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1 Avaliadores de Artigo Científico O avaliador3 2 Enap Escola Nacional de Administração Pública Enap, 2021 SAIS - Área 2-A -70610-900 - Brasília, DF Conteudista: Claudio Paixão Anastácio de Paula (conteudista, 2021); Eliane Pawlowski de Oliveira Araújo (conteudista, 2021); Fernanda Oliveto (conteudista, 2021); Keila Rêgo Mendes (conteudista, 2021); Diretoria de Desenvolvimento Profissional. 3 Sumário Unidade 1: O que é preciso para ser um avaliador de artigo científico? .........................4 1.1 Por que ser avaliador? ................................................................................................................................... 4 1.2 Competências necessárias ao perfil do avaliador ................................................................................ 8 1.3 Requisitos para uma avaliação de qualidade .......................................................................................10 Referências .............................................................................................................................................................14 Unidade 2: A ética no processo editorial ............................................................................. 16 2.1 Aspectos éticos..............................................................................................................................................16 Referências .............................................................................................................................................................21 4 1.1 Por que ser avaliador? O papel do avaliador é tão estratégico no processo editorial que, sem sua participação, o atual sistema de publicações corre o risco de colapsar. Essa observação é importante, pois o número de periódicos científicos tem crescido nos últimos anos e depende do trabalho voluntário de pesquisadores para avaliarem os manuscritos. Um panorama desse cenário pode ser visto na pesquisa sobre revisão por pares feita pelo Publons, principal plataforma de revisão acadêmica, publicada em 2018, que ouviu mais de 11 mil pesquisadores de vários países. Segundo a pesquisa, os editores estão enviando mais convites para avaliação do que há cinco anos e foi detectada a existência de uma “fadiga crescente de pareceristas”, de modo que os editores precisam convidar mais avaliadores para que cada revisão seja realizada (SPINAK, 2019). Resultado da pesquisa realizada pelo Publons: Unidade 1: O que é preciso para ser um avaliador de artigo científico? Objetivo de aprendizagem Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer o perfil de avaliador de artigo científico, identificando as vantagens pessoais e profissionais que a função traz e as competências necessárias para desempenhar a função. Neste módulo, serão apresentadas para você as vantagens de ser avaliador e as competências necessárias ao perfil, além de reconhecer aspectos éticos para agir em situações de conflito. O módulo 3 está estruturado da seguinte forma: O avaliador M Ó D U LO 3 • Unidade 1 – O que é preciso para ser um avaliador de artigo científico? • Unidade 2 – A ética no processo editorial • Horas dedicadas à avaliação global por ano – 68,5 milhões. • Mediana do tempo de avaliação – 16,4 dias. • Mediana do tempo dedicado a escrever cada avaliação – 5 horas. • 10% dos pareceristas são responsáveis por 50% das avaliações. • Para 75% dos editores de periódicos a parte mais difícil é encontrar pareceristas dispostos. • 42% dos pesquisadores rejeitam a solicitação de avaliação por estarem muito ocupados. • 39% dos pareceristas nunca receberam capacitação sobre avaliação por pares. 5 É o avaliador quem auxilia os editores a decidirem se publicam, ou não, o manuscrito e assegura que os melhores trabalhos sejam publicados, contribuindo para a qualidade do produto final que é a sua disponibilização dentro de uma publicação científica para acesso pela sociedade. Sua função, conforme destaca Rodrigues, Quartiero e Neubert (2015), implica o julgamento de um manuscrito e elaboração de um parecer sobre ele, que traduz a recomendação de aceitação ou rejeição do material baseada em uma argumentação fundamentada, a qual constitui o referencial para subsidiar a tomada de decisão do editor. A presença do avaliador no processo editorial indica que houve uma avaliação crítica dos manuscritos submetidos ao periódico, feita por um especialista, e pressupõe que foram observados princípios de idoneidade na seleção e publicação do material. De acordo com Vasconcellos (2017), o avaliador possui duas funções primordiais no processo editorial: O processo de avaliação realizado por pares, no qual se insere o trabalho do avaliador, em geral, é bem-visto pela comunidade acadêmica. Helena Shigaki e Roberto Patrus, ao relatarem duas pesquisas realizadas sobre esse tema, verificaram que essa modalidade é avaliada positivamente pela maioria dos pesquisadores: Os autores, entretanto, ao analisarem a literatura da área, verificaram também a existência de argumentos contrários à revisão por pares, o que demonstra que o exercício dessa atividade precisa passar por constantes