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Crimes Contra o Sistema Finance - Bruno Queiroz Oliveira

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E
AGRADECIMENTOS
sta obra é fruto de estudos e do contato diário com temas
relacionados ao Direito Penal Econômico, seja o autor na qualidade
de advogado criminalista, causídico de instituição �nanceira (Caixa
Econômica Federal) e professor universitário, o que conduziu a se re�etir
sobre temas relevantes vinculados à teoria e prática, relacionados aos crimes
previstos nas Leis 7.492/85 e 6.385/76.
A escrita de uma obra jurídica requer um período de solidão e
introspecção, e, por isso, este livro é resultado de apoio de professores e
familiares, instituições, colegas e amigos.
Agradeço aos meus pais, Manoel de Sousa Oliveira (in memoriam) e
Maria Queiroz Oliveira, pelo incentivo constante na obtenção de
conhecimento.
Sou grato à minha esposa, Juliana Bastos Aires Fernandes Queiroz, por
todo apoio e compreensão durante o período de pesquisa e algumas
ausências. Reconhecido sou ao meu enteado, Leonardo Aires, e às minhas
�lhas, Maria Beatriz e Manoela, cujos sorrisos e alegrias são fontes
inesgotáveis de energia e motivação para enfrentamento dos desa�os diários
da vida.
Dirijo agradecimentos aos meus companheiros de estudos no Instituto
Nordeste de Direito Penal Econômico, entidade que tenho a honra de
presidir e que me permite contato com temas de alta indagação relacionados
aos crimes econômicos.
Aos meus colegas do Corpo Jurídico da Caixa Econômica Federal, que
me concedem o ensejo de debater e ampliar os conhecimentos em temas
conexos e, também, relevantes ao Direito Penal Econômico.
Aos confrades da Academia Cearense de Direito, em especial, ao
Presidente Roberto Victor Pereira Ribeiro, pelo apoio e auxílio na conclusão
desta obra.
Registro a ideia de que grande parte do ânimo em aprender decorre do
exercício do magistério. Assim, agradeço aos meus alunos de graduação e
pós-graduação, pois a convivência diária e a constante percepção de suas
di�culdades e dúvidas na absorção da matéria e na compreensão do
conteúdo transmitido foram e continuam sendo, com certeza, fator de
grande aprendizado na minha trajetória ao lecionar Direito Penal
Econômico.
Fortaleza/CE., 02/04/2023.
Bruno Queiroz Oliveira
E
PREFÁCIO
s un verdadero privilegio ser convocado a prologar una nueva obra
del reconocido especialista en Derecho Penal Económico Bruno
Queiroz Oliveira, polifacético nativo del Estado de Maranhao que
en su condición de Doctor en Derecho, Mestre, Professor (Unichristus),
Académico de la Academia de Derecho de Ceará, publicista, Procurador de
la Caixa Económica Federal y Abogado criminalista, encarna con las
mejores virtudes de la nueva generación de destacados penalistas brasileños
La obra que hoy el autor nos presenta, Crimenes contra el Sistema
Financiero, armoniza con �uidez ciertas virtudes que en pocas obras de su
tipo se ven convivir con tal nitidez: (a) una visión panorámica integral del
estado actual de la normativa del Derecho Penal Económico vigente en la
Unión; (b) una perspectiva razonablemente comprometida de esa normativa
y su praxis; (c) una tercera virtud-no menor: el lector atento descubrirá que
el texto admite dos niveles de lectura, por lo que será de utilidad tanto para
el estudiante avanzado como para el lector especializado; y (d) compromiso
mani�esto con la coherencia sistematica.
La obra analizada evidencia que la obra normativa no es mas que una
construccion humana pero paradojicamente no re�eja necesariamente una
proyeccion de nosostros mismos, sino que cobra una existencia propia.
Por el solo imperio de su concresion legislativa. Se trata de
imputaciones humanas cuyos valor es parcibido atraves de los sentidos. El
ser humano, e diferencia de otros seres vivos, es capaz de percibir cundo sus
acciones suponen un claro perjuicio para otros, no mucho mas. Los
ulteriores desarrollos de la responsabilidad son obra del permanente debate
sobre consrruccion dogmatica de la imputacion ejemplo el ambito de la
atribucion de sentidos.
Bien señana el Maestro napolitano Sergio Moccia que en materia de
responsabilidad penal es buena cosa por en duda la idea preconcebida de
que el instinto del legisdlador simprer cuida de buscar las mejores
soluciones para prevenir o reprimier la conducta que considera lesiva para la
sociedad.
El autor es conciente de ello, por ello trata cautamente de evitar las
grandes frases y las grandes aseveraciones En ocasiones pre�ere no alejarse
en exceso de la ortodoxia tamizada por el consenso madurado, mantenerse a
distancia y levantar la voz para conceder la palabra a la excepcion y / o la la
critica tecnica medida en terminos de coherencia dogmatica y sistematica,
antes aludida – el �nal del segundo parrafo – al resumir las virtudes de la
obra analizada.
Coincidimos con los renombrados Profesores Jesus Maria Silva
Sanchez y Pablo Sanchez-Ortiz respecto a que la actual doctrina penal sobre
la imputacion distingue enunciados descriptivos, prescriptivos y
adscriptivos.
Entendemos que con el termino impuitacion deberiamos aludir
unicamente al juicio en cuya virtud alguen es considerado como agente –
causa libera – de una accion (hacer-responsable) que se sustrae al universo
causal exterior, sinembargo hoy tenemos que convivir con la denominada
imputacion objetiva que se relaciona con el juicio sobre el conternido de
sentido de una accion, en otras palabras busca generar categorias necesarias
para a�rmar la existencia de una relacion su�ciente entre el resultado y la
conducta mas alla del actruar con causa libera.
E incluso la cultura jurididca angloamericana denomina imputacion al
juicio en virtud al cual se atribuye responsabilidad a determinada persona
en ausencia del elemento no concurrente, es decir: a pesar de que la persona
no haya realizado todos los elementos de la infraccion.
Actualmente un sector neo positivista de la doctrina retoma un
concepto cada dia mas ampio de la imputacion, redimensionando el
pensamiento comprensivo y no meramente descriptivo de la realidad. Para
ello recurren a nuevos patrones de ordenacionj sistematica, en el propio
concepto de sujeto – categorias clasicas e incluso en el modo de entender del
saber juridico. Hoy dia gran pare de la doctrina considera imputar como
sinonimo de “hacer responsable”.
Por su parte La Politica Criminal complica el equilibrio al sostener que
la actual globalizacion di�culta emitir juicio de imputacion (prueba del dolo,
difuminacion de la autoria, ampliacion de riesgo permitido, etc.).
En sintesis en estoss tiempos, lejos de reestringirse la atribucion de
responabilidad, se percibe una desmesurada ampliacion de la imputacion
individual que ha conducido a una innegable expansionm del Derecho
penal, principalmengte en el ambito de los delitos economicos-�nancieros
complejos.
Nosotros descartamos por principio estos cambios tan categóricos y
peligrosos. No es admisible que para contemplar lo adjetivo (di�cultades
probatorias) se termine por trastocar lo sustantivo (principios neuralgicos
del dogma garantista). Entendemos, en �n, que el derecho penal no debe ni
puede hacerse cargo de esas di�cultades probatorias, principalmente
teniendo en cuenta que estas pueden ser normalmente superadas mediante
una tipi�cación adecuada a un conocimiento también adecuado de los
mecanismos económicos involucrados (omographic Approach). En caso
de optarse �nalmente por el criterio de criminalizar manifestaciones de
macrodelincuencia económica organizada, esta tarea deberá y podrá
intentarse —en la mayor parte de los casos— sin violar esos principios básicos
del derecho penal. Para ello es imprescindible que el trabajo se emprenda con
suma prudencia y �na técnica legislativa, ya que en un sistema democrático
y liberal deben existir férreos límites al jus puniendi del Estado a la luz de los
principios de legalidad y culpabilidad de la persona humana. Estos
principios, nos recuerda Sergio Moccia, aparecen como irrenunciables
cualquiera sea la forma de delincuencia que se pretenda combatir. Ninguna
estrategia legal contra la macrodelincuencia será justi�cada si es una salida
de corte meramenteemergencial que pone en entredicho la seguridad
jurídica.
La tarea de elaborar leyes realmente útiles en materia de
macrodelincuencia económico-�nanciera, puede compararse a una
operación de microcirugía, donde se impone un mínimo de actividad con el
instrumento más preciso. Ocurre que lamentablemente la misión de legislar
en estas ramas tan delicadas se emprende siempre en forma apresurada,
respondiendo a reclamos populares frente a hechos puntuales o presiones
internacionales. Asimismo, ese cometido suele dejarse en manos de
personas sin la su�ciente especialización, que se atienen exclusivamente a
los síntomas del fenómeno sin comprender el funcionamiento inherente a
los mecanismos involucrados.
Los elementos constitutivos de los tipos penales y en particular los
mecanismos de imputacion se deben delinear cuidadosamente con “criterio
jurídico trascendente” (Severin-Moccia-Cervini) o sea, tomando en cuenta
todas las posibles consecuencias intradogmáticas de las nuevas creaciones
penales. Se trata de una tarea muy ardua pero no imposible. Lo más grave es
que la renuncia a ella signi�caría necesariamente la renuncia a los propios
principios que deben motivar esa misma tarea. Se estaría sustituyendo
automática y concomitantemente un derecho penal de legalidad por un
derecho penal de conveniencia: la hipotetica y evanecente razón de Estado
por sobre la razón jurídica.
Lamentablemente, en este campo se encuentra arraigada la injusti�cada
tendencia a confundir di�cultades técnicas con imposibilidad.
En suma, coincidimos plenamente con la postura criteriosa del
Professor Queiroz: la creación de esos tipos penales imprescindibles para la
persecución de los casos más gravosos de criminalidad económica �nancera
deberá promover también una re�exión responsable respecto de la
imputación penal en el marco del delito corporativo, principalmente en lo
relativo al entrecruzamiento de responsabilidades en los ilícitos
transnacionales. Personalmente nos inclinamos a pensar que el tema puede
dilucidarse satisfactoriamente empleando, en buena parte de los casos, los
recursos dogmáticos tradicionalmente transitados por la doctrina,
iluminados – ante su complejidad operativa – mediante una aproximacion
metodologica renovada como hoy dia ofrece con contrastada e�ciencia la
llamada aproximacion tomopgra�ca.
