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A Psicologia Experimental e a pesquisa básica e aplicada Prof. Roberto Sena Fraga Filho Prof.ªPatricia Rossi Carraro Descrição Os experimentos na Psicologia que permitem tomadas de decisão amparadas por evidências na compreensão do comportamento humano. Propósito O domínio das bases e características da pesquisa experimental na Psicologia, assim como a aplicação dos seus princípios na investigação do comportamento permite compreender as pessoas, sem vieses e tendenciosidades. Objetivos Módulo 1 As bases de uma pesquisa cientí�ca Analisar as bases de uma pesquisa científica. Módulo 2 As características do método experimental Reconhecer as características do método experimental. Módulo 3 Os experimentos que investigam a cognição humana Analisar os experimentos que investigam a cognição humana. Introdução Em nosso estudo, vamos revisitar alguns conceitos básicos do método científico, tais como a curiosidade do pesquisador, as formas de abordagens do conhecimento, as influências epistemológicas, entre outros aspectos que influenciam pesquisas na Psicologia. Na sequência dessa pequena revisão de aspectos- chave, vamos investigar diversos exemplos que nos ajudarão a sistematizar a aplicação do método científico na investigação de fenômenos psicológicos e do comportamento. 1 - As bases de uma pesquisa cientí�ca Ao �nal deste módulo, você será capaz de analisar as bases de uma pesquisa cientí�ca. Ligando os pontos Você sabe como os psicólogos interessados em estudar o indivíduo realizam um experimento na área da Psicologia? Saberia explicar por que o psicólogo tem interesse no relacionamento entre a variável independente e dependente? Para entendermos esse conceito na prática, vamos analisar o case de um psicólogo que é professor e pesquisador em uma universidade e realizou um experimento para o Centro de Treinamento e Desenvolvimento. Um Centro de Treinamento e Desenvolvimento, o qual realiza cursos de formação, na área da Educação para as escolas da educação básica, procurou o psicólogo, docente e pesquisador Danilo e solicitou que ele realizasse um experimento, cujo objetivo é manipular variáveis e verificar o efeito de uma sobre a outra. O pesquisador Danilo explicou que iria trabalhar basicamente com duas variáveis, mais especificamente a relação entre elas. Ele iria observar as mudanças que ocorrem em uma variável, a qual é a independente, e como essas mudanças se associariam a outra variável, que é a dependente. Ele explicou ainda que, nessa pesquisa experimental, desenvolvida na área da Psicologia, iria ter o controle e manipularia, de maneira intencional, os comportamentos em estudo. Além disso, escolheria os participantes ao acaso para um grupo experimental e para um grupo controle. A proposta do experimento seria investigar se os elogios dos pais fazem os filhos se sentirem melhor. Ele selecionou dois grupos e, para um, solicitou que os pais proporcionassem muitos elogios. Já para o segundo, pediu que eles não elogiassem seus filhos. A variável independente, nesse caso, seria a quantidade de elogios. Posteriormente, o pesquisador Danilo mediu como as crianças, em cada um dos grupos, sentem-se a seu próprio respeito. Essa é a medição da variável dependente. Para finalizar, foram realizadas análises com a finalidade de determinar como as mudanças na quantidade de elogio se associaria a diferentes sentimentos da criança. Após o término do estudo, o pesquisador Danilo apresentou a conclusão aos gestores do Centro de Treinamento e Desenvolvimento para montarem o curso sobre o relacionamento entre pais e filhos. Desse modo, constatou-se que as crianças que recebem muitos elogios dos pais possuem uma tendência a se sentirem melhor a seu próprio respeito do que as que não são elogiadas. Após a leitura do case, é hora de aplicar seus conhecimentos! Vamos ligar esses pontos? Questão 1 Como você viu, o psicólogo Danilo realizou uma pesquisa, para o Centro de Treinamento e Desenvolvimento, o qual fundamenta e constrói os seus programas partindo da observação de variáveis. Pensando nesse assunto, de que maneira Danilo deve testar uma variável? A Ele deve manipular a variável dependente, pois esta é a variável mais importante numa pesquisa. B Ele deve estudar se e como a variável independente afeta a variável dependente. C Ele deve controlar somente as variáveis mensuráveis, como por exemplo, a idade dos participantes. Parabéns! A alternativa B está correta. A característica principal de um experimento, o qual pode ocorrer em um laboratório ou em campo, é que o pesquisador tem o controle direto sobre a variável independente para determinar seu efeito na variável dependente. A variável dependente é algo que pode ou não se alterar como resultado de mudanças na variável independente. Os pesquisadores também afirmam que a variável dependente também pode ser considerada como medida final, pois os seus valores são usados para averiguar, ao final do experimento, se está tudo certo. É importante destacarmos que em uma pesquisa podemos encontrar a utilização de vários métodos, como, por exemplo: o de correlação, o longitudinal, o transversal e o estudo de casos. Questão 2 Como você viu no case, o psicólogo Danilo trabalhou em seu experimento com a quantidade de elogios que os pais oferecem aos filhos, fato que representa a variável independente do desenho experimental apresentado. Na sua opinião, o pesquisador Danilo considerou que D Ele deve ignorar experiências passadas e características não permanentes dos participantes, como por exemplo, a motivação. E Ele deve eliminar situações artificiais e procurar influenciar o comportamento dos participantes na direção do que se espera encontrar sempre em ambientes naturais. A por se tratar de um desenho experimental, ele precisa comprovar que necessariamente os elogios representam uma variável positiva e, dessa forma, eliminar qualquer evidência contrária. B ainda se tratando de um método experimental, ele não precisa da definição das variáveis, as quais, especialmente no caso da Psicologia e ciências afins, apresentam uma total falta de objetividade. Parabéns! A alternativa D está correta. O grupo experimental deve conter pessoas que receberão um tratamento especial em um experimento. Posteriormente, o efeito desse tratamento será mensurado para averiguar quais mudanças ele ocasionou. O grupo controle, apesar de ser um grupo de pessoas semelhante ao grupo experimental, não recebe o tratamento em estudo, ou ainda poderá receber um tratamento diferente. Esses grupos são fundamentais, pois os experimentos devem ser rigorosamente controlados para serem válidos e replicáveis. Além disso, esses grupos são partes essenciais para o método científico. Questão 3 Com a finalidade de explicar as causas dos fenômenos psicológicos, a maioria dos pesquisadores utiliza a pesquisa experimental. Para você, quais são os pontos principais que podemos encontrar em um experimento como o realizado pelo Danilo? Em sua opinião, é possível considerar que as Teorias da Psicologia utilizam a pesquisa experimental? Digite sua resposta aqui Chave de resposta C quando o método experimental é realizado de forma acidental e não planejada, especialmente em determinados grupos como os que envolvem crianças, é possível observar as verdadeiras relações de causa e efeito. D quando o método experimental é empregado de forma correta, os participantes do grupo experimental recebem alguma experiência específica e os do grupo controle não irão receber. E quando o método experimental envolve coleta de informações, os participantes serão atribuídos a grupos de forma intencional, para assim poder comprovar a hipótese de pesquisa. Quando um pesquisador realiza um experimento, quer formular