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IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 DIREITO CIVIL - PARTE GERAL - FATOS, ATOS E NEGÓCIOS JURÍDICOS 1. Conceitos iniciais O mundo por si só é dinâmico, decorrentes de fatos que ocasionam efeitos em todos os âmbitos, logo, pode provocar alterações também no mundo jurídico. Dessa forma, os fatos jurídicos, qualquer ocorrência com repercussão para o direito, dividem-se em dois grandes grupos: os fatos jurídicos naturais e humanos. Assim, os fatos jurídicos naturais (stricto sensu - sentido estrito) são aqueles decorrentes de fenômenos naturais que, independentemente da atuação humana, produzem efeitos jurídicos, podem ser: a) ordinários, que acontecem com regularidade (previsíveis) no decurso do tempo; b) extraordinários, que não ocorrem com regularidade, enquadrando como caso fortuito ou força maior. Por outro lado, os fatos jurídicos humano (fato jurígeno) é definido pela presença da vontade humana (elemento volitivo), abrangendo tanto os atos lícitos quanto os ilícitos (arts. 186, 187 e 188, CC), sendo o primeiro também chamado de atos jurídicos em sentido amplo (lato sensu), subclassificado em: a) ato jurídico em sentido estrito (stricto sensu): mera realização da vontade humana de um determinado direito, sem a criação de instituto jurídico próprio; b) negócio jurídico: fato jurídico com elemento volitivo, conteúdo lícito e regulação de deveres e direitos próprios dos envolvidos; c) ato-fato jurídico: comportamento derivado do homem, que produz efeitos jurídicos, mas desprovido de voluntariedade e consciência em direção ao resultado jurídico existente. Ademais, no ato jurídico em sentido estrito há uma manifestação de vontade do agente, mas as suas consequências são as previstas em lei e não na vontade das partes, previsto no art. 185 do CC, visto que determina que as regras do negócio jurídico podem ser também aplicadas à ele. Fato qualquer ocorrência Fato jurídico lato sensu Fato natural Ordinário nascimento e morte Extraor- dinário Caso fortuito evento totalmente imprevisível Força maior evento previsível, mas inevitável) Fato humano Lícito Ato jurídico lato sensu Negócio jurídico composição de vontades (interesses) - Cria instituto próprio, novo Ex.: Contrato Ato jurídico stricto sensu Efeitos legais IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 - Não cria algo novo Ex.: Pagamento Ilícito Penal, Administrativo e Civil (art. 186, CC) = abuso de direito (art. 187, CC) Fato não jurídico 2. Negócio jurídico O negócio jurídico é uma espécie do gênero ato jurídico em sentido amplo, sendo um ato cujo fim é modificar as relações jurídicas entre os particulares. Por meio de uma declaração de vontade, segundo o princípio da autonomia privada, com a finalidade negocial, para criar, adquirir, transferir, modificar ou extinguir direitos. Assim, pode ser entendido como fato jurídico que consiste em uma declaração de vontade à qual o ordenamento jurídico atribuirá os efeitos designados como desejados, desde que sejam respeitados os pressupostos de existência, os requisitos de validade e os fatores de eficácia (impostos pela norma jurídica). 2.1 Principais classificações A classificação do negócio jurídico tem como objetivo enquadrar um determinado instituto jurídico, bem como demonstrar a sua natureza jurídica, assim, os principais enquadramentos são: a) quanto às manifestações de vontade dos envolvidos: i. unilaterais: declaração de vontade emana de apenas uma pessoa, com um único objetivo, classificados ainda em receptícios (o destinatário deve ter ciência) e não receptícios; ii. bilaterais: há duas manifestações de vontade coincidentes sobre o objeto ou bem jurídico tutelado; iii. plurilaterais: envolvem mais de duas partes, com interesses coincidentes no plano jurídico. b) quanto às vantagens patrimoniais para os envolvidos: i. gratuitos: outorgam vantagens sem impor ao beneficiário a obrigação de uma contraprestação, ou seja, não envolvem sacrifício patrimonial de todas as partes; ii. onerosos: envolvem sacrifícios e vantagens patrimoniais para todas as partes no negócio. c) quanto aos efeitos, no aspecto temporal: i. inter vivos: produção de efeitos durante a vida dos negociantes ou interessados; ii. mortis