Fecha, Napoles 7 de abril de 2023
Raul Cervini
Catedratico Emerito de Derecho Penal – Dr/PHD/ DSP
Ex Director del Departamento de Derecho Penal de UCU y
Universidad de la Republica Uruguay
Vice presidente del Consejo Consultivo Internacional de ICEPS ( NY)
Acadêmico Coresponsal da Academia Cearense del Derecho
Pte Honorario de la REDE IBEROAMERICANA DE ADVOCACIA
CRIMINAL
SUMÁRIO
Capa
Folha de Rosto
Créditos
C A P Í T U L O 1 INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL
ECONÔMICO E AS DIRETRIZES CONCEITUAIS PARA A
CONSTITUCIONALIZAÇÃO PENAL
1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS
2 A SOCIEDADE DE RISCO COMO VETOR DE
INCREMENTO NA INTERVENÇÃO PENAL
3 GLOBALIZAÇÃO E AMPLIAÇÃO DO ESPECTRO
DO DIREITO PENAL
4 DIREITO PENAL CLÁSSICO E DIREITO PENAL
ECONÔMICO
clbr://internal.invalid/book/OEBPS/Text/capa.xhtml
5 BEM JURÍDICO INDIVIDUAL VERSUS BEM
JURÍDICO TRANSINDIVIDUAL
6 CARACTERÍSTICAS DA CRIMINALIDADE
ECONÔMICA
7 CONCEPÇÕES ACERCA DO DIREITO PENAL
ECONÔMICO
8 RELEVÂNCIA CONSTITUCIONAL DOS BENS
JURÍDICOS TUTELADOS PELO DIREITO PENAL
ECONÔMICO
C A P Í T U L O 2 O OBJETO DE TUTELA JURÍDICA NA
LEI 7.492/86
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ACERCA DOS CRIMES
CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL
2 BEM JURÍDICO TUTELADO
3 CONCEITO JURÍDICO DE INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA
3.1 BANCOS E CAIXAS ECONÔMICAS
3.2 CORRETORA DE CÂMBIO
3.3 FINTECHS
3.4 ADMINISTRADORAS DE CONSÓRCIO
3.5 COOPERATIVAS DE CRÉDITO
3.6 INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO
3.7 A CORRETORA E A DISTRIBUIDORA DE
TÍTULOS E DE VALORES MOBILIÁRIOS
3.8 BOLSAS DE VALORES
3.9 ADMINISTRADORAS DE CARTÃO DE
CRÉDITO E PIRÂMIDES FINANCEIRAS
C A P Í T U L O 3 A RESPONSABILIDADE PENAL NOS
CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL
1 RESPONSABILIDADE PENAL NOS CRIMES
PREVISTOS NA LEI 7.492/86
2 TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO E SUA
APLICAÇÃO AOS CRIMES PREVISTOS NA LEI
7.492/86
3 A DENÚNCIA GENÉRICA NOS CRIMES
FINANCEIROS
4 SUJEITO PASSIVO
5 JURISPRUDÊNCIA
C A P Í T U L O 4 O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE PENAL
NO ÂMBITO DOS CRIMES CONTRA O SISTEMA
FINANCEIRO NACIONAL
1 ESCORÇO HISTÓRICO DO PRINCÍPIO DA
LEGALIDADE PENAL
2 GARANTIAS INDIVIDUAIS DECORRENTES DO
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE PENAL
2.1 NULLUM CRIMEN NULLA POENA SINE
LEGE STRICTA
2.1.1 A BANALIZAÇÃO DO RECURSO ÀS
NORMAS PENAIS EM BRANCO E O
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE PENAL
2.2 NULLUM CRIMEN SINE PRAEVIA LEGE
2.3 NULLUM CRIMEN NULLA POENA SINE
LEGE CERTA
2.3.1 TAXATIVIDADE E ELEMENTO
NORMATIVO DO TIPO PENAL
2.4 NULLUM CRIMEN NULLA POENA SINE
LEGE SCRIPTA
C A P Í T U L O 5 CRIMES CONTRA O SISTEMA
FINANCEIRO NACIONAL
1 ART. 2º DA LEI 7.492/86 – FABRICAÇÃO OU
CIRCULAÇÃO IRREGULAR DE TÍTULO OU VALOR
MOBILIÁRIO
1.1 OBJETO JURÍDICO
1.2 SUJEITOS DO CRIME
1.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
1.4 PARÁGRAFO ÚNICO
1.5 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
1.6 PENA E AÇÃO PENAL
1.7 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
2 ART. 3º DA LEI 7.492/86 – DIVULGAÇÃO FALSA
DE INFORMAÇÃO SOBRE INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA
2.1 OBJETO JURÍDICO
2.2 SUJEITOS DO CRIME
2.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
2.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
2.5 PENA E AÇÃO PENAL
2.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
2.7 JURISPRUDÊNCIA
3 ART. 4º DA LEI 7.492/86 – GESTÃO
FRAUDULENTA DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
3.1 OBJETO JURÍDICO
3.2 SUJEITOS DO CRIME
3.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
3.4 VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
PENAL
3.5 O NÃO CUMPRIMENTO DE NORMA DE
CONFORMIDADE E A AUSÊNCIA DE
COMPLIANCE.
3.6 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
3.7 PENA E AÇÃO PENAL
3.8 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
3.9 JURISPRUDÊNCIA
4 ART. 4º DA LEI 7.492/86 – GESTÃO TEMERÁRIA
DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
4.1 OBJETO JURÍDICO
4.2 SUJEITOS DO CRIME
4.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
4.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
4.5 PENA E AÇÃO PENAL
4.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
4.7 JURISPRUDÊNCIA
5 ART. 5º DA LEI 7.492/86 – APROPRIAÇÃO OU
DESVIO DE BENS MÓVEIS E TRANSAÇÃO
DESAUTORIZADA
5.1 OBJETO JURÍDICO
5.2 SUJEITOS DO CRIME
5.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
5.4 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
5.5 PENA E AÇÃO PENAL
5.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
5.7 JURISPRUDÊNCIA
6 ART. 6º DA LEI 7.492/86 – OMISSÃO DE
INFORMAÇÕES
6.1 OBJETO JURÍDICO
6.2 SUJEITOS DO CRIME
6.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
6.4 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
6.5 PENA E AÇÃO PENAL
6.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
6.7 JURISPRUDÊNCIA
7 ART. 7º DA LEI 7.492/86 – TÍTULO OU VALORES
MOBILIÁRIOS FALSOS.
7.1 OBJETO JURÍDICO
7.2 SUJEITOS DO CRIME
7.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
7.4 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
7.5 PENA E AÇÃO PENAL
7.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
7.7 JURISPRUDÊNCIA
8 ART. 8º DA LEI 7.492/86 – COBRANÇA DE JUROS
OU COMISSÕES EXTORSIVOS
8.1 OBJETO JURÍDICO
8.2 SUJEITOS DO CRIME
8.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
8.4 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
8.5 DISTINÇÃO ENTRE O ARTIGO 8º DA LEI
7.492/86 E O CRIME E USURA PREVISTO NO
ARTIGO 4º, DA LEI 1.521/51
8.6 PENA E AÇÃO PENAL
8.7 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
8.8 JURISPRUDÊNCIA
9 ART. 9º DA LEI 7.492/86 – FALSIDADE
IDEOLÓGICA FINANCEIRA
9.1 OBJETO JURÍDICO
9.2 SUJEITOS DO CRIME
9.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
9.4 CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
9.5 PENA E AÇÃO PENAL
9.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
9.7 JURISPRUDÊNCIA
10 ART. 10 DA LEI 7.492/86 – FALSIDADE EM
DEMONSTRATIVOS CONTÁBEIS
10.1 OBJETO JURÍDICO
10.2 SUJEITOS DO CRIME
10.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
10.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
10.5 PENA E AÇÃO PENAL
10.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
10.7 JURISPRUDÊNCIA
11 ART. 11 DA LEI 7.492/86 – CONTABILIDADE
PARALELA
11.1 OBJETO JURÍDICO
11.2 SUJEITOS DO CRIME
11.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
11.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
11.5 PENA E AÇÃO PENAL
11.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
11.7 JURISPRUDÊNCIA
12 ART. 12 DA LEI 7.492/86 – SONEGAÇÃO DE
INFORMAÇÕES ÀS AUTORIDADES COMPETENTES
12.1 OBJETO JURÍDICO
12.2 SUJEITOS DO CRIME12.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
12.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
12.5 PENA E AÇÃO PENAL
12.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
12.7 JURISPRUDÊNCIA
13 ART. 13 DA LEI 7.492/86 – DESVIO DE BENS
13.1 OBJETO JURÍDICO
13.2 SUJEITOS DO CRIME
13.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
13.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
13.5 PENA E AÇÃO PENAL
13.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
13.7 JURISPRUDÊNCIA
14 ART. 14 DA LEI 7.492/86 – FALSIDADE EM
DECLARAÇÃO DE CRÉDITO OU RECLAMAÇÃO
14.1 OBJETO JURÍDICO
14.2 SUJEITOS DO CRIME
14.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
14.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
14.5 PENA E AÇÃO PENAL
14.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
14.7 JURISPRUDÊNCIA
15 ART. 15 DA LEI 7.492/86 – DECLARAÇÃO
FALSA DE INTERVENTOR, LIQUIDANTE OU
SÍNDICO
15.1 OBJETO JURÍDICO
15.2 SUJEITOS DO CRIME
15.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
15.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
15.5 PENA E AÇÃO PENAL
15.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
15.7 JURISPRUDÊNCIA
16 ART. 16 DA LEI 7.492/86 – OPERAÇÃO
DESAUTORIZADA DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
16.1 OBJETO JURÍDICO
16.2 SUJEITOS DO CRIME
16.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
16.4 DA INCOMPATIBILIDADE DOS ARTIGOS
4º E 16 DA LEI 7.492/86
16.5 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
16.6 PENA E AÇÃO PENAL
16.7 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
16.8 JURISPRUDÊNCIA
17 ART. 17 DA LEI 7.492/86 – CONCESSÃO ILEGAL
DE CRÉDITO OU ADIANTAMENTO
17.1 OBJETO JURÍDICO
17.2 SUJEITOS DO CRIME
17.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
17.4 PENA E AÇÃO PENAL
17.5 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
17.6 JURISPRUDÊNCIA
18 ART. 18 DA LEI 7.492/86 – VIOLAÇÃO DE
SIGILO
18.1 OBJETO JURÍDICO
18.2 SUJEITOS DO CRIME
18.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
18.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
18.5 PENA E AÇÃO PENAL
18.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
18.7 JURISPRUDÊNCIA
19 ART. 19 DA LEI 7.492/86 – OBTENÇÃO DE
EMPRÉSTIMO MEDIANTE FRAUDE
19.1 OBJETO JURÍDICO
19.2 SUJEITOS DO CRIME
19.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
19.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
19.5 PENA E AÇÃO PENAL
19.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
19.7 JURISPRUDÊNCIA
20 ART. 20 DA LEI 7.492/86 – DESVIO DE
FINALIDADE
20.1 OBJETO JURÍDICO
20.2 SUJEITOS DO CRIME
20.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
20.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
20.5 PENA E AÇÃO PENAL
20.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
20.7 JURISPRUDÊNCIA
21 ART. 21 DA LEI 7.492/86 – FALSA IDENTIDADE
EM OPERAÇÃO DE CÂMBIO
21.1 OBJETO JURÍDICO
21.2 SUJEITOS DO CRIME
21.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
21.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
21.5 PENA E AÇÃO PENAL
21.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
21.7 JURISPRUDÊNCIA
22. ART. 22 DA LEI 7.492/86 – EVASÃO DE DIVISAS
22.1 OBJETO JURÍDICO
22.2 SUJEITOS DO CRIME
22.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
22.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
22.5 DISTINÇÃO ENTRE OS DELITOS DE
“LAVAGEM” DE DINHEIRO E EVASÃO DE
DIVISAS
22.6 PENA E AÇÃO PENAL
22.7 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA.
