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EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E O SEU GRANDE DESAFIO: O EDUCANDO COMO SUJEITO DE SUA PRÓPRIA APRENDIZAGEM Jocelma Almeida Rios – UFBA/Redpect – jocelma@ufba.br Renê Gomes Pimentel – FTE – renegp@terra.com.br RESUMO O ensino na modalidade a distância, sobretudo através de um ambiente virtual de aprendizagem, tem sido considerado como uma alternativa à expansão do ensino superior no Brasil. Entretanto, são muitos os obstáculos apresentados. Dentre eles, a formação de professores, a adequação do currículo, a infra- estrutura tecnológica, a exclusão digital e a evasão. Este artigo aborda os fatores que influenciam a desistência dos estudantes, que vão desde dificuldades financeiras, perpassando por deficiência no processo de ensinagem até a ausência de autonomia no ato de aprender. Na aprendizagem autônoma, o estudante deve ser responsável pela sua própria aprendizagem, o que não descarta o papel do professor neste processo, enquanto facilitador. Este artigo discute sobre o papel do professor-educador, que é fundamental para o crescimento do outro, elenca os componentes para aprendizagem autônoma - o saber, o saber fazer e o querer, e propõe estratégias para uma melhor eficácia da modalidade. Acreditamos que há caminhos para a redução da evasão nos cursos oferecidos a distância, além de possibilitar maior garantia da sua qualidade, propondo a formação de um profissional autônomo, crítico e criativo. Palavras-chave: Educação a Distância, autonomia, aprendizagem. RESUMO La educación en la modalidad en la distancia, sobre todo a través de un ambiente virtual de aprendizaje, se ha considerado como alternativa a la extensión de la educación superior en el Brasil. Sin embargo, los actuales obstáculos son muchos. Entre ellos, la formación de profesores, la suficiencia del curriculum vitae, la infraestructura tecnológica, la exclusión digital y la evasión. Este artículo acerca a los factores que influencian la renuncia de los estudiantes, que van desde dificultades financieras, perpassando para la deficiencia en el proceso del enseñanza hasta la ausencia de la autonomía en el acto para aprender. En aprender independiente, el estudiante debe ser responsable de su aprender apropiado, qué ella no desecha el papel del profesor en este proceso, mientras que facilitador. Este artículo discute en el papel del profesor-educador, que es básico para el crecimiento y aprendizaje del otro, presenta los componentes para la aprendizaje autónoma – el saber, el saber hacer y el querer, y considera las estrategias para una eficacia mejor de la modalidad. Creemos que hay maneras para la reducción de la evasión en los cursos ofrecidos a distancia, además de hacer mayor garantía posible de su calidad, en vista de la formación de un profesional autónomo, crítico y creativo. Palabras-clave: Educación a Distancia, autonomía, aprendizaje. Introdução A Educação a Distância (EaD) tem sido apontada como uma das várias soluções para as carências educacionais no contexto brasileiro atual. Ensejando tal perspectiva, projetos de EaD são inseridos em políticas educacionais (FROES BURNHAM, 2002, p.119), que devem atentar para o contexto cultural em que estejam inseridas e para as condições reais que se desenvolvem, com o objetivo de proporcionar ao educando a autonomia do ato de aprender. Estudos realizados recentemente têm demonstrado a necessidade de uma prática pedagógica que não privilegie apenas a aquisição de conteúdos curriculares, como tem acontecido na maioria das instituições de ensino e, de forma mais intensa, na modalidade a distância. Galeffi (2001, p.23) afirma que é preciso “potencializar a educação humana do sujeito social autônomo e inventivo”. Embora a EaD tenha sido concebida com o propósito de promover a inclusão social, tem recebido muitas críticas no que diz respeito ao efetivo aprendizado do estudante. Percebe-se, neste contexto, a necessidade de mudança de mentalidade do modelo de educação predominante em alguns países de ensino tradicional, que na ótica de Paulo Freire (1985, p.38), é uma pedagogia da transmissão, na qual “o professor ainda é um ser superior que ensina a ignorantes. O educando recebe passivamente os conhecimentos, tornando-se