causa: efeitos só ocorrem após a morte de determinada pessoa. d) quanto à necessidade ou não de solenidades e formalidades: i. formais ou solenes: obedecem a uma forma ou solenidade prevista em lei para a sua validade e aperfeiçoamento; i. informais ou não solenes: admitem forma livre, constituindo regra geral (art. 107, CC), em sintonia com o princípio da operabilidade, no sentido de simplicidade ou de facilitação. e) quanto à independência ou autonomia: i. principais ou independentes: não dependem de qualquer outro negócio jurídico para terem existência e validade; IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 ii. acessórios ou dependentes: existência está subordinada a outro negócio jurídico, denominado principal. f) quanto às condições pessoais especiais dos negociantes: i. impessoais: não dependem de qualquer condição especial dos envolvidos, podendo a prestação ser cumprida tanto pelo obrigado quanto por um terceiro; ii. personalíssimos ou intuitu personae: dependentes de uma condição especial de um dos negociantes, havendo uma obrigação infungível. g) quanto à sua causa determinante: i. causais ou materiais: motivo consta expressamente do seu conteúdo; ii. abstratos ou formais: aqueles cuja razão não se encontra inserida no conteúdo, decorrendo dele naturalmente. h) quanto ao momento de aperfeiçoamento: i. consensuais: geram efeitos a partir do momento em que há o acordo de vontades entre as partes; ii. reais: geram efeitos a partir da entrega do objeto, do bem jurídico tutelado. i) quanto à extensão dos efeitos: i. constitutivos: geram efeitos ex nunc, a partir da sua conclusão; ii. declarativos: geram efeitos ex tunc, a partir do momento do fato que constitui o seu objeto. 2.2 Elementos constitutivos 2.2.1 Elementos essenciais do negócio jurídico O negócio jurídico tem três planos: existência, validade e eficácia, ou seja, pressupostos, requisitos e efeitos. Assim, o plano de existência não é previsto expressamente no CC, porém, trata-se do plano substantivo do negócio jurídico, com os pressupostos de composição deste, sendo eles: a) manifestação de vontade; b) objeto; c) forma; d) agente. * para memorizar: MOFA. Na falta de um desses requisitos, o negócio jurídico é inexistente. Em continuidade, tem-se no plano de validade, as caracterśticas para os substantivos anteriores, visto que qualifica o negócio para que ele tenha aptidão de gerar efeitos, ficando dessa forma: a) manifestação de vontade: livre e de boa fé; b) objeto: possível, determinado ou determinável; c) forma: prescrita ou não defesa em lei; d) agente: capaz. Os pressupostos de validade estão previstos no art. 104 do CC. Por fim, o plano de eficácia refere-se à produção dos efeitos jurídicos do IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 negócio, pressupondo que este seja existente e válido. Plano de eficácia condição, termo, encargo ou modo, consequências do inadimplemento e outros efeitos do negócio Plano de validade capacidade, liberdade; licitude; possibilidade e determinabilidade adequação; requisitos da validade P. existência - agente; - vontade; - objeto; - forma pressupostos de existência 2.2.2 Elementos naturais ou identificadores do negócio jurídico Os elementos naturais do negócio jurídico são aqueles que identificam determinado negócio jurídico celebrado. Têm a sua origem nos efeitos comuns do negócio, sem que exista a menção expressa da sua existência, nascendo como consequência comum da norma jurídica. Portanto, pode estar presente nos três planos do negócio. 2.2.3 Elementos acidentais do negócio jurídico Os negócios jurídicos para sua formação precisam inicialmente existir, ou seja, passando pelo plano de existência, precisam ser válidos, o que está dentro do plano de validade, e as consequências dos negócios jurídicos, com a criação, modificação ou extinção dedireitos, ocorrem no chamado plano de eficácia. Dessa forma, os elementos acidentais podem ou não estar presentes no negócio jurídico (não são obrigatórios), sendo acrescentados pela vontade das partes para modificação dos negócios jurídicos, sendo eles: condição, termo e o encargo ou modo. 2.2.3.1 Condição A condição é o elemento acidental do negócio jurídico, que relaciona os seus efeitos a evento futuro e incerto (art. 121, CC). Possuindo três elementos, voluntariedade, futuridade e incerteza, isto é: a) voluntariedade: as partes devem querer e determinar o evento; b) futuridade: o evento não pode se referir a fato passado ou presente; c) incerteza: deve ser incerto na mente da pessoa e, também, na realidade, se o fato futuro for certo, como a morte, não será mais condição, mas sim termo. Desta forma, enquanto a condição não se implementar, os efeitos do negócio jurídico não podem ser exigidos. Em regra, os negócios jurídicos de natureza patrimonial admitem condição. Entretanto, cabe esclarecer que nem todos os negócios jurídicos admitem o condicionamento de seus efeitos à imposição de uma condição, chamados de atos puros, que são: a) os negócios jurídicos que, por sua natureza, não admitem incerteza, como a aceitação e a renúncia de herança; b) os atos jurídicos em que os seus efeitos são determinados em lei; IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 c) os atos jurídicos de Direito de Família, em que não a atuação do princípio da autonomia da vontade; d) os atos referentes ao exercício dos Direitos de Personalidade, como o direito à vida, à integridade física, à honra e à dignidade pessoal. Ademais, a condição possui diferentes classificações, quanto à licitude, possibilidade e a origem. a) quanto à licitude: Refere às condições em concordância ou não com o ordenamento jurídico, ordem pública e aos bons costumes. Assim, as condições ilícitas, podem se subdividir em: perplexas, que tiram os efeitos do negócio jurídico; e puramente potestativas, que há puro arbítrio de apenas uma das partes (art. 122, CC). Já o art. 123 do CC dispõe sobre certas condições que provocam a nulidade do negócio jurídico, inclusive não sendo possível a convalidação do negócio jurídico. b) quanto à possibilidade: Refere-se a possibilidade ou não da condição no plano físico e jurídico, sendo que as impossíveis invalidam o negócio jurídico quando suspensivas (art. 123, I, CC). Ademais, o art. 124 do CC dispõe sobre as condições não escritas. c) quanto à origem: Divide em três, causal quando decorre de evento da natureza, potestativa, quando depende da vontade das partes, subdividindo em puramente potestativa, quando há a vontade de apenas uma das partes, e simplesmente potestativa, em que há vontade de todas as partes envolvidas. Por fim, de origem mista, conta com vontade das partes e ainda de eventos da natureza. d) quanto aos efeitos: A condição pode ser suspensiva, quando suspende a aquisição e o exercício do direito de fato (art. 125, CC). * para memorizar: SE. Pode ser também resolutiva, quando não suspende a aquisição e nem o exercício do direito. É aquela condição em que a pessoa já tem o direito, o qual se extingue quando da ocorrência da condição (art. 127, CC). * para memorizar: ENQUANTO. Nos negócios de duração continuada, a condição resolutiva não gera a extinção dos atos anteriores tendo em vista a conservação do negócio jurídico (art. 128, CC). IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 Outras disposições sobre condições estão previstas nos seguintes artigos do CC: 2.2.3.2 Termo Termo é o elemento acidental do negócio jurídico, que relaciona o seu efeito a um evento futuro e certo. * para memorizar: QUANDO. Assim, existe o termo inicial e final, podendo ter como unidade de medida a hora, dia, mês ou ano. Portanto, o termo inicial não suspende a aquisição do direito por ser evento futuro, mas dotado de certeza (art. 131, CC). A contagem do prazo ocorre de acordo com as disposições do art. 132 do CC: O termo possui diferentes classificação, sendo elas: a) quanto à origem: Pode ser legal, quando decorre de lei ou convencional, decorrente da vontade e do acordo das partes. b) quanto à certeza: Pode ser certo e determinado, quando afirma-se que irá ocorrer o termo e quando, ou incerto ou indeterminado, sabe o que o evento ocorrerá, mas não sabe quando. Ademais, existem atos que não admitem termo: a) aceitação ou a renúncia da herança; b) adoção; c) emancipação; d) reconhecimento de filho e outros. Por fim, o Termo Final resolve os efeitos do negócio jurídico. 