conclusões sobre causa e efeito. Em um experimento, um impacto de uma variável pode ser investigado enquanto outras variáveis ficam constantes. Em uma pesquisa, as variáveis sãofundamentais. Na variável independente, por exemplo, o pesquisador está livre para manipulá-la. Já a outra variável é a dependente, a qual está sujeita às alterações da variável independente. Dessa maneira, uma pesquisa experimental inclui um grupo experimental de participantes e também um grupo controle de participantes com objetivo de comparação. As teorias, sejam elas, por exemplo: da aprendizagem e do desenvolvimento cognitivo também fazem uso da pesquisa experimental, ou seja, em suas pesquisas evidenciam-se a manipulação da variável independente que afeta a variável dependente. As observações e intervenções no comportamento são fundamentais nesse processo. Analisar as bases de uma pesquisa cientí�ca À primeira vista, podemos dizer que um cientista, ou um pesquisador, é um curioso. É possível observar que as pessoas, em seu cotidiano, voltam sua atenção e curiosidade para as mais diversas questões. Ao escolher um smartphone, por exemplo, são curiosas acerca das suas características técnicas e as comparam com as de outros aparelhos. Isso vai determinar a tomada de decisão delas, ou seja, qual smartphone comprar. A maioria das pessoas, possivelmente, não pensa mais nisso após a compra do celular e, no geral, só se preocupa novamente com as características técnicas do aparelho em uma nova compra no futuro. A persistência em determinado assunto ou tema é um ponto que diferencia a curiosidade das pessoas, no senso comum, da curiosidade dos pesquisadores. Alguns cientistas pesquisam uma temática, uma tese, por boa parte de suas vidas e seguem toda uma sistematização de passos e procedimentos para suas tomadas de decisão, ou seja, para comprovar ou refutar hipóteses em delineamentos de pesquisa. Abordagens do conhecimento O método é mais uma característica que diferencia a curiosidade do senso comum da curiosidade do cientista/pesquisador. Vamos voltar ao exemplo do processo de escolha de um smartphone até a decisão da compra. Como a maioria das pessoas conduz esse processo? Algumas pessoas preferem ir até uma loja, outras optam por pesquisar o preço em várias lojas. Outros indivíduos fazem uma predileção pela internet pesquisando em sites específicos ou que comparem preços. Há quem, simplesmente, escolhe o aparelho pela dica de um amigo ou apenas pelo preço. Seja como for, o método para escolha do produto que será adquirido não é sistemático no senso comum. Normalmente, esse método é por conveniência. Já o método científico é sistemático, pois conduz a atitude dos pesquisadores a determinado campo de investigação da mesma maneira, permitindo que os achados das pesquisas possam ser comparados. Obviamente, existem diferentes modelos de ciência e múltiplos métodos de investigação. Não se trata de julgar o melhor ou pior método de investigação, tampouco estabelecer uma hierarquia no conhecimento científico. Neste e nos próximos módulos, vamos privilegiar e apresentar estudos e achados a partir de experimentos com construtos de interesse dos psicólogos. Abaixo, demonstramos os dois processos de abordagem do conhecimento. O primeiro segue o senso comum: Abordagem do conhecimento do senso comum. O segundo é aquele que segue o método científico: Abordagem do conhecimento do método científico. In�uências �losó�cas, epistemológicas e premissas do método experimental A seguir, abordaremos as relevantes influências do conhecimento filosófico e métodos de pesquisa que dão norte à aplicabilidade de ideias e investigações inerentes à profissão psicologia. O operacionismo O operacionismo é um princípio que orienta determinados modelos científicos e, sem dúvida, o método experimental. Trata-se de construir uma linguagem científica com terminologias objetivas e precisas. Tal princípio embasa esforços na investigação de problemas que possam ser observados e demonstrados empiricamente. Nesse caso, a validade de uma descoberta científica depende das operações empregadas para evidenciar o fenômeno investigado/pesquisado. Deriva-se, então, o conceito de definição operacional, que significa explicar um conceito unicamente em termos dos procedimentos observáveis usados para produzi-lo e mensurá-lo (SHAUGHNESSY et al., 2012). Por exemplo, uma definição operacional de aprendizagem em ratos pode ser relacionada à velocidade que o animal demora para sair de um labirinto ao qual já esteve exposto antes. O modelo científico não visa buscar verdades, tampouco as construir, mas atua na busca por evidências que possam demonstrar empiricamente como determinados fenômenos, ou determinadas variáveis, exercem influência sobre outras em condições específicas. Essas demonstrações empíricas precisam seguir as regras do método científico e, necessariamente, ser reproduzíveis, ou seja, outros pesquisadores precisam corroborar essas evidências por meio de experimentos, com os dados publicados em periódicos especializados (revistas científicas). O conhecimento científico é construído pelo acúmulo de evidências cuja quantidade e qualidade são demonstradas por diversos pesquisadores, em diferentes lugares, de determinado assunto, tema, tese, hipótese que estão sendo investigados. Falseabilidade da teoria O conceito da falseabilidade da teoria reforça a ideia de que a ciência não busca por verdades. Mas o que isso significa? Quando propomos uma teoria, não buscamos comprovar a sua veracidade, e sim que ela está errada. Caso não se refute com evidências uma teoria ou uma hipótese, ela permanece até que, em algum momento, um pesquisador demonstre que está errada. É evidenciando os erros nas teorias que o conhecimento científico evolui. Diante do erro, precisamos colocar outra teoria no lugar e, assim, testar a sua falseabilidade. Uma boa teoria sobrevive aos testes de falseabilidade ao longo do tempo, demonstrando sua estabilidade (confiabilidade) para que possamos interpretar fenômenos e fazer tomadas de decisão a partir dela com mais segurança e estabilidade (BREAKWELL et al., 2010). Variáveis da pesquisa O método experimental exige que as condições da pesquisa sejam controladas. Isso implica que busquemos maneiras de manter a nossa pesquisa dirigida apenas a duas variáveis básicas no delineamento experimental: a variável dependente e a variável independente. Variável dependente (VD) É aquela observada. São traços, características ou dimensões do fenômeno, do objeto de interesse. Variável independente (VI) É a experimental, ou seja, são as condições manipuladas pelo pesquisador. Assim, o efeito da manipulação de uma variável independente sob uma variável de estudo, que é dependente, se traduz em um achado, ou seja, em uma evidência de determinada pesquisa. Portanto, os efeitos ou a influência de qualquer outra variável precisam ser eliminados ou controlados para podermos afirmar com segurança as evidências observadas. Exemplo Podemos estabelecer relações de causalidade pelo método experimental ou apontar correlações entre outras variáveis por meio de experimentos/estudos que apresentem um viés preditivo (correlacional). O importante, quando fazemos um experimento com variáveis, é evidenciar as relações sistemáticas entre elas, seja por delineamentos experimentais ou seja por delineamentos correlacionais. Variáveis da pesquisa Em dezembro de 2019, a humanidade se deparou com uma variação do coronavírus, trata-se do SARS-CoV-2 ou covid-19. No ano seguinte, constatou-se que estávamos em uma pandemia, ou seja, o vírus infectou expressivamente pessoas de diversos países em todo o planeta. A curiosidade persistente de pesquisadores, especialmente de microbiologistas, virologistas e afins, que dedicam suas