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POLÍCIA MILITAR DE MINAS GERAIS ACADEMIA DE POLÍCIA MILITAR DE MINAS GERAIS CENTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO Tiago Fernandes Santos A DIGITALIZAÇÃO DE DOCUMENTOS FÍSICOS PARA UTILIZAÇÃO EM PROCESSOS ADMINISTRATIVOS DA PMMG DIANTE DAS DISPOSIÇÕES CONTIDAS NO DECRETO FEDERAL N° 10.278/2020: Um estudo sob a ótica da gestão de documentos. Belo Horizonte 2022 1 Tiago Fernandes Santos A DIGITALIZAÇÃO DE DOCUMENTOS FÍSICOS PARA UTILIZAÇÃO EM PROCESSOS ADMINISTRATIVOS DA PMMG DIANTE DAS DISPOSIÇÕES CONTIDAS NO DECRETO FEDERAL N° 10.278/2020: Um estudo sob a ótica da gestão de documentos Monografia apresentada ao Curso de Especialização em Segurança Pública (CESP/22) da Academia de Polícia Militar, como requisito parcial para conclusão de curso. Orientador: Eduardo Godinho Pereira, Cap PM Belo Horizonte/MG 2022 Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da Academia de Polícia Militar de Minas Gerais - Centro de Pesquisa e Pós-Graduação. Bibliotecária Regina Simão Paulino – CRB-6/1154 S237d Santos, Tiago Fernandes. A digitalização de documentos físicos para utilização em processos administrativos da PMMG diante das disposições contidas no Decreto Federal no. 10.278/2020: um estudo sob a ótica da gestão de documentos. / Tiago Fernandes Santos. - Belo Horizonte, 2022. 235 f.: il. Monografia (Curso de Especialização em Segurança Pública). Academia de Polícia Militar. Orientador: Eduardo Godinho Pereira. Referência: 174 - 189 f. 1. Decreto 10.278/2020. 2. Gestão de documentos digitais. 3. Polícia Militar de Minas Gerais. I. Pereira, Eduardo Godinho. II. Academia de Polícia Militar de Minas Gerais - Centro de Pesquisa e Pós-graduação. III. Título. CDU 005.92 3 Dedico este trabalho em primeiro lugar a Deus, pela saúde e pela oportunidade de realizar mais esse feito, à minha querida esposa Ana Flávia e ao meu melhor amigo, meu filho Caio, por toda paciência, compreensão e apoio dispensado. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço ao meu orientador, Cap PM Eduardo Godinho, por ter me guiado na confecção do trabalho com a melhor didática. Ao Chefe do CGDoc, Ten Cel Clessius, que desde os primeiros contatos colocou-se à disposição para auxiliar na elaboração do trabalho . A toda equipe do CGDoc , principalmente à Cap Gislayne e ao Ten Paulo que foram extremamente solícitos, fornecendo material didático e conhecimentos imprescindíveis para a concepção da monografia. A Toda equipe do Centro de Pesquisa e Pós Graduação pela organização dedicada do Curso. 5 RESUMO Os avanços tecnológicos associados a novas legislações têm promovido mudanças significativas na forma como as pessoas e as instituições interagem e realizam suas atividades. Com a promulgação da Lei n° 13.874, de 20 de setembro de 2019, que instituiu a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica no Brasil, o documento digital foi equiparado ao documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato de direito público. A referida norma incentiva a utilização dos documentos em formato digital em substituição aos documentos físicos em face da celeridade de transmissão das informações verificadas em meio digital. A facilidade com que os documentos digitais são produzidos, alterados e transmitidos, ao mesmo tempo em que representa um ganho de eficiência, apresenta algumas preocupações ao ramo da arquivologia, principalmente no que se refere à guarda e preservação da informação no longo prazo. Os documentos, como se sabe, possuem importância administrativa, jurídica e fiscal e, além disso, são elementos de registro, conservação e pesquisa da história e cultura de um povo. Para regulamentar o referido dispositivo da Lei n° 13.874/2019, em relação aos documentos digitalizados a partir de um documento físico, em 18 de março de 2020 entrou em vigor no Brasil o Decreto n° 10.278, o qual estabeleceu as técnicas e os requisitos para a digitalização de documentos públicos ou privados, a fim de que os documentos digitalizados produzam os mesmos efeitos legais dos documentos originais. A referida norma serve como um elemento de gestão dos documentos digitalizados, visto que apresenta elementos que são necessários para a gestão de documentos digitais e digitalizados em consonância com as normas arquivísticas e com a Teoria das Três Idades do documento. Nesse contexto, partindo da premissa de que a Polícia Militar de Minas Gerais é uma instituição que em suas atividades diárias produz uma série de documentos e que, assim como outros órgãos, utiliza os documentos digitais e digitalizados para otimizar suas atividades, buscou-se através do presente trabalho identificar se a digitalização de documentos físicos para utilização em processos administrativos da PMMG está alinhada com as disposições contidas no Decreto Federal nº 10.278, de 18 de março de 2020. A pesquisa caracterizou-se como exploratória, sendo adotados como métodos de pesquisa a documentação indireta e as observações diretas intensivas e extensivas, realizadas por meio de questionários e entrevistas. Trata-se de um tema de relevância institucional, visto que a Polícia Militar de Minas Gerais, como um órgão Público, está sujeita ao cumprimento dos princípios da Administração descritos no artigo 37 da Constituição Federal, entre os quais o da legalidade, motivo pelo qual está sujeita ao cumprimento das disposições contidas no Decreto n° 10.278/2020. Palavras Chaves: Decreto 10.278/2020, gestão de documentos digitais, Polícia Militar de Minas Gerais 6 ABSTRACT Technological advances associated with new legislation have promoted significant changes in the way people and institutions interact and carry out their activities. With the enactment of Law nº. 13.874 of September 20, 2019, which established the Declaration of Rights to Economic Freedom in Brazil, the digital document was equated with the physical document for all legal purposes and for the proof of any act of public law. This rule encourages the use of documents in digital format to replace physical documents in view of the speed of transmission of information verified in digital media. The ease with which digital documents are produced, altered and transmitted, while representing a gain in efficiency, presents some concerns to the field of archival science, especially with regard to the storage and preservation of information in the long term. Documents, as is known, have administrative, legal and fiscal importance and, in addition, are elements of registration, conservation and research of the history and culture of a people. To regulate the aforementioned provision of Law No. 13.874/2019, in relation to documents scanned from a physical document, on March 18, 2020, Decree nº. 10.278 came into force in Brazil, which established the techniques and requirements for the digitization of public or private documents, so that the digitized documents produce the same legal effects as the original documents. This standard serves as an element for the management of digitized documents, as it presents elements that are necessary for the management of digital and digitized documents in line with archival standards and with the Theory of the Three Ages of the Document. In this context, starting from the premise that the Military Police of Minas Gerais is an institution that, in its daily activities, produces a series of documents and that, like other bodies, uses digital and digitized documents to optimize its activities, we sought through of the present work to identify whether the scanning of physical documents for use in administrative processes of the PMMG is in line with the provisions contained in Federal Decree Nº. 10.278 of March 18, 2020. The research was characterized as exploratory, and the research methods adopted indirect documentation and intensive and extensive direct observations carried out through questionnaires and interviews. This is an issue of institutional relevance, since the Military Police of Minas Gerais, as a Public body, is subject to compliance with the principles of the Administration described in article 37 of the Federal Constitution, including legality, which is why which is subject to compliance with the provisions contained in Decree No. 10.278/2020. Keywords: Decree 10.278/2020, Digital Document Management, Military Police of Minas Gerais 7 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO...................................................................................... 11 2 O DOCUMENTO................................................................................... 17 2.1 O suporte da informação.................................................................... 17 2.2 Documento de arquivo....................................................................... 20 2.3 Caracterização dos documentos...................................................... 21 2.3.1 Gênero.................................................................................................. 22 2.3.2 Outras caracterizações......................................................................... 23 3 O DOCUMENTO DIGITALIZADO........................................................ 24 3.1 A digitalização de documentos......................................................... 24 3.2 As vantagens da digitalização.......................................................... 26 3.2.1 A digitalização, disrupção tecnológica................................................. 