reflexões e discussões visando seu aprimoramento. Entre esses argumentos estão: tempo e atraso na publicação, abuso de poder, parcialidade, subjetividade, preconceito, julgamentos inadequados ou inconsistentes, competição, desprezo e falta de sigilo. Saiba mais: Acesse outras análises relativas a essa pesquisa, trazidas por Ernesto Spinak, clicando aqui. • é responsável por auxiliar o editor na avaliação e seleção dos manuscritos submetidos ao periódico (gatekeeping role); e • auxilia o autor a melhorar seu trabalho por meio de críticas construtivas. Em uma pesquisa realizada por Ware (2008), com 3.040 entrevistados, constatou-se que 93% concordam que a revisão por pares seja necessária, 85% concordam que ela ajuda a melhorar a comunicação científica e, ainda, 83% acreditam que, sem a revisão por pares, não haveria controle. Em outro estudo, realizado por Mulligan, Hall e Raphael (2013), com 4.037 entrevistados, 69% diziam estar satisfeitos com o atual sistema e 94% concordam que a crescente melhoria da qualidade dos artigos publicados se deve ao processo de revisão por pares. (SHIGAKI, PATRUS, 2016, p.110-111) https://blog.scielo.org/blog/2019/02/05/de-pareceristas-estrela-a-pareceristas-fantasmas-parte-i/ 6 Saiba mais: Você sabia? Uma iniciativa que pode minimizar alguns dos aspectos negativos da avaliação de artigos científicos pode ser vista na utilização do Publons. De acesso gratuito, a plataforma foi criada para registrar a contribuição dos avaliadores encorajando-os a postar online suas experiências. Segundo Andrew Preston, um dos seus criadores, a revisão por pares é um trabalho especializado que é descartado logo após a publicação do artigo. A finalidade do Publons, portanto, é reunir e armazenar esse conteúdo, promovendo discussões, evitando o “desperdício” de ideias, sugestões e comentários feitos no processo de avaliação. Dessa forma, a revisão por pares poderia ser vista como uma espécie de produção científica, assim como as publicações e citações. (NASSI-CALÒ, 2015) O sistema de avaliação por pares será visto mais adiante, quando você reconhecer os tipos de avaliação e compreender, em detalhes, o processo avaliativo. Importante destacar, por ora, que essa modalidade não é exclusiva dos processos editoriais científicos. Como menciona Vasconcellos (2017): […] o controle por pares é um mecanismo de avaliação de trabalhos científicos utilizado em diversos meios, não só em periódicos científicos, mas também nos próprios programas de pós-graduação (bancas de mestrado, doutorado, etc.) e em análises para concessões de financiamentos por órgãos de fomento, por exemplo. Trata-se de “um processo baseado na premissa de que os revisores são indivíduos competentes na área do artigo que avaliam, que são independentes,objetivos e que dedicam seu melhor esforço à avaliação”. Ou seja, parte- se da ideia de que os pares (especialistas na mesma área) dos próprios autores dos artigos têm competências científicas e técnicas para analisar criticamente os elementos formais e substanciais das pesquisas que se pretende divulgar ao meio acadêmico e à sociedade. Assim, assegura-se à publicação um “selo de certificação, sinalizando que o trabalho foi escrutinado pelos pares”. (VASCONCELLOS, 2017, p. 439) A importância dos avaliadores no processo de publicação de artigos científicos pode ser vista também por desencadear a criação de um círculo virtuoso: quando se tem um alto crivo de qualidade pelos avaliadores na seleção dos manuscritos, a qualidade dos artigos publicados se torna alta, o que faz com que o periódico também reflita essa qualidade e atraia o interesse de bons pesquisadores para a publicação de seus achados de pesquisa naquela revista. Um gargalo que existe nesse círculo é que a relevante atividade exercida pelo avaliador no processo editorial de um periódico científico tem caráter voluntário, não havendo recebimento de pró-labore ou outro tipo de remuneração pelo seu exercício. Esse fator gera uma série de consequências no processo editorial, já que esse irá depender da predisposição do pesquisador em assumir tal encargo. Há de se destacar, todavia, a existência de outros aspectos que são responsáveis por motivar um pesquisador a assumir essa função, que não seja uma retribuição financeira. 7 Diante desse cenário, é comum pensar: mas o que o avaliador ganha com essa função? A motivação para atuar como avaliador pode vir de diferentes situações. Há fatores ligados ao currículo, já que os editores certificam a participação do pesquisador na atividade, o que pode corresponder a algumas linhas a serem inseridas no currículo Lattes. Há o aspecto do prestígio que isso traz ao jovem pesquisador ao ter essa atividade constando no rol das suas realizações acadêmicas. Também pode haver algo relacionado à satisfação de cunho pessoal ou algum aspecto subjetivo particular de cada indivíduo. É possível, ainda, observar a existência de outros motivos para que o pesquisador assuma essa tarefa. Vasconcellos (2017, p. 441), por exemplo, cita quatro razões para que uma pessoa atue como avaliador de periódicos científicos: “fazer a sua parte na comunidade acadêmica”, “apreciar ajudar no aprimoramento dos artigos”, “gostar