vidas para estudar microrganismos causadores de doenças, logrou êxito em colocar à disposição das pessoas diversas vacinas. Este é o primeiro efeito da curiosidade do pesquisador: expertise em determinado assunto. Em outras palavras, são pessoas que, na coletividade, devem ser ouvidas e consultadaspara tomadas de decisão em determinada área do conhecimento. O processo de construção de uma vacina não é o objetivo de nosso estudo, mas os testes para obtê-las com seres humanos e, também, o comportamento das pessoas diante da pandemia são de grande relevância para desenvolvermos algumas ideias associadas a experimentos. Por exemplo, no início da pandemia, um fenômeno foi observado em diversos países: a compra maciça de papel higiênico. O que motivou esse comportamento? Como vimos, é característica do senso comum tomar decisões por meio de observações casuais e não controladas. Qual o efeito dessas observações casuais e não sistemáticas? Uma possibilidade de resposta para essa pergunta é que a leitura dos eventos pelas pessoas, no início da pandemia, resultou em um fenômeno que a Psicologia nomeia de comportamento de manada. Na crise, devido à ausência de uma racionalização, compreensão dos dados e de evidências científicas, copia-se o comportamento do próximo. Aleatoriamente, alguém resolveu comprar uma quantidade exorbitante de papel higiênico. Podemos até supor que se tratava de um comerciante de uma pequena mercearia de bairro, aproveitando uma promoção de um grande atacadista, ou alguém preocupado com a higiene em razão da covid. O fato é que esse comportamento foi copiado indiscriminadamente e postado em redes sociais, ganhando atração por notícias falsas e colocando em ação o efeito manada. Outro aspecto observado no enfrentamento da pandemia foi uma enxurrada de notícias falsas, as chamadas fake news, circulando em redes sociais e na internet de modo geral. Essas notícias influenciaram negativamente o comportamento de várias pessoas. Lembremos, nesse momento, a forma da construção do conhecimento do senso comum, que são as fontes das fake news, e destacamos os quatro seguintes aspectos: abordagem intuitiva; acrítica; tendenciosa; e hipóteses não testadas. Em meio a uma pandemia, essa forma de analisar informações e tomar decisões é a receita do caos. Em alguns cenários, decisões foram tomadas pelas pessoas da mesma maneira como se estivessem comprando um smartphone, ou seja, por conveniência, de forma intuitiva e não sistemática, sem analisar rigorosamente os eventos e considerar os dados científicos que estavam sendo construídos e divulgados. Tomar ou não vacina? Usar ou não a máscara? Qual a melhor fonte para tomada de decisão diante dessas perguntas? Algumas pessoas repeliram as campanhas de vacinação e emitiram comportamentos meramente guiados por ideias que circulavam no senso comum ou, até mesmo, por pesquisadores isolados da comunidade científica. O que chamamos de pesquisadores isolados? Lembre-se de que o conhecimento científico é construído pela qualidade e quantidade de evidências que corroboram uma tomada de decisão. Enquanto 99% dos microbiologistas, virologistas, epidemiologistas e afins apontaram para a vacina e o uso de máscara como os principais meios de barreira para disseminação do vírus, 1% de pesquisadores se apoiaram em outras evidências, contrariando os demais. Não se trata da vitória da mera maioria, mas também da qualidade das evidências. Esses 1% de pesquisadores não seguiram um controle sistemático que permitissem as generalizações de protocolos de tratamento que defendiam e, ao longo da pandemia, se mostraram ineficazes. Já o método experimental, utilizado pelos outros 99%, necessitou de um rigoroso controle e fez generalizações com muita cautela e de forma mais confiável. Comentário Não podemos aceitar o resultado de uma pesquisa de passivamente. Precisamos contar com alguns critérios que nos permitam avaliar melhor esses resultados. O controle das variáveis no método experimental Um experimento verdadeiro exige que duas condições sejam atendidas, confira a seguir: 1. É necessária uma condição de controle. 2. É preciso fazer a comparação com uma condição experimental. Durante a produção de uma vacina, um grupo de pessoas (grupo controle) é submetido a um placebo (um tratamento inerte, por exemplo, injeção de soro). Enquanto outro grupo, chamado de experimental, é submetido à vacina. Esses grupos são comparados e acompanhados em sua evolução clínica. Assim, após trabalhos estatísticos, pode-se evidenciar a eficácia da vacina quando comparada ao grupo controle. Nesse caso, a variável dependente é a resposta imunológica das pessoas, e a variável independente é a resposta à vacina. Nesse processo, também podemos observar variáveis estranhas e intervenientes. As variáveis estranhas expressam a ideia de que existem condições que os pesquisadores desconhecem. Podem no máximo inferir, mas não é fácil de isolar. As variáveis intervenientes podem explicar, conectar a variável independente com a dependente. Outros aspectos estão envolvidos para que os cientistas façam uma inferência causal, nesse caso, que a vacina é a causa de uma melhor resposta imune do organismo. Segundo Shaughnessy, Zechmeister e Zechmeister (2012), são eles: Covariação das variáveis (demonstrada por trabalhos estatísticos) Uma relação temporal (evidências de que a melhora da resposta imune ao vírus ocorreu depois da vacina) Evitar explicações alternativas (demonstrar que apenas a vacina foi responsável pela melhora da resposta imune) Durante o enfrentamento da pandemia, observou-se o emprego de protocolos e medicações que, após passarem por procedimentos de pesquisas similares, conforme o descrito, não sustentaram suas evidências, ou seja, não passaram nos testes de falseabilidade. O comportamento supersticioso Indiscutivelmente, um dos principais objetos de estudo da Psicologia é o comportamento humano. Nesse ponto, destacamos que a variável dependente da Psicologia é o comportamento. Um conceito que vamos usar em nosso estudo é o de contingência. Em um sentido geral do método científico, contingência expressa a ideia da relação de variáveis de forma condicional (causalidade) em uma relação temporal. Comentário Importante destacar que trabalhamos com conceitos, os quais não necessariamente expressam uma ideia da mesma forma que usamos a palavra em nosso cotidiano ou da maneira que é apresentada em um dicionário, por exemplo. A palavra contingência como um conceito do behaviorismo (comportamentalismo) passa a ser definida como uma probabilidade condicional que relaciona eventos, tais como estímulos (aspectos do ambiente) e respostas (aspectos do comportamento). São as condições sob as quais uma resposta (um comportamento) produz uma consequência (CATANIA, 1999). A ideia central é que comportamentos são mantidos por suas consequências, por exemplo, um reforço. Outro conceito relevante é o de contiguidade. Esse também expressa uma relação temporal entre variáveis, mas sem uma relação causal entre si. Comportamentos podem ser mantidos por consequências que sucederam a determinadas condutas, mas que não expressam uma causalidade, ou seja, existe contiguidade, mas não uma contingência. A esse tipo de comportamento nomeamos como supersticioso. Podemos reforçar tais condutas em nós mesmos e em terceiros por meio de comportamento verbal (PANETTA; HORA; BENVENUTI, 2007). Skinner, em 1947, demonstrou, em condições experimentais, comportamentos supersticiosos em pombos (MOREIRA; MEDEIROS, 2019). Estudantes reproduzindo o experimento de Skinner. Em um dispositivo específico, as aves eram alimentadas em intervalos regulares (variável independente) por alguns minutos do dia, ou seja, não precisavam fazer nada para liberar a comida. Porém, sistematicamente, alguns