um depósito do educador”. Pierre Lévy (1993) corrobora com Freire, quando afirma que a escola pouco mudou nos últimos cinco mil anos, ou seja, ainda se baseia quase unicamente no ditar do mestre. Entretanto, não é a modalidade do ensino que determina a efetividade do aprendizado. A educação, seja ela presencial ou a distância, deve propiciar ao estudante, entre outras coisas, alguns aspectos fundamentais para sua formação como cidadão, tais como: consciência crítica, criativa e participativa; formação sólida que permita apreender conteúdos, que fundamente a análise e interpretação da realidade; e, vinculação da teoria e com a prática, contextualizada nos aspectos sócio, econômico, político e cultural. Dessa forma, a relação entre o professor, enquanto educador, e o estudante, enquanto educando, deveria ser de trocas e interações, tendo como objetivo o crescimento conjunto, não desconsiderando o aprendizado individual. Como diz Galeffi (2001), é preciso trazer para a aprendizagem autônoma uma tensão educativa que se funda na ação aprendente, e com essa ação, ser desenvolvida uma atitude aprendente radical. O educador nesta relação desempenha um papel fundamental. A questão-chave não reside em saber se a aprendizagem deve ou não conceder prioridade aos conteúdos, mas sim em assegurar que seja significativa. Diante desta problemática, aborda-se, então, o desafio da Educação a Distância no entendimento do educando como sujeito de sua própria aprendizagem. Desafio esse emergente de ensinar e aprender novos paradigmas do ensino, centrado no educador para desenvolver-se em um ambiente de colaboração e crescimento. Educação a Distância A Educação a Distância é a modalidade educacional na qual a mediação didático-pedagógica nos processos de ensino-aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos. O termo “Educação a Distância” nos condiciona à idéia imediata de ausência do professor e do estudante em um ambiente convencional denominado sala de aula. Fragale Filho (2003, p.27) salienta que muitos educadores têm esta modalidade como “sinônimo de ensino de baixa qualidade ou de oportunismo mercantilista”. Contudo, como dito anteriormente, não é a distância que faz com que a EaD não promova um aprendizado efetivo. É ausência de estratégia pedagógica consistente que pode trazer o insucesso tanto para a EaD quanto para o ensino presencial. Fragale Filho (2003, p.51) acrescenta que a qualidade da EaD não recai apenas sobre o educador, enquanto indivíduo, mas também para a instituição que promove o curso, pois a mesma é responsável pela infra-estrutura necessária à operacionalização de um curso. Para esta infra-estrutura, além daquilo que é necessário a um curso presencial, é prevista a necessidade de apoio técnico adicional para suporte ao uso dos equipamentos e sistemas necessários ao desenvolvimento das estratégias pedagógicas. Moore (1990) afirma que educação a distância é uma relação de diálogo, estrutura e autonomia que requer meios técnicos para mediatizar esta comunicação. O autor ainda complementa dizendo que a educação a distância é um subconjunto de todos os programas educacionais caracterizados por: grande estrutura, baixo diálogo e grande distância transacional. A afirmação de Moore remete à idéia de uma proposta puramentemercantilista. Para que um curso na modalidade a distância cumpra o objetivo de desenvolver um aprendizado efetivo, é necessário ir um pouco mais além. Apesar das críticas, a EaD tem avançado muito nos últimos anos, especialmente em razão do advento da Internet. A tecnologia, sem dúvidas, contribuiu sobremaneira para o desenvolvimento da EaD, pois grande parte das barreiras até então apontadas que dificultavam os processos de aprendizagem foram vencidas. As pesquisas sobre metodologias para o ensino a distância perpassa na maior autonomia do educando, condição sine qua non para superar os modelos instrucionais e behavioristas. Essas idéias são reforçadas por Marsden (1996) ao afirmar que as práticas dominantes no ensino a distância baseiam-se em uma “antologia empirista” e uma “epistemologia positivista”. E ainda, que esta compreensão de causalidade e explicação permeia a Educação a Distância pela mediação da teoria behaviorista e da instrução programada. Na Educação