de ter contato com os estudos antes de sua publicação” (ou seja, conhecer o que está sendo produzido nas pesquisas de ponta antes da divulgação ampla) e “retribuir as avaliações feitas por outros pareceristas aos próprios trabalhos”. Esse sentimento de retribuição é um aspecto relevante nessa atividade que tem demandado cada vez mais novos pesquisadores em função do grande volume de publicações. Conforme mencionado por Nassi-Calò (2015), a motivação imposta pela cultura “publish or perish” da ciência tem contribuído para o expressivo aumento do número de artigos: “o periódico de acesso aberto PLoS ONE, por exemplo, publicou mais de 105 mil artigos desde 2006, e o publisher Frontiers, mais de 20 mil desde 2007. Se cada artigo for avaliado por dois pareceristas, isso representa mais de 250 mil pareceristas apenas para esses publishers.” (NASSI-CALÒ, 2015). Também Silva (2018), ao elencar aspectos motivadores para o trabalho como avaliador, menciona a reciprocidade como fator motivador. Para esse autor, quando o serviço é orientado pela reciprocidade, a participação dos avaliadores pode desempenhar um papel de autorrealização. Nesse aspecto das recompensas individuais – e não institucionais como as que foram apresentadas até agora – outras motivações podem ser elencadas, pois o processo de avaliação possibilita ao avaliador desenvolver suas próprias habilidades como pesquisador e autor ao avaliar trabalhos científicos de terceiros, assim como ganhar experiência na atividade ao desenvolver conhecimento técnico sobre o processo se tornando um sujeito mais capacitado. Esse último perpassa a habilidade de poder aprimorar seu próprio trabalho pelo aguçamento do seu senso crítico. Conforme mencionam Deslandes e Silva (2013), a avaliação de um artigo científico, devido à sua característica da revisão realizada por pares: se aproxima do que a vertente antropológica maussiana1 denomina de dom ritual, um sistema de trocas que se alicerça na tríade dar-receber-retribuir. Esse sistema, mais do que fazer circular dádivas, materializadas como bens ou serviços, estabelece vínculos (de amizade ou de rivalidade), obrigações e dívidas ético-morais. A dádiva ofertada ao outro estabelece a oportunidade deste também exercitar o dom, demarcando um pertencimento àquela rede de sociabilidade e uma afirmação de sua persona. (DESLANDES; SILVA, 2013, p. 421) 8 1.2 Competências necessárias ao perfil do avaliador Conforme já mencionado, um dos ganhos que se obtêm da atividade de avaliador é a possibilidade de desenvolver conhecimento técnico do processo pela experiência na atividade. Esse aspecto é muito importante quando se fala de competências, porque o fato de ser pesquisador e autor não implica, necessariamente, em ser um bom avaliador. Ninguém nasce avaliador. Não há nada de místico no exercício dessa atividade que lhes faça acordar um dia como excelentes pareceristas sobre determinado tema. Tampouco serão guiados por intuições que lhes falarão se o texto é fruto de plágio, apresenta coerência metodológica ou contribuição relevante para a área. Algumas competências necessárias para um bom desempenho nessa atividade podem ser oriundas de características pessoais, enquanto outras podem ser aprendidas tanto pela experiência quanto pela participação em capacitações específicas para o exercício da função. O primeiro aspecto importante a ser ressaltado é que as competências correspondem a um tripé composto por três dimensões – conhecimento, habilidade e atitude – relacionadas não somente aos aspectos técnicos, mas também cognitivos, necessários ao bom desempenho de uma atividade. Conforme Santos (2011, p. 370) especifica: O conhecimento corresponde a uma série de informações assimiladas e estruturadas pelo indivíduo, que lhe permite entender o mundo, ou seja, trata-se da dimensão do saber. A habilidade, por sua vez, está associada ao saber-fazer, ou seja, corresponde à capacidade de aplicar e fazer uso produtivo do conhecimento adquirido e utilizá-lo em uma ação com vista ao alcance de um propósito específico. Finalmente, a atitude é a dimensão do querer-saber-fazer, que diz respeito aos aspectos sociais e afetivos relacionados ao trabalho. As três dimensões da competência estão interligadas e são interdependentes. (SANTOS, 2011, p. 370, grifos nossos) Esse entendimento deve ser acrescido dos aspectos levantados por Brandão (2009), para quem a competência incorpora também os comportamentos adotados na execução das tarefas. Assim, a competência englobaria, na atividade de avaliador, por exemplo, não apenas o conhecimento sobre determinado tema, a capacidade de sugerir uma correção adequada no texto e a vontade de contribuir para que o artigo fique adequado à publicação, mas, também, aspectos ético-comportamentais relacionados à confidencialidade, honestidade, cortesia e profissionalismo. Conhecimento Habilidade Competências Atitude Competências: CHA. Fonte: CEPED/UFSC (2021). 