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Geografia - Livro 2-136-138

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GEOGRAFIA Capítulo 4 Geografia Agrária136
Sistemas agrícolas
As atividades agrárias são aquelas que compreendem o cultivo e a criação de variadas espécies vegetais e animais –
agricultura e pecuária, ou agropecuária – para a produção de alimentos e matérias-primas.
Pesquisadores defendem que as técnicas de plantação, agricultura e domesticação de animais foram dominadas pelos
seres humanos entre 12 mil e 8 mil anos atrás. Esse fato transformou o modo como os povos se distribuíam e produziam,
refletindo diretamente na organização do espaço geográfico. Ao abandonar a necessidade de sair em busca de alimentos,
a humanidade pôde fixar-se em uma mesma área, ou seja, deixou de viver de modo nômade e adotou o sedentarismo.
Assim, foi possível afixar no espaço objetos mais permanentes, como abrigos, e definir áreas mais apropriadas para o
cultivo de alimentos. Além disso, criou-se um processo de diferenciação do uso do solo, atribuindo finalidades específicas
para cada parcela dele, e passou-se a valorar, ainda que simbolicamente, cada uma delas de acordo com os recursos
disponíveis, como a sua proximidade aos cursos hídricos.
A evolução e as transformações das relações entre as sociedades e o meio ocorreram de forma bem variada ao redor
do planeta O primeiro ponto a ser considerado é que, por muito tempo, as trocas (materiais e de conhecimento) realizadas
pelos diferentes povos era bastante restrita geograficamente, ocorriam de forma lenta, por meio do contato entre indíviduos
que contavam com poucos recursos de locomoção. Outro ponto importante é que, em razão das condições naturais de
cada região e das suas respectivas fauna e flora, cada grupo humano desenvolveu estratégias específicas de adaptação
ao ambiente, incluindo aí a agricultura e suas técnicas associadas.
Ainda há, até os dias atuais, diferenças na forma como cada sociedade faz uso da terra, apesar das enormes trans-
formações pelas quais o espaço rural já passou, como a integração crescente ao espaço urbano e a submissão à lógica
industrial e capitalista de produção.
Compreender a produção agrária de forma sistêmica implica considerar as condições naturais, os gêneros produzidos,
as técnicas aplicadas, a quantidade e a finalidade da produção, o tamanho da propriedade, as relações e a legislação de
trabalho estabelecidas em diversos contextos, bem como as suas variações internas.
As atividades agrícolas podem ser classificadas em diferentes sistemas agrcolas, ou agrossistemas, dependendo das
relações de produção e das forças produtivas que os caracterizem. Em geral, os agrossistemas podem ser tradicionais,
modernos ou alternativos. A tabela a seguir apresenta características de cada um deles, lembrando que, na realidade, os
empreendimentos agrícolas podem possuir características mistas.
Fatores Tradicionais Modernos Alternativos
Principais
caractersticas
Baseadas no conhecimento
tradicional e na observação do
trabalho direto com a terra. São
passadas livremente de geração
para geração e guardam relações
com outras questões tradicionais,
como as crenças, as festas e os
regimes alimentares.
Baseadas no conhecimento
científico que une indústria e
agricultura, surgiram com a
Revolução Verde. Priorizam o
incremento da produtividade e
apresentam elevado consumo
energético.
Baseadas no conhecimento
científico que une ecologia e
agricultura. Podem incorporar
elementos do conhecimento
tradicional e priorizam a
sustentabilidade socioambiental.
Acesso à terra
Posse ou pequenas propriedades e
latifúndios (plantation).
Médias e grandes propriedades.
Pequenas propriedades ou
sistemas coletivistas.
Acesso às técnicas Por meio da tradição
Por meio da compra de tecnologia
produzida pelas grandes
empresas. É comum utilizar
financiamento estatal para garantir
tal acesso.
Por meio das novas redes de
disseminação de tecnologias
alternativas, como internet,
universidades, cooperativas,
associações de produtores e
ONGs
Relações de trabalho
Familiar ou assalariamento de baixo
custo.
Assalariado, geralmente com
algum nível de qualificação.
Familiar, assalariado qualificado ou
cooperativo.
Produção
Subsistência, mercado local ou
exportação (no caso do plantation).
Principalmente agroindústria.
Comércio, redes de trocas e
mercados específicos.
Tab. 1 Comparação das forças produtivas na agricultura.
O campo não é mais o espaço no qual são desenvolvidas apenas atividades agrárias e, muito menos, um local isolado
e atrasado. Diversas das atividades modernas e industriais são executadas na zona rural, o turismo nessa área cresceu
bastante e há várias pessoas que vivem em cidades e deslocam-se cotidianamente para trabalhar no campo, que cada
vez mais está conectado com o resto do mundo por meio das novas tecnologias de informação e pelos sistemas de
transportes – terrestre, hidroviário e aéreo.