a Distância, educadores e educandos não estão juntos fisicamente, porém estão conectados. Saem do contato físico para o contato virtual, vencendo barreiras de espaço e tempo, e também de paradigmas. Talvez o paradigma mais difícil de transpor seja a mudança do controle do aprendizado, que antes era realizado pelo educador e, agora é pelo educando. Por isso, uma das estratégias fundamentais, e um grande desafio, desta modalidade de ensino é o alcance da autonomia do ato de aprender do sujeito, o qual precisa desenvolver ter a consciência da necessidade de desenvolver sua auto-aprendizagem. A demanda para o aperfeiçoamento profissional é um fato hoje (Gonzalez, 2005, p.29), e a Educação a Distância apresenta-se neste cenário como uma alternativa capaz de contribuir para este fim, para além dos limites de uma sala de aula convencional. Neste contexto, busca-se, então, a construção dinâmica do conhecimento, na qual a interação ocorra entre educador e educando, entre colegas, e entre educadores, estabelecendo uma rede colaborativa de troca de saberes. Cenário brasileiro A legislação brasileira regulamenta a educação a distância através do Decreto Lei n o 5.622 de 19 de dezembro de 2005, que revoga o Decreto Lei n o 2.494, de 10 de fevereiro de 1998, o qual inicialmente regulamentou o ensino nesta modalidade. Este Decreto veio regulamentar o ensino a distância, já que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), n o 9.396, promulgada em 20 de dezembro de 1996, referenciava a educação a distância apenas como uma complementação ao ensino presencial (MEC, s.d.). Na visão de Fragale Filho (2003), a EaD ainda é um processo em construção e, por isso, permeiam dúvidas e impasses, em razão da existências de inúmeras questões, relacionadas à implantação destes cursos, ainda sem respostas. Esta confusão tem raiz no texto da LDB, que generaliza as modalidades de ensino, sem tratar sobre suas especificidades. Somente com o Decreto Lei n o 2.494/98 é que foram dadas algumas diretrizes para a estruturação de cursos nesta modalidade, como já mencionado anteriormente. Entretanto, mesmo antes da promulgação da LDB em 1996, houve iniciativas em EaD no Brasil. Gonzalez (2005, p.35-37) cita algumas destas iniciativas, das quais cabe destacar que já em 1904, escolas privadas internacionais começaram a oferecer cursos pagos por correspondência; que o Instituto Universal Brasileiro começou a operar em 1939, e ainda hoje vem oferecendo cursos técnicos de aperfeiçoamento profissional, e também o ensino supletivo; e ainda que a Fundação Roberto Marinho iniciou em 1970, os telecursos de 1 o e 2 o graus. Entretanto, foi somente na década de 1990, que as universidades começaram a investir em programas de educação superior e educação continuada, iniciando pela UNB (Universidade de Brasília), seguida pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). O governo brasileiro, através da SEED (Secretaria de Educação a Distância), promove diversos programas de incentivo ao ensino a distância, tais como Proinfo, Mídias da Educação, Rived, TV Escola e Portal Domínio Público. Atualmente, inúmeros cursos estão sendo oferecidos exclusivamente a distância, nas mais variadas áreas. Além das iniciativas da SEED, outros órgãos do próprio MEC (Ministério da Educação) e também de outras esferas do governo federal brasileiro desenvolvem programas e projetos em prol da EaD. Como exemplo, tem-se o programa Escola de Gestores promovido pela SEEB (Secretaria de Educação Básica), que tem como objetivo formar gestores escolares das escolas públicas da Educação Básica em cursos de especialização e de atualização em Gestão Escolar, na perspectiva da gestão democrática e da efetivação do direito à educação escolar com qualidade social. Este programa, junto com todos os outros em andamento, vem fortalecer as políticas públicas de incentivo ao ensino na modalidade a distância. Obstáculos do ensino a distância O ensino a distância é uma estratégia desenvolvida para oferecer educação para aqueles que têm dificuldade de acesso a cursos oferecidos na modalidade presencial. Fragalhe Filho (2003, p.32) acrescenta que: “a EaD é um possível instrumento para concretizar políticas de eqüidade que aumentem as oportunidades educativas de grupos