9 Nesse sentido, são esperadas de um bom avaliador determinadas competências, que vão desde o cumprimento de prazos e objetividade na análise até o conhecimento de ferramentas tecnológicas que auxiliam na avaliação, como, ainda, imparcialidade, análises sem preconceitos ou prejulgamentos que possam implicar desprezo pelo trabalho ou abuso de poder ao decidir pela publicação ou não do manuscrito. Com base nesses elementos, podemos elencar algumas características que identificam um bom avaliador, na visão de Maurício Pereira. Segundoesse autor, o bom avaliador é aquele que está disposto a colaborar na avaliação e na melhoria do manuscrito que será por ele analisado. Em termos ideais, precisa ser competente na área de que trata o artigo e em metodologia científica. É conveniente que disponha de base sólida de conhecimentos sobre delineamento de pesquisas e análise de dados. Também deve estar familiarizado com avaliação do efeito do acaso e identificação de vieses. O trabalho do revisor é assinalar eventuais falhas e sugerir formas de aperfeiçoar o texto. Se possível, fornecer comprovações para as afirmações que faz. O bom revisor é pontual e cortês. Exerce papel de educador, quando a situação assim o requerer, emitindo comentários construtivos e sugestões para melhorar a apresentação do artigo. (PEREIRA, 2011, p. 544) é o que não responde prontamente às demandas ou formula parecer em termos pejorativos. Também, aqueles que apenas anotam suas observações em termos telegráficos, sem mais explicações: “Está bom”. “Pode publicar, eu conheço os autores, eles são muito bons”. “Está ruim, quem escreveu não entende nada de metodologia científica”. Ou então, as anotações se resumem a pontos de interrogação nas margens do texto, sem assinalar quais as falhas detectadas e as recomendações correspondentes. Pareceres desse quilate são pouco úteis para o autor do artigo e para o editor do periódico, pois não fornecem subsídios que auxiliem a comunicação entre eles e a melhoria do texto. Um procedimento, também indesejável, é a erudição excessiva. (PEREIRA, 2011, p. 544) Na mesma linha, o autor elenca as características não desejáveis a um avaliador. Na descrição de Pereira (2011, p. 544), o avaliador que deixa a desejar: 10 Ampliando a análise dessa perspectiva, o autor apresenta uma classificação para os avaliadores baseada na articulação de dois conceitos: competência e dinamismo: Tipos de revisor classificados segundo competência e dinamismo. Fonte: Adaptado de Pereira (2011, p. 571). De acordo com essa classificação, o avaliador preparado dinâmico seria aquele que executa bem o trabalho de avaliação e o faz com rapidez. Já o Preparado Apático corresponderia ao avaliador que emite pareceres breves, embora acertados e tem como ponto vulnerável a tendência à procrastinação. Na linha dos avaliadores despreparados, o despreparado apático seria aquele que demora em responder as demandas do editor e, quando o faz, peca pela incompetência. Por vezes, nem responde as demandas. Já o avaliador despreparado dinâmico atenderia com rapidez e fluência as solicitações do editor, mas opinaria sem base científica e, não raramente, utilizaria de uma “linguagem empolada” que dificultaria a compreensão do parecer pelo autor e editor. Veja você que coisa interessante! Pereira (2011) destaca que os avaliadores preparados dinâmicos podem vir a mudar de categoria, tornando-se apáticos, se forem sobrecarregados com solicitações de emissão de numerosos pareceres. Essa sobrecarga pode implicar a elaboração de uma análise superficial e confecção de um parecer sem o nível de acurácia e contribuição adequados e esperados. 1.3 Requisitos para uma avaliação de qualidade “[..] a reputação de um pesquisador se constrói não só pela qualidade dos seus artigos, mas também pela qualidade da sua revisão nos textos dos pares”. (DESLANDES, SILVA, 2013) Para Suely Deslandes e Antônio Silva, a revisão por pares é essencial para se produzir ciência de qualidade, sendo essa tarefa vista como uma atividade científica. Mas o que se pode considerar como uma avaliação de qualidade? Propõe-se a responder a essa pergunta com outra pergunta: para que se avalia um artigo científico? Avalia- se para referendar, ou não, que seu conteúdo está relacionado a uma investigação que observou a aplicação de métodos e técnicas de forma coerente, baseou-se em referencial teórico consistente, trouxe contribuição para a comunidade científica e para a sociedade e expressa o trabalho de pesquisadores interessados em aprimorar um campo científico. Então, uma avaliação que busque ressaltar essas questões pode ser considerada uma avaliação de qualidade. 11 Este deve ser o norte do trabalho que o avaliador se propõe a desenvolver: garantir que, no texto analisado, esses elementos estejam presentes, constituindo essa tarefa como a contribuição para o processo de comunicação científica e fortalecimento da ciência. Ao proceder assim, o avaliador atestará que aquele conteúdo é um conteúdo confiável, colocando o aval junto à produção de pessoas que não se sabe quem são, mas certos da seriedade daquilo que elas falam por meio do seu texto porque foi analisada e certificada sua validade. Dessa forma, para garantir que o objetivo ao analisar um artigo seja atendido, o avaliador deve se valer de algumas orientações para não perder a finalidade maior do processo; senão, corre-se o risco de fazer a avaliação pela avaliação. E isso é mais comum do que se