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,. NOVAS TENDENCIAS EM DIREITO PENAL Professora Dra. Daniela Duque-Estrada NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 1 Apresentação ................................................................................................................................ 7 Aula 1: As transformações do direito penal .................................................................................. 8 Introdução ............................................................................................................................. 8 Conteúdo ................................................................................................................................ 9 Algumas reflexões acerca da soberania estatal, da lógica capitalista e do Direito Penal no início do século XXI ..........................................................................................9 Algumas reflexões acerca da soberania estatal, da lógica capitalista e do Direito Penal no início do século XXI ..........................................................................................9 Algumas características do processo de globalização ............................................... 9 Interfaces entre globalização e Direito Penal............................................................. 10 Principais tendências político-criminais nesta “era da globalização”.................... 10 Principais características do Direito Penal na era da globalização ........................ 12 Sociedade de risco (Ulrich Beck) – a organização socioprodutiva capitalista na contemporaneidade ........................................................................................................ 13 Componentes básicos do modelo de modernização reflexiva, segundo Ulrich Beck .................................................................................................................................... 14 Estágio da reflexividade .................................................................................................. 14 Estágio da reflexão........................................................................................................... 15 A teoria da sociedade mundial do risco ...................................................................... 15 Reflexões sobre a expansão do Direito Penal ............................................................ 16 Motivos que podem explicar o surgimento de novos bens jurídico-penais........ 16 Delimitação do bem jurídico-penal ............................................................................. 17 O surgimento efetivo de novos riscos ......................................................................... 18 Encerramento ................................................................................................................... 18 Atividade proposta .......................................................................................................... 20 Referências........................................................................................................................... 22 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 23 Notas ........................................................................................................................................... 27 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 27 Aula 1 ..................................................................................................................................... 27 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 27 Aula 2: Terrorismo ....................................................................................................................... 30 Introdução ........................................................................................................................... 30 Conteúdo .............................................................................................................................. 31 Algumas reflexões de natureza histórica, política e jurídica ................................... 31 NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 2 Novas configurações do terrorismo ............................................................................ 31 Terrorismo e Direito Penal do Inimigo ........................................................................ 32 Aspectos gerais da teoria do Direito Penal do Inimigo de Günther Jakobs ........ 32 A temática do terrorismo no Direito brasileiro .......................................................... 34 Criminalidade econômica .............................................................................................. 35 Considerações gerais sobre a ordem econômica ..................................................... 36 Características do Direito Econômico ......................................................................... 36 Direito Penal Econômico ............................................................................................... 37 Macro e microcriminalidade.......................................................................................... 38 A independência entre Direito Penal Administrativo e o Direito Administrativo Penal ................................................................................................................................... 39 A pessoa jurídica como agente e a coautoria em crimes contra a ordem econômica ........................................................................................................................ 40 Atividade proposta .......................................................................................................... 41 Referências........................................................................................................................... 43 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 44 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 49 Aula 2 ..................................................................................................................................... 49 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 49 Aula 3: Criminalidade econômico-financeira .............................................................................. 52 Introdução ........................................................................................................................... 52 Conteúdo .............................................................................................................................. 53 Crimes contra o mercado de capitais: disposições gerais ...................................... 53 Comissão de Valores Mobiliários – CVM .................................................................... 53 CVM na atual sociedade globalizada ........................................................................... 53 Definição de insider ......................................................................................................... 54 Crimes contra o mercado de capitais .......................................................................... 54 Direito Administrativo Sancionador e Direito Penal Sancionador ......................... 55 Considerações finais - CVM ........................................................................................... 56 Condutas relacionadas aos crimes contra o mercado de capitais ........................ 56 O delito de uso indevido de informação privilegiada – Artigo 27-D da Lei nº 6.385/1976......................................................................................................................... 57 Estelionato previsto no Artigo 171 ................................................................................ 57 Insider trading- conceito ................................................................................................ 58 Formas de utilização da informação privilegiada ...................................................... 58 Abalar a confiança no mercado financeiro ................................................................ 59 Elementos do tipo penal ................................................................................................ 59 NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 3 Atividade proposta .......................................................................................................... 61 Referências........................................................................................................................... 61 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 62 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 68 Aula 3 ..................................................................................................................................... 68 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 68 Aula 4: Crimes contra o SFN ........................................................................................................ 71 Introdução ........................................................................................................................... 71 Conteúdo .............................................................................................................................. 72 Sistema financeiro ........................................................................................................... 72 Instituição financeira ....................................................................................................... 