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- -1 HISTÓRIA DA ÁFRICA DO SÉCULO XX O MODELO COLONIAL PORTUGUÊS E FRANCÊS: UM ESPAÇO EM TRANSFORMAÇÃO NO SÉCULO XX - -2 Olá! Ao final desta aula, você será capaz de: 1- Examinar a estrutura da organização colonial imposta pelos portugueses. 2- Analisar os principais objetivos e as formas econômicas na exploração das colônias francesas. 3- Relacionar os processos de independência das duas colônias como casos específicos. Estamos diante de uma África que no século XX ainda vive sob a tutela, influência ou como quer que pensemos dos europeus, mas iniciando claros sinais de resistência e reorganização. Seus moldes não estão definidos e as formas desta independência ainda estão em concepção, mas os modelos coloniais e as transformações decorrentes dos acordos de paz e das guerras anticoloniais nos oferecem o pano de fundo para compreender as primeiras décadas do século XX africano. Premissa Entre 1880 e 1900, a África tropical apresentava um estranho e brutal paradoxo. Se o processo da conquista e da ocupação pelos europeus era claramente irreversível, também era altamente resistível. Irreversível por causa da revolução tecnológica – pela primeira vez, os brancos tinham uma vantagem decisiva nas armas, e, também pela primeira vez, as ferrovias, a telegrafia e o navio a vapor permitiam-lhes oferecer resposta ao problema das comunicações no interior da África e entre a África e a Europa. Resistível devido à força das populações africanas e porque, na ocasião, a Europa não empregou, na batalha, recursos muito abundantes nem em homens nem em tecnologia. De fato, os brancos compensavam a escassez de homens recrutando auxiliares africanos. Mas eles não eram manipuladores diabolicamente inteligentes de negros divididos e atrasados. Os europeus estavam apenas retomando o repertório das estratégias dos antigos impérios. Quanto a detalhes, muitas vezes sabiam menos das coisas que os dirigentes africanos. A implementação da estratégia de penetração foi muito desordenada e inábil. Os europeus enfrentaram uma enormidade de movimentos de resistência que provocaram e até inventaram por ignorância e medo. Fonte: http://unesdoc.unesco.org/images/0019/001902/190255por.pdf Nesta aula, trataremos de dois colonizadores históricos da África: Portugal e França - -3 Esses domínios começam a ser constituídos ainda no século XVI, mesmo que apenas consolidados os modelos de exploração para além do tráfico negreiro no século XIX. França e Portugal, na partilha da África, em especial os portugueses, defenderam sua posição histórica, mantida pelos franceses com Napoleão e a conquista do Egito. A dominação francesa O domínio francês foi especialmente marcado em regiões de grande relação com o Mediterrâneo, em especial os espaços de dominação muçulmana. Portugal tinha suas duas maiores colônias em Angola, no Atlântico, fundamental com o comércio com o Brasil e Moçambique, um dos pontos importantes da dinâmica de Portugal com o Oriente, reunindo Goa, Timor e o papel de Moçambique. Atenção Sem discutir aspectos gerais das duas colônias e seu diálogo no século XX, devemos notar que diante da industrialização, no século XIX, França e Portugal iniciam um processo de modernização e ocupação de suas terras no domínio Africano. Não se trata de uma dinâmica marcada pelos domínios de empresas, como no caso inglês, mas pela forte atuação do governo, seja na formação e no incentivo a ocupar as velhas colônias, seja pelo controle militar destas áreas. Não à toa são as primeiras regiões onde começam a se observar um forte movimento de resistência que se aproxima da ordem de um nacionalismo o qual discutiremos mais na próxima aula. Quando estes movimentos foram detectados a França usou os mesmos em prol de lutas que eram tratadas às vésperas da Primeira Guerra, e tornaram-se um palco importante com a promessa de alianças entre os colonizadores e os domínios. Em áreas portuguesas, no entanto, a luta era contra toda e qualquer manifestação que não vinculasse as colônias ao governo central. Colonialismo e resistência Neste ponto, uma discussão é necessária: Fique ligado A ocupação é um dos elementos mais importantes nesta construção, pois sabemos que, em um primeiro momento, a dinâmica comercial era presente e vinculada