Entretanto, o meio rural é ainda caracterizado por um espaço menos complexo, com menor diversidade e densidade
técnica que o espaço urbano. Porém, a definição do que é meio rural ou urbano é, na maior parte dos países, uma atribui-
ção do Estado, que, por intermédio de legislação própria, traça os limites entre um e outro de acordo com suas políticas
de desenvolvimento setorial.
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A produção agrícola antes da Revolução
Industrial
Ao longo da maior parte da história, a vida no campo
foi o elemento mais importante para a humanidade. Era
nele que a maioria da população vivia e onde se davam as
atividades sociais, econômicas, políticas e culturais.
A agricultura e a pecuária foram desenvolvidas duran-
te o Neolítico, período da Pré-História que se estendeu
entre os anos 10000 a.C. e 6000 a.C., e revolucionaram
a forma de o ser humano se relacionar com a natureza.
Boa parte dos avanços na agropecuária se deram pelo
aprendizado da seleção e do cruzamento de espécies,
pela identificação das épocas do ano mais favoráveis à
semeadura e pela diferenciação dos tipos de solo. Além
disso, tivemos avanços artificiais para viabilizar ou aumen-
tar a produção, como a irrigação, a fertilização do solo,
o arado e a domesticação de animais para o trabalho, a
oferta de leite, entre outros.
Fig. 1 Diferentes tipos de arado movidos a tração animal.
As primeiras grandes civilizações de que temos co-
nhecimento na Mesopotâmia, no Egito, na Índia e na China
surgiram em áreas próximas às planícies de inundação
de grandes rios (Tigre e Eufrates; Nilo; Ganges; Amarelo),
áreas que eram fertilizadas naturalmente pelas cheias pe-
riódicas, que depositavam sedimentos e restos orgânicos
no solo às margens do curso de água. As civilizações
da Mesopotâmia e do Egito, região do Crescente Fér-
til, ficaram conhecidas como teocracias de regadio, por
apresentarem poder político baseado na religião e terem
sistema econômico estruturado na agricultura em grandes
áreas irrigadas.
Crescente Fértil: localização
Fonte: elaborado com base em Crescente Fértil Britannica escola, [s.d.]. Disponível em:
https://escola.britannica.com.br/levels/fundamental/article/Crescente-F%C3%A9rtil/481272.
Acesso em: 19 out. 2020.
No mapa: As grandes civilizações da Antiguidade desenvolveram-se
nas planícies de inundações dos grandes rios, que fertilizavam o solo e
possibilitavam a agricultura.
Mar Mediterrâneo
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Rio Jordão
Mar Morto
Golfo
Pérsico
Mar
Cáspio
45° L
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Rio Eufrate
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RioTig
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30° N
Alto Egito
Palestina
Fenícia
Anatólia
Assíria
Elam
Mesopotâmia
Península
do Sinai
Baixo Egito
DESERTO
DA NÚBIA
DESERTO
DA SÍRIA
0 295 km
N
Crescente fértil
Contribuição indígena à culinária brasileira
São muitas as contribuições dos variados povos indígenas para a culinária
brasileira, e, sem dúvidas, a mandioca (também chamada de macaxeira
ou aipim) foi uma das mais importantes. Segundo o antropólogo Câmara
Cascudo, ela foi o primeiro produto cultivado no Brasil que os portugue-
ses conheceram ao fazer contato com os indígenas e, depois, levaram-na
para suas colônias na África e na Ásia, onde é consumida até nos dias
atuais(a Tailândia é o maior produtor mundial do alimento).
A mandioca é base para uma série de iguarias da alimentação indígena
São cerca de 80 espécies, divididas em dois grupos: a mandioca-amar-
ga, ou brava, venenosa, que contém ácido cianídrico e pode ser fatal; e
a mandioca mansa, ou doce, sem o veneno. Com técnicas criadas pelos
índios, a raiz dá origem a diversos produtos que fazem parte da cultura
alimentar do brasileiro, como a farinha, o beiju, o pirão, o tucupi etc
Até hoje bastante apreciado no Norte do Brasil e avaliado por muitos
chefes de cozinha como uma verdadeira iguaria da culinária auten-
ticamente brasileira, o tucupi é obtido do sumo da mandioca brava,
naturalmente venenosa, que os indígenas aprenderam a aproveitar
por meio do cozimento e da fermentação.
Saiba mais
Em diversas partes do mundo, incluindo o Brasil, ainda é
praticada a agricultura itinerante, aqui denominada coivara
quando executada por populações tradicionais e originárias.
Essa prática consiste na derrubada de trechos da mata e
em queimadas controladas para limpar o terreno e fertilizar
o solo com as cinzas. Esse solo é aproveitado por poucos
anos, geralmente três, para cultivo de gêneros alimentícios
variados, e, então, abandonado por longos períodos, tempo
necessário para a vegetação natural se regenerar. A coivara
não é uma queimada comum e caracteriza a agricultura de
subsistência, hoje mais conhecida como roça ou roçado.