imagina. Recebe-se o documento, pega-se as diretrizes da revista, faz-se um checklist, elabora-se um relatório e está pronta a avaliação. Temerário, não?! Nesse aspecto, o primeiro passo para realizar uma avaliação de qualidade é a percepção da sua responsabilidade no processo. O editor confiou a você um manuscrito, e será o seu parecer (e o do outro avaliador, visto que a avaliação normalmente envolve mais de um parecerista) que irá dizer se aquele documento é adequado para ser divulgado por aquele periódico. Retoma-se aqui a reflexão sobre a influência da Inteligência Artificial no processo editorial, destacando seu impacto, agora, na avaliação dos artigos científicos. A reportagem “Máquina de criar artigos expõe fragilidade da academia”, publicada no site Questão de Fato, em junho de 2021, destaca a preocupação de pesquisadores com a fragilidade do sistema de controle de qualidade dos periódicos e suas nefastas consequências, principalmente quando a falta de rigor possibilita a publicação de artigos que impactam a saúde pública com informações inverídicas. “Para muitos cientistas, o aumento das fraudes nos artigos está ligado às falhas da revisão por pares [...]” (SILVEIRA, 2021). Saiba mais: Acesse a reportagem na íntegra clicando aqui. Além de casos em que os artigos científicos apresentaram conteúdo de “trollagem” (gíria de internet relacionada à zombaria), há também publicações com temas de pesquisa inusitados. Esse tipo de artigo despertou a atenção dos pesquisadores Meredith Carpenter e Lillian Fritz-Laylin, do Departamento de Biologia Molecular da Universidade de Berkeley, que criaram um depósito virtual com artigos científicos curiosos. Faz parte desse acervo um estudo que verificou se as garrafas de cerveja litro cheias são mais ou menos resistentes que as vazias, podendo servir como instrumentos perigosos em uma disputa física e fraturar o crânio humano. Nesse estudo, conforme relato da investigação publicado em outubro de 2009 no Journal of Forensic and Legal Medicine, foram testadas as propriedades do vidro jogando as garrafas de uma torre. A constatação de que as garrafas cheias quebraram em uma energia de impacto de 30 J (mais de 3 kg), enquanto as vazias estouraram em 40 J (mais de 4 kg) demonstraram que essas energias realmente ultrapassam o limite de fratura mínima do crânio humano, podendo ser perigosas em uma briga. https://revistaquestaodeciencia.com.br/questao-de-fato/2021/06/10/maquina-de-criar-artigos-expoe-fragilidade-da-academia 12 A reportagem sobre o tema nos aponta outro tipo de reflexão, a começar pelo título da matéria, que carrega uma depreciação das pesquisas selecionadas ao chamá-las de “publicações científicas absurdas”. Sobre as pesquisas, a relação dos estudos considerados curiosos nos leva a refletir sobre as várias linhas de pesquisa científica existentes e repensar nossos valores e julgamentos: apesar de inusitadas, essas investigações são ou não são sérias? Contribuem ou não para o crescimento de seus campos científicos?Note que a pesquisa sobre a garrafa de cerveja foi publicada em um periódico cuja temática se relaciona à Medicina Legal e Forense. Nesse contexto, será que a pesquisa pode ser considerada inusitada? Saiba mais: Acesse a reportagem na íntegra clicando aqui. Na atividade de avaliação é fundamental, portanto, que os avaliadores assumam a responsabilidade da análise e busquem contribuir para o aperfeiçoamento do campo científico no qual se inserem. Busquem contribuir também para a melhor apresentação do propósito do artigo à sociedade, pois realizar a avaliação com seriedade beneficia tanto o autor quanto a revista e o próprio avaliador. Mas como isso se configura na prática? Mais adiante, será detalhado como conduzir a avaliação de um artigo. Aqui, o propósito é ser mais reflexivo sobre essa responsabilidade, pois a decisão sobre aprovar, ou não, um artigo científico é fácil quando seu conteúdo é excelente ou, no extremo oposto, quando o texto possui uma péssima qualidade. Considerando, contudo, que a maioria dos manuscritos se encontra em posição intermediária, a aceitação ou rejeição devem ser decididas por meio de uma análise criteriosa, como Pereira (2011) bem nos lembra. Em linhas gerais, esse autor considera que a realização de uma avaliação de qualidade consiste em examinar se o texto está em condições de ser publicado por meio da análise do conteúdo e da forma de apresentação, o que pode ser verificado pela observação de cinco itens: Apresentação O artigo está adequadamente apresentado? Trata-se da melhor forma de divulgar os resultados da investigação? O delineamento é apropriado para investigar o tema e alcançar o objetivo proposto? Relevância O artigo cobre tema importante para os leitores do periódico? O periódico escolhido é o local certo para publicá-lo? O tema é relevante, original e há um objetivo claro? Originalidade Trata-se de assunto pouco pesquisado? O artigo acrescenta algo ao conhecimento existente? https://www.terra.com.br/noticias/ciencia/pesquisa/conheca-as-10-publicacoes-cientificas-mais-absurdas,b04884bb948ea310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html 13 Validade O trabalho está de acordo com os