pombos começaram a demonstrar comportamentos estereotipados, consistentemente, instantes antes do alimentador liberar a comida. Como isso aconteceu? Aleatoriamente, em algum momento, instantes antes de o mecanismo liberar o alimento, determinadas aves emitiram comportamentos (variável dependente) que sofreram um reforço arbitrário e, acidentalmente, guardaram uma relação de contiguidade com a liberaçãoda comida, mas, obviamente, não uma contingência. Esses comportamentos de nada tinham a ver com a liberação da comida, ou seja, a emissão do comportamento supersticioso não guardava relação com a consequência (comer). Padrões similares foram demonstrados com seres humanos em centenas de estudos em condições experimentais, explicando, em parte, como nos comportamos, eventualmente, de maneira arbitrária, aceitando eventos que podem expressar contiguidade, mas não uma contingência. Durante a pandemia, algumas pessoas fizeram uso de medicamentos sem eficácia comprovada na prevenção da covid-19. De que modo esse comportamento foi reforçado embora não tenha sido respaldado em protocolos científicos, ou seja, que não tenham sido contingencialmente reforçados? Uma resposta simples, meramente com uma pretensão didática, é que algumas pessoas que fizeram uso do medicamento não contraíram a covid-19, reforçando com seu comportamento verbal outros indivíduos a terem a mesma conduta. Isso apoia a ideia, arbitrariamente, de que o medicamento foi eficaz. Demonstrando que outras pessoas contraíram o vírus mesmo fazendo uso do medicamento. Por meio das falseabilidades dessas teses de protocolos de tratamento da pandemia, gradualmente, concluiu-se que apenas a vacina é capaz de mitigar (reduzir) o contágio entre as pessoas, associadas a outras práticas comportamentais, como lavar as mãos e o uso de máscaras. Muitas outras variáveis estão envolvidas nesse processo. Somente o método experimental é capaz de demonstrar uma inferência causal entre variáveis. Agora, munido dessas premissas, você será capaz de enxergar o mundo com mais crítica e analisar as ideias que são, muitas vezes, disfarçadas de ciência, mas que não cumpriram com as premissas básicas do método científico. Esperamos ter relacionado, de forma lúdica, alguns conceitos com as suas experiências cotidianas em uma análise de um evento que impactou o nosso tempo histórico e colocou a ciência nos lares das pessoas. E como podemos comprovar a falseabilidade dessa tese? O comportamento supersticioso e as fake news Neste vídeo, propomos uma reflexão sobre comportamento supersticioso e as fake news, destacando a diferença entre contingência e contiguidade. Falta pouco para atingir seus objetivos. Vamos praticar alguns conceitos? Questão 1 O método científico não se destina à construção de verdades, mas à busca de evidências que permitam compreendermos um fenômeno e fazermos tomadas de decisão respaldadas por tais evidências. O conceito de validade expressa a ideia da qualidade e da quantidade de evidências que corroboram para uma tomada de decisão e/ou que nos permita compreender o fenômeno de estudo. Marque, entre as alternativas abaixo, aquela que expressa, em função do método experimental, as condições que um estudo precisa apresentar para ter qualidade. A Controle das variáveis de estudo. B Controle das variáveis estranhas e intervenientes. C Trabalhos estatísticos e controle de variáveis. D Covariação das variáveis, uma relação temporal; evitar explicações alternativas. Parabéns! A alternativa D está correta. Uma evidência de qualidade, considerando o método experimental, é aquela que consegue demonstrar por trabalhos estatísticos a covariação das variáveis, ou seja, que uma é a causa da outra. Essa covariação precisa ocorrer em uma relação temporal, ou seja, de contiguidade e, obviamente, não pode existir outra explicação para o fenômeno que está sendo investigado. Em outras palavras, isolamos determinado efeito e apontamos como a causa para um fenômeno. Questão 2 O conhecimento do senso comum é útil para a vida das pessoas no cotidiano. Permite que as pessoas interajam de forma fluida e compartilhem de algumas ideias, que atribuem significado para algumas experiências do seu dia a dia. Tomar chá de alho quando estamos resfriados ou manga faz mal quando batida com leite são premissas inofensivas. Em várias circunstâncias de nossas vidas, precisamos do conhecimento científico, que se diferencia do senso comum pelas seguintes características: E Controle da variável independentes, estranha e das variáveis intervenientes. A Abordagem geral é intuitiva; conceitos claros e com especificidade operacional. B Atitude acrítica e aberta; divulgação tendenciosa e subjetiva; hipóteses são testáveis. C Conceitos claros e com especificidade operacional; atitude acrítica e aberta. D Atitude crítica e cética; instrumentos inacurados e imprecisos. Parabéns! A alternativa E está correta. O conhecimento científico produz premissas que, uma vez aplicadas, resultam em mais segurança para população. A possibilidade de testar hipóteses e refutá-las é fundamental para se evitar tomadas de decisão arbitrárias e tendenciosas. São características do conhecimento científico: abordagem geral é empírica; atitude crítica e cética; observação sistemática e controlada; divulgação imparcial e objetiva; conceitos claros e com especificidade operacional; instrumentos acurados e precisos; medição com critérios de validade e confiabilidade; hipóteses são testáveis. 2 - As características do método experimental Ao �nal deste módulo, você será capaz de reconhecer as características do método experimental. Ligando os pontos Você conhece as características do método experimental? Saberia como empregá-lo em um experimento? Para entendermos esta proposta na E Atitude crítica e cética; hipóteses são testáveis; observação sistemática e controlada. prática, vamos analisar o case de um experimento realizado com crianças em uma escola. O psicólogo, professor e pesquisador Danilo se reuniu com o grupo de pesquisa, do curso de graduação de Psicologia e propôs a elaboração e, posteriormente, o desenvolvimento de um experimento para colocarem em prática o conhecimento adquirido a partir de pelo menos um dos teóricos da Psicologia que estudou o comportamento e desenvolveu pesquisas experimentais. Os alunos se reuniram e começaram a trocar ideias sobre tudo que já tinham aprendido com o professor e elaboraram um experimento, cuja finalidade era estudar, ao mesmo tempo, o relacionamento entre a idade de uma criança e o desempenho em uma tarefa de aprendizagem. Para a realização dessa ação, eles iriam selecionar crianças com idades diferentes: com cinco, oito e doze anos. De maneira aleatória, pensaram em dividir metade das crianças em um grupo, o qual seria recompensado com um doce a cada vez que dessem a resposta correta em uma atividade, e a outra metade de crianças, que não seria recompensada com doces. Eles pensaram em realizar esse experimento em uma escola onde um dos alunos do grupo de pesquisa trabalhava. Após supervisão com o professor Danilo, realizaram o experimento, autorizado pela escola, com adesão de 15 crianças e consentimento dos pais, por serem menores de 18 anos. Os alunos gostaram de realizar as atividades e constataram que os resultados da pesquisa mostraram que as crianças que recebem doces pelas respostas corretas, procuram aprender mais rapidamente do que quando não os recebem. Por outro lado, o recebimento de doce pelas respostas corretas tem pouco efeito na aprendizagem das crianças com doze anos. A variável etária e o recebimento de doces como recompensas interagem na determinação da aprendizagem. Professor Danilo ficou muito satisfeito com o trabalho dos alunos e pôde concluir que os discentes estão