22.8 JURISPRUDÊNCIA
23 ARTIGO 23 DA LEI 7.492/86 – PREVARICAÇÃO
FINANCEIRA
23.1 OBJETO JURÍDICO
23.2 SUJEITOS DO CRIME
23.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
23.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
23.5 PENA E AÇÃO PENAL
23.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
23.7 JURISPRUDÊNCIA
C A P Í T U L O 6 CRIMES CONTRA O MERCADO DE
CAPITAIS
1 MERCADO DE CAPITAIS
2 ARTIGO 27-C DA LEI 6.385/76 – MANIPULAÇÃO
DE MERCADO
2.1 BEM JURÍDICO
2.2 SUJEITOS DO CRIME
2.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
2.4 O RISCO PERMITIDO E O CRIME DE
MANIPULAÇÃO DE MERCADO
2.5 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
2.6 PENA E AÇÃO PENAL
2.7 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
2.8 JURISPRUDÊNCIA
3 ARTIGO 27-D DA LEI 6.385/76 – USO INDEVIDO
DE INFORMAÇÃO PRIVILEGIADA (INSIDER
TRADING)
3.1 BEM JURÍDICO
3.2 SUJEITOS DO CRIME
3.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
3.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
3.5 PENA E AÇÃO PENAL
3.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
3.7 JURISPRUDÊNCIA
4 ARTIGO 27-E DA LEI 6.385/76 – EXERCÍCIO
IRREGULAR DE CARGO, PROFISSÃO, ATIVIDADE
OU FUNÇÃO.
4.1 BEM JURÍDICO
4.2 SUJEITOS DO CRIME
4.3 TIPO OBJETIVO E SUBJETIVO
4.4 MOMENTO CONSUMATIVO E TENTATIVA
4.5 PENA E AÇÃO PENAL
4.6 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA
REFERÊNCIAS
O
C A P Í T U L O 1 INTRODUÇÃO AO
DIREITO PENAL ECONÔMICO E AS
DIRETRIZES CONCEITUAIS PARA A
CONSTITUCIONALIZAÇÃO PENAL
1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS
Direito Penal Econômico é relevante instrumento de proteção da ordem
econômica. Tal ramo do Direito Penal constitui sua importância e seu
desenvolvimento ditados pelo crescimento do progresso econômico,
tecnológico e social, e tem como objetivo o combate à criminalidade
decorrente das relações empresariais e a tutela de bens jurídicos
supraindividuais.
A intervenção do Direito Penal em temas relacionados à Economia
encontra antecedentes históricos no Direito Romano. Na época romana, por
exemplo, punia-se quem especulasse sobre os preços dos cereais ou
sonegasse impostos. Nesse período, o imperador Diocleciano estabelecia os
preços máximos de produtos e salários, punindo o descumprimento com
pena de morte.1
Na Idade Média, destacam-se os antecedentes do crime coletivo de
falsidade na Alemanha, que agrupava uma série de condutas ilícitas, bem
como a Constitutio Criminalis Carolina, considerada o primeiro esboço do
Direito Penal germânico. Durante a Idade Moderna, a intervenção criminal
em matéria econômica se estendeu a outras condutas, exceto no período da
ascensão das ideias liberais durante o século XIX.
A ideia de Direito Penal Econômico, no próprio sentido, só começa a
existir quando surge uma economia dirigida e centralizada, porque,
enquanto havia condições que con�aram aos operadores econômicos plena
liberdade para desenvolver as relações econômicas, o Estado não teve
interesse em interferir na manutenção da ordem econômica.
O grande desenvolvimento industrial proporcionado pela política
liberal conduziu à concentração de capitais por parte das empresas. Esse
novo contexto fez aclarar uma rivalidade entre os poderes privado e público.
Nessa passagem do capitalismo atomista para o de grupo, ocorrida em
meados do século XIX, vislumbra-se um germe do Direito Econômico.
Desse modo, o surgimento do Direito Penal Econômico com as
características mais atuais é relativamente recente e encontra seus
antecedentes em leis de proteção ao consumidor, aprovadas na Inglaterra, a
exemplo da Lei da Adulteração de Sementes e Saúde Pública, de 1890. 2
Na América do Norte, observaram-se manifestações legislativas
semelhantes. Em 1890, o Sherman Act, ainda em vigor, marcou o início do
sistema jurídico antitruste ianque, cujo objetivo fora controlar e estabelecer
uma gestão equitativa de atividades econômicas na área de defesa do
consumidor.3 A política intervencionista do Estado �cou patente com o
esforço de superação da queda da Bolsa de Valores de New York, de 1929.
Fruto da concentração de capitais e, sobretudo, da superprodução sem
correspondente demanda, o crash de 1929 explicitou a fragilidade da ordem
liberal, requereu uma atuação incisiva do Estado com políticas econômicas
protecionistas, bem como promoveu um agigantamento do aparato estatal
com aumento de gastos públicos.4
Na Europa, o reconhecimento da importância do fenômeno criminal
na esfera da economia ocorreu mais tarde. Historicamente, aponta-se como
o marco do surgimento do Direito Penal Econômico a Primeira Guerra
Mundial, acompanhada pelos diversos con�itos sociais e mobilização do
Estado para fortalecer a Economia devastada, que incumbiu ao Estado a
vestimenta de responsável pela captação de recursos, no modelo de
intervenção estatal, com a consequente queda do modelo liberal de
separação entre Direito, Economia, Estado e Sociedade. Desde esse
momento, o Legislador Penal preocupou-se em corrigir distorções do
sistema econômico. 5
Foi assim que, na Alemanha, comportamentos de acumulação e
práticas que restringiam a concorrência passaram a ser reprimidos em
tribunais criminais por intermédio da chamada Lei de Simpli�cação do
Direito Penal Econômico, introduzida em 1949 e que signi�cou a primeira
tentativa de separar do âmbito penal comum as chamadas contravenções à
ordem econômica.6
Já nos anos de 1970, em consequência do acelerado desenvolvimentodas economias europeias, foram reforçadas as medidas destinadas a proteger
a atividade econômica. Interessante é registrar o fato de que, na seara dos
crimes ditos tradicionais, nesse período, houve retrocesso na intervenção do
sistema penal (descriminalização da homossexualidade, adultério, sedução,
bem como a atenuação de outras �guras criminosas). No domínio do
Direito Penal Econômico, assistiu-se a um aumento progressivo das
condutas fraudulentas consideradas ilícitas nas legislações dos países
europeus. 7
A expansão do Direito Penal nas sociedades pós-industriais, a
arrecadação de tributos, a globalização, o avanço da sociedade, a troca
econômica, a movimentação �nanceira e o papel das cooperações
transnacionais in�uenciaram ainda mais o fortalecimento do Direito Penal
Econômico.
A evolução histórica da sociedade, especialmente após o período
entendido como Pós-Modernidade, trouxe uma série de novos riscos,
decorrentes do aperfeiçoamento das relações econômicas e do incremento
tecnológico desenfreado. Tais riscos, certamente, representaram a criação de
enormes con�itos e, por consequência, submeteram a xeque o Direito Penal
clássico, acarretando nova análise dogmático-penal ante essas novas
necessidades. 8
Não se olvida do surgimento dos blocos econômicos com o escopo de
fortalecimento do poder econômico dos Países-Membros, que resultou, na
Europa, na formação da União Europeia, inclusive com moeda própria. A
evolução histórica do Direito Penal Econômico na esfera mundial é
constantemente assinalada pela in�uência da UE, que, embora não legisle
em matéria penal, exerce ação manifesta nessa seara, tanto negativa como
positivamente. O in�uxo negativo manifesta-se, principalmente, por meio
da concretização excessiva de normas penais em branco, enquanto o de
ordem positiva vem da capacidade de in�uenciar os poderes legislativos do
Estados-Membros, a �m de criar ou modi�car os regulamentos vigentes de
acordo com as novas demandas.
2 A SOCIEDADE DE RISCO COMO VETOR DE
INCREMENTO NA INTERVENÇÃO PENAL
Após o �m da Segunda Guerra Mundial, impende assinalar que houve
extraordinária revolução no modelo de produção capitalista, porquanto
novas técnicas de produção foram incorporadas à sociedade pós-industrial.
Por outro lado, o desenvolvimento da robótica e das telecomunicações, bem
como o surgimento da internet, são alguns exemplos que alteraram
signi�cativamente o modo como o Homo sapiens modi�cou sua interação
com o Planeta.