princípios, usualmente aceitos, de metodologia científica? O autor é cuidadoso na parte metodológica? Seu material é de boa qualidade? A evidência e a interpretação apresentadas são suficientemente sólidas para publicação? As técnicas foram apropriadamente descritas? Há vieses que podem comprometer a credibilidade dos resultados? A análise dos dados é apropriada? A interpretação é adequada? Os pontos centrais de uma discussão, inclusive limitações metodológicas, estão contemplados? A conclusão está suficientemente embasada nos resultados, na sua correta interpretação e em relação com o objetivo da pesquisa? Há sugestões para futuras pesquisas? Legibilidade O texto é legível? As informações estão devidamente apresentadas no artigo, nos locais em que deviam estar? A redação permite entendimento claro do enunciado e está de acordo com as boas normas de linguagem? Por fim, a qualidade da avaliação irá se traduzir também no relacionamento que o avaliador mantém com os outros atores do processo. De acordo com o Manual ANPAD de Boas Práticas da Publicação Científica, o avaliador deve adotar um tom positivo, cordial e construtivo na avaliação. Caso encontre falhas, essas devem ser apontadas, indicando-se o que pode ser feito para saná-las. Para tanto, o avaliador deve usar adjetivos encorajadores (tais como interessante, criativo e ambicioso, seguidos de expressões como: no entanto, ainda existem lacunas…), pois se deve ter em mente que o autor, ao ter ciência do parecer, precisa se sentir motivado a aperfeiçoar o texto. Assim, cabe ao avaliador, nesse processo, possibilitar aos autores uma flexibilidade que lhes permita continuar escrevendo o artigo que querem escrever, sem perder sua identidade e o entusiasmo em compartilhar suas descobertas. http://www.anpad.org.br/diversos/boas_praticas.pdf 14 Referências AMARAL, Ana Clara Sampaio Guedes. A inteligência artificial e o Direito do Autor: uma análise da possibilidade de tutela jurídica para criações intelectuais produzidas com sistemas de inteligência artificial. Res Severa Verum Gaudium, v. 5, n. 1, Porto Alegre, p. 179- 198, out. 2020. Disponível em https://www.seer.ufrgs.br/resseveraverumgaudium/article/ view/104664/58955. ARAÚJO, Marcelo. O uso de inteligência artificial para a geração automatizada de textos acadêmicos: plágio ou meta-autoria? Logeion: Filosofia da Informação, v. 3, n. 1, p. 89-107, 30 set. 2016. Disponível em http://revista.ibict.br/fiinf/article/view/3012/2761. BRAGA, Maria Elisa Rangel. Como escrever artigo científico. 2013. Disponível em http://aai.bireme.org/wp-content/blogs.dir/2/files/2013/08/Como-avaliar-artigo- cientifico_2013.pdf. BRANDÃO, Hugo Pena. Aprendizagem, Contexto, Desempenho e Competência: um Estudo Multinível. Tese (Doutorado em Psicologia Social do Trabalho e das Organizações). Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social do Trabalho e das Organizações – PGPSTO, Universidade de Brasília, Brasília. 2009. DESLANDES, Suely F.; SILVA, Antônio Augusto Moura. Revisão por pares: crise de demanda ou mudança de valores? Editorial. Cad. Saúde Pública 29 (3), Mar 2013. https://doi. org/10.1590/S0102-311X2013000300001. NASSI-CALÒ, Lilian. 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A Ética se ocupa das normas que regem ou deveriam reger as relações de cada indivíduo com os outros, bem como com os valores implícitos no comportamento individual. Unidade 2: A ética no processo editorial Objetivo de aprendizagem Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer os aspectos éticos necessários para agir em situações de conflito. Saiba mais: Você sabia? Originária do grego ethos, a palavra Ética tem seu significado associado a caráter, costume ou modo de ser. Os romanos traduziram esse termo para o latim mos, que significa costume. Tanto ethos (caráter) como mos (costume) indicam um tipo de comportamento especificamente humano que, contudo, não é natural: o homem não nasce com ele como se fosse um instinto, mas o adquire ou conquista por hábito. Nesse sentido, Ética, por sua etimologia, diz respeito a uma realidade humana que é construída histórica e socialmente a partir das relações coletivas dos seres humanos nas sociedades onde nascem e vivem. Para acessar a fonte, clique aqui. O que seria, então, um comportamento ético no tocante ao processo editorial? Quais as normas devem reger as relações envolvidas nesse processo? Para subsidiar a reflexão sobre esse tema, Silva, Araujo e Paula (2020) trazem uma abordagem que irá nortear os pontos a serem destacados nesse tópico. Segundo os autores, A função da Ética não é dar uma resposta descritiva, compreensiva, explicativa para essas questões fundas ao sentido último da vida e da condição humana, mas é constituir-se, eternamente, em ser uma questão que se põe sobre o humano pelo próprio humano – porque a Ética foi concebida para nos colocar limites, para tornar nossa vida social comportável e suportável. (SILVA; ARAUJO; PAULA, 2020, p. 75) https://www.dicionarioetimologico.com.br 17 Pensando, pois, na ética relacionada aos limites e ao respeito às normas de conduta de cada sociedade, que são estabelecidas por uma convenção socialmente aceita, percebe-se que ela se conforma