28 3.2.2 A digitalização no contexto da eficiência administrativa...................... 30 3.2.3 “Desburocratização” e digitalização.................................................... 31 3.3 As Teorias da Administração e a digitalização de documentos... 33 3.4 Digitalização dos documentos e processos administrativos eletrônicos - previsão legal............................................................... 34 3.5 Aspectos que denotam preocupação com a digitalização dos documentos........................................................................................ 36 4 O DECRETO FEDERAL Nº 10.278 DE 08 DE MARÇO DE 2020........ 38 4.1 Definição e Aplicação........................................................................ 40 4.2 Regras de digitalização..................................................................... 40 4.3 Requisitos e a responsabilidade pela digitalização....................... 43 4.4 Manutenção do documento digitalizado......................................... 47 4.5 Principais questões envolvendo o Decreto.................................... 48 5 OS ARQUIVOS E A GESTÃO DOS DOCUMENTOS FÍSICOS E DIGITAIS............................................................................................. 52 5.1 A origem dos arquivos...................................................................... 52 5.1.1 Razões para o surgimento dos arquivos públicos............................... 54 5.1.2 Definição e natureza dos arquivos........................................................ 55 5.1.3 Natureza dos arquivos segundo a atividade......................................... 56 8 5.1.4 Finalidades e funções dos arquivos...................................................... 56 5.1.5 Os princípios arquivísticos.................................................................... 57 5.1.6 O ciclo vital dos documentos e a Teoria das Três Idades.................... 58 5.1.6.1 Os arquivos correntes.......................................................................... 59 5.1.6.2 Os arquivos intermediários................................................................... 60 5.1.6.3 Arquivos permanentes.......................................................................... 61 5.1.7 Valor dos documentos.......................................................................... 62 5.1.8 Modelo Records Continuum................................................................. 62 5.2 A Gestão de documentos................................................................... 63 5.2.1 Objetivos da gestão de documentos..................................................... 64 5.2.2 Fases da gestão de documentos.......................................................... 64 5.2.3 Comissão permanente de avaliação de documentos............................ 65 5.2.4 Tabela de temporalidade e plano de classificação................................ 66 5.3 Gestão dos documentos digitais ...................................................... 67 5.3.1 Sistema de Gestão Arquivística de Documentos (SIGAD) e Gestão Eletrônica de Documentos (GED) ...................................................... 69 5.3.2 Aspectos da gestão arquivística do documento digital....................... 71 5.3.2.1 Produção............................................................................................... 71 5.3.2.2 Registro................................................................................................. 72 5.3.2.3 Classificação......................................................................................... 72 5.3.2.4 Manutenção, segurança e controles de acesso................................... 73 5.3.2.5 Arquivamento, pesquisa, localização e apresentação......................... 73 5.3.2.6 Destinação, eliminação e guarda permanente..................................... 73 5.3.3 Preservação e armazenamento do documento digital......................... 74 5.3.3.1 Repositório Arquivístico Digital Confiável- RDC-Arq............................ 76 5.4 A gestão de documentos e o Decreto n° 10.278/2020.................... 77 5.4.1 Processos de digitalização de documentos originais segundo o Decreto n° 10.278/2020........................................................................ 79 5.4.1.1 Unidade Técnica de Digitalização (UTD).............................................. 80 5.4.1.2 Pontos de Digitalização Descentralizados (PDD)................................. 81 5.4.1.3 Unidade Técnica de Digitalização Externa (UTDE).............................. 82 6 OS PROCESSOS/PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS E OS PROCESSOS ELETRÔNICOS NA PMMG.......................................... 84 6.1 Os procedimentos administrativos.................................................. 85 9 6.2 Legislação........................................................................................... 86 6.3 Os processos administrativos eletrônicos...................................... 88 6.4 Os princípios do processo administrativo....................................... 91 6.5 Assinatura digital e a arguição de nulidade 95 6.5.1 Da arguição de nulidade ............................................. ..................... 98 6.6 Alguns sistemas utilizados na PMMG para tramitação de processos administrativos................................................................. 99 6.6.1 Outros sistemas que tramitam informação administrativa em meio digital.......................................................................................... 102 7 A GESTÃO DOCUMENTAL NA PMMG.............................................. 104 7.1 A legislação......................................................................................... 106 7.2 A dimensão dos documentos produzidos na Instituição............... 108 7.3 A gestão.............................................................................................. 109 7.3.1 Centro de Gestão de Documentos - CGDoc........................................ 110 7.3.2 As pastas funcionais............................................................................. 112 7.3.3 Microfilmagem na PMMG...................................................................... 113 7.3.4 Da eliminação dos documentos............................................................ 114 7.4 A gestão dos documentos digitais na PMMG....................................... 115 7.5 Do Acesso, da segurança da informação e das implicações............... 116 7.5.1 Lei de Acesso à Informação................................................................. 117 7.5.2 Lei Geral de Proteção de Dados........................................................... 118 7.5.3 Outros dispositivos legais que apontam as implicações diante da falha na guarda de documentos............................................................ 119 7.6 A proteção da informação na PMMG................................................ 120 7.7 O Decreto n° 10. 278 e a gestão dos documentos na PMMG......... 121 8 METODOLOGIA................................................................................... 123 8.1 Classificação da Pesquisa................................................................. 123 8.2 Quanto ao método.............................................................................. 124 8.3 Método de abordagem....................................................................... 125 8.4 Técnica de pesquisa /métodos e procedimentos........................... 125 8.4.1 Documentação indireta........................................................................ 126 8.4.2 Observação direta intensiva............................................................... 127 8.4.3 Observação direta extensiva.............................................................. 128 8.5 Delimitação da população e amostra............................................... 129 10 8.6 Técnica de coleta de dados............................................................... 129 8.7 Análise dos dados de pesquisa........................................................ 131 9 ANÁLISE DE DADOS.......................................................................... 132 9.1 Dados quantitativos dos processos/procedimentos que tramitam no SICOR (Sistema Informatizado de Corregedoria) ....................... 132 9.2 Dados quantitativos procedimentos que a PMMG gerou ou recebeu pelo SEI (sistema Eletrônico de Informações)................... 134 9.3 Análise de questionários.................................................................... 136 9.3.1 Análise das respostas ao questionário aplicado ao Gestor do SICOR – Sistema Informatizado de Corregedoria............................................. 149 9.4 Análise das entrevistas...................................................................... 152 9.4.1 Análise da entrevista da Arquivista do CGDoc.................................... 152 9.4.2 Análise da entrevista do Chefe da Seção de Gestão de Documentos Digitais................................................................................................ 156 9.4.3 Análise da entrevista do Chefe do Centro de Tecnologia e Sistemas da PMMG........................................................................................... 160 9.5 Dados acerca de algumas despesas que envolvem a tramitação e gestão de documentos.................................................................... 163 10 CONCLUSÃO....................................................................................... 166 REFERÊNCIAS..................................................................................... 