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GEOGRAFIA Capítulo 4 Geografia Agrária138
Agricultura de subsistência
A agricultura de subsistncia não é propriamente aquela em que as
pessoas responsáveis pelo cultivo da terra comem apenas aquilo
que plantam. Na atualidade, ela também pode envolver o comércio
de excedentes. Porém, seu objetivo principal não é o lucro nem a
comercialização, e sim a manutenção da vida das famílias envolvidas.
As relações de trabalho predominantes são baseadas na organização
familiar, com poucos trabalhadores assalariados. Na maioria das ve-
zes, os trabalhadores não são proprietários da terra, e sim posseiros,
ou seja, tm a posse da terra, mas não a sua propriedade.
Atenção
Na Ásia, sobretudo nas regiões úmidas do Sudeste,
com as intensas chuvas das monções, a população local
aprendeu a represar as águas em terraços construídos nas
encostas dos morros e das colinas para o cultivo de arroz (ri-
zicultura), em uma técnica conhecida como terraceamento,
que é utilizada até os dias atuais e caracteriza a agricultura
de jardinagem.
Agricultura de jardinagem
Sua característica fundamental é a utilização de técnicas tradicionais,
aliadas a grandes quantidades de mão de obra. Nesse modelo há
um bom aproveitamento e uma ótima conservação do solo. Como
a mão de obra é numerosa, é possível atingir um bom rendimento
Em países muito populosos, como China ou Indonésia, há um estímulo
a esse tipo de agricultura, principalmente a produção de arroz nos
terraços alagados. Como a produção é, na maioria das vezes, voltada
ao mercado interno, a preocupação em se empregar pessoas é maior
que a de diminuir os custos da produção.
As relações de trabalho e a propriedade da terra podem variar de acordo
com cada região. Na China, por exemplo, havia as comunas populares
até a década de 1970, e, de lá para cá, o governo distribuiu a terra para
as famílias de camponeses em um estatuto de posse, mas não de pro-
priedade. Entretanto, é comum também que a agricultura de jardinagem
seja feita em latifúndios por mão de obra camponesa, principalmente por
meio do sistema de parcerias, como acontece na Tailândia e na Malásia.
Atenção
Como realizar um terraceamento
Evitar a erosão
Reter a água
Terra fértil
Fonte: Animação mostra, passo a passo, como realizar um terraceamento com curva de nível.
Embrapa, 14 abr. 2016. Disponível em: www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/11733925/
animacao mostra-passo-a passo como realizar-um terraceamento com curva-de nivel.
Acesso em: 20 out. 2020.
Fig. 2 O terraceamento consiste em criar barreiras de terra para reter a água da
chuva e os nutrientes.
Fig. 3 Rizicultura em terraços na Tailândia, foto de 2020.
Grande parte das práticas agrícolas pré-modernas
era realizada de forma coletiva, tanto pela posse da terra
como pela divisão do trabalho. Logo, não havia propriedade
privada da terra; o trabalho no campo era executado de
forma comunitária, caracterizando um sistema coletivista
de produção agrícola.
Todas essas práticas agrícolas tinham em comum
a forte dependência das condições naturais, tais como
clima, relevo e solo, para serem realizadas. Condições
extremas, como secas, geadas e até chuvas intensas,
eram grandes ameaças à produção. As técnicas e os
instrumentos eram rudimentares, existia o uso intensivo
da mão de obra, e a produtividade, de modo geral, era
baixa e visava à subsistência.
Com os avanços do conhecimento e das técnicas de
produção agropecuária e também com a maior comple-
xificação das sociedades (como o estabelecimento de
pequenos núcleos urbanos, a constituição de diferentes
classes sociais e a ampliação da área geográfica de trocas
entre povos), a produção de alimentos passou a ser maior
e a ter a finalidade de realizar trocas comerciais com as
regiões vizinhas.
No entanto, nem sempre a produção era suficiente
para atender, de forma satisfatória, a toda a população,
que estava cada vez maior e com mais expectativa de vida,
sobretudo quando a safra era ruim. Era uma época em que
grande parte da população – ao menos a da Europa, do
norte da África e do Oriente próximo , vivia ameaçada
pela fome. Porém, os momentos de prosperidade e oferta
de alimentos, progressivamente, tornaram se mais fre
quentes que os de escassez. Isso libertou muitas pessoas
do trabalho na terra e possibilitou à sociedade se tornar
mais complexa com o surgimento de outras profissões,
como os ferreiros, tecelões, ceramistas, padeiros, sacerdo-
tes etc., que puderam se dedicar às suas especialidades
em tempo integral.
Durante esse período, a forma predominante de produ-
ção foi a agricultura extensiva, caracterizada por técnicas
rudimentares, baixa exploração da terra e pequena pro-
dutividade, ainda largamente praticada nos países não
desenvolvidos.
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