tradicionalmente marginalizados e permitam a construção de uma sociedade em que todos os cidadãos compartilhem um patamar comum de conhecimentos e códigos culturais, atenuando a injusta exclusão social”. O acesso se democratiza ainda mais quando os cursos oferecidos estão estruturados em ambientes virtuais de aprendizagem, através da Internet. Contudo, apesar de todas as intenções de democratização do acesso à educação, a EaD enfrenta diversos obstáculos para atender àqueles que têm dificuldade de acesso ao ensino tradicional. Isso, portanto, gera um problema de grande preocupação para as instituições de ensino que oferecem esta modalidade: a evasão. Para Lobo (2000), citado por Fróes Burnham (2002, p.129), a função social da EaD “não se restringe a promover a ampliação do número dos que têm acesso à educação” (p.11), nem “pode ser concebida apenas como sucedâneo da educação especial” (p.10). Fragale Filho (2003, p.53) afirma que entre os obstáculos para preponderantes da EaD é o velho preconceito de que não é possível garantir o aprendizado do educando estando este distante do educador. O autor ainda acrescenta que esta barreira ainda é maior por parte dos profissinais da educação. Mas, é possível identificar diversos outros problemas mais concretos que prejudicam o desenvolvimento de um curso na modalidade a distância. Entre eles, podem ser citados: a) Falta de planejamento adequado às características do ensino nesta modalidade; b) Mau dimensionamento dos custos envolvidos; c) Preparação inadequada dos profissionais que mediam o aprendizado, seja por falta de conhecimento técnico do ambiente virtual de aprendizagem, ou por falta de fundamentação teórica; d) Falta de critérios e estrutura de avaliação destes cursos, por parte das entidades governamentais. Além dos problemas supracitados, há ainda aqueles sob o ponto de vista pedagógico, os quais são abordados com maior ênfase por este artigo. Grande parte dos estudantes que abandonam cursos a distância reclamam da falta de contato com o professor. Mas, quando questionados se os encontros presenciais solucionariam o problema, são categóricos em negar tal hipótese. É a falta de atenção aos seus questionamentos, às suas contribuições e a falta de estímulo ao seu auto- desenvolvimento como aprendiz que mais impulsiona a evasão. Com isso, pode-se concluir que este tipode estudante busca mais que um tutor; busca sim um orientador, alguém que o conduza ao aprendizado autônomo e libertador. Isso não é uma prerogativa da EaD apenas, logo, é possível vencer tais obstáculos com o uso de uma estratégia pedagógica inovadora que promova a auto-aprendizagem no educando. Aprendizagem autônoma No ensino a distância, o educador precisa perceber as potencialidades desta modalidade, sem tentar repetir as estratégias utilizadas no ensino presencial. Embora seja um pressuposto teórico que a aprendizagem é pessoal e intransferível, as instituições, na sua grande maioria, ignoram esses pressupostos e tiram as oportunidades dos estudantes de construírem os seus próprios conhecimentos, uma vez que a prática pedagógica comum caracteriza-se por conduzi-los a uma aprendizagem mecânica, normalmente pautada em modelos passivos, receptivos, autoritários e competitivos. Pacheco (1996) afirma que os currículos precisam atentar-se para a valorização da individualidade do sujeito e da sua cognição, das atitudes e valores, ao respeito pelas diferenças individuais e a procura de um desenvolvimento global e contínuo. Levy (1999, p.169) afirma que “é preciso superar-se a postura ainda existente do professor transmissor de conhecimentos. Passando, sim, a ser aquele que imprime a direção que leva à apropriação do conhecimento que se dá na interação. Interação entre aluno/professor e aluno/aluno, valorizando-se o trabalho de parceria cognitiva; [...] elaborando-se situações pedagógicas onde as diversas linguagens estejam presentes. As linguagens são, na verdade, o instrumento fundamental de mediação, as ferramentas reguladoras da própria atividade e do pensamento dos sujeitos envolvidos. [...] [é preciso] buscar o desenvolvimento de um espírito pesquisador e criativo entre os docentes, para que não sejam reprodutores, incapazes de refletir e modificar sua prática profissional. [...] este