174 APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO APLICADO ÀS SUBCORREGEDORIAS DAS DEZENOVE REGIÕES DA PMMG...... 190 APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO APLICADO AO GESTOR DO SISTEMA SICOR NA PMMG................................................................ 195 APÊNDICE C – ROTEIRO DE ENTREVISTA ARQUIVISTA DO CGDoc................................................................................................... 200 APÊNDICE D – ROTEIRO DE ENTREVISTA CHEFE DA SEÇÃO DE GESTÃO DE DOCUMENTOS DIGITAIS....................................... 203 APÊNDICE E – ROTEIRO DE ENTREVISTA CHEFE DO CENTRO DE TECNOLOGIA E SISTEMAS......................................................... 207 APÊNDICE F – TRANSCRIÇÕES ENTREVISTAS............................ 210 11 1 INTRODUÇÃO A Polícia Militar de Minas Gerais - PMMG - produz diariamente uma gama de documentos, os quais, há mais de dois séculos, têm registrado sua história. A conservação e guarda desses documentos, seja pelo seu valor legal, seja pelo seu valor histórico, é um tema de suma importância e que merece atenção da Instituição. Dada à evolução dos meios de comunicação, da informática e da internet, bem como com o advento de algumas normas como a Lei de Acesso à Informação, associada a uma necessidade de eficiência administrativa, tem-se verificado a tramitação de documentos de forma cada vez mais célere na PMMG. Na busca pela agilidade de transmissão da informação e de documentos e acompanhando as tendências de digitalização dos processos, muitos documentos físicos estão sendo digitalizados na Instituição. De igual modo, softwares e sistemas têm sido desenvolvidos, inclusive na Polícia Militar de Minas Gerais, para transmitir os referidos documentos, intensificando e consolidando a tramitação dos processos de forma eletrônica. Sistemas como o Sistema Informatizado de Corregedoria- SICOR e o Sistema Eletrônico de Informações - SEI, institucionalizados e amplamente utilizados na Instituição, são empregados para tramitação de processos e procedimentos de forma eletrônica. A Instituição, com essas práticas, procura se modernizar e acompanhar o que está sendo realizado no cenário nacional e estadual. O processo eletrônico, por exemplo, já é uma realidade em outros poderes constituídos, os quais se relacionam frequentemente em suas atividades com a PMMG. A Justiça Militar do Estado de Minas Gerais, por exemplo, há alguns anos adotou o sistema de processo judicial eletrônico, e-Proc, pelo qual realiza os trâmites dos processos judiciais de forma digital. Inclusive, todos os Inquéritos realizados na Polícia Militar de Minas Gerais atualmente são encaminhados totalmente digitalizados para a Justiça Militar. 12 Tais atividades estão em consonância com o Plano Estratégico da PMMG 2020- 2023, no qual foram estabelecidos entre os projetos para a Instituição, a promoção, a implementação e o aperfeiçoamento de tecnologias e sistemas de suporte a atividade meio e fim. Importante destacar também que a busca pelas inovações digitais está alinhada com o Plano Mineiro de Desenvolvimento 2019-2030 (2019, p.73), que traz entre as diretrizes para a Segurança Pública o foco “na desburocratização e ampliação do uso das tecnologias digitais para melhorar a infraestrutura, a formação, a distribuição dos recursos e as atividades das forças de segurança”. No cenário nacional, tem-se observado algumas ações para desburocratizar e possibilitar a utilização dos recursos digitais. Entre essas ações verifica-se a edição de novas leis que visam facilitar e ou regulamentar o uso das novas tecnologias de modo a permitir melhorias dos serviços. Nesse sentido, uma das referidas legislações é a Lei n° 13.874, de 20 de setembro de 2019, que instituiu a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica. Tal dispositivo normativo trouxe em seu artigo 3º inciso X a informação de que o documento digital se equiparará ao documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato de direito público. Para regulamentar o referido dispositivo, em 18 de março de 2020 entrou em vigor o Decreto n° 10.278/2020, o qual estabeleceu as técnicas e os requisitos para a digitalização de documentos públicos ou privados, a fim de que os documentos digitalizados produzam os mesmos efeitos legais dos documentos originais. A digitalização de documentos proporciona uma tramitação mais rápida da informação, possibilitando, entre outras vantagens, a resolução de demandas administrativas de forma mais célere e também a ampliação do acesso à informação. 13 Além disso, as novas disposições normativas trouxeram a possibilidade de adoção da digitalização do documento como um recurso de preservação arquivística da informação, visto que antes disso, apenas o documento microfilmado tinha a legitimidade de produzir os mesmos efeitos do documento físico original. Entretanto, o Decreto n° 10.278/2020 trouxe elementos que merecem atenção dos gestores públicos. A referida norma dispõe em seu artigo 9º que após o processo de digitalização realizado conforme os requisitos do decreto, o documento físico poderá ser descartado, ressalvado aquele que apresente conteúdo de valor histórico. A possibilidade de eliminação dos documentos originais após a digitalização, trazida pelo decreto, implica em estudos necessários à implementação das disposições normativas, a fim de que documentos originais não sejam perdidos sob uma equivocada constatação de que a digitalização seria suficiente à preservação e guarda da informação. Assim, importante que seja estudado como é realizada a digitalização e a gestão dos documentos digitalizados na Instituição. Tal estudo se justifica, visto que a Polícia Militar, como um órgão da Administração Pública, está sujeita ao cumprimento dos princípios descritos no artigo 37 da Constituição Federal, entre os quais, o da legalidade, motivo pelo qual está sujeita ao cumprimento das disposições contidas no Decreto n° 10.278/2020. Nesse contexto, o Centro de Gestão Documental da PMMG, que é o orgão responsável por orientar a gestão dos documentos na Instituição, possui papel fundamental de alinhar o comportamento e técnicas às novas tendências e disposições legais. Por todo o exposto, o presente trabalho representa uma oportunidade de lançar luz sobre as peculiariedades do Decreto n° 10.278/2020. Através da pesquisa pretende- se subsidiar o Comando da Polícia Militar de Minas Gerais com informações que contribuam para entender como está a situação da digitalização de documentos na Instituição, bem como entender como está sendo realizada a gestão desses 14 documentos, a fim de assessorar a implementação de ações alinhadas às disposições do Decreto nº 10.278/2020 e outras normas que tratam do assunto. Nesse contexto, diante do novo decreto que regulamentou a digitalização dos documentos físicos em âmbito nacional, o problema de estudo se encontra na seguinte indagação: considerando as disposições do Decreto Federal n° 10.278 de 18 de março de 2020, o qual teve por objeto estabelecer a técnica e os requisitos para a digitalização de documentos públicos ou privados, a fim de que os documentos digitalizados produzam os mesmos efeitos legais dos documentos originais, como a Polícia Militar de Minas Gerais está realizando a digitalização dos documentos físicos para utilização em seus processos administrativos? Estabelecendo-se a seguinte hipótese à problemática citada: A Polícia Militar de Minas Gerais ainda não realiza a digitalização de documentos físicos segundo as disposições do Decreto Federal nº 10.278 de 18 de março de 2020 nos processos em andamento. A legislação recente apresenta inovação e desafios, havendo a necessidade de estudos para a implementação das disposições contidas no Decreto Federal nº 10.278 de 18 de março de 2020. A pesquisa tem como o objetivo geral verificar se a digitalização de documentos físicos para utilização em processos administrativos da PMMG está de acordo com as disposições contidas no Decreto Federal nº 10.278 de 18 de março de 2020 e os objetivos específicos são os seguintes: a) Verificar se atualmente ocorre a digitalização de documentos físicos nas Unidades da PMMG e , caso ocorra, verificar para qual finalidade; b) Verificar se diante das disposições contidas no Decreto Federal n° 10.278/2020, houve alguma influência nas rotinas do Centro de Gestão Documental da Polícia Militar de Minas Gerais no tocante à gestão documental; c) Identificar a destinação dada aos documentos físicos originais após a digitalização; d) Identificar a destinação dos documentos digitalizados e a sua forma de armazenamento; 15 Assim, a fim de estudar o tema proposto, responder ao problema e cumprir o objetivo geral e os objetivos específicos da pesquisa, o tema foi estudado a partir de documentação indireta, por meio de pesquisa documental e bibliográficas, e também utilizando-se a observação direta intensiva e extensiva, realizada por meio de entrevistas e questionários .Para tanto, o trabalho será organizado da seguinte forma: a) a primeira seção contém a introdução do trabalho onde se contextualiza a importância do tema, justifica a necessidade do estudo e apresenta os objetivos geral e específicos, bem como o problema de estudo e a hipótese estabelecida; b) a segunda seção expõe noções acerca do documento, apresentando as características dos documentos de arquivo, bem como um breve histórico de alguns dos suportes que já foram utilizados para a transmissão da informação até chegar aos suportes eletrônicos; c) na terceira seção é realizado uma abordagem sobre a digitalização de documentos, contextualizando a digitalização, o avanço digital no mundo e no Brasil. Nesta seção é apresentada também a digitalização como uma ferramenta de melhoria dos processos administrativos, os aspectos legais da digitalização de documentos e as Teorias da Administração que tangenciam o assunto; d) a quarta seção traz uma explanação sobre o Decreto nº 10.278 de 18 de março de 2020, apresentando os requisitos e detalhes a serem compreendidos para a correta execução da digitalização; e) na quinta seção é apresentado um conteúdo sobre a gestão de documentos físicos e digitais, apresentando a teoria que baliza a gestão de documentos e os principais conceitos e princípios que orientam a atuação arquivística; f) na sexta seção é realizada uma abordagem sobre os processos e procedimentos administrativos da PMMG, bem como sobre os processos eletrônicos, explanando acerca de alguns dos sistemas que tramitam os documentos digitais e digitalizados na Instituição; g) na sétima seção é apresentado uma visão geral da gestão de documentos digitais na PMMG ; 16 h) na oitava seção descreve-se a metodologia utilizada no trabalho; i) Na nona seção são apresentados os dados coletados na pesquisa e análise destes; j) a décima seção traz as considerações finais do trabalho. 