a produtos agrícolas e tráfico de escravos. - -4 O que é colonialismo e o que é resistência? A visão mais tradicional de História só estudava o colonialismo, apenas as relações com vistas e forma ao domínio Europeu. Hoje, podemos observar a figura de colonialismo pensando por dois lados, em um aspecto relacional, entre a proposta europeia e a organização, e tentativas e lutas dos povos por sua condição diferenciada. Se por um lado, estes grupos sofreram rupturas terríveis com a divisão africana sem respeito à etnicidade e a sua própria história, eram agora obrigados a repensar suas diferenças, ainda que fosse estimulada, pelos seus colonizadores, a figura de conflitos e diferenciação social. Redistribuição de territórios Na Primeira Guerra, a redistribuição dos territórios na África, as colônias alemãs, o tempo da “ocupação” e os mandatos internacionais vinculados à Liga das Nações acabaram por denotar a busca de um reequilíbrio de forças. Enquanto franceses e portugueses conseguiram certa estabilidade no século XIX, o século XX prometia ser muito mais difícil. No norte da África, o discurso islâmico passa a funcionar como elo integrador, estimulando e defendendo o comprometimento e a luta contra o cristão dominador. Velhos sacerdotes e prática que eram periféricas na sociedade, diante da luta contra o inimigo ganham força e permitem a formação de movimentos fazendo com que França, após intensos combates na Argélia, tenha mudado sua posição sobre o domínio, passando a estabelecer uma série de acordos, permissivos, mas que garantiria a manutenção da influência, embora com um forte trajeto. Atenção A proposta francesa passa pelo mandato dual, passando a existir um governo local, legitimado, e a tutela de um grande país Europeu visando seu desenvolvimento com aspectos vinculados ao controle de natalidade, estabelecimento de uma educação europeia e a chegada da medicina “civilizada”. Minorias locais instruídas X Minoria branca colonizadora Saiba mais Apesar de adotar o velho termo, a reflexão é de que a resistência dos povos africanos era fundamental, pois marcava as reações ao mesmo colonialismo e tiravam a ideia de unidade, sucesso da empresa colonial. - -5 Comunidades colonizadoras brancas passaram a se estabelecer, a garantir e a manter formas de poder, onde a dualidade não era tão importante. Essa é uma dicotomia construída fortemente na África francesa com os grupos educados no espaço da França e retornando para liderar os países, contudo, em um modelo do que foi aprendido. Dominação portuguesa Portugal não tem o mesmo modelo que a França, mas também não deixa de constituir uma elite local, mestiça, de poucos números, mas que garante a ideia de ascensão social dentro do mundo português, explorando e fortalecendo o discurso de pertencimento à colônia. Ainda que a passagem dos angolanos para a Europa não fosse algo propriamente fácil, devido ao controle do grupo, a saída de portugueses para as colônias era, no entanto, estimulada e defendida, como forma ideal de constituir um novo mundo português. Atenção Com a Crise de 1929-30, vimos as primeiras fissuras no sistema colonial. Começa a ficar muito mais claro, gritante, e gera um grande movimento de lutas, marcado pela - Conquista da Etiópia pela Itália (1936-36). Se não bastassem as dificuldades geradas pela Primeira Guerra, e a incapacidade dos americanos continuarem estabelecendo a reconstrução, as tensões e a resistência se tornam insuportáveis. Surgem movimentos contra o aumento do controle que vem sendo imposto como forma de financiar a reconstrução ao preço do sangue e suor do continente africano, os mitos de civilização começam a ficar demonstrados. EstadosUnidos da América: prazo de 50 anos, livre acesso aos mercadores africanos A pressão americana contra o modelo colonialista tinha um função marcadamente mercadológica, era a busca de uma nova zona de influência, produtora agrícola importante, e principalmente novas áreas de controle para as empresas americanas em crescimento. Vamos comparar algumas visões de diferentes autores? Saiba mais A África não estava melhor, mas sim mostrava graves sinais de degradação política econômica e social. A reboque destas questões, os Estados Unidos intervia, com um olhar diferente, como vimos no caso da Libéria ( )https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/6896.pdf - -6 B. Davidson fez um apelo aos estudiosos do assunto para que refutassem “as concepções da historiografia europeia tradicional”, segundo as quais “os povos africanos viram na chegada dos colonialistas um feliz acaso, que os libertava das guerras fratricidas, da tirania das tribos vizinhas, das epidemias e das fomes periódicas”. De acordo com essa tradição, os povos que não ofereceram resistência foram considerados “pacíficos”, e os que resistiram, “sedentos de sangue”. Para Jacob Ajayi a principal ideologia profana proposta é o princípio de “soberania”. O aspecto mais importante do impacto europeu foi a alienação da soberania. Quando um povo perde sua soberania, ficando submetido à outra cultura, perde pelo menos um pouco de sua autoconfiança e dignidade; perde o direito de se autogovernar, a liberdade de escolher o que mudar em sua própria cultura ou o que adotar ou rejeitar da outra cultura. Walter Rodney sublinha com maior ênfase um fenômeno análogo: O caráter determinante do breve período colonial [...] resulta principalmente do fato de a África ter sido despojada de seu poder [...]. Durante os séculos que precederam esse período, a África mantinha ainda em suas trocas comerciais certo controle da vida econômica, política e social, embora com desvantagens no comércio com os europeus. Até mesmo esse pequeno controle dos negócios internos se perdeu sob o colonialismo [...] O poder de agir com toda a independência é a garantia de uma participação ativa e consciente na História. Ser colonizado é ser excluído da história [...] De um dia para outro, os Estados políticos africanos perderam o poder, a independência e a razão de ser. Outras declarações exprimem o desejo de modernização, mas não ao custo da soberania, como a de Hanga, chefe makombe dos Barué, na Moçambique central, que em 1895 disse a um visitante branco: Fique ligado Davidson observa que “os defensores da dominação colonial recusavam-se a considerar as rebeliões fenômenos organizados”. Referiam-nas com reações “primitivas e irracionais”, ou atribuíam-nas à agitação da minoria “sedenta de sangue”. “Recusavam-se a admitir a única interpretação correta – que se tratava de guerras justas de libertação, motivo pelo qual recebiam o apoio da imensa maioria dos africanos”. - -7 “- Estou vendo como os brancos penetram cada vez mais na África; em todas as partes do meu país as companhias estão em ação [...] É preciso que meu país também adote estas reformas, e estou plenamente disposto a propiciá-las [...]. Também gostaria de ver boas estradas e boas ferrovias [...]. Mas meus antepassados eram makombe e makombe quero continuar a ser”. E também há expressões surpreendentes de uma filosofia mais profunda da soberania. Algumas das mais dignas de nota vêm do Sudoeste Africano. O chefe nama, Hendrik Wittboi, registrou no seu diário: Pela cor e pelo modo de vida fazemos parte do mesmo todo, e esta África é, de maneira geral, a terra dos capitães vermelhos [quer dizer, dos africanos]. O fato de formarmos diferentes reinos e regiões traduz apenas uma subdivisão banal da África. Concluindo Essas citações são para retirar da nossa visão uma noção de coitados, mas entender a dinâmica de expropriação e as estratégias definidas durante o momento de consolidação colonialista. Um impacto que não pode ser subestimado, mas que também é fruto do próprio sistema, essa lógica capitalista, que se tornou tremendamente eficiente. Ainda que como defende Fukoyama, a História não tenha chegado ao fim, mas é inegável a força e a dinâmica deste sistema como consolidador de uma dinâmica de exploração africana. O sucesso do modelo, no entanto, não enfatiza que foram mantidos referenciais importantes, formas de produção e governo que nos permitem entender as disputas que daí decorrem. O que vem na próxima aula •Os efeitos da conferência de Bandung; •Os movimentos que discutem uma nova identidade africana; •Etnias e as novas identidades nacionais. CONCLUSÃO Nesta aula, você: • Observou a estrutura da organização colonial imposta pelos portugueses; • Conheceu os principais objetivos e as formas econômicas na exploração das colônias francesas; • Assimilou os processos de independência das duas colônias como casos específicos. • • •