processo criativo é sempre coletivo, na medida que a memória e a experiência humana são patrimônio social.” Muitas das dificuldades de aprendizagem encontradas pelos educandos podem estar no processo de comunicação e no processo motivacional, na medida em que se parte do pressuposto de que estes nada sabem e a estes deve-se impor conteúdos, obrigando-os a dominá-los. Mesmo tendo sua importância, os conteúdos sem alguma significação nada tem a acrescentar, e por isso se tornam inúteis. Por esta razão, não é tarefa fácil identificar e selecionar conteúdos curriculares que provoquem o devido interesse dos educandos nesta modalidade de ensino. Além de definir conteúdos instigantes, o educador tem que ter a capacidade de provocar atitudes positivas sobre os conteúdos tratados e sobre o próprio aprendizado do educando, através de uma comunicação motivadora. Acima que qualquer coisa, o educador ético precisa respeitar a autonomia do educando, dando-lhe liberdade de inferir sobre os conteúdos a ele apresentados. Freire (1996, p.35), afirma que “o respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros [...] o professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, mais precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor que ironiza o aluno, que minimiza, que manda que „ele se ponha em seu lugar‟ ao mais tênue sinal de sua rebeldia legítima, tanto quanto o professor que se exige do cumprimento de seu dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à experiência formadora do educando, transgride os princípios fundamentalmente éticos de nossa existência”. Freire ainda complementa dizendo que autoritarismo na educação, “afoga a liberdade do educando, amesquinhando o seu direito de estar sendo curioso e inquieto” (Freire, 1996, p.35). Ao identificar a carência do educador em proporcionar uma atitude aprendente aos educandos, este artigo propõe uma reflexão de sua práxis pedagógica, visando uma mudança de atitudes e ações. Então, em oposição à prática conservadora e tecnicista, surge a aprendizagem autônoma. Tendo-se a autonomia como a faculdade que o indivíduo tem de se governar por si mesmo; no processo de aprendizado, está implícito que o educando é o responsável pela sua própria aprendizagem. Mas e o educador, qual seria o papel dele neste processo? Ele deve atuar como gestor da atividade de ensino, sendo um orientador do sujeito no desenvolvimento de sua auto-aprendizagem. Para isso, como diz Freire (1996), o educador precisa desenvolver habilidades de investigação, sair da idéia de senso comum, e permitir que o outro atue com a sua singularidade. Pacheco (1996) afirma que o aprender a aprender é o objetivo mais ambicioso e ao mesmo tempo irrenunciável da educação; equivale a ser capaz de realizar aprendizagens significativas por si mesmo numa ampla gama de situações e de circunstâncias. É preciso que o educador renuncie ao poder oferecido pelo status de “professor”, e passe a agir como mais generosidade, buscando reconhecer no educando um sujeito ativo, que formula idéias, desenvolve conceitos e constrói seu próprio conhecimento. O processo de ensino-aprendizagem não deve mais ser compreendido como uma relação unidirecional, que prevê a transmissão verbal dos conteúdos prontos por parte do “professor” e a memorização passiva destes, por parte do “aluno”. Galeffi (2002, p.17) afirma que “só se aprende o que se mostra necessário no pensar-ser. Só o necessário pode ser aprendido em seu evento”. A construção da auto-aprendizagem deve ser buscada, mesmo que não se perceba ganhos pedagógicos em curto prazo, pois quando se alimenta no outro a potencialidade de crescimento, ele busca sua independência e sua auto-afirmação. Demo (2002, p.37) declara que “é possível pesquisar e elaborar a distância, mantendo com o professor ligação virtual efetiva e mesmo afetiva”. Como conseqüência, a aprendizagem ocorrerá não de forma dicotômica, distante e distorcida, mas pelo contrário, interligada e interdependente com todas as relações significativas mantidas com o sujeito aprendente. Percebe-se então, a necessidade de uma intervenção pedagógica construtivista, que retira o educador da posição de mero transmissor de conteúdos e propicia aos educandos condições adequadas para que os esquemas de