17 2 O DOCUMENTO Antes do estudo dos documentos digitalizados faz-se necessário conceituar o que é um documento. Tal definição tem o propósito de apresentar as características e a importância dos documentos. Conforme a definição do Arquivo Nacional (2019, p.10) constante no curso de capacitação para os integrantes do Sistema de Gestão de Documentos de Arquivo – SIGA “O documento é toda unidade de registro de informações, qualquer que seja o suporte ou formato, suscetível de ser utilizada para consulta, estudo, prova e pesquisa, por comprovar fatos, fenômenos, formas de vida e pensamentos.” Schellenberg apud Alvares (2021, p. 15), nessa esfera, define que “o documento é um objeto importante para o estudo e análise, servindo como fonte de prova para o futuro e para o exercício de uma determinada atividade.” Rousseau; Couture apud CRUZ (2013): apresentam a importância dos documentos para a sociedade nos seguintes termos: Nas sociedades conhecedoras da escrita os documentos sempre foram o alicerce do “... exercício do poder, para o reconhecimento dos direitos, para o registro da memória e para sua utilização futura” (ROUSSEAU; COUTURE, 1998, p. 32). A prática de produção de documentos revolucionou a utilização da informação com o seu registro, cópia, autenticação, transmissão, recepção, difusão, classificação, recuperação, conservação e utilização de forma fácil, estável e exata (ROUSSEAU; COUTURE, 1998, p. 61). (ROUSSEAU; COUTURE, 1998 apud CRUZ, 2013, p. 9). Conforme exposto, o documento é um instrumento em que é possível encontrar uma informação, um pensamento, um conhecimento que podem ser preservados a longo prazo para consulta e pesquisa das gerações futuras. 2.1 O suporte da informação A necessidade da informação, bem como a de registrá-la e transmiti-la, levaram a civilização a criar mecanismos que pudessem contribuir para tal intento. Conforme 18 Paes (2004, p. 15), “o homem primitivo, tendo a necessidade de um meio de expressão permanente, recorreu a uma engenhosa disposição de símbolos ou a sinais materiais que constituíram a base dos primeiros sistemas de escrita.” Ainda conforme a autora, paralelamente à evolução da escrita, o homem aperfeiçoou também o material sobre o qual gravava seus sinais convencionais, alterando, como consequência, lenta e progressivamente, o aspecto dos documentos. Esse material onde se registra uma informação, segundo a Norma Brasileira de Descrição Arquivística- NOBRADE (2006) é denominado suporte. Ao longo da história, vários foram os suportes que foram utilizados para o registro de uma informação, dentre os quais se citam as tábuas de argila, os papiros, os pergaminhos, o papel e as mídias digitais. No mesmo sentido Paes (2004, p.16) afirmou que nos tempos antigos “o suporte da escrita era o mármore, o cobre, o marfim, as tábuas, os tabletes de argila e outros matérias. Só mais tarde é que apareceram o papiro, o pergaminho e, finalmente o papel ”. As ilustrações a seguir trazem alguns tipos de suportes das informações que já foram utilizados pelo homem e alguns que ainda são utilizados. Figura 1 – Tabuleta de argila Tabuleta de argila Utilizadas há aproximadamente 3500 A.C. os primeiros pictogramas foram gravados nessa espécie de tábua de madeira coberta de argila. Com um instrumento feito de algum tronco vegetal, a argila era empurrada e os símbolos eram gravados. As tabuletas eram levadas ao forno para que o registro se tornasse permanente. Quando eram revestidas de cera, podiam ter os escritos apagados. Assim, as tábuas eram reaproveitadas. Fonte: compilação do autor 1 (2022). 1 Disponível em <https://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/historia-escrita/ > acessado em 07 jul.2022 - em <https://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/historia-sobre-papel/ > acessado em 07 jul.2022 e LYON ( 2011, p.16). http://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/historia-escrita/ 19 Figura 2 – Papiro, Pergaminho, Papel e Meio Digital (computador) -Papiro O percursor do papel foi desenvolvido por volta de 2.500 a.C., pelos egípcios, a partir da planta papiro, que tinha o miolo cortado em finas lâminas. Depois de secas, elas eram mergulhadas em água, na qual permaneciam por seis dias. Outra vez secas, as lâminas eram ajeitadas em fileiras horizontais e verticais, sobrepostas umas às outras. A folha obtida era martelada, alisada e colada ao lado de outras, para formar uma longa fita que era depois enrolada. - Pergaminho Com a falta do papiro como suporte para a escrita, foi desenvolvido o pergaminho, em Pérgamo. O pergaminho era obtido através do tratamento do couro de carneiro, vitelo de ovelhas e bezerros. Sua produção era muito demorada e cara, mas, por outro lado, ele era bem mais resistente que o papiro. O pergaminho surgiu na Ásia, na cidade de Pérgamo, por volta do século II a.C -Papel No ano 105 d.C, o chinês T’sai Lun, durante experimentos em tela de pano esticada no bambu e aplicação de fibras maceradas, descobriu um suporte que absorvia melhor a tinta: o papel. A descoberta do papel revolucionou o império chinês e foi utilizado apenas pelos chineses, por quase 600 anos. - Computadores Em 1946 foi criado o primeiro computador, o Eletronical Numerical Integrator and Computer – ENIAC. Desde então houve o avanço da tecnologia até os computadores pessoais. Fonte: compilação do autor 2 (2022). 2 Disponíveis em <https://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/historia-escrita/ > acessado em 07jul.2022, https://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/historia-sobre-papel, acessado em 07 jul.2022 e <https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/do-eniac-ao-notebook-confira-a-evolucao-dos- computadores-nas-ultimas-decadas >acessado em 08 ago.2022. http://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/historia-escrita/ https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/do-eniac-ao-notebook-confira-a-evolucao-dos-computadores-nas-ultimas-decadas https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/do-eniac-ao-notebook-confira-a-evolucao-dos-computadores-nas-ultimas-decadas 20 Os diversos tipos de suportes utilizados ao longo dos anos demonstram que o ser humano, utilizando dos materiais disponíveis ao seu alcance em sua respectiva época, ou seja, da tecnologia disponível, evoluiu, se adaptou e se aproveitou da maior capacidade de tramitação proporcionada pelos suportes. Tal situação é verificada nos dias atuais com cada vez mais emprego de documentos em suportes eletrônicos. O desenvolvimento de suportes possibilitou a ampla produção e uso dos documentos. Todavia, nem todos os documentos produzidos são tratados como um documento de arquivo, como se verificará adiante. 2.2 Documento de arquivo Conforme Schelenberg (2004, p.38), se os documentos “foram produzidos no curso de uma atividade organizada com uma determinada finalidade, se foram criados durante o processo de consecução de um certo fim administrativo, (...) são então considerados como tendo qualidade de material de arquivo (...)”. No mesmo sentido, o Arquivo Nacional (2019, p.10) descreve que: Documentos de arquivo ou documentos arquivísticos são todos aqueles que, produzidos e/ou recebidos por pessoa física ou jurídica, pública ou privada, no exercício de suas atividades, constituem elementos de prova ou de informação. Formam um conjunto orgânico, refletindo as ações a que estão vinculados, expressando os atos de seus produtores no exercício de suas funções. Assim, a razão de sua origem ou a função para qual são produzidos é que determina sua condição de documento de arquivo, e não a natureza do suporte ou formato. A definição de um documento de arquivo faz-se necessária para distinguir se um documento deve ser preservado e direcionado a um arquivo. Mais adiante, na presente pesquisa, será apresentada uma abordagem acerca da gestão dos documentos de arquivo. 