Consoante Nicolau Sevcenko, o que distinguiu particularmente o
século XX, em comparação com qualquer outro período, foi uma tendência
contínua e acelerada de mudança tecnológica, com efeitos multiplicativos e
revolucionários sobre praticamente todos os campos da experiência humana
e em todos os âmbitos da vida no Planeta. Esse surto de transformações
constantes é passível de ser dividido em dois períodos básicos, intercalados
pela irrupção e pelo transcurso da Segunda Guerra Mundial. Na primeira
dessas fases, prevaleceu um padrão industrial que representava o
desdobramento das características introduzidas pela Revolução Cientí�co-
Tecnológica de �ns de século XIX. O segundo intervalo, iniciado após a
Guerra, foi assinalado pela intensi�cação das mudanças, imprimindo à base
tecnológica um choque revelado, sobretudo, pelo crescimento dos setores de
serviços, comunicações e informações, o que o conduziu a ser caracterizado
como período pós-industrial. Para se representar a amplitude e densidade
dessas mudanças tecnológicas, consideram-se alguns dados relativos ao
século XX. Caso fossem somadas todas as descobertas cientí�cas, invenções
e inovações técnicas, desde as origens da espécie até hoje, chegar-se-ia à
espantosa conclusão de que mais de 80% de todas elas se deram nos últimos
cem anos.9
O con�ito central de interesses sociais, por sua vez, está vivo
hodiernamente, cada vez com maior frequência ante aspectos de tolerância e
controle dos riscos. Nessa contextura, uma das indagações fundamentais
para a política e a administração nos dias atuais é a seguinte: de que maneira
são suscetíveis de ser evitados ou minimizados os riscos e ameaças
produzidos sistematicamente nos processos de modernização, especialmente
onde surgem como efeitos colaterais latentes e distribuídos de tal sorte que
não impeçam a modernização, ou que sejam adaptados no âmbito do
exigível, em termos ecológicos, médicos, sociais e psicológicos?
Beck assinala que, na Modernidade avançada, a constituição social da
riqueza se manifesta acompanhada, sistematicamente, pela produção social
dos riscos. Os perigos dessa modernização, por sua vez, são um big business.
Assevera, ainda, que são os riscos da civilização um conjunto necessidades
in�nitas. Certamente o incremento dos riscos do desenvolvimento
industrial e tecnológico, adicionado a fatores como o aumento populacional
e a massi�cação do consumo, dá ensejo à criação de “situações sociais de
perigo”, expondo à ameaça os bens jurídicos relevantes, quando não os
lesionando de modo irreparável, sobretudo em se tratando de bens jurídicos,
como o ambiente e a saúde pública.10
Em verdade, jamais a sociedade viveu um período de tal modo seguro;
porém, sob conjuntura semelhante, em tempo algum, a humanidade se
achou tão ameaçada por elementos diversos, tais como guerras, fome,
ataques terroristas, acidentes nucleares e crises de ordem �nanceira. 11
Uma espécie de irresponsabilidade organizada dessa sociedade de risco
a deixa impotente para agir de maneira dissuasória, mormente no que se
refere aos novos perigos, especialmente a possiblidade de autodestruição.
Merece registro, ainda, o modo como a sociedade atual admite o surgimento
desses riscos, todavia, a igual tempo, as instituições tentam esconder suas
origens e impedir modalidades de compensação e controle. 12
Zygmunt Bauman esclarece que os riscos são produzidos pelas pessoas,
ainda que sejam inesperados e, em alguns casos, seja impossível prevê-los ou
calculá-los. Isto ocorre porque, quando se faz alguma coisa, tende-se à
concentração na tarefa imediata, enquanto as mudanças que se introduzem
no equilíbrio da natureza e da sociedade, ao levarem a cabo a tarefa em
causa, produzem consequências de largo alcance: os seus efeitos remotos
ricocheteiam sobre as pessoas como novos perigos, mais problemas e, por
consequente, novéis tarefas. O que torna essa crise deprimente quase
catastró�ca é, todavia, o fato de a escala de mudanças que inadvertidamente
a sociedade provoca ser tão maciça, que a linha para lá da qual os riscos se
tornam absolutamente incontroláveis e os estragos irreparáveis é passível de
ser transposta a qualquer momento. Atualmente, é possível avaliar os
perigos das alterações climáticas causadas pela poluição ou a degradação dos
solos e das reservas de água causada pelos fertilizantes e inseticidas cada vez
mais especializados.13
A quadra �uente demonstra que seria uma grande utopia qualquer
tentativa de abolição dos riscos; no entanto, há que se avaliar a hipótese do
risco aceitável, de modo a determinar o limiar daquilo que não deve ser
ultrapassado. Impõe-se, in hoc sensu, um conjunto de ações preventivas
baseadas no acordo entre as pessoas por intermédio da troca de informações
ao nível de uma política pública de caráter globalizado. Assim, o risco
decorrente de fenômenos naturais deve ser objeto de avaliação pelo Poder
Público, uma vez que o interesse subjetivo dos cidadãos se confunde com os
proveitos de ordem geral.
Por certo, os perigos a que a sociedade está submetida chegam a todos,
até mesmo àqueles que, no primeiro momento, bene�ciam-se desses riscos,
ou seja, os próprios protagonistas dessa modernização restam envolvidos
nesse redemoinho de perigos por intermédio de uma espécie de efeito
bumerangue. De outra vertente, o fato de a sociedade moderna caracterizar
uma sociedade de risco não signi�ca que, no passado, não havia riscos de
grande monta. Na verdade, nos dias atuais, existe uma modalidade diferente
de percepção dos riscos, e, também, cursa uma relação distintacom a ideia
de perigo, a qual confere uma nova missão ao Direito Penal e aos discursos
jurídicos de modo geral, vale dizer, a consolidação do modelo de produção
econômica sobre a dinâmica daquilo que é inédito, do desenvolvimento
cientí�co em fase por demais avançada que transforma a noção de risco, até
então acessória e super�cial, em um elemento essencial no contexto da
organização da sociedade, de modo que a nova função do risco constitui o
vetor em relação ao qual se orientam os mais relevantes mecanismos de
interação social.14
Com o passar dos séculos, houve a constatação cientí�ca de que as
relações naturais não se orientam por uma dinâmica causal de caráter
estável. Assim, não é admissível uma teoria de conhecimentos absolutos em
matéria de nexo de causalidade, na medida em que nem mesmo as
modernas teorias da Física Quântica conseguem estabelecer qualquer
regularidade entre causas e efeitos da natureza, conforme pretendido pelos
positivistas. O perigo abandona a esfera eminentemente subjetiva e passa a
conduzir uma realidade objetiva, preenchida a probabilidade fática da
ocorrência da lesão ou do dano que pretende evitar. O risco, portanto, é uma
situação de fato, um dado natural, em decorrência do contexto de crise em
que se apõe um bem valorado. O perigo se quali�ca com teor real, exterior à
pessoa humana e, por isso mesmo, ante essa nova realidade, será
quanti�cado.15
Maria Luísa Lima apadrinha a opinião de que nem todas as ameaças
têm, para os cidadãos, o mesmo sentido inaceitável e potencialmente
mobilizador da opinião pública. Para ela, o risco que se associa a um
conjunto muito vasto de tecnologias e atividades não se relaciona,
diretamente, com o número de mortes que provoca, mas com dimensões
qualitativas, a exemplo do caráter devastador (se é incontrolável, se
representa um perigo para as gerações futuras) ou do grau de
conhecimentos sobre o caráter desse risco (se é um risco novo, se é
conhecido para a ciência ou se suas consequências são visíveis). Desse
modo, riscos percebidos como desconhecidos e de consequências drásticas
são analisados como particularmente inaceitáveis, não obstante terem sido
causa de morte de um número muito menor de pessoas do que em relação a
outros riscos menos temidos, como os relativos aos acidentes de
automóveis.16
Não obstante a corrente que minimiza a abrangência do discurso
referente aos riscos da Modernidade, o certo é que o risco, especialmente no
século XXI, deixa de ser um aspecto periférico da organização em sociedade
para assumir um papel nuclear relacionado à própria natureza da atividade
humana, do homem. Se no passado o risco se vinculava a elementos de
caráter externo, sem a possibilidade de gerenciamento por intermédio da
elaboração de certas diretrizes direcionadas ao comportamento humano,
pois este não se caracteriza como agente da produção desses riscos, na
quadra atual, esse risco é criado pela organização social, valet loquentes, e
tem relação direta com a atividade desenvolvida pelo ser humano.
Efetivamente, pois, o que tinha caráter externo passa a ser interno e os riscos
se tornam um referencial político.17
A periculosidade produzida pelo comportamento humano tende a ser
objeto de decisões políticas e da elaboração de normas jurídicas em função
desses fatores, dando azo à criação de sanções para os comportamentos que
se demonstrem de maior periculosidade ou fora dos indicadores apontados
pelo Poder Público. Exatamente nessa contextura, a�ora a abertura de
espaço para atuação do Direito Penal Econômico com o desiderato de
incidir sobre as condutas arriscadas, especialmente em cima dos
comportamentos humanos que, de modo signi�cativo, submetam a perigo
os bens jurídicos de interesse fundamental para o bem comum.
3 GLOBALIZAÇÃO E AMPLIAÇÃO DO ESPECTRO DO
DIREITO PENAL
A globalização é um fenômeno relativamente novo, inacabado e em
moto continuo de transformação, de modo não homogêneo e que afeta
desigualmente fatores tais como Economia, Cultura, Política, Direito e
outros. Desse modo, a sua realização conceitual não é pací�ca. Mercado
Pacheco distingue o entendimento sobre duas correntes acerca da
globalização: na primeira abordagem, a globalização é a expansão da
economia e, principalmente, das tecnologias, uma fase de expansão geral de
mercado para todos os países e regiões do Globo, uma tendência para a
economia mundial, indústria internacional, modalidades de comunicação
universais, democracia integral e, de maneira total, uma aproximação
bastante positiva entre globalização e desenvolvimento como elementos de
um mesmo processo. Numa versão mais pessimista, in alia manu, isto
signi�ca a concentração dos benefícios deste processo, que produz
acumulação e se estende, aumentando o fosso entre ricos e pobres, entre as
sociedades de abundância no Norte e marginalização absoluta do Sul.18
A ideia-chave da globalização fundamenta-se na consagração de um
mercado no plano mundial, disciplinado por via de regras próprias e que
dispõe de uma força gigante de dominação. Para o atendimento a essa força
de caráter mundial, já fora proposta até mesmo a exclusão de toda e
qualquer modalidade de protecionismo nacional. Assim, o que tem maior
relevância já não é o Estado-Nação, mas sim o conjunto de empresas
multinacionais atuantes como incentivadoras do mercado globalizado.
Conquanto, no plano do discurso, a�rme-se a soberania dos Estados no
limite de suas fronteiras nacionais, o certo é que já não existem ambientes
geogra�camente fechados. Além disso, notam-se muitas políticas estatais,
�nanceiras, monetárias e referentes ao meio ambiente, as quais possuem
seus centros de decisão fora dos estados para se concentrar nas grandes
empresas de atuação mundial.