na ação das pessoas. Nesse sentido, deve-se pensar na ética relacionada às atividades que compreendem o processo editorial manifesta na ação de seus atores. Essa análise perpassa ações ligadas, por exemplo, à redação autêntica de um manuscrito para publicação, à avaliação idônea do artigo elaborado para comunicar achados inéditos de pesquisa, à responsabilidade em manter acessível o documento confiado à revista por um autor, dentre outros. Nesse tópico serão apresentados alguns aspectos éticos relacionados ao processo editorial sem ser, contudo, de uma forma exaustiva. O intuito é pontuar questões que sirvam como norte para subsidiar sua atuação enquanto avaliador de artigos científicos e o alerte para não atuar de modo conivente com a situação apresentada. A princípio, serão abordados os aspectos éticos ligados diretamente ao autor como a autocitação excessiva, que pode ser considerada como uma forma de impactar índices de citação e não é vista como um comportamento adequado a um pesquisador quando da elaboração de um texto científico. A ocorrência de plágio na elaboração do texto, por sua vez, é um exemplo que implica não apenas uma questão ética, mas também uma questão jurídica. Apesar da palavra plágio não constar do ordenamento jurídico brasileiro, o artigo 108 da Lei de Direitos Autorais responsabiliza por danos morais quem utilizar uma obra intelectual sem indicar a autoria (PITHAN; VIDAL, 2013). O plágio adota diferentes formas, como pode ser visto a seguir. Além da cópia de texto alheio sem indicar a referência, constitui também como outro tipo de plágio o envio do mesmo manuscrito a várias publicações, com o texto sendo publicado mais de uma vez (SPINAK, 2013). Plágio. Fonte: adaptado de Spinak (2013, online). Tipo Comentário Parafrasear Expressar as mesmas ideias com outra palavras, que pode chegar até a reescrita completa, mantendo as mesmas ideias. Repetir pesquisa Repetir os dados usando uma mesma metodologia e resultados similares sem se referir ao trabalho anterior. Fonte secundária Uso de fonte secundária, como um metanálise, mas apenas cita fontes primárias. Duplicação Usa trabalho e dados de estudos prévios. Verbatim Copia texto alheio sem destacá-lo (aspas, itálico, parágrafo recuado etc.) e não indica a referência. Colaboração não ética Pesquisadores que trabalham juntos não declaram e se citam mutuamente (scratch each other’s backs). Atribuição enganosa Não indicar todos os autores que participaram do manuscrito, negar créditos a colaboradores. Replicação Enviar o trabalho a várias publicações, onde o manuscrito é publicado mais de uma vez. Fonte válida A referência não existe, não é correta, ou não tem os dados completos. Completo Copiar o manuscrito completo e enviá-lo em nome próprio. 18 Outro aspecto relacionado ao autor é a questão do produtivismo, que também envolve um ordenamento ético. Entendido como uma excessiva valorização da quantidade da produção acadêmica, associada a uma desconsideração quanto à qualidade do conteúdo publicado, esse fenômeno ocorre em decorrência do fato dos pesquisadores serem avaliados por sua produtividade. Um dos riscos associados a essa prática se relaciona ao fato do produto final da pesquisa científica (ou seja, a publicação) poder se transformar em um fim em si mesmo e não no resultado do processo de produção de conhecimento. Decorre também da pressão por publicar e o risco dessa superprodução “corroer” a noção de solidariedade acadêmica, entendida como um compromisso mútuo entre os pesquisadores que disponibilizam o seu tempo e expertise voluntariamente na avaliação de manuscritos elaborados por seus pares (PATRUS; DANTAS; SHIGAKI, 2015). Essa prática também fere os critérios que são elencados por Pendergast (2007), segundo o qual a publicação de um artigo deve observar três critérios fundamentais que são analisados no processo de avaliação: rigor teórico, rigor metodológico e contribuição de valor. Uma questão ética que envolve não apenas os autores, mas também editores e avaliadores está relacionada ao conflito de interesses. A pesquisaser patrocinada por uma empresa que está sendo analisada na investigação, por exemplo, pode comprometer e enviesar os resultados. Tem-se, portanto, que o conflito de interesse corresponde a uma situação em que a objetividade do julgamento é comprometida por interesse de terceiros. No tocante ao conflito de interesses relacionado à avaliação do artigo, deve-se atentar para que não haja interferências externas na avaliação justa do manuscrito. Conforme menciona Pereira (2011), nem editor, nem avaliador podem ter envolvimento que limitem a objetividade de suas decisões em relação aos artigos submetidos à publicação. Julgando-se impossibilitado de aceitar a revisão, o avaliador deve declinar do convite. Saiba mais: Veja outros aspectos ligados às questões éticas, publicados pelo Committee on Publication Ethics (COPE), clicando aqui. Neste, consta um documento interessante que apresenta um diagrama de como agir, por exemplo, se há suspeita de que uma publicação é redundante ou duplicada, ou de que houve plágio em um manuscrito. O documento, em espanhol, está disponível aqui. Questões éticas podem estar também