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ORIENTE E A HISTORIA

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Na aula de hoje, trabalharemos aspectos orientais ligados à abordagem
historiográfica. Em nosso estudo, você verá um pouco mais acerca de uma
perspectiva diferente da qual estamos acostumados a lidar em nosso dia a dia, ou
seja, terá a oportunidade de entender como enxergar o mundo por uma nova ótica,
com diferentes valores, heranças e crenças.
O Oriente e a Historiografia
Olá, estudante! Seja bem-vindo(a)!
Você já parou para refletir a respeito do ensino de História em nosso país?
Os conteúdos abordados em nossas escolas brasileiras, via de regra, possuem uma
viés eurocêntrico, não possibilitando uma abordagem que nos dê o outro lado da
moeda (ou da própria história) vivenciado por civilizações que sabemos ser ainda
mais antigas, reconhecidas como o berço da humanidade.
O Oriente e a Historiografia
Esse tipo de perspectiva eurocêntrica, dá margem para generalizações e anacronismos, além da
formação de conceitos superficiais sobre aquilo que nos é desconhecido.
Nesse sentido, frente a tantos desafios enfrentados em nossa atualidade, tendo como por exemplo, o
mal da intolerância seguido da ignorância, conhecer a história do Oriente se faz necessário para a
formação de sujeitos versados em uma história mais abrangente e pautada na diversidade, essencial
para expandir as fronteiras culturais.
É preciso aprender a respeitar outros pontos de vista para melhor conhecer as diferenças e
semelhanças presentes na pluralidade desse vasto campo que é a História.
O Oriente e a Historiografia
José Nunes Carreira, em seu livro que trata sobre a História antes de Heródoto (1993), tem por
objetivo definir de uma maneira mais explícita a historiografia e a ideia de história na Antiguidade
Oriental, ultrapassando as vagas impressões que, com frequência, vêm ainda marcando esta área na
bibliografia sobre a história da historiografia. O desafio está implícito no próprio título do livro, que
utiliza um parâmetro Ocidental como referência: o ilustre Heródoto (484-425 a.C.), conhecido como
“pai da História” - título cunhado pelo filósofo Cícero (106-43 a.C). Para Carreira, o caminho é romper
com o dogmático ou mítico limiar herodiano para o aparecimento da historiografia.
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
Ao adentrar pelos vastos espaços da historiografia médio-oriental antiga, Carreira
decidiu que a melhor maneira de compreender a História numa perspectiva Oriental é
não comparando-a com a História clássica e seus desdobramentos ocidentais, mas
enquadrando-a no seu ambiente cultural e nos pressupostos essenciais de sua
própria historiografia. Esta é a maneira de ultrapassar com realismo e perspectivas
de eficácia definições prévias já determinadas pelos nossos parâmetros. Os critérios,
os métodos e as atitudes são aqueles que se definem em uma análise específica, e
não generalizada.
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
O estudo das origens dos registros orientais se inicia pelos dados representativos de uma atitude historiográfica
oriunda da Mesopotâmia. Apesar de certa homogeneidade na civilização mesopotâmica, a historiografia suméria e a
acádica expressam cada uma certa ideia de história. Os Sumérios deixaram muitas referências históricas diretas, mas
poucas criações literárias passíveis de serem denominadas historiografias. As próprias fontes históricas não são
cunhadas num intuito de prover memória dos eventos para aqueles que sucederão a época registrada. Tendo em
vista se tratar de um período muito primitivo, os dados mais relevantes consistem sobretudo na Lista dos Reis
Sumérios (XXI a.C) - onde temos a ideia de História como sequência, demonstrando que cada dinastia experimenta
bons ou maus tempos - e na Maldição de Agade (XXI a.C). De modo geral, os Sumérios enxergavam seu passado de
um modo peculiar, o documentando a fim de prover lições práticas e demonstráveis:
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
A impressão que fica é de que os Babilônios e Assírios possuíam enorme interesse pelo passado.