21 2.3 Caracterização dos documentos A par dos conceitos de documento de arquivo é necessário o conhecimento das características do documento os quais, segundo Alvares (2021), lhes conferem elementos de conhecimento e de prova. Pode-se dizer que um documento é provido de características específicas que valoram a informação constante em seu conteúdo. Nesse sentido, Duranti (1994, p.4) descreve que: As características de imparcialidade, autenticidade, naturalidade, inter- relacionamento e unicidade tornam a análise dos registros documentais o método básico pelo qual se pode alcançar a compreensão do passado tanto imediato quanto histórico, seja com propósitos administrativos ou culturais. A natureza da prova documental é de primordial importância e diz respeito tanto ao direito, que regula a conduta de nossa sociedade, como à história, que a explica. De fato, ambos contam com a reconstrução mental do passado para seus julgamentos e interpretações. Essa reconstrução não pode ser feita cientificamente - no sentido dos experimentos desenvolvidos em ambiente de laboratório - e tampouco seus resultados podem ser absolutamente certos, porque os fatos passados não podem ser repetidamente reproduzidos e observados. Segundo a Norma Brasileira de Descrição Arquivística - NOBRADE (2006, p.11), a caracterização técnica de um documento de arquivo é baseada em normas as quais por sua vez “visam garantir descrições consistentes, apropriadas e auto- explicativas”. Conforme o Arquivo Nacional (2019) as principais características dos documentos são a organicidade, a unicidade, a confiabilidade e a autenticidade: • organicidade: diz respeito à produção e organização dos documentos em razão das funções e atividades desenvolvidas pelo órgão ou entidade. Ou seja, os documentos estão relacionados com a organização que os produziu (ARQUIVO NACIONAL, 2019). • unicidade: diz respeito à característica do documento ser único no conjunto documental de que faz parte. Mesmo que haja cópias, estas serão únicas (ARQUIVO NACIONAL, 2019). 22 • confiabilidade: diz respeito à capacidade do documento sustentar os fatos que atesta. A confiabilidade está relacionada ao momento em que o documento é produzido e à veracidade de seu conteúdo. Para tanto, precisa ser dotado de completeza e ter seus procedimentos de criação bem controlados (ARQUIVO NACIONAL, 2019). • autenticidade: diz respeito ao documento ser livre de adulterações ou alterações, se refere à transmissão do documento e à preservação e custódia. O documento autêntico é aquele que se mantém da forma como foi elaborado e, portanto, apresenta o mesmo grau de confiabilidade que tinha no momento de sua produção (ARQUIVO NACIONAL, 2019). Outros autores como Duranti (1994) trazem ainda como características dos documentos a imparcialidade, a naturalidade e o inter-relacionamento. 2.3.1 Gênero De acordo com o Arquivo Nacional (2019), o gênero documental reúne espécies de documentos que se assemelham por suas características, em especial o suporte e o formato, e que exigem processamento técnico específico. Conforme Paes (2004), os gêneros documentais mais comuns são o documento textual, o cartográfico, o iconográfico, o filmográfico, o sonoro, omicrográfico e o informático. O Arquivo Nacional (2019) cita ainda as classificações audiovisuais, eletrônico e digital. Todavia, segundo o Arquivo Nacional (2019, p.14), “não existe consenso quanto à caracterização de documento eletrônico e documento digital como gêneros documentais, uma vez que ambos podem se apresentar como documentos textuais, cartográficos e audiovisuais”. Conforme o Glossário do CONARQ (2020, p.26) “na literatura arquivística internacional, algumas vezes encontra-se o termo “documento eletrônico” como sinônimo de “documento digital””. 23 2.3.2 Outras caracterizações Conforme o Arquivo Nacional (2019), os documentos de arquivo podem ser caracterizados também quanto à espécie, quanto ao tipo e quanto à natureza do assunto. Quanto à espécie, tem-se a divisão de gênero por seu formato, que pode ser tanto em razão da natureza dos atos que lhes deram origem, quanto pela forma de registro dos fatos. São exemplos de espécies documentais os atos administrativos mais comuns nas estruturas de governo como os atos normativos, enunciativos, de assentamento, dentre outros. O tipo documental é a subdivisão da espécie que reúne os documentos pelas características que dizem respeito à fórmula diplomática, a natureza de conteúdo ou a técnica de registro. Segundo o Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística, são exemplos de tipos documentais as cartas precatórias, cartas régias, cartas- patentes, decretos sem número, decretos-leis, decretos legislativos, daguerreótipos, litogravuras, serigrafias, xilogravuras (BRASIL, 2005, p.163). Quanto à natureza do assunto, os documentos podem ser ostensivos ou sigilosos. Sendo que conforme Paes (2004), os ostensivos são aqueles que estão disponíveis para o acesso do público e os sigilosos são os que possuem algum tipo de restrição ao acesso. As caracterizações dos documentos apresentadas nesta seção são necessárias para a classificação do documento de arquivo, sendo importantes para uma correta valoração, guarda e conservação. Para se realizar a gestão dos documentos, sejam eles físicos ou digitais, deve-se atentar para uma boa classificação. Como se verificará nos próximos capítulos, a Polícia Militar de Minas Gerais se insere nesse contexto, visto que possui e produz uma infinidade de documentos que necessitam de gestão. 24 3 O DOCUMENTO DIGITALIZADO Para o melhor entendimento dos aspectos técnicos do objeto da pesquisa faz-se necessário esclarecer que a doutrina diferencia um documento nato digital do documento digitalizado. O documento nato digital, conforme o Arquivo Nacional (2021, p. 8) é o “Documento criado originalmente em meio digital”, que já nasce no meio digital, produzido com o emprego de câmeras fotográficas e computadores. O documento digitalizado por sua vez é definido como “a representação digital de um documento produzido em outro formato e que, por meio da digitalização, foi convertido para o formato digital”3. Tal definição está em consonância com a contextualização realizada no segundo capítulo deste trabalho, na qual se apresentou o conceito de documento como sendo a junção de uma informação disposta em um suporte. No caso do documento digitalizado ou representante digital a informação do documento físico é transferida, utilizando-se de um periférico tecnológico para um suporte digital. O manual de gestão de documentos da Universidade de Brasília (2015, p.25), em que pese tal diferenciação, descreve que tanto os documentos nato digitais como os digitalizados são documentos digitais, visto que “Ambos são codificados em dígitos binários, acessíveis e interpretáveis por meio de um sistema computacional.” A distinção entre os documentos natos digitais e os digitalizados se mostra adequada, uma vez que o Decreto nº 10.278/2020, objeto de estudo, trata dos documentos digitalizados. Todavia, como visto, ambos são considerados documentos digitais. 3.1 A digitalização de documentos Segundo o Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística (2005, p.69), a digitalização é o “processo de conversão de um documento para o formato digital por 3 Disponível em <https://www.gov.br/conarq/pt-br/assuntos/camaras-tecnicas-setoriais- inativas/camara-tecnica-de-documentos-eletronicos-ctde/perguntas-mais-frequentes> Acessado em 08 ago.2022. 25 meio de dispositivo apropriado, como um escâner”. Assim, o processo de digitalização é o que produz a partir de um documento físico um representante digital. O CONARQ (2010, p.5-6) entende a digitalização como um processo de conversão dos documentos arquivísticos em formato digital, que consiste em unidades de dados binários, denominadas de bits - que são 0 (zero) e 1 (um), agrupadas em conjuntos de 8 bits (binarydigit) formando um byte, e com os quais os computadores criam, recebem, processam, transmitem e armazenam dados. A digitalização, segundo o mesmo dispositivo, inicia-se pela captura digital da imagem do documento original, a qual deve garantir a máxima fidelidade em relação ao documento de origem. A fidelidade está relacionada à autenticidade do documento, que diz respeito à capacidade do representante digital conservar as características do documento original. Conforme o CONARQ (2010, p.7), a captura da imagem digital é realizada através de equipamentos periféricos, a qual será precedida de um exame do suporte original, que deve considerar “suas características físicas e estado de conservação, de forma a garantir aos representantes digitais a melhor fidelidade visual em relação aos documentos originais, e sem comprometer seu estado de conservação” . Segundo o CONARQ (2010, p. 9), entre os principais equipamentos utilizados para a captação de imagem para a finalidade de digitalização têm-se os scanners4 e as populares câmeras digitais. 4 Os scanners são dispositivos (de entrada) utilizados para converter imagens em arquivos digitais. SOUKI e MACHADO( 2004, p. 141). 26 Figura-3 - Equipamento scanner Fonte:Manual de procedimentos para Gestão Documental (2021, p. 104). A utilização de equipamentos como os scanners ou as câmeras digitais para a conversão do documento físico em documento digital, segundo o CONARQ (2010), depende ainda de softwares que auxiliam na criação dos arquivos digitais que podem ser encontrados em formatos como PDF( Portable Document Format), JPEG (Joint Photographic Experts Group ) e TIFF (Tagged Image File Format). Como veremos no próximo capítulo para digitalizar um documento de modo que ele possa ser considerado com a mesma validade do original, ele deve ser digitalizado seguindo os requisitos descritos no Decreto n° 10.278/2020. No referido decreto entre outras disposições é descrito o formato digital que o arquivo digitalizado deve ser produzido. 