Sobre a nova con�guração do capitalismo, Bauman explica que, em seu
estádio pesado, o capital estava tão �xado ao solo quanto os trabalhadores
que empregava. Hoje o capital viaja leve, apenas com bagagem de mão, que
inclui nada mais do que pasta, aparelho celular e computador portátil. É
capaz de saltar em qualquer ponto do caminho e não precisa se demorar em
nenhum lugar além do tempo que durar sua satisfação. O trabalho, porém,
permanece tão imobilizado quanto no passado, mas o lugar em que ele
imaginava estar �xado de uma vez por todas perdeu a solidez de outrora; à
demanda de rochas, as âncoras encontram areias movediças.19
De um jeito ou de outro, tal como se expressa, a globalização parece se
exibir como fenômeno irreversível. Nessa perspectiva, Beck lança outros
elementos, os quais há que se ter em conta: a) o alargamento do campo
geográ�co e a crescente densidade do câmbio internacional, assim com o
caráter global da rede de mercado �nanceiro e o poder crescente das
empresas multinacionais; b) a gigantesca revolução em matéria de
informação e das tecnologias de informação; c) a exigência, universalmente
aceita, do reconhecimento dos direitos humanos; d) a pobreza mundial; e)
os danos e atentados ao meio ambiente; e f) os con�itos transculturais e o
espectro cada vez maior da política internacional. Em relação a essas
coordenadas, Beck acentua que a globalização resultará na rami�cação,
densidade e estabilidade de suas redes de relacionamento regionais-globais e
na autode�nição dos meios de comunicação, assim como dos espaços social,
político, militar e econômico.20
Em relação ao Direito Penal, a globalização também produz efeitos
consistentes. Impende destacar, ab initio, a noção de que a globalização,
como fenômeno essencialmente econômico, também resulta na
mundialização de determinadas espécies delitivas, situação que demanda
uma resposta ao crime também transnacionalmente, sob pena de restar
fracassada a estratégia no combate a esse tipo de criminalidade.21
De outra parte, a globalização, fatalmente, não permitirá a aplicação de
uma política criminal unitária coerente e justa, visto que a atuação penal em
relação aos ilícitos ambientais, a exploração de menores ou o trá�co de
armas e drogas não deve ser igual em relação aos países desenvolvidos e
nações maispobres, no contexto global. Impõe-se evidenciar o fato de que,
dentro da própria União Europeia, existem di�culdades graves para a
implantação de um Direito Penal comunitário e que avança com grande
lentidão, mais no rumo da cooperação do que no que concerne a uma
efetiva uni�cação.
Ainda no que se refere aos novos formatos de criminalidade, sem
fronteiras geográ�cas e para as quais di�cilmente é possível se recorrer a
algum tipo de controle estatal, é azado asseverar que, ante a inexistência de
um Estado Mundial ou de organismos internacionais su�cientemente
robustos que exercitem a persecução criminal em relação aos crimes
transnacionais, os controles de caráter penal dos Estados-Nações,
enfraquecidos pelo poder econômico global, mostram-se incapazes no
sentido de combater com efetividade essa nova dimensão da criminalidade,
em áreas diversas. Tais delitos abarcam amplo espectro de comportamentos
lesivos, que incluem, em ultrapasse às transgressões de cariz �nanceiro, os
crimes relacionados à tecnologia da informática, as infrações ambientais, o
trá�co internacional de drogas, a evasão �scal, a espionagem industrial,
dentre outros. Essas con�gurações recentes de criminalidade não
demandam a ação isolada de uma ou poucas pessoas, ou mesmo de um
grupo bem caracterizado, tornando muito difícil a desarticulação dessas
organizações criminosas. De efeito, a teia criminosa que se estabelece para a
obtenção de lucros ilimitadamente não é elaborada de modo amadorístico,
mas sim num projeto racionalmente formulado que possua uma
organização de sobejo hierarquizada e com alto nível de especialização de
funções.22
Embora ainda de maneira incipiente, os instrumentos de combate a
essas novas conformações de criminalidade são articulados de maneira
conjunta pelos organismos internacionais, numa perspectiva de utilização
preventiva do Direito Penal e de persecução orquestrada das condutas
criminais como tentame de se estabelecer uma coesão intrassistêmica. Essa
atuação concernente ao combate internacional do crime segue um ritual
determinado, quando procedida por essas agências internacionais, por
intermédio da elaboração e aprovação dos planos globais de ação, com o
escopo de estabelecer uma coordenação na condução dessas ações.
A aprovação desses instrumentos, em geral, privilegia o enfoque
essencialmente punitivo para o problema com a concentração na
harmonização das normas de criminalização e na instituição de convênios
para a cooperação na fase de investigação e persecução criminal, vale dizer,
praticamente não existe um foco na questão no aspecto preventivo dos
delitos ou mesmo no tratamento dos agentes desse tipo de delinquência.23
A realidade, portanto, é no sentido do crescimento dos esforços para
um aumento da integração da legislação penal com maximização das
iniciativas de cooperação internacional e consequente esvaziamento do
princípio da territorialidade, tudo no afã de permitir a formulação do
processo transnacional de integração jurídica, seja no aspecto judicial
propriamente dito, ou no âmbito da legislação criminal.
Também merece registro, no que se relaciona ao segmento Globalização
e Direito Penal, o fato de que essa globalização econômica é conducente a
inconsistências extremadas, ou seja, por um lado, as ambições de caráter
expansionista de uma legislação criminal, que serve aos interesses das novas
formulações de mercado, e, de outra banda, em sentido diametralmente
oposto, um esvaziamento do conteúdo das regras punitivas penais.24
O primeiro caso diz respeito aos programas e in�uxos políticos e
econômicos da globalização, no senso de usar a legislação criminal
transposta a sua função primária de proteger os interesses essenciais com
evidente quebra das garantias inerentes ao Estado Social e Democrático de
Direito e consequente criminalização excessiva de determinadas condutas,
aliado ao crescimento irre�etido das consequências delas derivadas.25 O
segundo outro, contrario sensu, mostra a globalização como fator de
incidência, visando a descriminalizar comportamentos. Signi�ca,
fundamentalmente, in aliis verbis, a adoção de políticas econômicas para
fornecer ao Direito Penal uma função minimalista que transcenda o próprio
princípio da intervenção mínima para situá-lo em coordenadas de inibição
conducentes a uma efetiva desregulação penal.26
Em matéria de expansão do Direito Penal, é inegável que o fenômeno
da globalização funciona como um motor que a acelera em ritmo intenso. A
realidade que ora �ui é de criminalização de novas condutas, exacerbação
das sanções penais dos tipos punitivos já em vigor, relativização das
garantias penais e processuais previstas nas constituições, com o emprego
cada vez mais crescente de conceitos jurídicos indeterminados na
elaboração dos tipos penais e com grave desapego ao Princípio da
Legalidade Penal.
Essa tendência fora devidamente apontada com a identi�cação de
algumas características decorrentes da in�uência da sociedade de risco e da
globalização, ou seja: 1) instrumentalização do Direito Penal; 2) excessiva
antecipação da tutela penal de caráter preventivo; 3) aumento exacerbado
das penas; 4) �exibilização das garantias penais e processuais; 5) fenômeno
da explosão carcerária; 6) aumento da utilização dos instrumentos de
colaboração com a Justiça, a exemplo da delação premiada. Tal situação
tende, ainda, a aumentar as estatísticas no que tange aos delitos de
exploração e trá�co de pessoas, além das situações de xenofobia e dos
crimes de racismo.27
A globalização, indiscutivelmente, reduz consideravelmente as
distâncias geográ�cas e os valores que orientam as sociedades do Planeta e,
em decorrência do esvaziamento do Estado-Nação, o Direito Penal aufere
ressalto por intermédio da missão de proteger os interesses comuns das
comunidades internacionais. De outra vertente, é indispensável considerar
que o Direito Penal é bastante incompatível em relação à dinâmica da
globalização, pois funciona tradicionalmente como manifestação autêntica
da soberania dos Estados, daí por que esse ramalho do Direito Público não
se compatibiliza celeremente à tendência de expansão que parece funcionar
como ponto nodal da dinâmica econômica que funciona como vetor do
processo impulsionado pelo mercado global.
Malgrado as mudanças pelas quais transita o Direito Penal, também
não se mostra bem formatada a existência de uma justiça penal globalizada,
isto porque ainda são muitas as di�culdades no atingimento desse objetivo
como unidade real e operacional, seja no âmbito interestatal, seja no
concerto dos Estados-Nações. A própria União Europeia, que possui
estruturas de coordenação bastante alinhadas em comparação aos outros
blocos de países, ainda exerce apenas uma espécie de in�uência comunitária
nos ordenamentos nacionais, pois as medidas coercitivas desta possuem,
essencialmente, caráter administrativo, o que, sem dúvida, já representa um
relevante compartilhamento de valores e interesses comuns, mas que precisa
avançar bastante.28
Essa di�culdade, com vistas a promover a integração de normas de
caráter penal em relação à União Europeia, sucede, em grande parte, em
razão do dé�ce democrático que esse tipo de bloco representa, na medida
em que os países, em sua maioria, são representados por ministros de
Estado. A criação da norma penal, por sua vez, depende da chancela do
Poder Legislativo, em razão do Princípio da Legalidade, contudo os tratados
da União Europeia não autorizam a transferência da persecução criminal e
do jus puniendi, além do que os seus órgãos não possuem competência
legislativa, tampouco poder para imposição de sanções penais.29
Não se negam o surgimento recente dos bens jurídicos decorrentes da
sociedade de risco e da globalização assim como a existência de elementos
novos para se questionar os limites do Direito Penal clássico ante a realidade
atual sobradamente complexa, que demanda uma e�caz atuação para tutela
desses interesses, mas se questiona o modo como a legislação penal avança
na quadra atual, em descompasso relativo aoseu caráter subsidiário e de
intervenção mínima. Eis o desa�o do Direito Penal Econômico no Século
XXI.
4 DIREITO PENAL CLÁSSICO E DIREITO PENAL
ECONÔMICO
As profundas alterações veri�cadas no concerto mundial e que se
intensi�caram demasiadamente com o surgimento do movimento de
globalização chocaram, irreversivelmente, o curso da Ciência Penal, haja
vista o contexto da sociedade de risco e o surgimento de mais bens jurídicos
a serem e�cazmente tutelados.