conhecimento construídos por eles sejam os mais adequados. Na EaD, esse modelo se mostra ainda mais apropriado. Ramos (2002, p.139) diz que “ao proporcionarem ambientes de aprendizagem flexíveis mas, simultaneamente, exigentes, cujo grau de sucesso é muito dependente do trabalho individual que cada aprendente tem de desenvolver, os sistemas de eLearning apontam claramente para a adoção de abordagens que exploram intensivamente os conceitos construtivistas de aprendizagem, bem como as estratégias de tipo problem-based learning”. O ensino, na maioria das vezes, tem sido autoritário: é o “professor” quem determina o que o “aluno” deve aprender, e como este deve responder às questões postas nas avaliações, sendo um mero reprodutor de idéias alheias. Este autotoritarismo educacional é um reflexo da educação e/ou orientação vinda da família e do meio social de sua convivência. Como as instituições de ensino costumam dar poucas oportunidades de escolha e de decisão, o indivíduo se torna dependente e com características marcantes de mero reprodutor. Na modalidade de ensino a distância, este aspecto precisa ser (re)pensado e imediatamente re(adequado). Para isso, exige-se do educando a capacidade de: a) estabelecer contatos, por si mesmo, com fatos e idéias, analisando-as; b) compreender fenômenose conteúdos; c) planejar, por iniciativa própria, ações em busca de soluções de problemas; d) desenvolver atividades que possibilitem manejar as informações mentalmente, de forma independente. Na aprendizagem autônoma, identificam-se três componentes que desempenham importante papel em todo o processo: o componente do saber, o do saber fazer e o do querer. Silva (2004) elenca três componentes necessários para a aprendizagem autônoma, que são: o saber, o saber fazer e o querer. a) Componentes do saber: não se trata de um saber teórico aprendido, e sim de um saber relativo a si mesmo, saber sobre o seu próprio processo de aprendizagem, com suas facilidades e dificuldades, pois o aprendizado não ocorre pela razão e sim por inspirações. O saber envolve conhecimentos necessários à execução de uma prática. Entretanto, para poder ser capaz de executá-la, é preciso saber fazer. Portanto, fica claro que, ao conhecimento, alia-se a habilidade do indivíduo. b) Componentes do saber fazer: partindo do pressuposto de que todo conhecimento sobre o processo de aprendizagem está naturalmente à disposição de uma aplicação prática, o saber sobre o seu processo de aprendizagem, deve ser convertido em um saber fazer. Contudo o educando deve ser conscientizado de que se trata de um processo de construção e reconstrução, pois as modificações deverão ser efetuadas a partir da sua prática, que sempre está a exigir o saber fazer. c) Componente do querer: o desejo de aplicar algo é de fundamental importância para que se obtenha sucesso, ou seja, o educando precisa estar convencido das vantagens da aprendizagem autônoma. O educador é somente o gestor do processo didático. É preciso atentar que o desafio do educando e do educador em busca do aprender a aprender não é algo simples, e ainda mais quando na modalidade de ensino a distância. Não basta ao educando ter ciência da aprendizagem autônoma; é tarefa primordial do educador buscar a conexão entre o saber, o saber fazer e o querer. Essa conexão, primaz à práxis pedagógica contextualizada, sem dúvida contribui para que a aprendizagem seja prazerosa, desafiadora, estimulante e, sobretudo, construtiva, obtendo do educando uma atitude aprendente, investigativa e fundamentalmente persistente. Estratégias Apesar das inúmeras experiências com educação a distância, realizadas por diversas instituições de ensino, nos mais variados níveis, a metodologia adequada para esta modalidade ainda está em evolução. Ramos (2002, p.139-140) afirma que o ensino a distância articula-se bem com os princípios das teorias de aprendizagem mais contemporâneas, influenciadas por Vygotsky, que realçam a importância da participação ativa dos aprendentes no processo de construção do conhecimento ao nível individual. Para os autores as estratégias metodológicas utilizadas em um Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) podem ser de dois tipos: síncronas e assíncronas. As estratégias síncronas se caracterizam