73 Estruturas do injusto jurídico-penal: normas penais do mandato em branco e elementos normativos do tipo penal ........................................................................... 74 A delimitação do bem jurídico-penal .......................................................................... 74 A Lei nº 7.492/86 e os crimes contra o sistema financeiro nacional ..................... 75 Falsidade em demonstrativos contábeis ..................................................................... 76 A conhecida figura típica de “caixa dois” .................................................................... 77 Omissão de informações, declarações e documentos pelo ex-administrador de instituição financeira ....................................................................................................... 78 Obtenção de financiamento em instituição financeira mediante fraude ............ 78 Evasão de divisas ............................................................................................................. 79 Evasão de divisas x lavagem de dinheiro .................................................................... 80 Considerações gerais ...................................................................................................... 81 Atividade proposta .......................................................................................................... 82 Referências........................................................................................................................... 84 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 85 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 89 Aula 4 ..................................................................................................................................... 89 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 89 Aula 5: Crimes contra a ordem tributária ................................................................................... 92 Introdução ........................................................................................................................... 92 Conteúdo .............................................................................................................................. 93 Considerações iniciais .................................................................................................... 93 Punição dos crimes fiscais ............................................................................................. 93 Dimensão ética- tributo ................................................................................................. 94 Conceito de crime contra a ordem tributária e bem jurídico tutelado ................ 94 NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 4 Considerações iniciais de bem jurídico ....................................................................... 95 Bem jurídico tutelado - conceito ................................................................................. 96 Conduta criminosa .......................................................................................................... 97 Sujeitos do delito ............................................................................................................. 98 Responsabilização penal da pessoa jurídica .............................................................. 99 Crimes na constituição ................................................................................................... 99 Responsabilidade penal ................................................................................................ 100 Extinção da punibilidade pelo pagamento ............................................................... 100 Extinção da sua punibilidade ....................................................................................... 102 Pagamento do débito tributário ................................................................................. 102 Atividade proposta ........................................................................................................ 103 Referências......................................................................................................................... 103 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 105 Notas ......................................................................................................................................... 109 Chaves de resposta ................................................................................................................... 110 Aula 5 ................................................................................................................................... 110 Exercícios de fixação ..................................................................................................... 110 Aula 6: Lei de falência e direito do consumidor ........................................................................ 112 Introdução ......................................................................................................................... 112 Conteúdo ............................................................................................................................ 113 Direito Penal ................................................................................................................... 113Direito Penal mínimo .................................................................................................... 114 A Lei de Recuperação de Empresas (Lei nº 11.101/2005) ...................................... 115 Infrações penais ............................................................................................................. 116 Proteção ao consumidor .............................................................................................. 117 Direito Penal do Consumidor ...................................................................................... 119 Proteção jurídica nas relações de consumo ............................................................ 120 Código de Defesa e Proteção ao Consumidor ........................................................ 121 Critérios de política criminal........................................................................................ 121 Direito à informação ..................................................................................................... 122 Considerações finais ..................................................................................................... 123 Atividade proposta ........................................................................................................ 124 Aprenda Mais ..................................................................................................................... 125 Referências......................................................................................................................... 125 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 126 Notas ......................................................................................................................................... 130 NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 5 Chaves de resposta ................................................................................................................... 131 Aula 6 ................................................................................................................................... 131 Exercícios de fixação ..................................................................................................... 131 Aula 7: Criminalidade econômico-financeira ............................................................................ 133 Introdução ......................................................................................................................... 133 Conteúdo ............................................................................................................................ 134 Considerações iniciais .................................................................................................. 134 Crime é fato típico, ilícito e culpável .......................................................................... 134 Conduta é sempre perpetrada por uma pessoa natural ........................................ 134 Processo Penal da Pessoa Jurídica e a Lei nº 9.605/1998 ..................................... 135 Lei ..................................................................................................................................... 135 Luiz Regis Prado ............................................................................................................. 136 Incriminalização e responsabilização jurídico-penal - responsabilidade indireta ........................................................................................................................................... 138 Responsabilidade penal ................................................................................................ 138 Requisitos da denúncia................................................................................................. 139 Descrição do fato que fundamenta a responsabilidade da pessoa jurídica ....... 140 As garantias processuais constitucionais e a pessoa jurídica ............................... 140 Vedação a autoincriminação compulsória ............................................................... 141 Habeas corpus ................................................................................................................ 141 Ampliando nossa abrangência de análise ................................................................ 