Alguns sinais vitais são responsáveis por estimular tal interesse na época: a curiosidade aliada pelo
instinto de conservar, o poder e os anseios de fundamentar a legitimidade. Os reinos orientais e seus
interesses não dispensaram o serviço da história. Acontecimentos políticos do século XII legitimam-se
com uma suposta profecia do rei divinizado em vida Shulgi (2093-2046 a.C), da III dinastia de Ur. Já
no século VII a.C, um usurpador assírio toma o nome dinástico de Sargão, reclamando a si não só o
nome mas também o prestígio do grande Sargão de Akkad (outro usurpador), que viveu um milênio e
meio antes.
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
A Crônica de Weidner (escrita na antiga Babilônia), é o primeiro compêndio mesopotâmico sobre a ideia de
história. De cunho partidário e doutrinário, uma manifestação abaixo do nível do pensamento de seu tempo,
não deixa de ser, com seus problemas, um registro historiográfico.
A Crônica se inicia no período Dinástico Primitivo (2750-2350 a.C), permeada de mitologia, mas tendo como
seu ponto principal a dinastia de Sargão e os acontecimentos que sucederam até Shulgi. Nela a ideia de
história aparece de forma simples: a ascensão e queda dos reis dependeu sempre de sua relação com o
Esagil, o grande templo de Marduk localizado na Babilônia. Os que negligenciaram ou insultaram a Babilônia,
Marduk e seu culto, tiveram um fim terrível, enquanto os que seus admiradores viveram felizes e em
prosperidade. Assim, registra-se o conselho para os monarcas do tempo presente do registro e os futuros.
(CARREIRA, 1993)
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
O esquema fundamental da historiografia suméria consiste em tempos bons e tempos
ruins. Os deuses não atuam com total arbitrariedade, e sim recompensando os méritos e
punindo as transgressões dos reis, únicos responsáveis pelos destinos da nação. Assim,
da mera sequência de bons e maus períodos, emerge a consequência da ação humana.
Chega-se a uma espécie de fórmula genérica: "aquele que peca contra os deuses, não
terá sua estrela estável no céu" A presente concepção semita de pecado está a um passo
significante de uma concepção imanentista - ponto de partida uma investigação imanente
da condição humana, em sua imperecível busca pela realidade transcendente de Deus -
da história. (CARREIRA, 1993)
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
No que diz respeito ao Egito, em matéria de produção historiográfica e de ideia de
história, o vale do Nilo tem maior destaque para trabalho arquivístico ou interesse
antiquário pelo passado, além da longa lista de faraós, confeccionadas e
conservadas por razões de cultos funerários. No entanto, é no Império Novo, com a
expansão para a Síria e o fim do isolamento, que ocorre o desabrochar de uma
historiografia mais relevante, relativa à civilização faraônica.
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
Em linhas gerais, ao falarmos em termos orientais, a ideia de história, própria e vigorosa, é o
que impediu o desenvolvimento da historiografia como nós ocidentais entendemos e,
ingenuamente, desejamos impor a todas as épocas e culturas. No antigo oriente, historiografia e
literatura régia, se confundem, porque a história é função do rei divino. Em suma, só o faraó é
objeto da historiografia, porque é em relação a ele que tudo acontece. Nesse sentido, escreve-
se a história egípcia com a dogmática do rei-deus. Assim, o faraó e os egípcios são os únicos
sujeitos da história, enquanto o resto do mundo não passa de objetos. No todo, podemos
considerar a ideia egípcia de história como culto celebrado pelo faraó na qualidade de
plenipotenciário dos deuses e garantidor da ordem. A alternância de cenas histórias com cenasde cultos nas paredes dos templos reforça tal ideia. (CARREIRA, 1993)
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
Ainda no palco da historiografia oriental antiga, os Hititas foram precoces no despertar para a historiografia,
souberam colocar a história ao serviço da política, com aspectos propagandísticos.