compreendendo as etapas de uma pesquisa, bem como as características de um método experimental, a partir das teorias estudadas. Após a leitura do case, é hora de aplicar seus conhecimentos! Vamos ligar esses pontos? Questão 1 Como você viu no case, as crianças de diferentes idades foram recompensadas com um doce quando respondiam corretamente a uma atividade. Em sua opinião, de que forma Danilo e seu grupo de pesquisa podem controlar ou mudar o comportamento de uma criança além do uso dos doces? Parabéns! A alternativa B está correta.A definição de reforço é uma das mais importantes formulações teóricas de Skinner. Ele afirmava que os efeitos de consequências, após uma ação, podem servir como reforço ou punição. O reforço positivo e negativo vai fortalecer uma resposta. Já a punição busca diminuir a probabilidade de ocorrência de determinado comportamento. A teoria de John Watson, apesar de ser considerada behaviorista, não trabalha com reforços. A teoria do condicionamento clássico, vai envolver a aquisição de novos comportamentos para as respostas existentes. A teoria de Albert Bandura (aprendizagem observacional) aponta que os reforçamentos influenciam o comportamento, porém, não são necessários para que a aprendizagem aconteça. Questão 2 Como você viu no experimento, o recebimento de doce pelas respostas corretas não tem muito impacto no aprendizado das A Eles podem elaborar um novo experimento, em que possam comparar a influência dos fatores hereditários sobre os fatores ambientais. B Eles podem utilizar o reforço negativo, como por exemplo a isenção de realizar alguma tarefa desagradável que seja obrigatória. C Eles podem fazer uso da aprendizagem observacional porque o que importa é o resultado da ação em si. D Eles podem utilizar o condicionamento clássico, já que os pesquisadores desejam controlar os antigos comportamentos. E Eles podem fazer o uso da punição, pois o objetivo maior é manter algum comportamento por meio da sua aplicação. crianças maiores. Para você, o que Danilo e o grupo de pesquisa poderiam fazer para tentar modificar essa situação? Parabéns! A alternativa C está correta. Pelas Teorias da Aprendizagem, verificamos que o conceito de aprendizagem é um dos processos primordiais, por meio das diversas experiências individuais que impactam no ser. Temos três tipos de aprendizagem: condicionamento clássico, operante e observacional. A última esclarece que os indivíduos podem aprender observando uma pessoa realizando uma atividade. A compreensão do que ela vê pode também influenciar o que ela aprende, já que, a partir do que é visto, o cidadão estará no controle do que está olhando. Questão 3 Os experimentos são primordiais para o avanço da ciência e para o desenvolvimento das diversas áreas do conhecimento. Com base na sua experiência, qual seria o maior interesse do pesquisador Danilo e dos A No grupo de crianças de 12, eles poderiam trocar os doces por ameaças até obter o resultado desejado na pesquisa. B Eles poderiam trocar os doces por algum salgadinho, pois, assim, uma resposta positiva apareceria várias vezes. C Eles poderiam tentar realizar uma outra atividade, na qual essas crianças poderiam se envolver e sentir que estão no controle do que observam. D Eles poderiam retirar essas crianças do experimento, pois elas dificultam o processo de aprendizagem significativa. E Eles poderiam convidar os pais para participarem da atividade, pois a presença deles possibilitaria maior envolvimento das crianças. cientistas do comportamento? Por que a preocupação deles vai além das questões de causa e efeito? Digite sua resposta aqui Chave de resposta Pode-se ressaltar que o objetivo principal da ciência é proporcionar uma descrição precisa dos eventos. O foco maior dos estudos dos cientistas do comportamento é descrever, de maneira cuidadosa, o comportamento. Por isso, eles se preocupam também em estudar como as variáveis influenciam umas às outras e, além disso, almejam desenvolver teorias que irão explicar o comportamento. Vidas dedicadas à ciência e ao estudo do comportamento O conhecimento científico é construído em um continuum histórico e por muitas pessoas de diferentes níveis de formação, por exemplo, bacharelado, especialização, mestrado e doutorado. Seja um aluno de graduação, em uma iniciação científica, apresentando painéis em congressos, ou os pesquisadores (doutores) que são referência para determinada comunidade científica, o universo de cientistas é muito amplo e diversificado na formação, nos objetos de pesquisa, nos métodos e, fundamentalmente, no fator de impacto de suas produções. Vamos destacar, a seguir, três personalidades da Psicologia que se dedicaram ao estudo do comportamento. Por meio de seus estudos, vamos desvendar alguns desenhos experimentais e seus achados. Fator de impacto Por fator de impacto entende-se o quanto determinada publicação é citada em artigos científicos e livros, influenciando outros pesquisadores. Skinner e sua proposta de um behaviorismo radical Burrhus Frederic Skinner, psicólogo e professor na Universidade de Harvard (entre outras instituições de ensino estadunidenses), dedicou sua vida ao estudo do comportamento. O ponto central da produção científica desse autor foi demonstrar que todo comportamento está sujeito a contingências de reforço. Deriva-se da obra de Skinner conceitos como: reforço positivo; reforço negativo; punição positiva; punição negativa; contingência de três termos, entre outras importantes teorias. Em 1948, Skinner escreveu um romance utópico chamado Walden two – uma sociedade do futuro, no qual questiona veementemente o livre- arbítrio evidenciando o determinismo ambiental. Burrhus Frederic Skinner (1904–1990). A caixa de Skinner Neste experimento, um rato privado de água por um tempo é colocado em uma caixa com dispositivos que permitem alguns experimentos. Por exemplo, ao pressionar a barra, o rato pode obter água ou evitar tomar um choque. No primeiro caso, temos um exemplo de reforço positivo, ou seja, o comportamento emitido de pressionar a barra resulta como consequência a apresentação da água. No segundo caso, temos um exemplo de reforço negativo. Ao entrar na caixa, o rato recebe choques elétricos, que são retirados uma vez que o animal pressiona a barra. Em ambos os exemplos, o comportamento de pressionar a barra é a variável dependente. As condições manipuladas pelo pesquisador, a apresentação da água e os choques elétricos são as variáveis independentes. Caixa de Skinner. Tanto no reforço positivo quanto no reforço negativo, a água e o choque aumentam a probabilidade do rato de pressionar a barra. Em outras palavras, o animal será modelado (modelagem) para fazê-lo. Esse aumento é comparado com os comportamentos a nível operante, que são naturais do comportamento do rato, tais como farejar, limpar-se ou levantar nos cantos e na parede da caixa (comportamento exploratório). E qual o objetivo deste experimento? A caixa de Skinner é um exemplo de definição operacional, na qual um controle rígido das variáveis de estudo é possível. Dessa maneira, pode- se evidenciar um processo de modelagem e estabelecer as circunstâncias específicas em que a manipulação de variáveis independentes (as condições experimentais) afetam a variável dependente (o comportamento do rato). Conceitos desenvolvidos por Skinner foram amplamente replicados e empregados no estudo do comportamento humano. Contingência de três termos Como explicar comportamentos complexos? Um comportamento operante é definido como aquele que produz mudanças no ambiente e pelas quais é afetado (MOREIRA; MEDEIROS, 2019). Desse modo, os elementos presentes no contexto em que o comportamento ocorre são chamados de operantes (ou estímulos) discriminativos, ou seja, selecionam determinado