A realidade demonstra que o Direito Penal, recorrentemente, é incapaz
de atender satisfatoriamente a esses novos desa�os decorrentes da sociedade
pós-moderna, uma vez que a legislação penal se revela desprovida de
e�cácia social perene e, raramente, atinge o êxito na redução dos índices de
criminalidade, tampouco é capaz de proteger os bens jurídicos de caráter
metaindividual. In hoc sensu, o Direito Penal que pretende tudo tutelar, de
fato, muito pouco logra defender. Todo esse quadro desencadeia a
deslegitimação do Direito Penal, com o resultante aumento da sensação de
insegurança e que, por via de ricochete, dá ensanchas ao próprio fenômeno
da expansão do Direito Penal, num fenômeno vicioso e autofágico.30 O
Direito Penal clássico não é su�ciente para enfrentar, com e�ciência, os
novos con�itos decorrentes dessa sociedade do risco, fato que impulsionou o
surgimento de movimentos de expansão do Direito Penal.
Como instrumento para agravar essa realidade, merece destaque o
descompasso bem caracterizado da dogmática jurídica tradicional, cuja
origem remonta ao século XVIII, em relação aos novos problemas
decorrentes da sociedade pós-moderna. Em tais circunstâncias, há que ser
ressaltado o fato de que o Direito Penal clássico fora estruturado para a
tutela de bens jurídicos, de titularidade determinada e sua lógica
vocacionada para o combate de uma criminalidade individual, que, por sua
vez, demonstre autores e vítimas bem delineados. Nesta senda, exprime-se
insatisfatório para lidar com os novos desa�os decorrentes do contexto de
risco e da criminalidade difusa. Em resumo, a realidade, também, é de
vinculação do legislador e dos operadores do Direito a instrumentos
dogmáticos anacrônicos que funcionam, muita vez, apenas como
manifestação simbólica das normas incriminadoras, o que acarreta, na
prática, verdadeira deslegitimação da intervenção penal.31
A inicial dualidade entre Direito Penal Clássico versus Direito Penal
Econômico consiste na função exercida por ambos, porquanto são modelos
de conciliação difícil e na medida em que o Direito Penal Econômico teria
sua linha de atuação vocacionada essencialmente para a prevenção. Assim,
não se expressa passível de ocorrência a harmonização do Direito Penal
clássico com foco para a prevenção geral, sem abrir mão do Princípio da
Intervenção Mínima. O Direito Penal clássico surgiu em contraposição ao
Direito Natural, com a incumbência de limitar sua aplicação às �nalidades
da pena e garantir o banimento da tortura, tudo num contexto de
vinculação do legislador aos bens jurídicos penais. O seu foco de atuação
consiste fundamentalmente, na proteção das liberdades asseguradas no
contrato social, numa perspectiva de que tão somente essas lesões poderiam
ser tratadas como fatos criminosos.32
O pensamento de Cesare Beccaria possui relevante signi�cado para a
Política Criminal e a Criminologia, funcionando como base para a
constituição do Direito Penal Clássico inclinado pela ideia liberal do
estabelecimento de um sistema de garantias ante o arbítrio estatal, o qual
estabelece a imprescindível legitimidade para esse ramo jurídico.33
O Direito Penal moderno, a seu turno, teria como principal foco de
atuação a tutela dos bens jurídicos metaindividuais, numa perspectiva de
prevenção e orientação às consequências, prescindindo de conceitos
metafísicos e de modo a privilegiar uma metodologia empírica. Em razão
disso, tende essencialmente a uma perspectiva teórica mais preventiva do
que retributiva, ao mesmo tempo em que prima por vincular as decisões do
legislador aos paradigmas de proteção dos bens jurídicos.
Na conceição de Albrecht, o Direito Penal Econômico é fruto da
retração da responsabilidade política por intermédio do reducionismo das
situações sociais problemáticas a um contexto de caráter individual,
caracterizado, sobretudo, pela ausência de laços de solidarismo, elevada
desigualdade de renda e de riqueza em todo o Planeta, bem assim pelo
desenvolvimento de políticas con�ituosas que conduzem a uma
criminalidade imoderadamente violenta, transposta ao desenvolvimento
cientí�co tendente a riscos incalculáveis.34
De tal maneira, recolhe mais força a ideia generalizada de que somente
haverá ordem em uma sociedade com a elaboração de leis rigorosas e com a
certeza de que, uma vez violada a norma, os mecanismos criminais atuarão
rigorosamente com o objetivo de segregar o delinquente. Demais disso,
somente o Direito Penal possui o rigor necessário, aos olhos da população,
para atingir esse objetivo, pois somente este ramo do Direito público está
habilitado a afastar esse cidadão da sociedade por um determinado período.
Prittwitz assevera, por sua vez, que o Direito Penal, cujo per�l se
alterou, e até mesmo se deformou sob o peso das tarefas que lhe foram
atribuídas, nada ou quase nada tem a indicar como fato de sucesso ou
mesmo prognósticos plausíveis ao sucesso. O autor complementa ao
exprimir que os problemas urgentes da sociedade moderna, e em muitos
aspectos em rápida evolução, na verdade, permanecem sem solução em
consequência de terem sido transferidos excessivamente para a esfera do
Direito Penal. Em algumas situações, há até que se temer efeitos colaterais
contraproducentes pelo emprego da intervenção penal.35
Efetivamente, o Direito Penal Econômico é uma especialização do
Direito Penal, caracterizado: a) por mobilidade, �exibilidade,
“revisibilidade” e pela maleabilidade, oriundas de seu estreito
relacionamento com o Direito Econômico; b) pelo escopo tutelar à política
econômica; e c) por suas tipi�cações que expressam o conteúdo econômico
peculiar de suas preocupações, disposições e normas. 36
Uma vez a�rmada a existência do Direito Penal Econômico e
estabelecida sua natureza de especialização do Direito Penal, deve ser ele
entendido como o sub-ramo do Direito Penal incumbido de tutelar a
política econômica estatal, por isso dotado de normas de teor econômico
especí�co e caracterizado pela mobilidade, �exibilidade, “revisibilidade” e
maleabilidade das condutas que tipi�ca.37
É necessário ressaltar que a opção entre Direito Penal Tradicional e
Direito Penal Econômico representa uma escolha de política criminal por
parte do legislador. Assim, desde a preferência por uma política ou por
outra, será possível manter alguma coerência em relação às críticas para
adoção ou reproche de cada um.
5 BEM JURÍDICO INDIVIDUAL VERSUS BEM JURÍDICO
TRANSINDIVIDUAL
Haja vista a perspectiva de evolução dos fatos sociais, o ordenamento
jurídico avança frequentemente para acolher outra gama de direitos,
especialmente de modo a afastar a ideia, atualmente obsoleta, de
reconhecimento apenas dos bens ou interesses suscetíveis de apropriação de
caráter individual. Nessa dinâmica, a transição da ideia do Estado de Direito
Formal rumo ao Estado de Direito Material consagrou o acolhimento de
novas ordens de valores, visando a permitir a classi�cação dos direitos em
dimensões ou gerações. De parte diversa, as alterações decorrentes do
contexto pós-industrial, com a consequente produção em massa,
surgimento de realidades tecnológicas, relações intersubjetivas modi�cadas,
manipulação genética e maximização dos riscos globais, concedem azo à
necessidade de uma atuação diferenciada sob o prisma jurídico para o
tratamento desses novos aspectos.
O Direito Penal, sob o argumento histórico, assomou como mecanismo
especí�co de combate à criminalidade praticada pelos pobres,
permanecendo assim durante sua existência, ainda que tenha avançado o
escopo de eliminar a pena de tortura e os açoites públicos tão comunsno
decurso do Medievo.38 A razão dessa característica consiste no fato de que a
proteção de propriedade privada �gurava como ponto nodal da intervenção
penal, tendo como consequência o direcionamento da população mais
pobre como principal cliente desse tipo de atuação do Estado, status quo
perdurante até os dias atuais.
O ponto a ser discutido é justamente se se deve prosseguir com a
atuação em pleno século XXI, com as categorias valorativas características
do início do século XVIII, ou se a Ciência Penal há de avançar com vistas a
estender a tutela a outras categorias de bens e interesses, atualmente,
devidamente reconhecidos no plano constitucional. No Direito Penal, a
existência do bem jurídico de natureza transindividual já era reconhecida
pela doutrina desde as origens do conceito de bem jurídico penal.
Desde meados do século XX, a geração atual é ao mesmo tempo
protagonista e espectadora da Revolução Tecnológica, capaz de promover o
progresso ascendente da microeletrônica, das telecomunicações e da
informática. Essa crescente evolução tecnológica fomentou e fortaleceu,
sobremaneira, o mercado capitalista global, ao ponto de tornar-se a
convivência com novas tecnologias algo corriqueiro na contextura da
sociedade moderna e, ao mesmo tempo, permitiu transformações que
impuseram uma nova ordem social, de abrangência não apenas no contexto
econômico, mas também em todos os aspectos sociais, produzindo
transformações que atingem desde o contexto político ao jurídico.39
De tal sorte, é compreensível o surgimento dos denominados direitos
de terceira dimensão, providos por uma abrangência que não se limita
somente aos contornos individuais ou mesmo coletivos. Emergem da
re�exão sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio
ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade.40 Com
efeito, con�guram-se os direitos metaindividuais, portadores de alta
complexidade na sua identi�cação, porquanto, ante a impossibilidade de
delimitação em contornos de�nidos, seu reconhecimento advém da atual
conceição de sociedade de massa, não possuindo titular certo, tampouco
objeto divisível, mas sempre ao bem-estar.
A intervenção do Direito Penal, com o intento de proteger bens
jurídicos transindividuais, transporta a preocupação com o futuro desse
ramo do Direito Público, pois lhe atribui a função de prevenção de riscos
imagináveis, porém sem real concretização. A Constituição Federal de 1988
reconhece explicitamente a existência de interesses difusos e coletivos
diversos, como, exempli gratia, a defesa do meio ambiente, a proteção do
consumidor, a proteção à família, a comunicação social, o sistema
�nanceiro, dentre outros de caráter transindividual.