143 Criminalidade econômica, denúncia genérica e devido processo legal ............ 143 Decisão proferida em sede de recurso em sentido estrito pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região ...................................................................................................... 144 A sistemática processual penal na criminalidade econômica e o princípio da prejudicialidade .............................................................................................................. 144 Decisão administrativa final ......................................................................................... 145 Atividade proposta ........................................................................................................ 146 Referências......................................................................................................................... 148 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 148 Notas ......................................................................................................................................... 152 Chaves de resposta ................................................................................................................... 152 Aula 7 ................................................................................................................................... 152 Exercícios de fixação ..................................................................................................... 152 Aula 8: Criminalidade ambiental ............................................................................................... 157 Introdução ......................................................................................................................... 157 Conteúdo ............................................................................................................................ 158 NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 6 Meio ambiente ecologicamente equilibrado ........................................................... 158 Conceitos de meio ambiente e recursos ambientais ............................................. 158 Características gerais da Lei nº 9.605/1998 .............................................................. 159 Crimes da lei nº. 9.605/98 em espécie ...................................................................... 161 Poluição ........................................................................................................................... 161 Obras ou serviços potencialmente poluidores ........................................................ 163 Obras ou serviços potencialmente poluidores ........................................................ 164 Critérios de licenciamento ambiental ....................................................................... 164 Questões processuais penais relevantes ................................................................... 166 Atividade proposta ........................................................................................................ 168 Referências......................................................................................................................... 169 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 169 Notas .........................................................................................................................................173 Chaves de resposta ................................................................................................................... 174 Aula 8 ................................................................................................................................... 174 Exercícios de fixação ..................................................................................................... 174 Conteudista ............................................................................................................................... 177 NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 7 Esta disciplina contempla temas de fundamental relevância para a estruturação do saber penal face à evolução da sociedade e consequente expansão do Direito Penal. Sua finalidade precípua é identificar as representações e/ou justificativas acerca da existência de ligações estreitas entre os conceitos de Globalização, Sociedade de Risco, Macro e Microcriminalidade, Tutela Penal de Direitos Supraindividuais, bem como a Tutela da Atividade Econômica, suas implicações político-criminais e dogmáticas. Sendo assim, esta disciplina tem como objetivos: 1. Identificar a existência de novos paradigmas para a Ciência Penal, prática penal e efetivo Controle Social com vistas à criação de novas redes de sentidos para a construção do raciocínio jurídico – sempre pautado na noção de controle social-penal como forma de efetivação dos direitos humanos e fundamentais; 2. Articular, em nível teórico e prático, os instrumentais necessários ao conhecimento dos fundamentos políticos e jurídicos das novas formas de criminalidade e as práticas cotidianas do funcionamento do Sistema de Justiça Criminal. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 8 Introdução Nesta aula será discutida a expansão do Direito Penal e o consequente surgimento de novas formas de criminalidade, novos ramos do Direito Penal, bem como novas formas de controle social face ao cenário sociopolítico e econômico de uma sociedade globalizada que, cada vez mais, demanda o surgimento de novas formas de controle social. Para tanto, o estudo será sempre balizado pelo controle de constitucionalidade realizado pelos princípios norteadores do Direito Penal com vistas a vislumbrar sua função, missão, características e legitimação da Intervenção Estatal Penal. Desta forma, analisaremos de forma sucinta a contextualização histórico- econômica das transformações do Direito Penal na denominada “Sociedade Globalizada de Risco”. Objetivo: 1. Identificar as novas formas de criminalidade decorrentes da Sociedade de Riscos Globalizada; 2. Avaliar os novos modelos de Política Criminal, Estado Constitucional e Democrático de Direito, a serem adotados com a transnacionalização do campo penal. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 9 Conteúdo Algumas reflexões acerca da soberania estatal, da lógica capitalista e do Direito Penal no início do século XXI As três últimas décadas do século XX (décadas de 1970, 1980 e 1990) e estes primeiros “tempos” do século XXI trouxeram para os Estados Nacionais, com intensidade crescente, questões relacionadas: às novas concepções sobre a Soberania (nos moldes que definiram o surgimento dos Estados-Nação) e a uma paulatina “desnacionalização” do Direito. Algumas características do processo de globalização Na medida em que as interações transnacionais vão se tornando cada vez mais intensas, verifica-se um considerável impacto sobre o Direito — a transnacionalização da esfera jurídica, mais especificamente —, a transnacionalização do campo penal tem levado os pesquisadores da área a reconsiderações importantes a respeito do crime e do controle. Tal impacto reflete-se, principalmente, na impossibilidade de se quantificar ou qualificar a extensão das lesões aos bens jurídico-penais que possam ser perpetradas através da conduta de, até mesmo, um único agente que, muitas vezes, torna-se “invisível” face às facilidades decorrentes do processo de globalização. As transformações ocorridas na economia mundial — mais precisamente a configuração assumida pelo capitalismo a partir das duas últimas décadas do século XX — repercutiram de maneira intensa no âmbito do crime, já que novas práticas criminais se desenvolveram, provocando transformações nas estratégias de controle. Ainda que um número considerável de pesquisadores que lidam com as questões relacionadas ao crime e ao controle trabalhem com uma NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 10 perspectiva local ou regional desses fenômenos, necessário se faz um redimensionamento da questão criminal em escala mundial — o campo das relações transnacionais criminais. Atenção Paralelamente ao surgimento e desenvolvimento da criminalidade econômica transnacional, configura-se uma nova lógica de segurança transnacional que se sobrepõe à lógica de segurança estatal ou interestatal. Dessa forma, será feita uma análise de algumas observações importantes para a compreensão das transformações ocorridas no Direito Penal em virtude da globalização socioeconômica e política. Interfaces entre globalização e Direito Penal Paralelamente à consolidação do fenômeno da globalização no âmbito econômico, no plano jurídico-político sedimentou-se o modelo do Estado Constitucional e Democrático de Direito. E ao estabelecer as interfaces entre a globalização e Direito Penal, é importante que se faça uma distinção entre: o Direito Penal da Globalização (que trata de um fenômeno novo) e o Direito Penal na era da globalização (produto e reflexo da soma de todas as transformações do Direito Penal tradicional que se construiu originalmente a partir do final do século XVIII com as modificações características da globalização). Principais tendências político-criminais nesta “era da globalização” Feita essa análise, nos resta o seguinte questionamento Quais seriam as principais tendências político-criminais nesta “era da globalização”? NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 11 Ênfase na persecução de crimes financeiros Transnacionais, como por exemplo a lavagem de dinheiro/capitais – alguns crimes desaparecerão (evasão de