por flexibilizar a distância, mas não a temporalidade, o que exige a simultaneidade de acesso ao AVA pelo professor e pelo estudante. As estratégias assíncronas, ao contrário, permitem não só a flexibilidade da distância quanto a flexibilidade temporal. Exemplos de recursos que permitem a interação assíncrona são: chat, e-mail e fórum. Independente dos recursos utilizados é imprescindível ao professor, na condição de orientador de estudos na modalidade a distância, algumas competências, tais como visto em Luz, Riccio e Silva (2005, p.103-104): a) Competências técnicas: - Domínio dos recursos tecnológicos utilizados no curso; - Capacidade de socialização desses saberes com os cursistas; - Domínio de procedimentos para confecção de relatórios técnicos sobre o desenvolvimento do curso. b) Competências gerenciais: - Habilidade de planejamento em curto e médio prazos; - Prontidão na formulação de estratégias para o redimensionamento de problemas; - Autonomia na tomada de decisões. c) Competências pedagógicas: - Domínio do conteúdo de gestão de sistemas e unidades escolares; - Habilidade para estimular a busca de resposta pelo participante; - Disposição para continuar aprendendo; - Domínio de técnicas motivacionais aplicáveis a EaD; - Domínio e conhecimento dos recursos didáticos disponíveis; - Domínio dos critérios e da perspectiva de avaliação embutidos no curso. Deve-se estar ciente de que as competências do professor não são suficientes para que a aprendizagem se efetive. Como dito anteriormente, o estudante necessita de três componentes para desenvolver sua aprendizagem autônoma, que são: o saber, o saber fazer e o querer. Entretanto, é requerido ao professor que busque orientar o estudante na organização dos estudos, com o objetivo de dar-lhe autonomia no aprendizado. Gonzalez (2005, p.48-49) salienta algumas ações que possibilitam a busca desta autonomia, entre elas estão as citadas a seguir: a) Incentivar a distribuição do tempo disponível para as atividades propostas, distribuindo-o entre leituras, pesquisas e tarefas; b) Orientar o uso de técnicas de resumo e fichamento do material estudado; c) Estimular a discussão sobre os temas abordados com outros coletas de turma; d) Reforçar a busca de informações oriundas de outras fontes; e) Orientar o cumprimento de prazos para entrega de atividades; f) Incentivar a busca de ajuda com o professor; g) Comunicar-se habitualmente com os estudantes, sobretudo com aqueles que apresentam maiores dificuldades para prosseguir os estudos ou no uso do AVA. De um modo geral, é preciso buscar desmistificar a idéia de ensino distante e sem comprometimento que muitos têm da EaD, transformando o ambiente de aprendizagem, mesmo sendo on-line em um ambiente real e próximo do educando. E, para isso, só é preciso ser e agir como um verdadeiro educador. Um exemplo de caso Um exemplo de como as estratégias construtivistas são viáveis e efetivas no ensino a distância, é a proposta pedagógica do curso de aperfeiçoamento em Gestão do Conhecimento (GC), que está sendo construído como projeto da disciplina Educação a distância, do Programa de Pós-graduação em Educação (PPGE) da Faculdade de Educação (Faced), da Universidade Federal da Bahia (Ufba). O curso em construção contempla um dos objetivos específicos do Projeto Gestão do Conhecimento no Cenário Brasileiro: espaço de produção do conhecimento e (in)formação de gestores, vinculado à Redpect (Rede Cooperativa de Pesquisa e Intervenção em (In)formação, Currículo e Trabalho). Este projeto tem como propósito geral contribuir para a construção do conhecimento na área de Ciência da Informação, tomando a GC e os respectivos espaços de (in)formação e trabalho dos gestores do conhecimento, no Brasil, para uma investigação que contraste o regional/nacional com o global. O objetivo do curso é a formação de gestores do conhecimento, sobretudo aqueles que estão inseridos no cenário acadêmico. É um curso de aperfeiçoamento de formação inicial, na modalidade a distância, com duração de 180 h, sendo 90 h de formação básica e 90 h de formação específica (GC em organizações educativas e GC em organizações virtuais). A formação básica é subdividida em três módulos: Módulo I – Retrospectiva de GC, Módulo II – Referenciais de GC e Módulo