Portanto estes dois 
deveriam mostrar que eram necessários a ordem e o fizeram. 
Gerardo o fez depois da morte do imperador Henrique II, onde fica clara a sua 
intenção de defender os interesses da igreja. Mas por que Gerardo resolve escrever este 
gesto, Gerardo julgou dever demonstrar “que o gênero humano, desde sua origem, se 
divide em três.” Na discussão do casamento Gerardo responde que “alguns homens são 
em parte anjos, são dispensados das tarefas servis deste mundo”, o pecado determina a 
desigualdade, ele baseia-se em Gregório, o grande, este mostra que ainda que a natureza 
gere todos os homens iguais, ou ainda, que todos os homens nasçam iguais em direito, a 
falta (culpa) subordina uns aos outros conforme a ordem variável do mérito; esta 
diversidade, que procede do vício, é estabelecida pelo juízo divino para que, uma vez 
que não pertence ao homem viver na igualdade, ela será exigida diferentemente, a uns e 
a outros. É este o discurso de Gerardo; os bispos que em as prerrogativas do monarca, 
Deus quis que mesmo no paraíso, reinasse uma desigualdade, é preciso uma 
redistribuição generosa, numa desigualdade fatal, esta é a chave-mestra da ideologia de 
Gerardo, ele fala de função de comunicação de serviços prestados e, é claro de 
desigualdades, mas não de castas, de graus, nem de poder. O que constitui o objeto da 
proclamação não é o poder, mas a ação. 
Os bispos e os reis desempenham duas funções diretas, associados e dominando 
a massa dos inferiores que, no entanto, devem amar. A terceira função, a agrícola, surge 
de forma assaz fugidia. 
De passagem, o discurso evoca-a, com o único intuito de justificar que os 
oradores não trabalhem com as mãos e que os pugnadores recebam rendas; de mostrar 
como a ociosidade e a exploração fazem parte da ordem das coisas. Quer dizer, a 
expressão mais evidente do modo de produção senhorial. No caso de Adalberão, a tarefa 
do autor foi descobrir dentro do poema cujo nome As graças (Carmem), feito para o rei 
Roberto, um sistema ideológico, o autor é guiado pelo que já conhece do pensamento de 
Gerardo de Cambrai, trata-se de um poema político. Um poema panfletário, uma sátira 
composta por Dudon cônego de Saint Quentin, ao dedicar a Adalberão a sua história dos 
duques da Normandia. 
 
SARDE NETO, Emílio. Meu Acervo Digital, 2014 [2000]. 
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Os modelos dos dois bispos carolíngios não venceram, é preciso notar que desde 
o século XI os clérigos, para atingirem a perfeição e para que o seu estado prevalecesse 
sobre o monástico, resolveram levar uma vida apostólica, ou seja, passaram a agir. 
Nesta luta ideológica entre o desordenado fragmentado surge um novo “grupo” 
social, este não é nobre não pertence ao clero e também não é camponeses, vivem do 
comércio e, é neste ponto que aparece a contradição do feudalismo, o dinheiro, com ele 
surge o medo social, estamos no século XII, estemal é trazido pela reivindicação 
popular que põe em causa as relações senhoriais de produção, o que se espera do rei é 
que vele para que não se ultrapasse a barreira entre os que têm o direito de mandar, 
porque são ricos e nada fazem, e aqueles que devem obedecer porque trabalham, é 
preciso manter rigorosas as diferenças sociais. Portanto, ressurge o modelo tripartite dos 
bispos carolíngios. 
O último texto analisado pelo autor e o trabalho de Guilherme de Bretão que 
narra as conquistas do rei Felipe, chamada A Filipiada, um tipo de resgate da Eneida, da 
força do imperador. 
Felipe representa o soberano que se prepara para vencer cumprindo a tarefa que 
Adalberão tinha convidado Roberto, O Piedoso, a desempenhar; fazer representar pela 
força, a solidariedade, as formas, ao enquadramento que Deus previu para ela. 
Para o autor, as conquistas de Felipe Augusto podem ser vistas como o 
desabrochar do mito da Unidade Nacional, para ele todos estavam felizes houve uma 
festa na chegada do imperador ele foi saudado, entretanto, com o surgimento das 
cidades, após as festas fica claro o ressurgimento das diferenças sociais que estão 
conforme as leis da natureza e ela impõe a estabilidade, temos o clero, os nobres e o 
povo, estes agora divididos em três frações: os cavaleiros, as gentes das cidades 
distintas das gentes do campo, e o próprio camponês inaugurando uma nova história da 
instituição do Estado monárquico. 
 
Referência 
DUBY, Georges. As Três Ordens ou o Imaginário do Feudalismo. Lisboa: Editora 
Estampa, 1982. 
SARDE NETO, Emílio. Meu Acervo Digital, 2014 [2000].

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