2.2.3.3 Encargo Encargo é o elemento acidental do negócio jurídico, trata-se de ônus adicional que é introduzido no ato de liberalidade, seja por doação, testamento ou declarações unilaterais de IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 vontade, Assim é uma cláusula acessória que restringe a liberdade do beneficiário no que diz respeito à forma de utilização do bem ou do valor recebido. Não suspendendo a aquisição nem o exercício do direito, exceto se houver previsão no ato de instituição do encargo (art. 136, CC). Portanto, se a cláusula de imposição do encargo não for cumprida, o ato de liberalidade poderá ser revogado por meio de ação judicial própria. Por fim, em regra, o encargo ilícito ou impossível é considerado não escrito (inexistente). Mas, se esse for o motivo determinante do negócio jurídico, o negócio será nulo (art. 137, CC). Espécies Carac. TIpo de NJ Aquisição Exercício Suspensiva SE Evento futuro e incerto Bilateral Suspende Suspende Resolutiva ENQUANT O Evento futuro e incerto Bilateral Nãosuspende Não suspende Termo QUANDO Evento futuro e certo Bilateral Nãosuspende Suspende Encargo PARA QUE Disposição de vontade de um agente Unilateral Não suspende, salvo previsão Não suspende, salvo previsão 3. Representação A representação consiste no instituto que permite a atuação jurídica de uma pessoa em nome de outra, constituindo uma verdadeira legitimação, em que seus poderes podem ser conferidos por lei ou voluntariedade do interessado (art. 115, CC). Assim, em relação à classificação, pode ser de três espécies: a) legal: conferida pela lei; b) judicial: nomeado pelo juiz; c) convencional: concedida pelo interessado. Ademais, aquele que recebe os poderes é chamado de representante. Aliás, não deve ser realizada de qualquer forma, sendo a primeira que o representante atua em nome do representado nos limites dos seus poderes (art. 116,CC). Dessa forma, caso o representante ultrapasse essa máxima, haverá o excesso de poder, podendo ser responsabilizado por isso (art. 118, CC). Sob essa ótica, enquanto não houver ratificação dos atos, o representante será um mero gestor de negócios (art. 665, CC). Além disso, podem ocorrer situações em que exista conflito de interesses entre o representante e o representando, inclusive abrindo possibilidade para anulabilidade do negócio jurídico celebrado (art. 119, CC). IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 Desse modo, só haverá anulabilidade do negócio jurídico se o conflito de interesse for de conhecimento do terceiro beneficiado, caso esse esteja de boa-fé, não se admite a anulabilidade. Posto isso, o conflito de interesses pode se manifestar de duas formas: a) abuso de poder: atuação do representante com falta de poderes ou contrários à sua destinação; b) excesso de poder: representante ultrapassa os limites da atividade representativa. Assim, em ambas as situações o negócio jurídico é celebrado sem poder de representação, podendo ser anulado, logo, o prazo decadencial para a busca de anulação do ato é de 180 dias, a contar da conclusão do negócio ou cessação da incapacidade (art. 119, CC). 3.1 Contrato consigo mesmo Pode ocorrer algumas situações específicas no contexto da representação a dupla representação e a dupla qualidade de representação, isto é: a) dupla representação: ambas as partes celebrantes do negócio jurídico se manifestam por meio de um mesmo representante, em que somente os representados adquirem direitos e obrigações; b) dupla qualidadede representação: representante atua como duplo papel, atuando como representante e dono do negócio jurídico, fazendo um contrato consigo mesmo ou autocontratação. Portanto, essa última modalidade é permitida desde que a lei ou representado autorize sua realização (art. 117, CC). Além do mais, há possibilidade que o representante transfere a outrem os poderes recebidos, chamado de substabelecimento. Por fim, existe a modalidade de mandato em causa própria, relacionada a dupla qualidade de representação, quando o mandatário recebe poderes para alienar determinado bem, por determinado preço, a terceiro e inclusive a si próprio. Além disso, a sua revogação não tem eficácia, não se extinguindo pela morte do representado, como também é dispensado de prestar contas do exercício do referido mandado. 