associadas às responsabilidades com as funções exercidas no processo editorial. No tocante ao editor do periódico, fundamentar a decisão mais no fator de impacto do que no interesse dos leitores é considerado um comportamento inadequado. Conforme menciona Pereira (2011, p. 539), “o editor deve basear suas decisões de seleção e avaliação do artigo na validade do trabalho e na sua importância para os leitores da revista, e não no sucesso comercial da mesma”. O avaliador de artigo científico no processo editorial também está sujeito a dilemas éticos no exercício de sua atividade. Pereira (2011) destaca algumas situações que devem ser conduzidas com cautela: https://publicationethics.org/ http://publicationethics.org/files/All_Flowcharts_Spanish_0.pdf 19 Fraude e viés A fraude é considerada um erro intencional que se materializa, desde a demora no parecer, uso indevido da ideia original em proveito próprio, até o retardamento da publicação. Já o viés pode, por exemplo, se externar em crítica agressiva por discordância, acadêmica ou não, com as ideias do autor. Respeito ao estilo do autor As modificações recomendadas devem respeitar o estilo do autor. Não é adequado que o avaliador substitua ou acrescente nomes, expressões, frases, textos, conceitos e proposições por motivo de gostar ou não gostar da redação. Preconceito editorial Acontece, por exemplo, quando o avaliador tem posição favorável sobre a qualidade do artigo, antes de lê- lo, e ele age motivado apenas pela inspeção superficial do texto, influenciado pelo idioma do artigo e local de realização da pesquisa. Isso pressupõe, portanto, dar crédito antecipado a certos grupos, como aqueles mais produtivos em termos científicos, e ser desfavorável a outros, de autores de regiões e locais menos tradicionais em pesquisas científicas. Conforme destaca Pereira (2011): É o que tem sido relatado sobre a conduta de editores e revisores de periódicos, ditos internacionais, em relação a autores de nações periféricas. Há um inerente preconceito na mente de alguns revisores com respeito a artigos de autores de países em desenvolvimento. Algo assim: “Uma boa pesquisa não pode ter vindo de país em desenvolvimento”. O mesmo tipo de preconceito apontado entre países também pode ocorrer no interior de um país: de uma determinada região do Brasil, em face de trabalhos provenientes de outras regiões, dos investigadores da capital em relação aos do interior, de uma instituição maior para uma menor, de entidades públicas em relação às privadas e assim por diante. Interesses corporativos Muitos periódicos científicos são criados para dar vazão à produção da própria instituição ou de grupos restritos de pesquisadores. Assim, as submissões do grupo e das pessoas próximas precisam ser aceitas para que a instituição que representam seja bem cotada no processo, sendo que é exigido, aos demais autores, o rigor da perfeição. Esse corporativismo constitui uma forma de desonestidade com a comunidade científica por privilegiar algumas pessoas a outras, que têm as suas chances de publicação diminuídas ou cortadas. Interesses pessoais Os avaliadores não devem usar o conhecimento do trabalho submetido, antes da publicação para favorecer interesses próprios, e nem a equipe editorial deve usar as informações obtidas no trabalho para ganhos particulares. Exemplo de atitude antiética é o avaliador recomendar recusa do original e utilizar a ideia ou protelar a revisão por longo tempo, e, nesse ínterim, utilizar os dados para publicar artigo científico de própria autoria. 20 Incapacidade do avaliador Acontece quando o material é recusado por evidente desconhecimento do avaliador e do editor sobre o tema, o método ou a forma de comunicação científica. Mas também pode ocorrer quando o artigo é recusado para publicação porque o autor apontou limitações na investigação. Sobre essa última questão, alertamos para o fato de que, nos bons periódicos, indicar as limitações da pesquisa e debatê-las constitui aspecto positivo e, dentro de certos limites, não se configura como motivo para recusa do artigo. Com esse tópico, você termina o estudo do conteúdo selecionado para esta unidade. Vamos fazer uma verificação de como foi sua aprendizagem? Execute as atividades disponibilizadas a seguir e veja se você compreendeu os principais pontos desenvolvidos. Qualquer dúvida, retorne ao texto! 21 Referências BRAGA, Maria Elisa Rangel. Como escrever artigo científico. 2013. Disponível em http://aai.bireme.org/wp-content/blogs.dir/2/files/2013/08/Como-avaliar-artigo- cientifico_2013.pdf COLEÇÃO Os Pensadores. Os Pré-socráticos. São Paulo: Nova Cultural, 1996. FERREIRA, Manuel A.; CANELA, Renata; PINTO, Cláudia F. O processo editorial nos periódicos e dicas para a publicação. Revista de Gestão e Secretariado, São Paulo, v. 5, n. 2, p. 01-22, mai./ago. 2014. https://www.revistagesec.org.br/secretariado/article/view/307. GOMES, Valdir Pereira. O editor de revista científica: desafios da prática e da formação. Inf. Inf., Londrina, v.15, n.1, p.147-172, jan./jun.2010. DOI 10.5433/1981-8920.2010v15n1p147 GONÇALVES, Jonas Rodrigo; COSTA, Danilo; GONÇALVES, João Carlos. 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