Os interesses difusos são caracterizados pelo fato de seus titulares
serem pessoas indeterminadas e, também, porque seus titulares estão
conectados por algum vínculo fático comum que não seja de caráter
associativo. Tais proveitos não se prestam a objetivos de fragmentação,
valendo exprimir que são atribuíveis apenas a determinados segmentos da
comunidade. Já os interesses coletivos possuem como característica o fato de
ostentarem como titulares grupos ou segmentos de pessoas determinadas e
conectadas por algum vínculo jurídico comum.41
Gianpaolo Poggio Smanio, ao tratar dos bens jurídicos penais, sugere
que os bens de natureza coletiva estejam compreendidos no âmbito do
interesse público. Desse modo, o autor propõe uma tríplice classi�cação:
bens jurídico-penais de natureza individual, bens jurídico-penais de
natureza coletiva e bens jurídico-penais de natureza difusa: a) os bens
jurídicos-penais de natureza individual são divisíveis em relação ao seu
titular, a exemplo da vida, integridade física, propriedade e honra; b) já os de
natureza coletiva são aqueles em que as pessoas não têm disponibilidade
sem afetar os demais titulares do bem jurídico. São, assim, indivisíveis em
relação aos titulares.42 No Direito Penal, os bens de natureza coletiva estão
compreendidos no interesse público, a exemplo da tutela da incolumidade
pública e da paz pública; c) os bens jurídico-penais de natureza difusa se
referem à sociedade como um todo, de modo que as pessoas não têm
disponibilidade sem afetar a coletividade. São, igualmente, indivisíveis no
que tange aos seus titulares. Esses bens, in alia manu, conformam uma
con�ituosidade social que opõe diversos grupos dentro da sociedade, como
na proteção do meio ambiente, que contrapõe, por exemplo, os interesses
econômicos industriais e o proveito na proteção ambiental, ou no amparo
das relações de consumo, em que estão contrapostos fornecedores e
consumidores.43
O objeto de tutela do Direito Penal Econômico está nos bens jurídicos
penais supraindividuais, que não são direitos ou interesses que recaiam em
uma pessoa, mas os que constituem interesses de toda a coletividade. A
titularidade desses direitos não é pessoal, mas sim dividida por todos os
cidadãos ou, ao menos, por uma coletividade de pessoas, com
independência de que essa proteção sirva a cada um dos cidadãos para
lograr o pleno desenvolvimento individual
6 CARACTERÍSTICAS DA CRIMINALIDADE
ECONÔMICA
O crime econômico não deve ser entendido, isoladamente, do contexto
social especí�co de sua ocorrência. Os delitos desta casta, como os delitos
em geral, são produtos sociais ou, precisamente, subprodutos estruturais,
uma vez que obedecem a condições especí�cas que se observam numa
determinada sociedade num momento histórico. Cada estrutura social gera,
de acordo com sua realidade, a própria criminalidade. Desse modo, a
conduta constitutiva do crime econômico é funcionalmente condicionada
pela estrutura socioeconômica especí�ca de um determinado lugar e de um
certo tempo.44
A sociedade moderna é, atualmente, entendida como enorme
agrupamento de riscos, no qual a atividade industrial é dominante e, por
intermédio dela, dela são criados perigos constantes e contínuos de
produção de resultados danosos aos bens jurídicos de ineresse de toda a
coletividade. Nesta ordem de ideias, é evidente que, nas sociedades
modernas, a empresa constitui uma das principais entidades geradoras de
riscos.
Os riscos no campo da atividade empresarial, conforme detalhado por
Zuñiga Rodriguez, desenvolvem-se em três momentos:1) no próprio
processo produtivo, como no caso dos acidentes de trabalho; 2) Com os
resultados da atividade industrial, porque, pela produção de bens em larga
escala e sua comercialização em grandes cadeias, em grande número, os
processos são provocadores de fatores causais, dos quais se deduz a grande
complexidade que envolve a responsabilidade por produtos defeituosos; 3)
Com resíduos industriais, capazes de produzir um número signi�cativo de
riscos (emissão de fumaça, gases tóxicos, produtos radioativos et reliqua).45
O crime cometido dentro de uma empresa possui características
próprias, dentre as quais merecem destaque a multiplicidade de sujeitos
ativos, a afetação de bens jurídicos coletivos e a diveridade de nexos causais
e problemas atinentes à determinação das responsabilidades.
Como as empresas são entidades de caráter coletivo, suas atividades são
realizadas mediante a participação de múltiplos sujeitos que agem para
proteger os interesses da entidade coletiva, o que funda di�culdades na
apuração da responsabilidade penal, principalmente nas organizações com
sistemas complexos da distribuição de funções.
Nessas entidades empresariais, a Sociologia e a Psicologia Social
apontam, recorrentemente, o fato de que a atitude coletiva dos membros
dessas sociedades varia em relação ao comportamento individual, o que
transporta à adoção de uma atitude criminal coletiva.
É evidente que comportamentos dentro dos grupos tendem a afetar
bens jurídicos de natureza coletiva ou macrossocial, vinculados ao bom
funcionamento do sistema social, como, verbi gratia, meio ambiente, bolsa
de valores, sistema socioeconômico et reliqua, interesses que estejam ligados
à própria atividade da empresa, tudo isso derivando na indeterminação das
vítimas atingidas,dando origem ao distanciamento entre agressor e ser
vitimado, com as di�culdades probatórias que isso acarreta.46 Nessa linha,
os processos de produção, distribuição e venda de bens e serviços dão ensejo
a uma série de problemas na determinação da participação, fato peculiar às
sociedades pós-modernas.
7 CONCEPÇÕES ACERCA DO DIREITO PENAL
ECONÔMICO
Raúl Cervini ressalta que, no primeiro momento, o Direito Penal
Econômico foi de�nido como aquele ramo do Direito Penal cuja função é a
proteção da ordem econômica dirigida ou intervencionada diretamente pelo
Estado. Essa posição não só confunde o conceito de ordem econômica com
uma certa modalidade de intervenção estatal na economia, como reduz
exageradamente os limites do Direito Penal Econômico aos delitos �scais,
monetários e de contrabando, e aos que afetam a determinação e formação
de preços. Segundo o autor mencionado há pouco, essa perspectiva tem
como consequência o estabelecimento de uma conceição de Direito Penal
Econômico como Direito Penal “de emergência”, utilizado para reforçar
políticas estatais, cuja origem é rastreável em Estados totalitários e, em
especial, em tempos de emergência nacional. Essa ideação impele a um
conceito excessivamente restrito de Direito Penal Econômico. 47
Na doutrina existem diversas posições que reconhecem o Direito Penal
Econômico como objeto limitado de estudo, a exemplo das ideações
postuladas pelo professor Miguel Bajo Fernández.
Segundo sua proposta restritiva, o Direito Penal Econômico consiste
em um conjunto de normas jurídico-criminais que protegem a ordem
econômica entendida como a regulamentação legal do intervencionismo
estatal no economia. Nessa perspectiva, o objeto de proteção do Direito
Penal Econômico é constituído pelos setores da Economia em que há
intervenção do Estado ou, in aliis verbis, do Direito Penal Administrativo
Econômico.48
Esta propositura, sustentada por Miguel Bajo Fernández, entende que
um conceito amplo de cariz econômico impede que a ordem econômica
adquira a concretização como bem jurídico.
O conceito amplo de Direito Penal Econômico, que goza de aceitação
majoritária na doutrina jurídica penal, considera que a ideia de ordem
econômica abarca todos os instrumentos da vida. O Direito Penal
Econômico não apenas protege o direito do Estado para dirigir a Economia,
mas inclui, também, a regulamentação da produção e distribuição de bens
econômicos. Segundo Tiedemann, ideólogo fundamental desta sugestão, o
Direito Penal Econômico inclui “[...] todo o conjunto de crimes relacionados
à atividade econômica e referentes às normas das organizações estatais que
organizam e protegem a vida econômica.” 49
Isso signi�ca que o Direito Penal Econômico não apenas protege a
ordem econômica, desde que o Estado nela intervenha por meio de sua
regulamentação (conceito restrito do Direito Penal Econômico), mas essa
proteção é dirigida a toda atividade econômica.50
O conceito e o alcance do Direito Penal Econômico democrático
pressupõem, necessariamente, uma perspectiva integrada, baseada nas
condições ônticas da estrutura social, no reconhecimento de uma essência
antropológica que traduza um conteúdo de proteção para a pessoa humana
individualmente considerada. Pressupoe, segundo Raúl Cervini, um coletivo
como destinatário �nal de regras que protegem um bem jurídico, porém
tudo isso amparado por uma participação democrática de acordo com o
Estado social-democrata de Direito.51
8 RELEVÂNCIA CONSTITUCIONAL DOS BENS
JURÍDICOS TUTELADOS PELO DIREITO PENAL
ECONÔMICO
A primeira condição de legitimidade para a criação de um tipo penal
consiste em que essa descrição normativa de conduta se dirija à proteção de
um bem jurídico, isto é, o mal que se causa por via da imposição de uma
pena somente resulta em conformidade ao Princípio da Proporcionalidade
se com ele se objetiva tutelar algum interesse especial da sociedade.
A Constituição reúne o conjunto de valores fundamentais que não
podem ser, de modo algum, olvidados pelo legislador infraconstitucional.
Sendo assim, assere-se que houve um fenômeno de constitucionalização do
bem jurídico penal, na medida em que ela já aponta os valores que
funcionam como vetores para a de�nição de bem jurídico.52
Assim, cabe ao legislador penal pugnar pela sinalização da relevância
desses bens, de modo a tê-los perenemente na elaboração das �guras
delitivas. Portanto, o mecanismo regulador da conceituação de bem jurídico
tende a possuir como parâmetro a Constituição, visto que esta contém as
ponderações mais signi�cativas do ordenamento, seja no âmbito de
organização do Estado, seja no aspecto dos valores primordiais da
sociedade, de maneira que se impõe com especial legitimidade, pois alicerça
as decisões políticas fundamentais de um povo.
Em matéria de direitos humanos, no caso do Brasil, além dos próprios
princípios, garantias e valores consagrados na Constituição Federal de 1988,
destaca-se a incorporação ao sistema jurídico de vários documentos de
cunho internacional a possibilitar sensível ganho no processo de sua
evolução histórica e proteção, especialmente, ante a intervenção penal do
Estado.