A ideia dos Hititas de história possui raízes orientais comuns a que vimos até aqui: teoria da história é, antes
de mais nada, teologia da história. O passado não é evocado pelo simples prazer de narrar, mas para
fundamentar teologicamente situações políticas do presente, e não para conservar fatos para a memória dos
tempos adjacentes. Assim como os Mesopotâmios e Egípcios, os Hititas se interessavam mais pelas lições da
história do que investigar o passado por si próprio. No quesito inovação, os Hititas são responsáveis pelo
espaço concedido ao homem e a dimensão política da história. Há presença de argumentação histórica em
documentos jurídicos, reflexão sobre a verdade histórica e ontológica, além de um grau abstração pouco
comum no segundo milênio a.C, libertando a historiografia da mitologia. (CARREIRA, 1993)
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
Com o colapso dos Hititas temos o emergir do povo israelita. Nesse sentido, Israel soube debruçar-se sobre o seu
passado e captá-lo com narrativas muito antes de organizar-se em um Estado. (CARREIRA, 1993). É preciso que
compreendamos a distinção entre História e saga, mas percebamos ambas como forma legítimas de conservar a
memória de um povo. Fortemente teológicas, tendo Deus como agente, as sagas enxergam a história
fundamentalmente como etiologia e paradigma. Ao satisfazerem a curiosidade intelectual, respondendo questões
sobre a origem de realidades atuais, servem ao leitor ou ouvinte a "moral da história" (paradigma). Três delas
possuem grande destaque nos registros israelitas: História da Sucessão de David, História Javeísta, História
Deuteronomista.
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
Ainda segundo Carreira (1993), com destaque para a História da Sucessão de David, temos mais do que uma
narração dos acontecimentos. É possível observar o domínio do registro das intrigas, dos personagens, das
questões jurídicas, emaranhada numa teia de acontecimentos até então não vista. Os personagens atuam
com personalidade e responsabilidade própria. Não há a presença de nenhum milagre, e sim o desenrolar dos
fatos segundo as leis terrenas, Deus conduz a história por meio de causas segundas. Tal concepção teológica
é nova a teologia e também a história, desenvolvida a inteira responsabilidade humana. Há aqui um
rompimento com as antigas instituições sacras, aspirante da atmosfera do iluminismo salomónico, numa
profanidade inteiramente desmistificada.
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
Na História Javeísta, temos uma narrativa dinâmica com rudimentos de uma história nacional
que dão lugar a uma história mundial, cujo os horizontes vão da Mesopotâmia ao Egito, onde
incluem-se Arameus, Amonitas, Moabitas, Edomitas, Quenitas e Filisteus. De uma história
política nasce uma história cultural e das mentalidades. O próprio objeto da História Javeísta é o
homem com seus problemas, lidando o bem e o mal, o trabalho e a dor, os retrocessos morais
que se misturam com os avanços culturais, diferentemente da realeza privilegiada que
observamos na Lista dos Reis e das instituições o sagrado na Crônica de Weidner.
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
No entanto, mesmo sem milagres, a história também aqui continua a ser teologia da história. Mesmo
que sem milagres, Deus conduz os homens, mas agora com uma novidade: a história não é uma
gama de eventos desconexos, e sim pertencente a uma unidade global que diz respeito a um plano
maior. Nesse sentido, a História Deuteronomista, oferece uma teoria da história do povo hebreu, que
apesar de simples, explícita em categoria o pensar histórico de um mundo complexo de vivências e
acontecimentos. Nela, procura-se captar o sentido autêntico da história dos hebreus a luz de
seiscentos anos de acontecimentos numa produção que utiliza dezenas de documentos orais e
escritos.
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
Dadas as proporções, os Hititas e Israelitas souberam criar obras literárias em que os
eventos do passado são revividos nas suas complexas determinantes políticas,
sociais, familiares, humanas e religiosas. A tendência marcadamente pragmática da
historiografia oriental tem excelente continuidade em Tucídides e Políbio, que
enxergam na história a grande mestra da ação política e militar, e em Salústio e
Tácito, que se comprazem em apresentar exemplos edificantes ou repugnantes da
vida moral.