4. Defeitos e vícios do negócio jurídico A vontade é elemento fundamental para que os atos e negócios jurídicos IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 sejam efetivados, devendo ocorrer de forma livre, espontânea e clara, para que o negócio alcance os efeitos almejados. Assim, compreende como vícios da vontade ou do consentimento: erro, dolo, coação, estado de perigo e lesão. Há também a fraude como credores e o enquadramento ou não da simulação como vício social. 4.1 Do erro e da ignorância O erro é uma falsa noção em relação a uma pessoa, ao objeto do negócio ou a um direito, que acomete a vontade de uma das partes do negócio jurídico, sendo passível de anulação, desde que o erro seja substancial (art. 138, CC). Para tanto, o erro será substancial quando (art. 139, CC): a) interessar à natureza do negócio (error in negotio); b) interessar ao objeto principal da declaração (error in corpore); c) interessar a algumas das qualidades a ele essenciais (error in substantia); d) interessar identidade ou qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade (erro in persona); e) erro de direito e não implicar recusa à aplicação da lei (erro de direito ou erro iuris). Ademais há ainda o erro acidental, que diz respeito aos elementos secundários e não essenciais ao negócio jurídico, este não gera anulabilidade, visto que não atinge o plano de sua validade (art. 142, CC). Assim, nos casos de erro quanto ao objeto ou pessoa, não será o negócio jurídico anulado se for possível identificar posteriormente. Ademais, o falso motivo, em regra, não pode gerar anulabilidade do negócio, a não ser que seja expresso como razão determinante do negócio, conhecido como erro quanto ao fim colimado (art. 140, CC). De acordo com o art. 141 do CC, a transmissão errônea da vontade por meios interpostos é anulável nos mesmos casos em que ocorre a declaração direta, devendo recair sobre elemento substancial do negócio (art. 139, CC) e que o destinatário da declaração possa perceber seu equívoco (art. 138, CC). IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 Há ainda o erro material retificável (art. 143, CC), que não possibilita a anulação do negócio por erro de cálculo, mas autoriza sua retificação da declaração de vontade. Prevê o art. 144 do CC que o erro não prejudica a validade do negócio jurídico se a pessoa, a quem dirige a manifestação de vontade, oferecer realizar conforme a vontade real do manifestante. 4.2 Do dolo Define-se como o artifício ardiloso empregado para enganar alguém, a fim de benefício próprio, em que o negócio praticado com ele é anulável (art. 145, CC), havendo algumas modalidades: a) dolo essencial: uma das partes do negócio utiliza artifícios maliciosos, para levar a outra a praticar um ato que não praticaria normalmente, visando a obter vantagem, com vistas ao enriquecimento sem causa; b) dolo acidental: que não é causa para o negócio, não pode gerar a sua anulabilidade, mas somente a satisfação das perdas e danos a favor do prejudicado, assim, haverá dolo acidental quando o negócio seria praticado pela parte, embora de outro modo (art. 146, CC); c) dolo de terceiro: ocorre quando a parte a quem se aproveita tiver ou devesse ter conhecimento. Em caso contrário, ainda que válido o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou (art. 148, CC); d) dolo de representante legal: de uma das partes só obriga o representado a responder civilmente até a importância do proveito que teve. Mas, se for do representante convencional, o representado responderá solidariamente com ele por perdas e danos (art. 149, CC); Ademais, a omissão intencional para benefício próprio configura dolo também (art. 147, CC), e caso ambas as partes tenham condutas dolosas, não poderão arguir a anulabilidade do negócio jurídico (art. 150, CC). IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 Por fim, o dolo recebe ainda algumas classificações doutrinárias, sendo elas: a) Quanto ao conteúdo: - Dolus bonus (dolo bom): refere-se ao dolo tolerável, sendo exageros do comerciante em relação ao produto, não sendo passível de anulação, a não ser que seja o negócio celebrado por publicidade enganosa; - Dolus malus (dolo mau): ação ou omissão a fim de enganar alguém e lhe causar prejuízo, aqui é o caso da publicidade enganosa, sendo então o negócio anulável; b) Quanto à conduta das partes: - Dolo positivo (ou comissivo): aquele praticado por uma ação, conduta positiva; - Dolo negativo (ou omissivo): aquele praticado por uma omissão; - Dolo recíproco ou bilateral: situação em que ambas as partes agem dolosamente, uma tentando prejudicar o outro. 