3.2 As vantagens da digitalização O Manual de Gestão de Documentos da Universidade de Brasília (2015, p.25-26), afirma que o documento digitalizado normalmente é produzido com o objetivo de facilitar a disseminação, o acesso e a preservação do documento original do manuseio desnecessário. No mundo em que decisões são tomadas em questão de segundos e que a necessidade de informação é cada vez maior, a digitalização de documentos vem 27 sendo realizada em várias instituições privadas e públicas devido a vantagens como a velocidade de tramitação da informação e do acesso a essa informação. O arquivo Nacional, no mesmo sentido afirma que: O avanço das tecnologias da informação fez com que indivíduos e organizações públicas e privadas iniciassem a produção de documentos em formato digital. Este formato facilita a criação, processamento, transmissão e armazenamento dos documentos, trazendo inúmeras vantagens, como ampliação de produtividade, otimização do fluxo de trabalho, facilidade de gerenciamento e rapidez na recuperação dos documentos de arquivo. Graças às grandes redes de computadores, os documentos podem ser distribuídos, globalmente, de maneira ágil e com múltiplos propósitos (ARQUIVO NACIONAL, 2019, p.8). A digitalização do documento, associada à facilidade de transmissão pelo desenvolvimento da rede de dados de internet, permite que o documento digitalizado possa ser transmitido e acessado por meio de diversos sistemas, como por exemplo por meio de um aplicativo de celular, ou seja, de qualquer lugar do planeta pode-se ter acesso a uma informação constante em um documento digital em questão de segundos e de forma simultânea. Não há mais a necessidade de se deslocar ao local onde se localiza ou foi produzido o documento. Conforme Chiavenato (2014, p. 425), usa-se o conceito de Homo Digitalis (homem digital) para se referir ao comportamento das pessoas nos dias atuais. De acordo com o autor o homem digital é “aquele cujas transações com seu meio ambiente são efetuadas predominantemente por intermédio do computador e da internet.” Assim, a evolução tecnológica apresenta um grande potencial no que diz respeito à disseminação da informação e tem proporcionado inúmeras mudanças. O comércio eletrônico e as transações bancárias realizadas por meio digital são exemplos que demonstram a velocidade da disseminação de informações proporcionada pelos avanços tecnológicos dos últimos tempos. A apresentação dos suportes da informação no capítulo anterior e de suas alterações ao longo do tempo demonstra como a evolução tecnológica é um fator que não se pode controlar. 28 Segundo Chiavenato (2014, p. 26): Da tecnologia simples para a tecnologia sofisticada: estão surgindo tecnologias totalmente novas, e não simplesmente desenvolvimentos das tecnologias atuais. Além disso, a conversão da tecnologia em um produto ou serviço acabado e disponível para o consumo será cada vez mais rápida. Com isso, serão criadas novas empresas, com novas estruturas organizacionais mais adequadas a essas tecnologias e que tornarão rapidamente obsoletas as grandes organizações atualmente existentes. Nesse sentido, Bellotto (2002, p.30) afirma em relação à tecnologia da informação na gestão dos documentos que “(...) a velocidade com que surgem novas metodologias e formas de armazenar, utilizar e disseminar informação é a mesma velocidade com que os equipamentos se tomam obsoletos”. 3.2.1 A digitalização, disrupção tecnológica As mudanças e inovações implicam em uma necessidade de se adaptar de forma rápida às novas tecnologias, visando acompanhar as novas tendências. Tal necessidade não se aplica apenas ao ambiente privado, mas também ao setor público. Um conceito que é usado quando uma nova tecnologia tem o potencial de mudar como uma organização realiza suas atividades é a chamada disrupção (perturbação). Conforme Santos (2020, p.24): À medida que a transformação digital impulsionada pelo surgimento de novas tecnologias, interrompe os modelos de negócios antigos, tem-se uma disrupção e as organizações precisam lidar com a inovação tecnológica acelerada, além de reestruturar processos de negócios, estrutura organizacional ou cultura. No mundo empresarial a busca pela realização de tarefas de forma mais célere e de modo que gere menos custos tem feito com que as empresas adotem soluções tecnológicas. Essas organizações têm procurado adaptar suas atividades para produção de melhores resultados. A adoção do meio digital e dos documentos digitalizados é uma tônica em diversos seguimentos. Conforme Alvares (2021, p.17) “a digitalização é um exemplo claro de disrupção tecnológica no campo da Arquivologia”, (...) e o Decreto nº 10.278/2020 também 29 pode ser considerado “uma disrupção tecnológica, tendo em vista que os documentos digitais podem se equiparar aos documentos físicos e possuir o mesmo valor probatório.” O avanço da utilização dos meios digitais é percebido em diversos setores. Em pesquisa realizada pelo Instituto Verificador de Comunicação (IVC) demonstrou-se que a circulação de jornais impressos no Brasil, entre junho de 2015 a junho de 2022, teve queda expressiva ao passo que a circulação digital tem apresentado aumento nos últimos anos 5. Figura 4 – Evolução da Circulação impressa e digital de jornais junho 2015 a junho 2022 Fonte: compilação do autor 6 (2022). Na administração pública tem-se verificado a citada transformação digital em várias áreas e atividades. Neste contexto, Santos (2020, p.87) traz que “Com a adoção do Tele Trabalho, o SEI! MG registrou um aumento de 91% de documentos gerados e recebidos, no período de março a agosto de 2020, em relação ao mesmo período de 2019.” 5 Disponível em < https://www.poder360.com.br/midia/jornais-no-1o-semestre-impresso-cai-77-e- digital-tem-alta-timida/> Acesso em 01 ago.2022. 6 Disponível em < https://www.poder360.com.br/midia/jornais-no-1o-semestre-impresso-cai-77-e- digital-tem-alta-timida/> Acesso em 01 ago.2022. https://www.poder360.com.br/midia/jornais-no-1o-semestre-impresso-cai-77-e-digital-tem-alta-timida/ https://www.poder360.com.br/midia/jornais-no-1o-semestre-impresso-cai-77-e-digital-tem-alta-timida/ https://www.poder360.com.br/midia/jornais-no-1o-semestre-impresso-cai-77-e-digital-tem-alta-timida/ https://www.poder360.com.br/midia/jornais-no-1o-semestre-impresso-cai-77-e-digital-tem-alta-timida/ 30 O Sistema Eletrônico de Informação (SEI), como se verificará adiante no presente trabalho, é um sistema adotado pela Administração Pública para a tramitação de documentos digitais. Em Minas Gerais, o Decreto n° 47.228, de 04 de agosto de 2017 regulamentou sua utilização. 3.2.2 A digitalização no contexto da eficiência administrativa Conforme Chiavenato (2014, p.25) “a tecnologia proporciona maiores eficiência e precisão, e a liberação da atividade humana para tarefas mais complicadas que exijam planejamento e criatividade.” O conceito de eficiência está relacionado com “a melhor maneira pela qual as coisas devem ser feitas ou executadas (métodos de trabalho), a fim de que os recursos (pessoas, máquinas, matérias-primas, etc.) sejam aplicados da forma mais racional possível” (CHIAVENATO, 2014, p.62). A busca pela eficiência é uma realidade na administração pública. Ao contrário das empresas privadas a administração pública não tem como objetivo auferir lucro, todavia a redução de custos e a busca por uma prestação de serviço de melhor qualidade e da forma mais rápida à sociedade são vistas como essenciais e requisito de sustentabilidade de uma instituição. Acrescenta-se a isso que a eficiência é um princípio da administração pública presente no artigo 37 da Constituição Federal do Brasil de 1988: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...]” (BRASIL, 1988). Segundo Di Pietro (2018, p.151): O princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público. 31 Assim, pode-se dizer que a digitalização de documentos é um dos elementos que contribui e possibilita à administração pública adotar os processos administrativos eletrônicos tornando os mais eficientes. O Decreto nº 8.539, de 08 de outubro de 2015, que dispôs sobre “o uso do meio eletrônico para a realização do processo administrativo no âmbito dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional” em seu artigo 2º, alínea “c”, neste sentido, menciona o documento digitalizado. O referido decreto no que diz respeito à eficiência traz em seu artigo 3º inciso 1º que um de seus objetivos é “assegurar a eficiência, a eficácia e a efetividade da ação governamental e promover a adequação entre meios, ações, impactos e resultados.” (BRASIL, 2015). Nessa mesma esfera, no ano de 2021, foi promulgada pelo governo federal a Lei nº 14.129, de 29 de março de 2021, que tem por objeto “dispor sobre princípios, regras e instrumentos para o aumento da eficiência da administração pública”. Esta norma tem objetivos ambiciosos e que pretende acelerar os processos digitais no país. Conforme exposto, a busca da eficiência é uma tônica e, nesse sentido, a digitalização de documentos se apresenta como um meio de aprimorar a eficiência e a eficácia dos processos administrativos, possibilitando acelerar a tramitação de documentos e a melhoria da acessibilidade à informação. 