comportamento do repertório do organismo que foi reforçado anteriormente. Imagine que você está acompanhando uma novela na TV aberta, ou outro programa, que não esteja disponível em redes de streaming (distribuição digital pela internet). O horário dessa novela é um estímulo discriminativo para o seu comportamento de ligar a televisão e assistir ao novo capítulo. Vamos retornar à caixa de Skinner: imagine que o rato, já condicionado a apertar a barra, não logre êxito em algumas tentativas. O que está acontecendo? O pesquisador estabeleceu uma nova variável independente que é um sinal sonoro dentro da caixa. Eventualmente, o rato vai perceber que a barra sóliberará a água quando o sinal sonoro for disparado. Isso traduz a ideia do estímulo discriminativo, ou seja, a condição que antecede e discrimina o comportamento de apertar a barra. Clark Leonard Hull e o estudo da motivação do comportamento Clark Leonard Hull (1884–1952). Clark Leonard Hull, psicólogo e professor na Universidade de Yale nos Estados Unidos, dedicou-se ao tema da motivação do comportamento, ou seja, ao impulso, e o tratou como uma variável interveniente. Ficou reconhecido por sua exigência e sistematização em sua obra. Criou um modelo matemático e mecanicista para estudar o comportamento. Na década de 40, foi o pesquisador mais citado nos artigos sobre aprendizagem e motivação (SCHULTZ; SCHULTZ, 2019). A teoria do impulso de Clark Hull Para Hull, a motivação do comportamento, ou seja, o impulso, cumpre com o seu papel de “acalmar” as necessidades do organismo, por exemplo, em uma visão mais básica, fome, sede, sono etc. Vamos pensar em um experimento tradicional na Psicologia experimental utilizando a caixa de Skinner. Analisaremos esse experimento em perspectiva, ou seja, usando as premissas da teoria do impulso de Hull. Em um procedimento com uma caixa de Skinner, é imperioso que o sujeito experimental, o rato, fique privado de comida ou água. Nesse caso, vamos criar um motivo para sua participação no experimento, a fome (um estímulo). Podemos predizer, em termos de probabilidade, que o rato com fome terá uma maior chance de apertar a barra e aprender mediante reforço positivo (a comida). Assim, apertar a barra (um hábito) resulta em alimento, que é a consequência desse comportamento. Podemos demonstrar que, se um comportamento (pressionar a barra) reduz o impulso que o originou (a fome), então um hábito é reforçado. Embora o impulso energize um comportamento, ele não o guia, pois os nossos hábitos são provenientes da aprendizagem (REEVE, 2006). Hull acreditava que a interação entre um estímulo e uma resposta ocorria em um contexto mais amplo e que não se podia definir, apenas, naquilo que se observava. O impulso (os motivos) tem origem em uma vasta gama de necessidades fisiológicas, por exemplo: fome, sede, sexo, dor, necessidades homeostáticas, como o controle de temperatura corporal. Portanto, as bases puramente físicas, na proposta de Hull, são os estímulos para a motivação humana. No ano de 1943, Hull elaborou a seguinte fórmula para explicar esse pensamento (REEVE, 2006): Em que: “s” e “r” são os tradicionais estímulo e resposta. “E” significa o potencial excitatório e “H” a força do hábito. A letra “D” é o “drive” (o impulso). As letras “s” e “r” significam determinado estímulo ou resposta, respectivamente. O estímulo é o impulso (o “drive”), e a resposta é sEr = sHr × D ao comportamento. Assim, “sEr” = a magnitude de uma resposta em relação à intensidade de determinado estímulo, ou seja, o potencial excitatório de uma relação entre o impulso e o comportamento. Resumindo, o comportamento observável é uma aprendizagem, um hábito. No caso do rato: “sEr” = Pressionar a barra ou explorar o ambiente ou buscar por alimento, dependendo do impulso (do estímulo que gerou o impulso). A fome é um estímulo que energiza um comportamento, logo é um impulso, um motivo para o comportamento, que visa reduzir a intensidade do estímulo no organismo. “sHr” = A força do hábito, ou seja, a força da aprendizagem traduz a probabilidade de uma resposta (o hábito) ocorrer na presença de um estímulo. No caso do rato, quanto mais apertar a barra e comer, poderá reduzir o impulso (a fome), pois à medida que esse comportamento diminuir o impulso, maior será a probabilidade de se criar um hábito que é a força da associação da aprendizagem. A letra “D” = drive (o impulso), em nosso exemplo, é a fome. Os construtos “sHr” e “D” são características inobserváveis do comportamento, mas Hull compreendia isso como um fenômeno físico, e não por meio de uma causação mental. Por analogia, um átomo também é inobservável e trata-se de um fenômeno manipulável. sEr sHr “D” Podemos inferir que um organismo privado de comida ou sem se alimentar por muito tempo tenha fome, mas não a observamos diretamente, apenas o resultante, ou seja, o que esse organismo faz quando sente fome. Observamos o comportamento de apertar a barra (o rato), ou quando nós abrimos a geladeira para buscar o alimento ou vamos a uma lanchonete da esquina. Esse é um ponto de divergência com Skinner, pois, para esse autor, as relações entre os estímulos e as respostas são diretas, e não mediadas por componentes internos. Hull, no entanto, considerava variáveis intervenientes, por exemplo, a fome, entre outras, e tais variáveis podiam ser quantificadas, tais como os fenômenos físicos. Posteriormente, em 1952, a proposta foi ampliada com a letra “K”, que significa a qualidade ou quantidade de estímulo. Tanto a letra “D” quanto a letra “K” expressam motivos, ou seja, estados motivacionais. A diferença é que “D” traduz um desequilíbrio interno do corpo, por exemplo, a fome. A letra “K” traduz algo externo ao organismo em relação à qualidade e quantidade de estímulo. Exemplo Estou com fome e preciso, naquele momento, de algo doce ou algo salgado para nutrir as necessidades do organismo (qualidade). Posso “matar minha fome” comendo, em um restaurante a quilo, 400g de comida ou necessito de 800g? (quantidade). Assim, a nova fórmula ficou: Os estados motivacionais na compreensão da aprendizagem Entenda a importância da consideração de variáveis não observáveis, como o impulso, o hábito e a qualidade e quantidade de estímulo, no estudo de um comportamento. São destacadas as diferenças entre a proposta de Skinner e a proposta de Hull. Bandura e a teoria social cognitiva Albert Bandura, psicólogo e professor na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, postulou uma abordagem sociocognitiva do comportamento humano. Inicialmente, trabalhou com premissas do behaviorismo radical, mas ampliou o seu olhar ao notar que crianças e adolescentes imitavam comportamentos e, consequentemente, aprendiam por meio da observação. Diferenciou os seus achados da modelagem, via reforço, evidenciada por Skinner e apresentou o conceito de modelação, ou seja, uma aprendizagem observacional ou vicariante. sEr = sHr × D × K Albert Bandura (1925–2021) Aprendizagem vicariante (modelação) Em 1961, Bandura e colaboradores conduziram um experimento para demonstrar a generalização da imitação de comportamentos agressivos para outras situações em que o modelo significativo (aquela pessoa que se imita) não está presente. Trabalharam com 72 crianças com uma média de idade de 52 meses (BANDURA, 2008). Bandura dividiu as crianças em três grupos: Um grupo controle. Um grupo de crianças que foram submetidas a modelos agressivos. Um grupo de crianças submetidas a modelos submissos e não agressivos. Todas as condições foram balanceadas em função do sexo, ou seja, os modelos eram de ambos os sexos e as crianças também foram analisadas em grupos masculinos e grupos femininos. Em todas das condições, as crianças eram instruídas a uma tarefa: desenhar, pintar, com o