O Oriente e a Historiografia
História e Historiografia na Antiguidade Oriental
A ideia de história em árabe é denotada pelos termos "ahbar" e "tarih" - que significam
respectivamente: relatos, informações e datação, cronologia, era. Ahbar trata da
transmissão de uma observação direta, visual, ou de um relato de um testemunho que
acredita-se ser verídico, não designando um acontecimento pretérito; enquanto tarih -
palavra que surge no segundo século da Hégira, e não propriamente junto com o Islã -
refere-se a trabalhos datados. Nesse sentido, a palavra tarih passa a ser correntemente
utilizada, desde o século IX, para designar a História em uma ampla perspectiva. Embora
ambos os termos coexistam, a partir do século XII, é tarih que aparece em textos
acadêmicos. (SOUZA, 2017)
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
Mesmo assim, de acordo com Franz Rosenthal (1968), a relação estabelecida entre a
palavra tarih e o conceito de História que temos em nossa concepção é uma
associação mais semântica do que de conteudista. Há uma discrepância no sentido
ideológico que influencia o tratamento do objeto histórico e a visão que temos dele.
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
Já para o historiador Abdsselam Cheddadi (1991), ao relacionar as questões de
memória e história, entendendo como memória o que um grupo ou sociedade retém
e elabora de seu passado, a dupla designação - ahbae e tarih - aponta a relação
memória e história, partindo de memórias particulares e de determinados nichos a
aspiração de uma memória unificada. Assim, emerge do ponto de vista do autor, uma
concepção de história essencialmente plural e informativa.
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
É preciso ressaltar que para a sociedade muçulmana, o conceito de história está
diretamente associado à fé islâmica. O Islã instaura, desde sua origem, atividades da
prática historiográfica no intuito de organizar a memória do Alcorão e de Maomé, é
dessa forma que a cultura islâmica organiza suas memórias árabes, políticas,
etnográficas, costumeiras, etc. É por meio da palavra revelada a Maomé que o Islã
situa o homem árabe dentro de um contexto histórico definido.
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
Nessa perspectiva, Islã e história são sinônimos: "e não vos fez constrangimento algum, na religião: a
crença de vosso pai Abraão. Ele vos nomeou "moslimes", antes (de Abraão) e, agora neste (Alcorão),
para que o Mensageiro seja testemunha de vós, e vós sejais testemunhas da humanidade". (Alcorão,
XII, 78). A partir daí, o homem está situado num mundo que se inicia na Criação de Deus e que
acabará no dia do juízo final. A determinação escatológica faz com o que homem avalie suas ações
do tempo presente, visto que estas serão julgadas. Nesse sentido, a ação humana assume um
incentivo definitivo para registrar e memorizar o passado.
O Oriente e a HistoriografiaO lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
O estudo do passado, e por consequência da história, tem importância ética e moral na medida em que as
implicações da Palavra Revelada estimulam a relação entre os eventos passados com advertências para a
humanidade. É a partir da predicação profética que o árabe acessa a sua consciência histórica. Assim, a
historiografia é, primeiramente, filha da tradição, isto é, do recolhimento dos gestos do Profeta e de seus
acompanhantes. A Sunna (caminho trilhado pelo profeta) constituiu o seu corpus por meio da metologia do
Isnad (cadeia sucessória de autoridades por onde a informação a respeito de algum evento relacionado à vida
de Maomé tenha passado). Por consequência, o Hadith (relatos ligados à vida e à obra do profeta Maomé) e a
historiografia se apoiam no Isnad para composição de suas obras. (SOUZA, 2017)
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
As três principais categorias sociais interessadas na leitura dos livros de história no
eclodir do oriente islâmico medieval eram os príncipes, as cores e os letrados. Essa
função política e social na sociedade islâmica, utiliza-se da historiografia cronística
como instrumental de construção de um discurso que fundamenta a memória dos
governos, proporcionando legitimidade:
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
Com o que aprendemos até aqui, podemos perceber que a história cumpre nas sociedades
islâmicas medievais uma função social e política. Emergida da Sunna, ou seja, do recolhimento
dos gestos de Maomé, a história contempla também o percurso dos árabes no mundo, desde a
sua criação até os dias atuais, abrangendo o imenso território ocupado pelo Islã, no objetivo de
criar uma memória coletiva que seja unificada. Em um sentido hierárquico, qualquer
conhecimento que não possuísse relação direta com a religião, obtinha certo grau da
desvalorização, na medida em que a religião é o coração dessa estrutura científica.