3.2.3 “Desburocratização” e digitalização Em que pese o uso de novas tecnologias e da adoção das melhores metodologias, não rara às vezes, a melhoria da eficiência na produção de um serviço à sociedade esbarra na disfunção da burocracia das normas que ditam as ações da administração. Todavia, a exemplo do Decreto nº 8.539 de 2015 citado anteriormente que possibilitou o procedimento administrativo eletrônico nas instituições federais, tem-se verificado no Brasil nos últimos anos a edição de novas normas que tendem a 32 “desburocratizar” as atividades administrativas, acelerando processos e permitindo a utilização dos recursos tecnológicos em suas máximas possibilidades. Essa prática não é uma exclusividade do Brasil. Na Estônia, por exemplo, mais de 80% de seus serviços públicos são oferecidos de maneira digital. O caso da Estônia é notório. Conforme cita Santos (2020, p.28) “na Estônia, todos os serviços de governo, como: legislação, votação, educação, justiça, assistência médica, bancos, impostos, policiamento foram transformados digitalmente e vinculados em uma plataforma, conectando todo o país.” Os dados citados por Santos foram extraídos do Digital Economy and Society Index (DESI) 2020, que tem por finalidade monitorar o desempenho do desenvolvimento digital na Europa. Ao se consultar o DESI 2021 verifica-se que a Estônia permanece entre os melhores resultados no quesito de digitalização entre os países da Europa. Conforme cita Santos (2020, p.31), o sucesso da Estônia se baseou em três pilares: a vontade política, uma abordagem centrada no cidadão e uma forte plataforma de compartilhamento de dados. No Brasil esta “desburocratização” embora seja ainda tímida está se acelerando para acompanhar as tendências mundiais. A citada Lei nº 14.129/2021, nesse sentido trouxe no parágrafo 1º do artigo 1º seus objetivos que são “dispor sobre princípios, regras e instrumentos para o aumento da eficiência da administração pública, especialmente por meio da desburocratização, da inovação, da transformação digital e da participação do cidadão” (BRASIL, 2021). Entre as recentes inovações normativas que visaram destravar os serviços administrativos citadas por Santos (2020, p.48) está justamente o Decreto nº 10.278/2020 objeto do presente estudo e que será detalhado nos próximos capítulos. 33 3.3 As Teorias da Administração e a digitalização de documentos Segundo Chiavenato (2014, p. 8) “A Teoria Geral da Administração (TGA) é o campo do conhecimento humano que se ocupa do estudo da administração em geral, não importa onde ela seja aplicada, se nas organizações lucrativas (empresas) ou nas não lucrativas”. Conforme o Autor as atividades da administração dependem da situação e da circunstância em que se desenvolvem os acontecimentos. Chiavenato (2014, p. 20) ainda conclui que as atividades da administração estão relacionadas com “seis variáveis – tarefas, estrutura, pessoas, ambiente, tecnologia e competitividade” que segundo o mesmo impulsionaram a criação de diferentes teorias da Administração. Algumas dessas teorias da administração tiveram como objetivo a busca da eficiência na realização das atividades, e constituíram as bases da abordagem clássica da administração. Conforme Chiavenato: O norte-americano Frederick Winslow Taylor iniciou a chamada Escola da Administração Científica, preocupada em aumentar a eficiência da indústria por meio da racionalização do trabalho do operário. O europeu Henri Fayol desenvolveu a chamada Teoria Clássica, preocupada em aumentar a eficiência da empresa por meio de sua organização e da aplicação de princípios gerais da administração em bases científicas (CHIAVENATO, 2014, p.52). As teorias acima estão voltadas para os métodos de trabalho e também da organização das tarefas, visando a melhor produtividade. Com a inclusão das tecnologias da Informação na Administração, associadas a um ambiente dinâmico de transformações, segundo Chiavenato (2014) houve o desenvolvimento de novas teorias dentre as quais a Teoria dos Sistemas e a Teoria da Contingência. A Teoria Geral dos Sistemas foi estruturada, segundo Chiavenato (2014), a partir dos estudos realizados por Ludwig Von Bertalanffy. Segundo o autor, essa teoria ganhou destaque visto que “as teorias anteriores tinham um ponto fraco: a microabordagem. Elas lidavam com pouquíssimas variáveis da situação total” (CHIAVENATO, 2014, p. 463). 34 A referida teoria está relacionada ao fato de que o mundo globalizado coloca as organizações como parte de um sistema que está inter-relacionado a outros participantes do sistema. “Como um sistema, a organização está continuamente submetida a mudanças dinâmicas que requerem equilíbrio.” (CHIAVENATO, 2014, p. 469). No mundo em que várias instituições estão adotando os documentos digitais e digitalizados há, pois, a necessidade de se adaptar. Nesse sentido, Chiavenato dispõe que: A perspectiva sistêmica trouxe uma nova maneira de ver as coisas. Não somente em termos de abrangência, mas principalmente quanto ao enfoque. O enfoque do todo e das partes, do dentro e do fora, do total e da especialização, da integração interna e da adaptação externa, da eficiência e da eficácia. A visão gestáltica e global das coisas, privilegiando a totalidade e as suas partes componentes, sem desprezar o que chamamos de emergente sistêmico: as propriedades do todo que não aparecem em nenhuma de suas partes. A visão do bosque, e não de cada árvore apenas. A visão da cidade, e não de cada prédio. A visão da organização, e não apenas de cada uma de suas partes. Nessa nova abordagem organizacional, o importante é ver o todo, e não cada parte isoladamente, para enxergar o emergente sistêmico. É esse emergente sistêmico que faz a água ser totalmente diferente dos elementos que a constituem, o hidrogênio e o oxigênio (CHIAVENATO, 2014, p.482). Na mesma esfera da Teoria dos Sistemas tem-se a Teoria Contingencial, estudada por “Woodward (1958), Burns e Stalker (1960), Chandler (1962) e Lawrence e Lorsch (1967)”, conforme Fagundes apud Medeiros (2018, p.4). A Teoria Contingencial defende que “as características da organização são variáveis dependentes e contingentes em relação ao ambiente e à tecnologia. Isso explica a importância do estudo do ambiente e da tecnologia.” (CHIAVENATO, 2014, p.499). A atividade administrativa não implica seguir uma teoria e excluir outra, mas sim adotar as melhores práticas de cada teoria adaptadas ao mundo moderno para a execução dos trabalhos administrativos da melhor forma (CHIAVENATO, 2014). 3.4 Digitalização dos documentos e processos administrativos eletrônicos- previsão legal O princípio da eficiência foi tratado neste capítulo como um objetivo a ser alcançado pela administração pública no desempenho das atividades. Todavia, para o alcance da eficiência não se pode perder de vista o que determina as normas e leis. 35 Em que pese à burocracia apresentar como uma de suas causas o excesso de leis e normas, estas são essenciais para o desenvolvimento da democracia de um país, pois demonstram o caminho a ser seguido e regulam as ações de um povo de forma a viverem em harmonia. Nestes termos, a legalidade é considerada um princípio da administração pública e está presente na Constituição Federal em seu artigo 37. Assim afirmou Di Pietro (2018, p.152): “Vale dizer que a eficiência é princípio que se soma aos demais princípios impostos à Administração, não podendo sobrepor-se a nenhum deles, especialmente ao da legalidade, sob pena de sérios riscos à segurança jurídica e ao próprio Estado de Direito.” Nesse contexto, vários são os dispositivos normativos que autorizaram o uso dos processos eletrônicos no país. O dispositivo que legitimou essa prática em âmbito Federal foi o já mencionado Decreto nº 8.539, de 08 de outubro 2015. Em relação aos processos judiciais, tal normativa já existia desde o ano de 2006, através da Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006. O Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015), por exemplo, traz em seu art.193 que “os atos processuais podem ser total ou parcialmente digitais, de forma a permitir que sejam produzidos, comunicados, armazenados e validados por meio eletrônico, na forma da lei” (BRASIL, 2015). Os referidos dispositivos por sua vez têm suas bases na Medida Provisória nº 2.200- 2, de 24 de agosto de 2001, que instituiu no país a assinatura eletrônica de documentos. Tal dispositivo trouxe aos documentos eletrônicos (nato-digitais), assinados digitalmente, a mesma validade jurídica do documento assinado manualmente. No Estado de Minas Gerais o Decreto nº 47.222, de 26 de julho de 2017, autorizou “no âmbito do Poder Executivo, o uso de meio eletrônico para o registro e comunicação de atos e para a tramitação de processos administrativos”(MINAS GERAIS, 2017). 36 Recentemente, conforme já citado, no ano de 2021 foi promulgada a Lei nº 14.129 que teve por objetivo melhorar a eficiência da administração pública. A referida lei traz em seu artigo 5º que a “administração pública utilizará soluções digitais para a gestão de suas políticas finalísticas e administrativas e para o trâmite de processos administrativos eletrônicos” (BRASIL, 2021). Como visto, a utilização dos processos eletrônicos é permitida e incentivada por lei. E a adoção dos processos eletrônicos relaciona-se com o tema da digitalização, visto que, como já demonstrado, é por meio da digitalização de documentos que a informação disponível em um documento físico passa para o meio digital, facilitando e acelerando a transmissão da informação. 