III – GC como atividade humana. Como suporte ao processo de ensino-aprendizagem, o curso utiliza o AVA (Ambiente Virtual de Aprendizagem) Moodle, que é recomendado pela Cead (Comissão interinstitucional de educação a distância) da Ufba, e está em conformidade com as políticas públicas de uso de software livre. O Moodle, por ser um sofware livre,não tem custo de aquisição nem de manutenção, e também permite que seja possível implementar as customizações necessárias ao curso, já que seu código é aberto. Além disso, o Moodle foi concebido com a filosofia social construtivista, o que possibilita fornecer um suporte mais apropriado à proposta pedagógica do referido curso (MOODLE, s.d.). O curso vem sendo construído de modo colaborativo, com base na aprendizagem coletiva (FROES BURNHAM, 2000), por estudantes do PPGE, da Faced/Ufba, tendo sido iniciado no segundo semestre letivo de 2006. Atualmente, está em progresso o desenvolvimento da segunda etapa de construção deste curso, que objetiva revisar o conteúdo, a estética, a linguagem, e, principalmente, as estratégias metodológias, buscando a consonância com as demandas de um aprendizado autônomo. A proposta pedagógica deste curso visa promover a participação ativa do cursista, buscando construção de sua autonomia como aprendiz. Para isso, este curso propõe algumas estratégias bastante inovadoras: a) Permite que o cursista interfira na construção dos conteúdos apresentados. Cada contribuição é avaliada pelo professor, que sugere ajustes ao contribuidor até que o novo conteúdo possa ser disponibilizado para os demais cursistas; b) Propõe a construção de uma proposta de intervenção de gestão do conhecimento aplicável ao ambiente de trabalho do cursista; c) Disponibiliza a possibilidade do cursista criar um avatar (Second Life)1, com o objetivo de lhe dar mais liberdade de inferir sobre as diversas questões do curso, incluindo as atividades propostas; d) Prioriza atividades de construção coletiva de textos e projetos, com feedback Além disso, toda a interação com o cursista durante o curso prioriza a dialogicidade, fazendo com que este se sinta próximo do professor, mesmo este estando distante fisicamente. Demo (2002, p.179) afirma que “existe presença virtual”, e que “os internautas vivem isso de modo profundo e constante”. Segundo o autor, “é possível aprender a distância desde que se possa manejar possibilidade de orientação e avaliação por parte do professor, e processos reconstrutivos políticos no aluno, pela via sobretudo da pesquisa e elaboração própria” (p.179). Considerações finais A aprendizagem autônoma facilita e engrandece o processo de aprendizagem, pois só aprendemos o que desejamos. O que é imposto, memorizamos e posteriormente desprezamos. No ensino a distância, essa é uma condição essencial para que tal modalidade possa progredir. Na aprendizagem autônoma, os erros são contribuições preciosas para agregar novos conhecimentos. Através de descobertas, os educandos identificam seus erros, sendo conduzidos de forma prazerosa aos acertos e ao desenvolvimento de novas aprendizagens. Esta perspectiva de aprendizagem proporciona a libertação do ato de aprender, independente de modalidade de ensino, conduzindo à formação de indivíduos autônomos, críticos e criativos. Em outras palavras, um cidadão que não pense de forma fragmentada, mas de forma sistêmica. Só assim serão sujeitos de sua própria aprendizagem. 1 Avatar é uma representação criada no software Second Life (cf. www.secondlife.com), que simula um mundo virtual em 3-D. Este software foi desenvolvido em 2002 pelo engenheiro americano Philip Rosedale, da empresa Linden Lab. Referências bibliográficas DEMO, Pedro. Complexidade e aprendizagem: a dinâmica não linear do conhecimento. São Paulo: Atlas, 2002. FRAGALE FILHO, Roberto (org.). Educação a distância: análise dos parâmetros legais e normativos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. ______. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996. FROES BURNHAM, Teresinha. A política de educação a distância na LDB: buscando entender o discurso oficial. In: JAMBEIRO, Othon; RAMOS, Fernando (Org). Internet e educação a distância. Bahia: Edufba, 2002, p.119-134. _______. 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