4.3 Da coação Definida como a pressão física ou moral exercida sobre o negociante, visando obrigá-lo a assumir uma obrigação que não lhe interessa, assim, para que vicie o negócio jurídico é preciso que tenha relevância (art. 151, CC). Assim, pode ser classificada como: a) física (vis absoluta): constrangimento corporal que retira toda capacidade de manifestação de vontade, sendo então uma nulidade absoluta; b) coação moral ou psicológica (vis compulsiva): fundada de temor iminente e considerável à pessoa do negociante, à sua família, à pessoa próxima ou aos seus bens, gerando anulabilidade do ato (art. 151, CC). Dessa forma, para que possa influir a gravidade da pressão exercida, o magistrado deverá levar em consideração sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias do caso concreto (art. 152, CC). Para tanto, o prazo decadencial para propositura de ação anulatória é de quatro anos, contados de quando cessar a coação (art. 178, CC). IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 Ademais, a coação exercida por terceiro gera anulabilidade do negócio, desde que o beneficiado dela tiver ou devesse ter conhecimento, respondendo ambos por perdas e danos (art. 154, CC). Por outro lado, o negócio jurídico permanecerá válido se o negociante beneficiado não tiver ou não devesse ter conhecimento, mas, não afasta o dever de indenizar (art. 155, CC). Por fim, não constituem coação (art. 153, CC): a) ameaça relacionada com exercício regular de um direito reconhecido; b) mero temor reverencial ou receio de desagradar alguém. 4.4 Do estado de perigo Haverá estado de perigo toda vez que o próprio negociante, ou alguém próximo, estiver em perigo, estando a outra parte ciente e usando a situação para celebrar o negócio (art. 156, CC). Assim, o juiz decidirá pelas circunstâncias fáticas e regras da razão. Portanto, é preciso a presença de dois elementos, o objetivo, o grande temor do negociante que acaba celebrando o negócio por uma prestação exorbitante, e o subjetivo, conhecimento da situação de risco que atinge a ele. Logo, a sanção aplicada é a anulação, havendo o prazo decadencial de quatro anos, a contar da data da celebração do ato, para ação anulatória (arts. 171 e 178, CC). 4.5 Da lesão Por lesão compreende-se a desproporção das prestações, que gera uma onerosidade excessiva e um prejuízo a uma das partes, em razão da inexperiência ou necessidade do lesado (art. 157, CC). Havendo, assim, dois elementos, objetivo na onerosidade excessiva, subjetivo ,a necessidade ou inexperiência. IZABELLA FERREIRA REIS -2024 Por fim, não se deve confundir lesão com estado de perigo, conforme quadro abaixo: Lesão Estado de perigo Elemento subjetivo: premente necessidade ou inexperiência Elemento subjetivo: perigo que acomete o próprio negociante, pessoa de sua família ou amigo íntimo, sendo esse de conhecimento do outro negociante Elemento objetivo: prestação manifestamente desproporcional (lesão objetiva) Elemento objetivo: obrigação excessivamente onerosa (lesão objetiva) Aplica-se a revisão negocial pela regra expressa do art. 157, §2°, CC, hipótese de subsunção Há entendimento doutrinário de aplicação analógica do art. 157, $2°, CC, visando à conservação negocial. Adotada essa tese, há hipótese de integração, não de subsunção. 4.6 Da fraude contra credores Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos. Igual direito assiste aos credores cuja garantia se torna insuficiente (art. 158, CC). Para tanto, há o elemento subjetivo, que é a intenção de prejudicar, e o objetivo, diminuição patrimonial do devedor ou criado um estado de insolvência (eventus damni). Além disso, somente os credores que já o eram no momento da disposição poderá promover tal ação, atentando-se ao prazo decadencial de quatro anos, contados da celebração do negócio fraudulento (art. 178, CC). Ainda acerca da anulabilidade do negócio, é preciso ter em mente a seguinte questão: Disposição onerosa de bens com intuito de fraude. Conclui