3.5 Aspectos que denotam preocupação com a digitalização dos documentos A mudança do suporte físico para o digital traz alguns questionamentos entre os arquivistas. Alvares (2021, p.30) cita aspectos que trazem preocupação em relação aos documentos digitais entre os quais: a garantia da preservação e acesso dos documentos a longo prazo, bem como a garantia da autenticidade e integridade de forma que possa definir que tal documento é verdadeiro e não sofreu alterações ao longo de sua produção e disseminação; os custos e investimentos ocasionados pela adoção de uma preservação digital e uma boa infraestrutura tecnológica; assim como o problema da obsolescência tecnológica, suas degradações físicas e suas fragilidades intrínsecas As preocupações relativas aos documentos digitais e digitalizados estão relacionadas a uma visão prática da atividade de gestão de documentos. Em que pese dispositivos normativos legitimarem a utilização dos processos eletrônicos na administração pública, verifica-se um descompasso entre a utilização das tecnologias e a regulamentação destas em relação à gestão de documentos. Como exemplo, cita-se a edição da Lei nº 12.682, de 09 de julho de 2012, a qual teve por objeto regular a elaboração e o arquivamento de documentos em meios eletromagnéticos. Tal lei foi promulgada apenas seis anos após a promulgação da Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006, quando o uso do meio eletrônico para a transmissão de peças processuais já estava em implementação no país. 37 Outro exemplo desse descompasso está justamente entre a utilização dos documentos digitalizados pela administração e a edição do Decreto nº 10.278, de 18 de março de 2020. Conforme já apresentado, desde o ano de 2015, com a promulgação da Lei nº 8.539, de 08 de outubro de 2015, já se havia admitido a utilização dos processos administrativos eletrônicos, mas somente em 2020, os documentos digitalizados passaram a ter a mesma validade jurídica do documento original, desde que sejam digitalizados segundo os critérios definidos pelo decreto. Os exemplos citados demonstram a necessidade de estudos abrangentes relativos aos aspectos da digitalização e do uso dos meios eletrônicos. Nesse contexto, no próximo capítulo se apresentará o Decreto nº 10.278/2020 para o entendimento de suas disposições. 38 4 O DECRETO FEDERAL Nº 10.278, DE 08 DE MARÇO DE 2020 O Decreto Federal nº 10.278, que entrou em vigor em 18 de março de 2020, teve por objeto regulamentar o inciso X do art. 3º da Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019 e o art. 2º-A da Lei nº 12.682, de 9 de julho de 2012. A Lei nº 13.874 de 2019 instituiu no país a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica e teve como finalidade estabelecer normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica. Em seu artigo 3º, a referida lei descreve, entre outros, “que são direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País” (BRASIL, 2019). X - arquivar qualquer documento por meio de microfilme ou por meio digital, conforme técnica e requisitos estabelecidos em regulamento, hipótese em que se equiparará a documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato de direito público (BRASIL, 2019). A Lei nº 13.874/2019 ainda acrescentou o artigo 2-A à Lei n° 12.682/ 2012. A Lei nº 12.682/2012, como citada no capítulo anterior, “dispõe sobre a elaboração e o arquivamento de documentos em meios eletromagnéticos” (BRASIL, 2012) e o novo artigo acrescentado descreve que: Art. 2º-A. Fica autorizado o armazenamento, em meio eletrônico, óptico ou equivalente, de documentos públicos ou privados, compostos por dados ou por imagens, observado o disposto nesta Lei, nas legislações específicas e no regulamento. § 1º Após a digitalização, constatada a integridade do documento digital nos termos estabelecidos no regulamento, o original poderá ser destruído, ressalvados os documentos de valor histórico, cuja preservação observará o disposto na legislação específica. § 2º O documento digital e a sua reprodução, em qualquer meio, realizada de acordo com o disposto nesta Lei e na legislação específica, terão o mesmo valor probatório do documento original, para todos os fins de direito, inclusive para atender ao poder fiscalizatório do Estado. § 3º Decorridos os respectivos prazos de decadência ou de prescrição, os documentos armazenados em meio eletrônico, óptico ou equivalente poderão ser eliminados. § 4º Os documentos digitalizados conforme o disposto neste artigo terão o mesmo efeito jurídico conferido aos documentos microfilmados, nos termos da Lei nº 5.433, de 8 de maio de 1968, e de regulamentação posterior. § 5º Ato do Secretário de Governo Digital da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art3x http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art3x http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12682.htm#art2a. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5433.htm 39 estabelecerá os documentos cuja reprodução conterá código de autenticação verificável. § 6º Ato do Conselho Monetário Nacional disporá sobre o cumprimento do disposto no § 1º deste artigo, relativamente aos documentos referentes a operações e transações realizadas no sistema financeiro nacional. § 7º É lícita a reprodução de documento digital, em papel ou em qualquer outro meio físico, que contiver mecanismo de verificação de integridade e autenticidade, na maneira e com a técnica definidas pelo mercado, e cabe ao particular o ônus de demonstrar integralmente a presença de tais requisitos. § 8º Para a garantia de preservação da integridade, da autenticidade e da confidencialidade de documentos públicos será usada certificação digital no padrão da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) (BRASIL, 2019). Os novos dispositivos normativos trouxeram em seu texto a informação de que o documento digital terá o mesmo efeito jurídico do documento físico original pelo que o Decreto n° 10.278/2020 teve por propósito estabelecer as técnicas e os requisitos para a digitalização de documentos públicos ou privados, a fim de que os representantes digitais produzam os mesmos efeitos legais dos documentos originais. Conforme Demeneghi (2020, p.9), a motivação para as alterações legislativas citadas É a de ‘acelerar’ o movimento que já experienciamos de modernização nas nossas transações e de diminuição dos nossos registros em meio físico para o meio virtual, dispensando-se, assim, as mais diversas entidades, públicas ou privadas, pessoas físicas ou jurídicas, da necessidade de manterem grandes acervos de documentos em papel - o que até então seria inviável, sobretudo em razão da eficácia jurídica e do valor probatório advindo desses registros. Segundo o mesmo autor as alterações normativas tem como consequência a redução de custos decorrentes da “manutenção de documentos em papel, seja para sua guarda, sua preservação, sua localização, seu trânsito ou sua remessa, mas também o ganho no acesso, na difusão e na celeridade dos procedimentos que envolvam tais documentos” (DEMENEGHI, 2020, p.9). As informações de Demeneghi (2020) se alinham com as disposições do capítulo anterior o qual descreveu os benefícios da digitalização, bem como das tecnologias associadas às alterações legislativas. 40 4.1 Definição e Aplicação O Decreto n° 10.278/2020 apresenta que o documento digitalizado é o representante digital7 oriundo do processo de digitalização do documento físico. Esta definição é importante, pois diferencia o documento digitalizado do documento nato digital. Tal conceituação se mostra em consonância com as definições apresentadas no capítulo anterior acerca do documento digitalizado. Conforme o artigo 2º do decreto, o mesmo se aplica aos documentos físicos digitalizados por pessoas jurídicas de direito público, por pessoas jurídicas de direito privado ou por pessoas naturais nas suas relações com outras pessoas jurídicas ou naturais. Entretanto, o decreto não se aplica aos documentos de porte obrigatório, de identificação, audiovisuais, em microfilme, os referentes às operações e transações realizadas no sistema financeiro nacional e os nato digitais produzidos originalmente em meio digital. Demeneghi (2020, p.90) afirma que a exclusão de certos documentos do decreto como, por exemplo, os documentos relativos a operações e transações financeiras ocorreu “justamente pela existência de lei e regulamento próprios a esse respeito”. Os referidos documentos possuem forma própria e requisitos técnicos que orientam a sua produção e garantem a validade destes. 4.2 Regras de digitalização Conforme estabelece o decreto, os procedimentos e os métodos tecnológicos utilizados na digitalização dos documentos físicos devem assegurar que o representante digital mantenha as características do documento original. A primeira propriedade que o representante digital deve conter é a integridade que, conforme o CONARQ (2020, p.35) se refere ao “Estado dos documentos que se encontram completos e que não sofreram nenhum tipo de corrupção ou alteração não autorizada nem documentada”. A integridade é componente da autenticidade, 7 Representação em formato digital de um documento originalmente não digital. É uma forma de diferenciá-lo do documento de arquivo nato digital - Glossário (CONARQ, 2020, p.43). 41 que por sua vez se refere à qualidade do documento ser exatamente aquele que foi produzido, não tendo sofrido alteração, corrompimento e adulteração (CONARQ, 2012). A integridade, conforme a Resolução n° 37, de 19 de dezembro de 2012, do CONARQ, é a capacidade do documento “transmitir exatamente a mensagem que levou à sua produção (sem sofrer alterações de forma e conteúdo) de maneira
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