divisas, descaminho) e outros terão/manterão vigência, mas sua perseguição será seletiva (é o caso de lavagem de capitais incidindo sobre investimentos estrangeiros). Globalização da política criminal – como expressão da soberania, cada Estado procurava (e ainda procura) delinear opções de controle da criminalidade, mas em relação a alguns delitos, tal realidade está a se transformar, uma vez que existem claras reivindicações no sentido da uniformização da reação contra os delitos que perturbam a “ordem internacional”. Globalização da cooperação policial e judicial – órgãos encarregados da “persecutio criminis” através de acordos ou tratados bilaterais ou multilaterais de cooperação e de troca de informações. Globalização da justiça criminal – destaca-se aqui a criação do Tribunal Penal Internacional alicerçado no propósito de sempre garantir julgamentos justos, sob a égide do devido processo legal penal. Ainda, podemos elencar algumas das principais transformações ocorridas no Direito Penal tradicional: ►Globalização dos crimes e dos criminosos – a globalização é a era da delinquência organizada com finalidade econômica, o que leva à concepção de que o crime organizado na atualidade é o crime dos poderosos. ►Globalização dos bens jurídicos – nestes “novos tempos”, admite-se não somente a ofensa aos direitos subjetivos, também dos direitos coletivos, dos bens supraindividuais e dos bens jurídicos universais ou planetários (ecologia, genética, segurança informática, segurança nas comunicações, segurança na NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 12 Internet) – objeto de análise sobre asteorias monista e dualista sobre bem jurídico. ►Globalização das vítimas: verifica-se uma “evolução” das “vítimas certas”, “individualizadas” do Direito Penal Liberal para as vítimas coletivas (supraindividuais ou difusas) e fala-se agora nas vítimas planetárias ou globalizadas. ►Globalização da explosão carcerária – na sociedade globalizada, como se firmou e vem se firmando a clara distinção entre globalizados e excluídos, a distribuição de renda é inversamente proporcional à distribuição de castigos. ►Agravamento incessante da hipertrofia do Direito Penal – instrumentalizado em função de objetivos econômicos da globalização, através do surgimento de novas formas de criminalidade e respectivas medidas de política criminal. Principais características do Direito Penal na era da globalização Algumas importantes características podem ser destacadas na era da globalização que são: • Política deliberada de “criminalização”, ao contrário de antes, que era de “descriminalização” ou de “despenalização”; • Alterações frequentes e parciais da Parte Especial do Código Penal ou a edição das leis penais especiais (locus especial e predileto das “novidades penais”), através da reafirmação de um Direito Penal Simbólico, por exemplo, com a promulgação da Lei de Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/1990), Lei de Tortura (Lei nº 9.455/1997), dentre outras; NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 13 • Utilização ampla da técnica dos delitos de perigo abstrato – defesa dificultada, facilitação da atividade da persecutio criminis, relativização do conceito de bem jurídico-penal (Lei nº 7.082/1989); • Utilização ampla da técnica de tipificação de normas penais do mandato em branco; • Uso do Direito Penal como instrumento de política de segurança (em contradição com sua natureza subsidiária); • Responsabilidade penal da pessoa jurídica: questão bastante discutida dentro de um Sistema de Controle Social Penal como o nosso, pautado no juízo de culpabilidade – reprovabilidade da conduta; • Privatização ou terceirização da Justiça: questão a ser analisada com acuidade a partir da discussão acerca da aplicação de um modelo de Justiça Criminal e de Gestão do Crime, pautado em uma Justiça Restaurativa, bem como na Mediação Penal. Sociedade de risco (Ulrich Beck) – a organização socioprodutiva capitalista na contemporaneidade Segundo Ulrich Beck, a configuração atual do modo de produção capitalista teria o perfil de uma “modernização reflexiva” que, longe de se constituir em uma ruptura com a modernização proveniente da era industrial, significaria, na verdade, a vitória da própria modernização ocidental. A expansão continuada de um “progresso técnico-econômico” proveniente da “era industrial” não deixou de criar riscos – isso significa dizer que, na chamada “modernização reflexiva”, a expansão e intensificação do “progresso técnico- científico” pode conduzir à autodestruição, em que um tipo de modernização destrói o outro e o modifica. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 14 O processo de reflexividade descrito por Beck pode ser entendido como uma confrontação das bases do paradigma da modernidade com as consequências dessa modernização. Tal confronto não se constituiu como uma opção política ou mesmo como uma necessidade de oposição ao modelo da era industrial, mas sim como uma derivação do superdesenvolvimento da modernidade industrial, o que gerou efeitos e ameaças que não puderam ser assimilados pela racionalidade da época industrial. Componentes básicos do modelo de modernização reflexiva, segundo Ulrich Beck A autoameaça às fundações da sociedade industrial por essa “modernização contemporânea”, a princípio bem-sucedida, e que se mostra refratária aos riscos que produz (este seria o estágio da reflexividade). Crescimento do conhecimento e da reflexão sobre a situação anteriormente descrita (este seria o estágio da reflexão). A partir da análise dos componentes básicos do modelo de modernização reflexiva de Ulrich Beck, podemos indagar: “como poderíamos caracterizar o estágio da reflexividade e reflexão?” Estágio da reflexividade O “estágio da reflexividade”, no modelo de modernização contemporânea proposto por Beck, se constituiria na confrontação das bases da modernização com suas consequências, configurando-se como uma indesejada transição autônoma e despercebida do modelo da sociedade industrial para o modelo da sociedade de risco. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 15 Isso significa dizer que os principais aspectos desse processo de transição do modelo de sociedade industrial para o modelo de sociedade de risco são a irreflexão e a não intencionalidade. A questão central trazida pela reflexividade refere-se à alteração das bases da sociedade industrial por ela mesma, o que ocorre, em um primeiro momento, sem reflexão, ultrapassando o conhecimento e a consciência. Estágio da reflexão Ainda, “como poderíamos caracterizar o estágio da reflexão?” O “estágio da reflexão” é aquele em que, percebidas as questões fundamentais do paradigma da modernização contemporânea (segundo Ulrich Beck, uma modernização reflexiva) tornam-se objeto de consideração pública, política e científica. Tal mecanismo tem sua origem no momento em que a sociedade industrial, diante dos efeitos deletérios do processo produtivo, passa a questionar e a rever seus princípios de segurança e de cálculo. O que anteriormente parecia funcional e racional converte-se em uma ameaça à vida, gerando disfuncionalidade e irracionalidade, o que leva as instituições a se abrirem ao questionamento político de seus fundamentos. A teoria da sociedade mundial do risco Tal teoria encontra-se vinculada à percepção social dos riscos que os avanços tecnológicos podem acarretar, até então despercebido. Trata-se, na verdade, de uma teoria política sobre as mudanças estruturais na sociedade industrial e sobre o conhecimento da modernidade, o que leva a NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 16 sociedade (ou melhor, as sociedades) a desenvolverem uma crítica em relação a seu próprio desenvolvimento. A partir do momento em que os riscos tecnológicos passam a ser percebidos como riscos derivados de decisões humanas, questões relacionadas aos processos decisórios na área científica e tecnológica, assim como os temas relacionados aos procedimentos de controle e distribuição de riscos (sobretudo a ineficiência dos procedimentos atuais e a busca por novas) ganham preeminência nas agendas políticas dos governos e das instituições globais. Reflexões sobre a expansão do Direito Penal Segundo Jesús-Maria Silva Sánchez, o Direito Penal deve ser entendido como uma ferramenta qualificada destinada à proteção de bens jurídicos relevantes. Diante da expansão da atuação do Direito Penal que se tem verificado de maneira progressiva desde as últimas décadas do século XX, duas causas bem gerais podem servir como referências de explicação desse fenômeno: • O surgimento de novos bens jurídicos, de novos interesses, de valorações novas para (ou reconfigurações de) interesses já existentes; • O incremento de valor a ser experimentado por interesses preexistentes. Motivos que podem explicar o surgimento de novos bens jurídico-penais A doutrina, de um modo geral, já deu conta dos fenômenos anteriormente apresentados como motivos de explicação para o surgimento de novos bens jurídico-penais – são os bens coletivos, os interesses difusos que ressaltam a importância crescente que vem sendo dada aos impactos produzidos pelas mais NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 17 diferentes realidades e atividades levadas a cabo pelo ser humano, sobre ele mesmo. Todavia, apesar da importância reconhecida da emergência sócio-histórica dos bens coletivos, dos interessesdifusos e de sua tutela por parte da sociedade como um todo, não há consenso em torno de quais bens, de quais interesses devam ser protegidos penalmente e em que medida. Atenção Devemos ter em mente que existe um espaço bastante razoável