fraudulento (consilium fraudis) + evento danosos (eventus damni) Disposição gratuita de bens ou remissão de dívida Basta o evento danosos (eventus damni) Bem como será anulável os contratos onerosos do devedor insolvente quando esta, ou houver motivo para ser, conhecida do outro contratante (art. 159, CC). Assim, anulados os negócios fraudulentos, a vantagem resultante reverterá em proveito do acervo sobre IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 que se tenha de efetuar o concurso de credores (art. 165, CC) Em continuidade, se o adquirente dos bens do devedor insolvente não tiver pago o preço e este for próximo ao valor da dívida, deverá depositá-lo em juízo, denominada fraude não ultimada, mas, caso seja preço inferior, para a conservação dos bens, poderá depositar o montante que lhes corresponda ao valor real (art. 160, CC). Por fim, presumirá fraudulenta o privilégio do devedor à algum dos seus credores (art. 163, CC). 4.7 Simulação A simulação do negócio jurídico ocorre quando há uma falsa declaração de vontade de quem praticou o negócio, de forma a fazer parecer real o acordo que tem por origem uma ilicitude, fugindo de obrigações ou prejudicar terceiros (art. 167, CC). 4.8 Invalidade do negócio jurídico Existem três tipos de invalidade, a inexistência, a segunda nulidade e a terceira a anulabilidade. 4.8.1 Da inexistência Refere-se ao negócio jurídico que não gera efeitos por não preencher seus requisitos mínimos, sejam eles gerais ou categorias. 4.8.2 Da nulidade absoluta A nulidade é conceituada pela doutrina como a sanção imposta pela lei, nas hipóteses em que não estão preenchidos os requisitos básicos para a existência válida do ato negocial. Assim, a nulidade absoluta ofende regramentos ou normas de ordem pública, sendo o negócio absolutamente inválido, a saber (art. 166, CC): a) celebrado por absolutamente incapaz, sem a devida representação; b) objeto for ilícito, impossível, indeterminado ou indeterminável; c) motivo determinante for ilícito; d) negócio sem formalidade e solenidade prescrita em lei; e) objetivo fraudar a lei imperativa; f) quando a lei expressamente declarar. 4.8.3 Da nulidade relativa ou anulabilidade Na anulabilidade o negócio jurídico não o considera nulo em essência, mas sim anulável, vide art. 171 do CC. Assim, não deve ser confundida com a nulidade, sendo que esta remete ao âmbito privado da pessoa prejudicada, podendo ser sanada a qualquer IZABELLA FERREIRA REIS - 2024 momento, sendo suprida pelo juiz a favor dos interesses das partes, para tanto: a) negócio celebrado por relativamente incapaz, sem a devida assistência; b) erro, dolo, coação moral, lesão, estado de perigo ou fraude contra credores. Nos casos de anulabilidade, o seu reconhecimento deverá ser pleiteado por meio da denominada ação anulatória. Negócio nulo Negócio anulável - Negócio celebrado por absolutamente incapaz, sem devida representação; - Objeto ilícito, impossível, indeterminado ou indeterminável; - Motivo a ambas as partes for ilícito; - Desrespeito à forma ou preterida alguma solenidade. - Negócio celebrado por relativamente incapaz, sem a devida assistência; - Quando houver vício acometendo o negócio jurídico: erro, dolo, coação moral/psicológica, estado de perigo, lesão e fraude contra credores - Lei prevê anulabilidade - Objetivo o negócio de fraude à lei imperativa; - Lei prevê a nulidade absoluta (nulidade textual) ou proibir o ato sem cominar sanção (nulidade virtual); - Negócio simulado, incluída a reserva mental; - Presença de coação física (vis absoluta). - Nulidade absoluta (nulidade); - Ação declaratória de nulidade, imprescritível; - Não pode ser suprida nem sanada, inclusive pelo juiz. Exceção: conversão do negócio jurídico (art. 170, CC). - Nulidade relativa (anulabilidade); - Ação anulatória, com previsão de prazos decadenciais; Pode ser suprida, sanada, inclusive pelas partes (convalidação livre); - Ministério Público não pode intervir na ação anulatória, somente os interessados. Não cabe decretação de ofício pelo juiz. - Sentença da ação anulatória tem efeitos inter partes. Quanto ao debate de serem tais efeitos ex nunc ou ex tunc, há uma tendência atual em se seguir a última posição
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