Como alvitra André Mauro Azevedo, existe uma circularidade que se
revela nas relações entre o Direito Penal e a Constituição, ou, mais
propriamente, entre os bens jurídicos e a Constituição, e tal característica
não esconde a necessidade perene no reconhecimento da existência de uma
órbita em que a atuação penal se mostrará inafastável, uma vez que sua
radicalidade se transforma em potente instrumento de proteção de alguns
direitos e valores, de modo irrenunciável.53
Jorge de Figueiredo Dias assevera que a Constituição funciona como
padrão de referência da valoração social em relação aos interesses
fundamentais dos cidadãos e, com base nesse �ltro, deve-se legitimar a
seleção dos bens jurídicos, pois a fonte constitucional concede ao bem
jurídico a dignidade penal. Firma-se a prevenção de qualquer
contaminaçãoo intrassistemática de delimitação do bem jurídico, uma vez
que não é a norma jurídico-penal que condiciona a formatação do bem
jurídico, mas sim a Constituição. De fato, se a Carta Grande alberga os
valores fundamentais de uma determinada sociedade, então, é justamente
nela que se consolidarão esses valores, seja implícita ou explicitamente.54
Desse modo, o fundamento de maior relevância dessa corrente
doutrinária consiste em destacar a proveitosa missão do bem jurídico, no
sentido de exercer função delimitadora e crítica do poder punitivo estatal,
tendo como maior referencial as normas de conteúdo constitucional. Nessa
linha, a elaboração e a interpretação de qualquer elemento de caráter
normativo do ordenamento jurídico, especialmente os de teor penal,
precisam encontrar orientação por intermédio dos valores endossados pela
Carta Constitucional, objetivando adquirir validade material, de modo a
extirpar o vício da inconstitucionalidade. Assim, e em total conformidade
com o conceito estrito de legalidade penal, a Constituição deve �gurar como
agente do ordenamento jurídico, com vistas a fundamentar a sua
legitimação principiológica e impor respeito dessa característica de validade
às demais normas.55
É relevante destacar, nos debates acerca da legitimação constitucional
do Direito Penal, a intersecção da teoria dos direitos fundamentais com o
paradigma punitivo, na medida em que o respeito a tal paradigma se mostra
fundamental para a sobrevivência do Estado Democrático de Direito. A
relação entre o Direito Penal e os direitos humanos denota uma tensão
antinômica entre os dois polos. Essa antinomia reside na própria essência do
poder punitivo do Estado, o qual atinge, pela sua natureza, direitos
fundamentais da pessoa, a começar pela liberdade individual. De outra
banda, o sistema penal exerce, também, a função de proteger os direitos
fundamentais, por intermédio da incriminação de comportamentos, num
contexto de movimento duplo, para a�rmar valores e atribuir sentido
delitivo à sua transgressão. A harmonização e a demanda pelo ponto de
equilíbrioentre a segurança social e os direitos individuais exprimem-se
como das mais complexas tarefas no estabelecimento do conteúdo e da
legitimação da intervenção jurídico-penal.56
No centro atual do debate acerca dos modelos de intervenção penal,
surge a problematização relativa à delimitação das consequências dos
elementos que caracterizam as sociedades pós-industriais e à dogmática
penal. Advém daí a ponderação referente aos limites de racionalidade do
Direito Penal, com supedâneo no estabelecimento das implicações do
reconhecimento dos direitos fundamentais sobre o seu conteúdo.57
Raúl Cervini evidencia que, na dogmática atual, o importante não
consiste apenas na procura de paradigmas teóricos, na formulação de
sistemas lógico-formais absolutamente perfeitos, e, menos ainda, na
pretensão de organização e sistematização por meio de normas jurídicas da
ordem social, mas em exigir de todas as autoridades, nas estruturas política,
econômica e jurídica, quer na vertente da execução ou aplicação das leis,
quer no domínio da própria produção legislativa, a necessária ponderação
em decorrência de suas respectivas atividades. Impende expressar que esses
atores jamais vão ultrapassar os princípios de formato e conteúdo inerentes à
concretização dos valores do Estado Social Democrático de Direito.58
A Hermenêutica Constitucional deve proporcionar racionalidade e
mínima segurança ao sistema jurídico. A Ordem Constitucional, por sua
vez, há de respeitar o paradigma dos direitos humanos, sob pena de não
adquirir legitimação para normatizar racionalmente o conteúdo essencial
para a concretização dos valores atinentes ao regime democrático, e o
Direito Penal Econômico deve obedecer a tais parâmêtros estabelecidos na
Carta Magna.
1 SAN MARTÍN LARRINOA, Begoña. Derecho penal econômico y delito tributario, en:
MAZUELOS COELLO, Julio (comp.). Derecho penal econômico y de la empresa, Lima:
Editorial San Marcos, 1996, p. 185.
2 CORIA, Dino Carlos Caro; ALFARO, Luis Miguel Reyna. Derecho penal econômico
parte general – Tomo I. Lima/Peru: Jurista editores E.I.R.L. Jr. Miguel Aljovín N° 201,
2016, p. 36.
3 LAMAS PUCCIO, Luis. Derecho Penal Econômico aplicado al Código Penal. Lima:
Montecorvo, 1990, p. 28.
4 Ilana Martins Luz evidencia que o Direito Penal Econômico, de acordo com a perspectiva
atual, foi fruto, no mundo ocidental capitalista, de um conjunto de políticas estatais,
inclusive de natureza criminal, com vistas a controlar as crises econômicas veri�cadas no
decurso do século XX. O período das duas grandes guerras mundiais, bem como a crise
da Bolsa de Nova York em 1929 e posterior período da Grande Depressão, assim como
crises econômicas posteriores, a exemplo da crise do petróleo, tiveram in�uência direta
na promulgação e desenvolvimento das normas penais que integram a perspectiva
madura do Direito Penal Econômico. (LUZ, Ilana Martins. Compliance e Omissão
Imprópria. 2 reimp. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2019, p. 40).
5 A Primeira Guerra Mundial determinou o término da ordem política, econômica e
jurídica então vigente, ou seja, a ordem liberal. Para fazer frente ao esforço beligerante,
imprescindível foi a adoção de uma economia intervencionista, dirigida, na qual ao
Estado “não era mais indiferente a evolução das atividades econômicas ou as decisões dos
agentes da economia privada”. (COMPARATO, Fábio Konder. O indispensável direito
econômico. Revista dos Tribunais. São Paulo, ano 54, vol. 353, p. 14-26, março de 1965).
6 A reforma penal no campo do Direito Penal Econômico teve grande importância na
Alemanha, país onde, por meio da Primeira e Segunda Leis de combate ao crime
econômico, foram adotadas medidas substantivas e orgânicas dentro do sistema de
administração da justiça criminal.
7 ABANTO VÁSQUEZ, Manuel A. Derecho penal econômico. Consideraciones jurídicas y
económicas. Idemsa, Lima, 1997, p. 25.
8 As profundas alterações veri�cadas no contexto mundial – e que se intensi�caram
demasiadamente com o surgimento do movimento de globalização – in�uenciaram,
irreversivelmente, o curso da Ciência Penal, tendo em vista o contexto da sociedade de
risco e o surgimento de bens jurídicos a serem e�cazmente tutelados. Essas
transformações, analisadas em seu conjunto, signi�cam, dentre outras coisas, um
expressivo aumento da tutela penal. Normalmente coincidente com um Direito Penal que
se forma ao lado do Direito Penal tradicional, codi�cado, desde a previsão de normas
penais em leis extravagantes. Demais disso, signi�cam, ainda, com todas as
consequências que isso implica, nos quadros da teoria do crime, uma profunda alteração
da matéria de proibição das técnicas adotadas. Para tanto, basta perceber as diferenças
estruturais que caracterizam, de um lado, delitos tradicionais – como homícídio, lesão
corporal, furto e roubo – em que se dispõe de um bem jurídico individual, um sujeito
ativo identi�cado na pessoa física e uma relação de imputação veri�cável com suporte em
critérios teóricos já desenvolvidos, e, de outra parte, tipos do Direito Penal de perigo,
como, por exemplo, o crime de poluição, de extração não autorizada de minerais, ambos
previstos na Lei n. 9605/98, em que o bem jurídico perde em densidade ao assumir uma
dimensão supraindividual, o sujeito ativo se confunde com a pessoa jurídica, o sujeito
passivo é difuso e os critérios de imputação se veem perante relações de causa e efeito, em
que a cumulatividade de fatores, a ocorrência de efeitos sinergéticos, a dilação temporal
entre conduta e resultado, ou mesmo o caráter, muitas vezes transfronteiriço deste
último, fazem-nas de custosa, senão mesmo impraticável, constatação. (D’AVILA, Fábio
Roberto. Direito Penal e direito sancionador. Sobre a identidade do Direito Penal em
tempos de indiferença. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, ano 14, n.
60, p. 09-35, maio/jun. 2006. Bimestral).
9 SEVCENKO, Nicolau. A corrida para o século XXI: no loop da montanha-russa. São
Paulo: Companhia das Letras, 2001, p. 24.
10 BECK, Ulrich. A sociedade de risco mundial: em busca da segurança perdida, [e-book],
Lisboa: Edições 70, 2015, p. 25.
11 Por intermédio de sua modernidade re�exiva, Beck (2015) pondera o fato de o risco
caracterizar uma autoconfrontação com os danos colaterais da modernização
experimentada pela sociedade, criticando a industrialização, a qual, segundo esse autor,
esvaziou-se, propiciando o surgimento de uma recente fase de destruição ocasionada pela
nova criação da época industrial, a qual maximizou a divisão internacional do trabalho, o
desemprego, a fome e a pobreza, de modo geral. Com efeito, a sociedade de risco
caracteriza uma modalidade re�exiva, cujo desenvolvimento, na perspectiva teórico-
social e de diagnóstico cultural, provoca graves ameaças à humanidade. (IBIDEM, p.
115).
12 MACHADO, Marta Rodrigues de Assis. A sociedade do risco e o Direito Penal – Uma
avaliação de novas tendências politico-criminais. São Paulo: IBCCRIM, 2005, p. 61.
13 BAUMAN, Zygmunt. A vida fragmentada: Ensaios sobre moral pós-moderna.
Tradução de Miguel Serras Pereira. Lisboa: Relógio D’Água Editores, 2007, p. 283.
14 BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Crimes de perigo abstrato. 3. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2013, p. 22.
15 SALAS ALMIRALL, Salvador. Causalidad e imputación objetiva en los delitos de peligro.
Cuadernos de Derecho judicial, Madrid, n. 26, p. 111-170, 1994, p. 116.
16 LIMA, Maria Luísa Pedroso. Uma releitura dos testemunhos do terremoto de 1755.
Revista do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, v. 43, n.
186, 2008, p. 8.
17 BOTTINI , 2013, p. 27.
18 MERCADO PACHECO, Pedro. “Transformaciones económicas y función de lo político
en la fase de la globalización”. Mundialización económica y crisis político-jurídica.
Anales de la Cátedra Francisco Suárez, n.32, 1995, p. 103.
19 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Tradução de Plinio Dentzien. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 2001, p. 70.
20 BECK, 2015, p. 24.
21 TERRADILLOS BASOCO, Juan. El derecho penal de la globalización: Luces