para a expansão do Direito Penal em face da emergência/construção sócio-histórica de novos bens jurídico- penais, entretanto, é possível afirmar que tal expansão vem se produzindo desarrazoadamente. Delimitação do bem jurídico-penal Desta forma, podemos citar, dentre os motivos, para a nova delimitação do bem jurídico-penal: Configuração/generalização de novas realidades A configuração/generalização de novas realidades de natureza econômica, tecnológica, política até então inexistentes ou cuja existência não se mostrava significativa – essas novas realidades passaram a influenciar os contextos de vida das pessoas (as novas tecnologias da informação/comunicação, as novas dinâmicas do setor financeiro, novas práticas de controle social). Escassez de determinados tipos de bens A escassez de determinados tipos de bens, de recursos “naturalmente” considerados “inesgotáveis”, escassez esta resultante da deterioração de NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 18 realidades tradicionalmente abundantes – como exemplo, podemos citar as questões relacionadas ao meio ambiente. Aumento de valor de determinadas realidades O aumento de valor de determinadas realidades (de presença absolutamente “cotidiana”) em função de redimensionamentos culturais, artísticos, paisagísticos – como é o caso do patrimônio histórico-cultural (material e imaterial). O surgimento efetivo de novos riscos Com a enorme difusão da obra de Ulrich Beck, a forma histórica assumida pelo capitalismo a partir das últimas décadas do século XX e nesse início do século XXI passou a receber a denominação de “sociedade de risco”. Ainda que os avanços tecnológicos tenham produzido (e continuem produzindo) impactos significativos no bem-estar individual, não podemos esquecer das consequências negativas destes avanços. Dentre elas, deve-se ressaltar a configuração do risco de procedência humana como fenômeno social estrutural. A configuração do risco de origem humana como um fenômeno social estrutural decorre em boa parte das ameaças a que os cidadãos estão sujeitos, provenientes de decisões tomadas por outros cidadãos no manejo de avanços técnicos e que produzem riscos direta ou indiretamente (consumidores, usuários, beneficiários de serviços públicos). Encerramento Assim, do surgimento dos Novos Riscos, extraímos as seguintes observações: Ciberdelinquência NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 19 O progresso técnico proporciona (na verdade, tem proporcionado cada vez mais), no contexto da delinquência dolosa, a adoção de novos instrumentos capazes de produzir resultados significativamente lesivos, gerando novas modalidades delituosas que se projetam e se expandem nos campos abertos pelas novas tecnologias. Tal “evolução” pode ser percebida no incremento da criminalidade associada à informática e à internet – a chamada ciberdelinquência. Ambiente delituoso O ambiente delituoso proporcionado pela “evolução” a que nos referimos ganha contornos mais dramáticos quando se verifica a sua vinculação com formas de criminalidade organizada, operando internacionalmente e produzindo efeitos danosos sobre os indivíduos e os Estados. Inovações Além disso, as inovações organizacionais e tecnológicas tem incidido significativamente no âmbito da delinquência não intencional (dolosa eventual ou culposa). No que se refere ao âmbito da chamada delinquência não intencional, há que se considerar que as consequências lesivas decorrentes de determinadas “falhas técnicas” se configuram através de acidentes graves, muitas das vezes como resultados inevitáveis da complexidade das configurações técnicas. Atenção Nesse contexto da qualificação dolosa eventual ou culposa, a questão crucial reside nos critérios que serão usados na “localização das falhas”, se no âmbito do risco penalmente relevante ou no âmbito próprio do risco permitido. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 20 Sociedades pós-industriais As chamadas sociedades pós-industriais, além de se configurarem como “sociedades de risco”, também podem ser entendidas como sociedades de “objetiva” insegurança. Novas tecnologias O emprego de novos meios técnicos, a comercialização de produtos e/ou a utilização de produtos potencialmente produtores de efeitos nocivos (desconhecidos logo após a realização da conduta, mas reconhecidos como prejudiciais após um tempo) introduzem um importante fator de incerteza na vida social. Atividade proposta Leia a transcrição da matéria “PF prende condenado por tráfico de pessoas”, publicada no jornal Estadão, bem como os comentários disponibilizados pela mídia sobre a novela “Salve Jorge”, transmitida pela Rede Globo de Televisão, e trace um paralelo entre a realidade fática apresentada pela produção televisiva e a realidade brasileira atual. PF prende condenado por tráfico de pessoas A Polícia Federal prendeu um foragido da Justiça condenado por tráfico internacional de pessoas para prostituição no sábado, durante um culto de uma seita dedicada ao xamanismo, em Capivari do Sul, no leste do Rio Grande do Sul. O mandado de prisão foi emitido em 2009 e, desde então, o procurado havia conseguido escapar de duas tentativas de prisão. Segundo a Polícia Federal, ele aliciava mulheres sob falsas promessas de obtenção de lucros elevados com prostituição em Hamburgo, na Alemanha, e Ibiza, na Espanha. O esquema contava também com uma irmã do preso, que NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 21 providenciava documentos, e um terceiro participante, que coordenava os embarques para a Europa. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/geral,pf-prende- condenado-por-trafico-de-pessoas,977196,0.htm>. Salve Jorge: fatos reais sobre tráfico de pessoas e adoção internacional Novela insere depoimentos de quem viveu direta ou indiretamente o drama Em novembro, a novela Salve Jorge passou a inserir depoimentos reais de pessoas que viveram ou acompanharam de perto o drama de quem foi sequestrado ou levado para adoção internacional. Em um dos depoimentos, o pai João Borges conta a história de Simone Borges, que foi à Espanha na esperança de ganhar dinheiro, no entanto, era uma farsa e a moça foi forçada a se prostituir. Assim como na ficção, os sequestradores ficaram todo o dinheiro de Simone, o passaporte e a mantiveram em cativeiro. Com ela, estavam entre 10 e 15 outras brasileiras vivendo o mesmo drama. Simone morreu no mesmo ano que foi para a Espanha, em 1996. Em outro depoimento, Fabiana Soares conta que foi levada para Israel com poucos dias de vida. Na cena de Salve Jorge, a personagem Aisha (Dani Monteiro) – que foi para a Turquia ainda bebê, adotada de forma ilegal pela personagem Berna (Zezé Polessa) – assiste à Fabiana contando que gostaria de conhecer a mãe biológica. Disque Salve A Rede Globo disponibilizou para o público o site Disque Salve, criado para dar orientações e ajudar a esclarecer dúvidas sobre tráfico e exploração de pessoas, assuntos abordados em Salve Jorge. Como a exibição da novela deverá aumentar o interesse dos telespectadores sobre esses temas, a Rede Globo está apoiando o serviço desenvolvido pelo NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 22 Viva Rio. Uma central de atendimento esclarece, pelo telefone (21) 2555-3777, de segunda a sábado, das 17h às 23h, dúvidas sobre exploração sexual, exploração de crianças e adolescentes e trabalho escravo, além de orientar sobre onde buscar ajuda no Brasil e no exterior. O Disque Salve, que funcionará até o fim da novela, conta ainda com umsite para agilizar os contatos e os esclarecimentos. Disponível em: <http://redeglobo.globo.com/globocidadania/nas- novelas/noticia/2012/12/salve-jorge-insere-depoimentos-reais-de-quem-viveu- o-trafico-de-pessoas.htm>. Chave de resposta: Na atividade proposta deverão ser analisadas as medidas de política criminal a serem adotadas para fins do exercício da cidadania, de modo a sublimar a exploração sexual, a exploração de crianças e adolescentes e o trabalho escravo. Material complementar Para saber mais sobre globalização e sociedade de risco e direito penal e scoeidade de risco, acesses os textos disponíveis em nossa biblioteca virtual. Referências BECK, Ulrich. La sociedade del riesgo. Hacia uma nueva modernidad. Barcelona: Paidós, 2006. PRADO, Luiz Regis. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2013. ______. Bem jurídico-penal e Constituição. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 23 SILVA SANCHEZ, Jesús-María. Trad. ROCHA, Luiz Otávio de Oliveira. A Expansão do direito penal. Aspectos da política criminal nas sociedades pós- industriais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. SILVA, Pablo Rodrigo Alflen da. Leis Penais em branco e o direito penal do risco: aspectos críticos e fundamentais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. Exercícios de fixação Questão 1 Analise as assertivas abaixo, sobre as velocidades do Direito Penal e suas transformações. Assinale a opção INCORRETA: a) A teoria dualista sobre bem jurídico penal preconiza que existem duas classes de bem jurídico: individual e coletivo, sendo este tutelado independentemente do risco de lesão ao indivíduo. b) O Direito Penal de primeira velocidade, também denominado de Direito Penal do cidadão, fundamenta-se no garantismo penal desenvolvido por Ferrajoli, segundo o qual toda a atividade estatal de controle social-penal deve respeitar a força normativa da Constituição. c) Direito Penal de terceira velocidade tem como um de seus precursores Gunter Jakobs e visa à proteção da coletividade de seus inimigos, surgindo, desta forma, o denominado “Direito Penal do Inimigo”. d) As expressões “Direito Penal da Globalização” e “Direito Penal na Era da Globalização” são sinônimas e refletem um fenômeno novo. Questão 2 Analise as assertivas abaixo, sobre as principais características do Direito Penal na era da globalização, e assinale a opção INCORRETA: a) Privatização ou terceirização da Justiça através da gestão do crime. b) Utilização de medidas de política criminal de “descriminalização” ou de “despenalização” e redução de “criminalização”. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 24 c) Utilização ampla da técnica dos delitos de perigo abstrato e normas penais do mandato em branco. d) Uso do Direito Penal como instrumento de política de segurança (em contradição com sua natureza subsidiária). e) Utilização de medidas de política criminal deliberadas de “criminalização” antes “descriminalização” ou de “despenalização”. Questão 3 Analise as assertivas abaixo, sobre as principais transformações ocorridas no Direito Penal tradicional, e assinale a opção INCORRETA: a) Globalização dos crimes e dos criminosos. b) Globalização de medidas de política criminal de “descriminalização e redução de criminalização. c) Globalização das vítimas. d) Globalização da explosão carcerária. e) Globalização dos bens jurídicos. Questão 4 Leia a afirmativa: Uma das características do Direito Penal na era da globalização é a não utilização das normas penais em branco. Esta afirmativa pode ser considerada: a) Verdadeira b) Falsa Questão 5 Leia a afirmativa: Na sociedade globalizada, como se firmou e vem se firmando a clara distinção entre globalizados e excluídos, a distribuição de renda é inversamente proporcional à distribuição de castigos. Esta alternativa pode ser considerada: NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 25 a) Verdadeira b) Falsa Questão 6 (MPE-MG – Promotor de Justiça – 2013) São criações doutrinárias diretamente relacionadas à punição na sociedade do risco, EXCETO: a) Direito de Intervenção b) Direito Penal de duas velocidades c) Direito Penal secundário d) Direito Penal funcional Questão 7 Leia a afirmativa: A chamada cifra negra ou oculta refere-se à porcentagem de crimes não solucionados ou punidos porque, num sistema seletivo, não caíram sob a égide da polícia ou da justiça ou da administração carcerária, porque nos presídios “não estão todos os que são”. Essa afirmativa pode ser considerada: a) Verdadeira b) Falsa Questão 8 Leia a afirmativa: Dentre as consequências negativas dos avanços tecnológicos, podemos destacar o risco de procedência humana como fenômeno social estrutural. Esta afirmativa pode ser considerada: a) Verdadeira b) Falsa Questão 9 Em virtude do surgimento de novos riscos, as assertivas abaixo estão corretas, EXCETO: NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 26 I. O progresso técnico tem proporcionado cada vez mais, no contexto da delinquência dolosa, a adoção de novos instrumentos capazes de produzir resultados significativamente lesivos, gerando novas modalidades delituosas que se projetam e se expandem nos campos abertos pelas novas tecnologias. II. As inovações organizacionais e tecnológicas têm incidido significativamente no âmbito da delinquência não intencional (dolosa eventual ou culposa). As chamadas sociedades pós-industriais, além de se configurarem como “sociedades de risco”, podem ser entendidas como sociedades de “objetiva” insegurança. III. O emprego de novos meios técnicos, a comercialização de produtos e/ou a utilização de produtos potencialmente produtores de efeitos nocivos introduzem um importante fator de incerteza na vida social. IV. A evolução técnica não tem qualquer ligação com o aumento da criminalidade associada à informática e à internet. a) I b) II c) III d) IV Questão 10 Dentre os motivos que justificam a existência de novos bens jurídicos penais podem-se citar: a) Novas realidades de natureza econômica, tecnológica e política. b) Excesso de determinados tipos de bens, de recursos “naturalmente” considerados “inesgotáveis”. c) Diminuição do valor de determinadas realidades (de presença absolutamente “cotidiana”) em função de redimensionamentos culturais, artísticos, paisagísticos – como é o caso do patrimônio histórico-cultural (material e imaterial). d) Apesar de haver novas realidades tecnológicas, políticas e sociais, essas realidades não influenciaram o Direito Penal. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 27 Desnacionalização do Direito: Remete-nos ao contexto da perda, por parte do Estado, da titularidade do monopólio da produção das normas jurídicas (sob o impacto da globalização e das mudanças qualitativas do Direito Internacional) e se encontra referenciada a três processos distintos que apresentam como denominador comum: • A relativização da soberania do Estado; • A universalização da tutela dos direitos humanos; • A integração dos Estados através de blocos regionais; • A expansão de um direito paralelo ao direito dos Estados (a chamada LEX MERCATORIA – adotada pelas empresas transnacionais em função da dispersão de suas atividades por diversos territórios). Aula 1 Exercícios de fixação Questão 1 - D Justificativa: São expressões distintas. O Direito Penal da globalização trata de um fenômeno novo e o Direito Penal na era da globalização é produto e reflexo da soma de todas as transformações do Direito Penal tradicional que se construiu originalmente a partir do final do século XVIII com as modificações características da globalização. Questão 2 - B Justificativa: Justamente é feito o contrário. Há uma maior criminalização.Questão 3 - B NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 28 Justificativa: Não há redução da criminalização, mas se faz justamente o contrário. Questão 4 - B Justificativa: Falsa, pois há utilização ampla da técnica de tipificação de normas penais do mandato em branco. Questão 5 - A Justificativa: Verdadeira, conforme você viu durante a aula a afirmativa se refere à globalização da explosão carcerária. Questão 6 - D Justificativa: O Direito Penal Funcional de Günter Jakobs tem por objetivo que a pena represente a realidade do sistema jurídico. Questão 7 - A Justificativa: O termo cifra negra se refere aos crimes não solucionados ou não punidos. Questão 8 - A Justificativa: A configuração do risco de origem humana como um fenômeno social estrutural decorre em boa parte das ameaças a que os cidadãos estão sujeitos, provenientes de decisões tomadas por outros cidadãos no manejo de avanços técnicos e que produzem riscos direta ou indiretamente (consumidores, usuários, beneficiários de serviços públicos). Questão 9 - D Justificativa: Observa-se um incremento da ciberdelinquência. Questão 10 - A Justificativa: A configuração/generalização de novas realidades de natureza econômica, tecnológica, política até então inexistentes ou cuja existência não se NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 29 mostrava significativa – essas novas realidades passaram a influenciar os contextos de vida das pessoas (as novas tecnologias da informação/comunicação, as novas dinâmicas do setor financeiro, novas práticas de controle social). NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 30 Introdução Na presente aula, serão analisadas, de forma crítica e baseada no estudo concatenado da Dogmática Penal com as demais Ciências Criminais, formas de criminalidade que, segundo seu modus operandi e caráter transnacional, aproveitam-se dos avanços da sociedade globalizada, econômica e politicamente, como forma de expandir a lesividade de suas condutas, bem como, as medidas de Política Criminal adotadas pelo Estado Democrático de Direito. O estudo terá também por objetivo a compreensão do surgimento e desenvolvimento da criminalidade econômica, bem como das medidas de política criminal a serem adotadas pelo Estado para fins de controle social- penal. Objetivo: 1. Correlacionar as novas configurações do terrorismo na sociedade contemporânea com o Direito; 2. Identificar a dimensão supraindividual dos bens jurídico-penais tutelados e a própria regulação da política econômica do Estado. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 31 Conteúdo Algumas reflexões de natureza histórica, política e jurídica Não é difícil encontrar nos jornais impressos e nos noticiários da televisão, do rádio e da Internet reportagens, matérias, notícias, cadernos ou sessões especializadas tratando da temática do terrorismo em suas mais variadas versões (religiosas, nacionalistas, emancipacionistas, fundamentalistas). Ainda que exista um certo senso comum na opinião pública internacional sobre o que é o terrorismo, a ambiguidade do termo (em que se misturam direito e política) dificulta, até hoje, uma construção teórica (política e doutrinário- jurídica) capaz de contribuir para a elaboração de procedimentos que permitam aos Estados e à comunidade internacional dar respostas adequadas (enfrentamento adequado) a esse grave problema contemporâneo. Novas configurações do terrorismo Na passagem dos anos 1980 para os 1990, verificou-se a emergência de novos tipos de terrorismo: o terrorismo doméstico norte-americano e o terrorismo internacional de grupos fundamentalistas islâmicos. Como exemplos do primeiro, temos as ações do Unabomber, que durante 20 anos enviou pacotes-bomba para suas vítimas – ao ser preso, em 1996, não revelou qualquer motivação política concreta –, e a ação espetacular levada a cabo por Timothy Mc Veigh (um ultranacionalista de 27 anos) que explodiu um prédio do governo federal norte-americano em Oklahoma, matando 168 pessoas, dentre as quais 25 crianças com idades de 0 a 06 anos. Além disso, o culto às armas nos EUA produz frequentemente massacres de pessoas inocentes – tais massacres se repetem com frequência nos mais diferentes locais do território norte-americano. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 32 O terrorismo fundamentalista islâmico contemporâneo nos ofereceu algumas das mais impressionantes cenas das últimas décadas: a explosão do Boeing da Pan Am em dezembro de 1988 nos céus da Escócia, os ataques ao World Trade Center em 1993, em 2001 os ataques aos trens em Madri em 2004, e os ataques ao metrô de Londres em 2005. Terrorismo e Direito Penal do Inimigo Neste momento, começamos a discutir o denominado de Terceira Velocidade, que como visto anteriormente, tem como um de seus precursores Günter Jakobs e visa à proteção da coletividade de seus inimigos. Tal condição se agrava com os discursos políticos acerca do terrorismo, sobretudo naqueles que se baseiam no chamado Direito Penal do Inimigo – fenômeno que se encontra explicitado nas reações ao terrorismo que se produzem nos âmbitos dos legislativos do Ocidente. De um modo geral, no contexto das sociedades “ocidentais”, observa-se há algum tempo um progressivo abandono do princípio do Direito Penal Mínimo e a adoção de propostas mais contundentes que vão da expansão da atuação do Direito Penal “comum” à emergência do Direito Penal do Inimigo – este se apresentaria como uma resposta “adequada” (enérgica e vigorosa) a possíveis ataques terroristas, ameaçadores da ordem representada em um discurso de repressão que se legitima na identificação do inimigo terrorista e na promulgação de leis voltadas para o incremento da segurança. Todavia, uma legislação mais dura e pretensamente garantidora da segurança pode se constituir em grande ameaça à democracia. Aspectos gerais da teoria do Direito Penal do Inimigo de Günther Jakobs Günther Jakobs, enunciador da Teoria do Direito Penal do Inimigo, defende, desde 1985, uma separação entre o “cidadão de bem” e o “inimigo”. O NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 33 cidadão de bem, ainda que infrinja uma norma, terá seus direitos de “cidadão-acusado” garantidos. O inimigo, por sua vez, não é vinculado às normas do Direito, devendo agir sobre ele tão somente a coação: esta seria a única forma de combater a sua periculosidade. A teoria do Direito Penal do Inimigo ganhou notoriedade a partir de atentados praticados desde a primeira década do atual século, quando alguns países passaram a adotar punições que quase sempre suprimem direitos humanos, incluindo-se o direito à vida. O delinquente-inimigo, de acordo com Jakobs, é aquele que infringe o contrato social de tal forma que não cabe mais a ele a condição de cidadão – a condição de inimigo contudo não é atribuída a qualquer um, mas somente àqueles que são completamente refratários ao contrato, representando não apenas uma ameaça ao ordenamento jurídico, mas um alto risco para a sociedade – assim, para esses indivíduos o Direito Penal do cidadão não teria vigência. Por representar alto risco para a sociedade, o inimigo deve ter a sua punição antecipada – no âmbito da Teoria do Direito Penal do Inimigo, este (o inimigo) só pode receber como resposta a coação, pois não se trata de uma pena contra pessoas culpáveis, mas contra indivíduos perigosos que devem ter suas ações e seu potencial ofensivo neutralizados. A tese de Jakobs apresenta três fundamentos básicos: Antecipação da punição do inimigo; Desproporcionalidade das penas e relativização e/ou supressão de certas garantias processuais; NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 34 Criação de leis severas direcionadas a uma clientela específica: terroristas,facções criminosas, traficantes, homens-bomba etc. A temática do terrorismo no Direito brasileiro Quando se analisa a influência do terrorismo e das respostas político- normativas ao estilo do Direito Penal do Inimigo de Jakobs, é possível constatar que o processo de construção normativa (pensado em termos amplos e globais) já estava atento à temática do terrorismo bem antes dos atentados de 11 de setembro de 2001. Entretanto, foi a partir dos eventos de setembro de 2001 que teorias como a do Direito Penal do Inimigo proporcionaram legitimidade a um tipo de lei que escapava do âmbito do Direito Penal do Estado Democrático de Direito – um tipo de lei voltada para segmentos específicos da sociedade entendidos como perigosos e apartados definitivamente do pacto social. No caso da legislação brasileira, não há, em nosso Código Penal, uma clara caracterização do “inimigo em si” tal como se encontra na tipificação dos crimes contra a segurança do Estado, fixada na legislação extravagante vigente. O “inimigo em si” a que nos referimos anteriormente encontra-se na Lei nº 7.170/1983, a Lei de Segurança Nacional. No entanto, a lei é de 1983 e tudo isso se modificou drasticamente com o advento da Constituição de 1988 e com os atos terroristas do início do século XXI. Com a promulgação da Constituição de 1988 e com a posterior ocorrência dos atos terroristas de cunho internacional da primeira década do atual século, retomou-se a discussão em torno da inexistência, em nosso ordenamento, do delito especificamente nomeado e tipificado como Terrorismo. Além disso, as condutas relacionadas no tipo penal fixado no artigo 20 da Lei nº 7.170/1983 passaram a ser questionadas menos por sua inadequação ao princípio da legalidade e mais pelo fato de que este artigo teria sido revogado tacitamente pela nova ordem constitucional. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 35 Por se tratar de uma lei produzida ainda em um contexto de regime militar, a Lei nº 7.170/1983 concedeu um tratamento às temáticas da divergência política e das organizações políticas que em muito diferem do que se encontra fixado no inciso XVII do art. 5º da Constituição de 1988. Pela atual Constituição, não há como vislumbrar organizações políticas clandestinas ou subversivas (a não ser aquelas cuja finalidade seja a manutenção de organização política subversiva de caráter paramilitar) e nem a condenação do “inconformismo político”, um dos alicerces do Estado Democrático de Direito. O debate a respeito da temática do terrorismo ganhou novo impulso no contexto brasileiro com o desencadeamento do processo da reforma do Código Penal, especialmente a partir da apresentação do anteprojeto do novo Código Penal ao Senado em junho de 2012, anteprojeto este que foi o resultado dos trabalhos desenvolvidos por uma comissão, instituída em outubro de 2011, e que está tramitando como PLS nº 236/2012. Criminalidade econômica Com a expansão do Direito Penal, no contexto de uma Sociedade Globalizada de Riscos, as transformações políticas e econômicas, bem como o surgimento de uma nova gama de bens-jurídicos penais a serem tutelados que ultrapassam a esfera individual, novas formas de criminalidade se desenvolvem e demandam do Estado a adoção de medidas de política criminal específicas face à indeterminação qualitativa e quantitativa dos bens jurídico-penais lesionados. É neste cenário que a criminalidade econômica passa a ser analisada como categoria sociológica autônoma e, consequentemente, um ramo autônomo do Direito Penal. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 36 Considerações gerais sobre a ordem econômica A partir da premissa de que a expressão “ordem”, para nós, significará o conjunto de valores e diretrizes voltados a uma mesma finalidade ou objetivo, podemos definir a “ordem econômica” como conjunto de normas, diretrizes e medidas de política pública voltadas à organização das relações econômicas. Neste sentido, afirma Pasini (1997) que ordem econômica é: "a distribuição de poder de disposição efetiva sobre bens e serviços econômicos que se produz consensualmente, segundo o modo de equilíbrio dos interesses, e à maneira como esses bens e serviços se empregam segundo o sentido desse poder fático de disposição que repousa sobre o consenso”. A Constituição da República Federativa do Brasil, ao consagrar competência legislativa concorrente da União, Estados e do Distrito Federal sobre normas de Direito Econômico, consoante dispõe o art. 24, I, e estabelece, ainda, uma série de princípios explícitos, norteadores de sua ordem econômica, nos nove incisos do art. 170, o que denota sua autonomia jurídico-científica. Características do Direito Econômico O Direito Penal econômico deve ser visto como um sistema de normas que busca o equilíbrio nas relações econômicas entre indivíduos e indivíduos e o Estado com vistas à defesa da política econômica do Estado, permitindo que esta encontre os meios para a sua realização. São, portanto, a segurança e a regularidade da realização dessa política econômica do Estado que constituem precipuamente o objeto jurídico do Direito Penal Econômico. (PIMENTEL, 1973, p. 21) Recenticidade É um ramo do Direito relativamente recente, oriundo do intervencionismo econômico (teoria moderna econômica – macroeconomia), com o fito de NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 37 discipliná-lo e regrá-lo. Portanto, sendo um ramo do Direito ainda em formação, fica sujeito às constantes influências e mudanças que ocorrem no dinâmico mercado econômico; Concretismo É um ramo jurídico próprio para o fato econômico característico de cada país, não havendo, comumente, um conjunto de regras para norteá-lo, como ocorre com outros ramos do Direito, tais como o Civil e o Penal; Singularidade O Direito Econômico disciplina os fenômenos socioeconômicos concretos e é visceralmente vinculado aos fatos históricos relevantes ao Estado e aos indivíduos e as relações jurídico-econômicas entre estes. Direito Penal Econômico A