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
Ibn al-Athir (1160 - 1223) foi um influente historiador árabe. A respeito de sua obra,
realizou importantes trabalhos de compilação de materiais biográficos e genealógicos de
autores anteriores. Entre seus textos mais famosos está o Kamil ou então chamado de A
História Completa. O Kamil foi escrito direcionado aos príncipes, nesse sentido, as
atitudes reais são tomadas no âmbito da crítica política e moral, visando a manutenção do
Islã.
O Oriente e a Historiografia
As inovações de Ibn Al-Athir
A história islâmica tradicional utiliza da escrita histórica por meio do relato analítico, constituído
em um modo serial sob a forma de sequência dos acontecimentos. Nesse sentido, uma das
maiores novidades presentes em Ibn al-Athir é a forma como a narrativa é construída no Kamil.
Por mais que se trate de um relato, o autor está mais interessado em explicar o contexto que
deseja do que adequar-se ao método. Antes dele, os autores possuíam tendência de
fragmentar os eventos em episódios classificados em divisões por ano ou sobre classificação de
fontes, perdendo assim a integralidade dos eventos, deixando-os dispersos no texto,
obedecendo uma rigidez temporal mas afastados de seu contexto. (SOUZA, 2017)
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
Ibn Al Athir não respeita a rigidez metodológica, na verdade, ele estava preocupado em fornecer uma
explicação para os eventos, e não apenas relatá-los, o que o obrigou a sair do plano rigoroso e
analítico da exposição. Em termos de temporalidade (começo, meio e fim), são reduzidos a um
momento intemporal destacado de seu contexto. Recolocá-lo sem seu local demanda um trabalho de
produção de narrativa coerente. É possível perceber essa atitude quando o autor narra a vitória de
Tugril III sobre as tropas de al-Nasir no ano de 1188, mas narradas em 1189. Ibn al-Athir justifica
dizendo que "seria conveniente apresentar este episódio antes, mas eu o retardei a fim de que os
eventos relatados antes seguissem uns aos outros e que cada evento fosse ligado a um outro" (Ibn al
Athir, apud Souza, 2017, p.151)
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
Neste exemplo em específico, al-Athir não queria interromper a narrativa sobre a
campanha de Saladino, que ocorreram no ano relatado.
A mudança na estrutura narrativa proposta por al-Athir visa produzir um relato de causas e
efeitos dos eventos, e não uma mera compilação de fontes ordenadas por datas.
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
Em linhas gerais, a obra de Ibn al-Athir propõe uma nova narrativa,
comprometida com a avaliação política das responsabilidades humanas por
suas ações, inclusive no que diz respeito aos contemporâneos do autor. Seu
trabalho pode ser considerado como independente e até mesmo secular,
representando uma quebra de paradigmas. O Kamil deve ser entendido em
sua originalidade pois é único em muitos sentidos.
O Oriente e a Historiografia
O lugar da História nas sociedades muçulmanas medievais
O livro Orientalismo de Edward Said, mostra como o imperialismo praticado por potências
ocidentais nos países árabes, além da faceta mais óbvia de controle da população e dos
territórios, implicou também a elaboração de uma representação do mundo árabe, que
possuía maior relação com os colonizadores do que com os colonizados, e implicava uma
imagem distorcida e negativa do mundo dos colonizados. (JOBIM, 2020)
O Oriente e a Historiografia
O Orientalismo
Said afirma em sua obra, entender por orientalismo diversas coisas interdependentes. Entre elas, a
designação mais aceita para o orientalismo é a acadêmica. Um dos aspectos mais utilizados do termo, discute
o orientalismo como uma instituição organizada para negociar com o Oriente - fazendo declarações a seu
respeito, autorizando opiniões sobre ele, o descrevendo, colonizando e governando. É preciso examinar o
orientalismo como um discurso para entender como a sistemática europeia conseguiu administrar e até
produzir a imagem sobre o Oriente. De forma bastante constante, o orientalismo depende, para a sua
estratégia, dessa superioridade posicional flexível, que coloca o ocidental em toda uma série de relações
possíveis com o Oriente, sem que ele perca jamais a vantagem relativa.