material disponibilizado. Nas condições experimentais, as crianças, além da tarefa de base, observavam um adulto recebendo a mesma instrução, ou seja, de desenhar e pintar. Imagens do experimento de Bandura. Agora vem uma divisão: no grupo de modelos agressivos, após um minuto do início do experimento, um boneco “João Bobo” inflável era chutado e agredido com socos e com ameaças verbais. O modelo adulto de não agressão simplesmente atendia à instrução e ficava em silencio desenhando. O resultado, quando comparados os três grupos, foi a reprodução de comportamentos violentos pelas crianças que observaram um modelo adulto violento. Podemos identificar as variáveis independentes como as condições do experimento que foram manipuladas pelo pesquisador, tais como o tempoda observação dos modelos adultos, os modelos agressivos e não agressivos, entre outras condições que foram controladas. A variável dependente, como sempre, é o comportamento, nesse caso, das crianças. A operacionalização desse experimento foi por meio da observação e da experimentação que se traduz pelas condições em que uma criança é capaz de assimilar um comportamento violento e reproduzi-lo com pouco tempo de exposição. Um ponto de comparação interessante é que Bandura, por meio desse experimento, refutou Skinner na ideia de que a aprendizagem ocorria apenas por reforçadores por aproximações sucessivas, ou seja, por modelagem. Bandura apresentou evidências de que a aprendizagem podia ocorrer por imitação social. Nesse aspecto exclusivo, a teoria da modelagem de Skinner como a única forma de se aprender não resistiu ao teste de falseabilidade da teoria, ou seja, Bandura demonstrou que a teoria do Skinner estava incompleta e, nesse aspecto, parcialmente errada. Perceba, entretanto, que Bandura não refutou as premissas da modelagem, mas pela modelação demonstrou que aquela não é a única forma de aprendermos. Curiosidade Outros pesquisadores reproduziram essa premissa no modelo animal colocando pombos ingênuos para observarem pombos treinados no uso de um alimentador, tal qual Skinner fazia, ou seja, modelava pombos e ratos nos mais diversos comportamentos. Foi percebido que animais também são capazes de aprender por imitação. Os pombos ingênuos, mesmo não tendo passado pela modelagem, foram capazes de usar o alimentador da mesma maneira que os pombos treinados. Com esses exemplos, fica claro como o conhecimento científico evolui. Os esforços dos pesquisadores em buscar falhas nas teorias de outros pesquisadores resultam no aprimoramento de uma área do conhecimento, nesse caso nas teorias de aprendizagem. Parte das obras de Skinner vem, invariavelmente, resistindo aos testes de falseabilidade; já parte da sua teoria, não! Quando um erro é encontrado, um novo conhecimento preenche esse lugar, dando margem para outros pesquisadores buscarem o mesmo processo. Esse é o movimento que demarca a revolução cognitivista na década de 1950, que, em grande parte, critica o conhecimento acumulado na Psicologia até então. Falta pouco para atingir seus objetivos. Vamos praticar alguns conceitos? Questão 1 Matheus, uma criança em idade escolar, estava apertado para ir ao banheiro, mas não sabia como pedir para professora, pois tinha medo de que ela o repreendesse. Momentos antes, a professora tinha pedido silêncio para turma e a criança não sabia como agir. Em dado momento, outro menino levanta a mão e pede para beber água, pois estava com a boca muito seca. A professora atende ao pedido e libera a criança para ir até o bebedouro. Ao observar isso, Matheus também levanta a mão e explica que precisava ir ao banheiro. Esse enunciado expressa a ideia de uma aprendizagem. Qual mecanismo Matheus usou para aprender como agir nessa situação? A Modelagem mediada por reforço positivo. Parabéns! A alternativa B está correta. A teoria sociocognitiva demonstra que aprendemos também pela observação. Ponto de divergência com o behaviorismo radical que postula que aprendemos apenas caso recebamos diretamente a consequência por um comportamento emitido. O Conselho Federal de Psicologia realiza a distinção do que é avaliação psicológica e testagem psicológica. A avaliação é um processo que requer métodos e técnicas e a testagem faz referência apenas ao teste psicológico. Questão 2 Em um shopping, observamos, eventualmente, pais tentando controlar o comportamento de seus filhos. Uma criança fazendo birra em frente a uma loja de brinquedos ou pedindo um lanche que acompanhe um brinquedo em uma loja de fast-food são exemplos típicos. O que acontece com o repertório comportamental dessa criança quando os pais cedem e atendem a um pedido que esteja sendo emitido acompanhado de birra? B Modelação, uma aprendizagem vicariante. C Condicionamento clássico. D Condicionamento operante. E Modelagem, mediada por reforço negativo. A O comportamento é reforçado negativamente. A probabilidade, no futuro, de a criança emitir uma birra quando desejar algo fica maior. B O comportamento é vicariante. A probabilidade, no futuro, de a criança emitir uma birra quando desejar algo fica maior. Parabéns! A alternativa C está correta. Chamamos de reforço positivo uma consequência, por exemplo, ganhar um brinquedo ou um lanche, que reforce o comportamento emitido que a produziu (por exemplo, a birra). 3 - Os experimentos que investigam a cognição humana Ao �nal deste módulo, você será capaz de analisar os experimentos que investigam a cognição humana. C O comportamento é reforçado positivamente. A probabilidade, no futuro, de a criança emitir uma birra quando desejar algo fica maior. D O comportamento é punido negativamente. A probabilidade, no futuro, de a criança emitir uma birra quando desejar algo fica maior. E O comportamento é punido positivamente. A probabilidade, no futuro, de a criança emitir uma birra quando desejar algo fica maior. Ligando os pontos Você conhece as funções executivas? Saberia apontar os benefícios para o desenvolvimento da criança? Para entendermos esta proposta na prática, vamos analisar o case de um grupo de alunos do curso de psicopedagogia na elaboração de um curso para educadores de uma escola de educação infantil e ensino fundamental I. O professor Danilo solicitou aos seus alunos a preparação de um curso para educadores da educação infantil e do ensino fundamental I mostrando a importância das funções executivas para o desenvolvimento infantil. Os alunos consideraram importante inicialmente mostrar aos educadores que as funções executivas são as habilidades cognitivas primordiais para termos o controle sobre o que pensamos, sentimos e agimos. Nesse sentido, será importante a memória, a atenção e um comportamento adequado em determinada situação. O aluno João lembrou que é necessário explicar aos educadores que a partir dessas dimensões das funções executivas serão construídas outras funções fundamentais para a aprendizagem, como, por exemplo: a capacidade de raciocínio, solução de problemas e planejamento. O professor Danilo, ao fazer a supervisão da atividade que os alunos iriam realizar, pontuou que não poderiam deixar de comentar com os educadores que as pessoas possuem uma capacidade genética a ser desenvolvida, porém, precisam de interações sociais favoráveis. Um contexto social favorável ao desenvolvimento das funções executivas na primeira infância é imprescindível para que a capacidade do indivíduo possa ser atingida quando a criança for adulta. O professor comentou ainda sobre a necessidade de darem exemplos aos educadores que vão contribuir para o desenvolvimento das funções executivas durante a infância. Lembrou-lhes de quando eram crianças e ouviam histórias dos avós, dos pais e professores. Essa simples ação possibilita que as crianças desenvolvam a atenção e a memória. Além