definição de Direito Penal Econômico, ciência autônoma do Direito Penal, é objeto de controvérsia, pois não só visa regular as relações jurídicas entre o Estado e os agentes econômicos de modo a fomentar a intervenção mínima estatal penal na ordem econômica, vindo a tutelar não somente direitos supraindividuais, mas também direitos individuais decorrentes das relações econômicas e de mercado. Além da ausência de individualização das condutas e resultados lesivos, a criminalidade econômica, na sociedade globalizada, caracteriza-se como a criminalidade praticada pelos “econômica e politicamente poderosos” e que, portanto, tem o condão de desestabilizar toda a ordem econômica e, consequentemente, todo mercado de um Estado. Diferentemente da criminalidade clássica, na qual é possível a individualização das condutas e, precipuamente são lesionados bens individuais, a criminalidade NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 38 econômica encontra-se inserida na denominada criminalidade moderna, segundo a qual são tutelados bens jurídicos supraindividuais, sendo, consequentemente, impossível a delimitação da extensão de seus danos. Importante destacar que os delitos econômicos abrangem em sentido amplo os crimes tributários, previdenciários e bancários. Desta forma, nos crimes econômicos, o bem jurídico tutelado é a ordem econômica, ou seja, o conjunto de relações econômicas que devem ser entendidas como um conjunto de regras e princípios relativos à produção, à distribuição e ao fornecimento de bens materiais suscetíveis de apreciação monetária e negociação, é evidentemente composta por bens jurídicos coletivos ou supraindividuais. Neste sentido assevera Sandra Gomes Esteves (2007) que “As infrações penais econômicas são constituídas por violações à organizaçãoeconômica do Estado, tipificadas criminalmente”. Macro e microcriminalidade Paralelamente à discussão fomentada acerca da caracterização do Direito Penal Clássico e Moderno ou das Velocidades do Direito Penal, ao estudarmos a criminalidade econômica é imprescindível que diferenciemos a macro e a microcriminalidade. Microcriminalidade A microcriminalidade, sob a ótica da criminologia, volta-se à análise do fenômeno individual, seja em relação ao agente da conduta, seja em relação à natureza e dimensão dos bens jurídicos lesionados. Podemos citar, por exemplo, os delitos contra o patrimônio perpetrados isoladamente, sem que os agentes integrem “organizações criminosas”, logo, pode ser identificada como o conjunto de infrações penais individuais. Macrocriminalidade A macrocriminalidade, voltada à criminalidade de caráter econômico, possui como infrações características a criminalidade organizada e os delitos de NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 39 colarinho branco. Cabe salientar que a macrocriminalidade é fruto da necessidade de maior velocidade das transações e da Interdependência econômica Globalizada que gera Riscos para todos os agentes econômicos. Em contrapartida, essas novas formas de criminalidade ensejaram a adoção de novas medidas de Política Criminal adotadas pelos Estados no âmbito da investigação e do Processo Penal, baseadas, inclusive, em um sistema de cooperação. A independência entre Direito Penal Administrativo e o Direito Administrativo Penal Esse tema, que merece ser analisado com acuidade, diz respeito à independência entre as esferas penal e administrativa, pois em determinadas situações fáticas podem ensejar, concomitantemente, infrações de natureza administrativa, tais como o não pagamento de um tributo, bem como uma infração penal e, por força do princípio do non bis in idem, imperioso destacarmos a necessidade do exaurimento da esfera administrativa para fins de propositura da respectiva ação penal. Podemos citar como exemplo o delito de descaminho e a infração aduaneira pelo não pagamento de multas. Importante destacar que, em relação aos crimes materiais contra a ordem tributária, previstos no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/1990, a Súmula Vinculante nº 24, estabelece que não se tipifica o crime antes do lançamento do tributo. Ou seja, não haverá justa causa para a propositura da ação penal enquanto não houver decisão definitiva do processo administrativo. Tal posicionamento tem sido defendido pelo Supremo Tribunal Federal desde 2003, após a decisão, pelo Tribunal Pleno, do HC nº 81.611/DF. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 40 A pessoa jurídica como agente e a coautoria em crimes contra a ordem econômica A discussão acerca da possibilidade da responsabilidade penal da Pessoa Jurídica tem por elemento nodal o disposto nos Artigos 225, §3º, e 173, §5º, ambos da Constituição da República de 1988, todavia, o entendimento predominante, a partir da adoção da Teoria da ficção jurídica de Savigny, é pela impossibilidade de se qualificar a pessoa jurídica como sujeito ativo de delito. Saliente-se que, pelo fato de o Direito Penal ser formado pelos princípios da responsabilidade penal subjetiva, da pessoalidade da pena e da culpabilidade, serão sujeitos ativos o empresário individual ou sócios integrantes da empresa comercial, jamais esta, por lhe faltar a consciência e a vontade de atuar. Como bem assevera Luiz Regis Prado, “não há que se confundir sujeito da ação e sujeito da imputação” [...], bem como [...] “a pessoa jurídica não possui capacidade de ação em sentido estrito; capacidade de culpabilidade; capacidade de pena” (p. 120-121), razão pela qual não há que se falar em responsabilidade jurídico-penal da pessoa jurídica, ou seja, a responsabilidade pessoal dos dirigentes não se confunde com a responsabilidade da pessoa jurídica. Outra questão relevante a ser suscitada decorre da dimensão supraindividual dos bens jurídicos tutelados e, portanto, da própria política econômica do Estado, qual seja, a infração à ordem econômica exige que o sujeito ativo da infração detenha poder de mercado, isto é, o poder econômico capaz de, por seu abuso, restringir ou limitar a livre concorrência no mercado relevante. Neste sentido, vide PRADO, Luiz Regis. Direito penal econômico. São Paulo: Revista dos tribunais, 2004. p. 36-37. NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 41 Atividade proposta Com base nos estudos realizados acerca da transnacionalização do Direito Penal, leia a notícia do Supremo Tribunal Federal. Após realizar a leitura, aponte as principais questões norteadoras acerca da transnacionalização do Direito Penal. NOTÍCIAS STF Quarta-feira, 02 de junho de 2010 Ministro Celso de Mello decidirá pedido de prisão contra suposto terrorista estrangeiro. O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), é relator de um pedido de prisão preventiva para fins de extradição que envolve um cidadão estrangeiro, que estaria em território brasileiro, e que está sendo investigado em seu país por suposta prática de terrorismo. O ministro pediu informações ao Estado estrangeiro que considera indispensáveis para que possa decidir o pedido de prisão. Para preservar o sigilo do caso, a íntegra do despacho não será publicada no Diário da Justiça eletrônico do STF. Inicialmente, o ministro Celso de Mello destaca a interessante controvérsia doutrinária em torno da definição e da tipificação penal dos atos de terrorismo no ordenamento jurídico brasileiro. Isso porque, para que um pedido de extradição seja aceito pelo Brasil, é necessário que a conduta imputada ao cidadão seja tipificada como crime no seu país de origem e também no nosso país. O postulado da tipicidade é um dos requisitos necessários para a concessão da extradição. De acordo com o ministro, embora haja controvérsia em torno da definição e da tipificação penal do delito, valores consagrados na Constituição permitem qualificar o terrorismo como crime inafiançável e insuscetível da clemência do Estado. Com base em precedente do STF (Ext 855), o ministro ressaltou que terrorismo não é crime político, tendo em vista que o repúdio ao delito está NOVAS TENDÊNCIAS EM DIREITO PENAL 42 entre os princípios essenciais que devem reger o Estado brasileiro em suas relações internacionais, de acordo com o artigo 4º, inciso VIII, da Constituição. “Essas diretrizes constitucionais – que põem em evidência a posição explícita do Estado brasileiro, de frontal repúdio ao terrorismo – têm o condão de desautorizar qualquer inferência que busque atribuir, às práticas terroristas, um tratamento benigno de que resulte o estabelecimento, em torno do terrorista, de um inadmissível círculo de proteção que o torne imune ao poder extradicional do Estado brasileiro”, afirmou o ministro. De acordo com o precedente citado pelo ministro em seu despacho, a cláusula de proteção prevista no art. 5º, inciso LII, da Constituição – que veda a extradição de estrangeiros por crime político ou de opinião – não se estende ao autor de atos de natureza terrorista. Mas, segundo o ministro relator, no caso em questão, não há informação acerca dos elementos definidores do delito de terrorismo, nem a respeito da data e local em que teria ocorrido. As informações deverão ser prestadas por meio da missão diplomática do país no Brasil. “A insuficiência descritiva do fato delituoso também não me permite verificar se, a despeito do nomen iuris dado pela legislação penal do Estado requerente, o fato delituoso poderia, eventualmente, subsumir-se a tipo penal previsto no ordenamento positivo do Brasil, assim satisfazendo a exigência da dupla tipicidade. Como anteriormente ressaltado, o princípio da dupla tipicidade impõe que o ilícito penal atribuído ao extraditando seja
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