O Oriente e a Historiografia
O Orientalismo
Quando agimos sob a influência de signos e imagens fornecidos pelo nosso meio
local ou num sentido mais amplo e generalizado, nos acostumamos a não pensar por
conta própria, e sim num modelo já pré estabelecido. Assim, criamos estereótipos de
coisas e pessoas sem ao menos termos conhecido tais lugares ou determinados
habitantes e suas culturas, nos poupando do trabalho de estudar para sabermos
mais sobre a realidade de como vivem e são, por exemplo, os povos do Oriente, e
assim realizamos juízos de valor em relação a essas sociedades.
O Oriente e a Historiografia
Atualidade
É preciso perceber que a convivência do diferente é não só possível, como
necessária. Por vezes, tomamos o caminho mais fácil de acreditar deliberadamente
em mentiras (fake news), sabendo que são falsas, por assim mantermo-nos em
nossa zona de conforto, não optando por reconhecer nossos erros ou pensar de uma
forma diferente da que já está exposta.
O Oriente e a Historiografia
Atualidade
Dessa forma, para nos defendermos desse processo limitador que desemboca na
ignorância e estupidez de nosso pensamento, é preciso que aprendamos a ler, para
então conhecer, e assim despertarmos o interesse pelo estímulo próprio de nosso
pensamento, imaginação e criatividade. É nesse caminho que se faz possível a
construção de uma consciência autônoma, dotada de um próprio sistema de valores,
que não desrespeite e sim considere todos os aspectos, em escalamais ampla
possível.
O Oriente e a Historiografia
Atualidade
Assim, como professores e pesquisadores, nossa tarefa está pautada, entre outros
aspectos, na seleção de uma biografia que contemple aspectos multiculturais e não
uma unilateralidade dos fatos que ocorreram ao longo da nossa trajetória no tempo
histórico. Ao percebermos o ser humano em sua totalidade, compreendemos melhor
o estudo das civilizações e seu desenvolvimento para além de um “projeto
civilizador”, e sim numa perspectiva que percebe cada sociedade em seu próprio
modo e projeções.
O Oriente e a Historiografia
Atualidade
ALCORÃO. Tradução do sentido do Nobre Alcorão para a Língua Portuguesa. Trad. Helmi Nasr. Al-Madinah Al-Munauarah. Complexo
do Rei Fahd.
CARREIRA, José Nunes. História antes de Heródoto, Lisboa: Editora Cosmos, 1993.
CARVALHO, Antônio Vilela de. A escrita da história na China: o historiador sem alternativa? Ensaio bibliográfico, Lisboa: Ler História, s.n,
v.70, p. 219-230, 2017.
CHEDDADI, Abdesselam. A l'aube de l'historiographie arabo-musulmane: la mémoire islamique. In: Studia Islamica, n.74, p.29-41, 1991.
JOBIM, José Luís. Comparando: o modo orientalista de representar o mundo árabe. Rev. Bras. Lit. Comp. Niterói, v. 22, n. 40, pp. 124-127,
mai. /ago. 2020
ROSENTHAL, Franz. A History of a Muslim Historiography. Netherlands: E. J Brill. Leiden, 1968
SAID, Edward. Orientalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
SOUZA, E. F. de. História e historiografia: Ibn al-Athīr, o lugar e a função da História na Síria do século XIII. São Paulo: Malala, v. 5, n. 7, p. 
134-157, 2017. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/malala/article/view/131666. Acesso em: 10 fev. 2023.
O Oriente e a Historiografia
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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