disso, irão ajudá-las a desenvolver a criatividade para fantasiar os fatos que são contados por uma pessoa de quem elas gostam. Os alunos comentaram que iriam pesquisar mais atividades para auxiliar o educador no desenvolvimento das funções executivas, e perceberam o quanto a infância é uma fase fundamental para o indivíduo, na qual várias habilidades cognitivas serão desenvolvidas. Viram que é na infância que as funções executivas devem ser formadas para ajudar o indivíduo futuramente no controle da própria vida e, também, assumir responsabilidades. Após a leitura do case, é hora de aplicar seus conhecimentos! Vamos ligar esses pontos? Questão 1 Como você viu no case, as funções executivas relacionam-se a um conjunto de habilidades cognitivas que são fundamentais para o desenvolvimento da criança. Pensando nesse assunto, quais variáveis deveriam ser trabalhadas no curso para educadoresa ser elaborado: Parabéns! A alternativa D está correta. No dia a dia, estamos diante de vários desafios e ações que nos solicitam habilidades das diversas funções cerebrais. Elas exigem raciocínio, lógica, estratégias e tomada de decisões. As funções executivas irão nos auxiliar na organização e no planejamento de nossas ações, ajudam no controle do comportamento, nas emoções, na realização de tarefas complexas e de operações mentais. É importante lembrar que as funções executivas têm relação com a memória, a atenção e pensamento criativo. As funções executivas não são inatas. Precisamos construí-las. Elas vão se desenvolver de forma progressiva, ao longo da idade, mas vai ocorrer um declínio com o avanço da idade. Questão 2 A pensamento, cultura e aspectos físicos. B conduta, motivação, peso e cognição. C pensamento, afetividade e herança genética. D comportamento social, tomada de decisões e planejamento. E domínio sobre a atenção, herança genética e influência social. Para o desenvolvimento das funções executivas na infância é necessário ambientes favoráveis e interações sociais saudáveis. Pensando nesse aspecto e a partir da leitura do case, para você quais condições relacionadas a seguir podem influenciar de forma desfavorável o desenvolvimento das funções executivas? Parabéns! A alternativa B está correta. A construção das funções executivas durante a primeira infância é primordial, e nesse sentido devemos ficar atentos aos contextos familiares e educacionais. Eles devem favorecer o desenvolvimento e a aprendizagem das habilidades cognitivas, emocionais e sociais. Vale lembrar o quanto é fundamental termos vínculos e interações sociais favoráveis entre educadores, familiares e crianças. Os adultos devem propiciar um ambiente saudável, e utilizarem de várias práticas que proporcionem de maneira gradual a obtenção das funções executivas. Questão 3 Existem várias práticas que podem contribuir para o desenvolvimento das funções executivas na infância. Você foi convidado pelo professor Danilo a participar da elaboração do curso para educadores mencionado no case. Para você, quais as atividades que irão ajudar as crianças a melhorarem suas funções executivas? Você considera que pais e A Crianças criadas em orfanatos e crianças que frequentam boas escolas. B Crianças que sofrem agressões físicas, abusos ou negligências, estresse prolongado, e crianças com maior privação material. C Crianças que vivem em ambientes com diálogo construtivo e incentivo adequado a autonomia. D Crianças que vivem em ambientes nos quais os adultos ajudam a controlar sua impulsividade. E Crianças que possuem bons cuidados básicos, afetividade e respeitem seu amadurecimento. educadores podem contribuir ativamente na construção dessas funções? Digite sua resposta aqui Chave de resposta Várias são as atividades que podem proporcionar o desenvolvimento das funções executivas, como, por exemplo: a brincadeira do faz de conta, na qual as crianças assumem e vivenciam diferentes papéis sociais e devem adaptar suas ações aos improvisos que ocorrem nas interações com os participantes. Outra atividade que permite o aperfeiçoamento das funções executivas é seu mestre mandou, cuja finalidade é estimular a concentração, a atenção, a criatividade, e também a coordenação motora. Estudos revelam que jogos eletrônicos, ioga e também atividade aeróbica possibilitam o desenvolvimento da memória, motricidade, capacidade de planejamento e também concentração. Os pais e educadores são as principais pessoas que podem e devem ajudar as crianças a desenvolverem suas funções executivas. Não apenas por meio de atividades, mas podem proporcionar o estabelecimento de bons vínculos, interações saudáveis, oferecer segurança e confiança, ajudar as crianças a controlarem suas reações emocionais, serem autônomas, realizarem tarefas e planejamentos. A proposta de aprendizagem latente de Tolman Edward Chace Tolman foi psicólogo e professor na Universidade da Califórnia em Berkeley. Como pós-graduando, estudou em 1912 com Kurt Koffka, um importante pesquisador da Psicologia da Gestalt — um movimento da psicologia funcional alemã. Questionando o método introspectivo empregado na tradição da época, declarou-se aliviado com a proposta comportamentalista de Watson (SCHULTZ; SCHULTZ, 2019), embora tenha seguido um caminho diferente, tendo proposto um comportamentalismo intencional. Tolman, apesar de ser um comportamentalista, vivenciou em sua época o contexto no qual propiciou o que chamamos de uma revolução cognitivista. Edward Chace Tolman (1886–1959). As explicações comportamentalistas não estavam mais sendo suficientes para responder a certos padrões de comportamento e/ou fenômenos que gradualmente, pela consolidação dos estudos behavioristas, foram sendo observados. A sistematização do conhecimento tem como resultado a busca por mais conhecimento. Uma vez que as respostas para as perguntas feitas em determinada época são encontradas, novas questões surgem. Um exemplo simples para entendermos essa dinâmica é que, uma vez evidenciada a modelagem como um mecanismo de aprendizado, e essa teoria tenha se consolidado, fatalmente os pesquisadores tentam aplicá- la para explicar tudo o que se refere ao aprendizado. Uma hora, porém, esbarram em um fenômeno cuja premissa anterior não foi capaz de explicar. Esse foi o caso de Bandura, que não encontrou uma forma de explicar um comportamento imitado pela modelagem e, assim, buscou evidências da modelação, entendendo que Skinner não conseguiu evidenciar, com eficácia, o contexto social da aprendizagem. Tolman, por exemplo, observou que algumas aprendizagens ocorriam na ausência de reforço e utilizou o conceito de aprendizagem latente para expressar tal fenômeno (GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005). Como esse autor evidenciou essa observação? Em seu delineamento experimental, Tolman trabalhou com ratos divididos em três grupos: E qual era a tarefa desses ratos? Percorrer um labirinto em busca de alimento. Um grupo controle Um grupo continuamente reforçado Um grupo reforçado tardiamente Experimento do labirinto de Tolman. O primeiro grupo, não reforçado, percorreu o labirinto aleatoriamente, vagando pelo labirinto. O segundo grupo foi reforçado em todas as tentativas, ou seja, cada vez que entravam no labirinto, uma caixa com comida estava à disposição e, assim, aprenderam a encontrar a caixa rapidamente. Já o terceiro grupo não foi reforçado nas primeiras dez vezes que entraram no labirinto, ou seja, similar ao grupo controle. Depois de dez entradas no labirinto, esse terceiro grupo foi reforçado nas tentativas subsequentes, ou seja, a caixa de comida foi disponibilizada. O achado impressionante foi que os animais desse grupo, mesmo tendo sido reforçado tardiamente, apresentaram uma curva de aprendizagem similar ao grupo que foi reforçado continuamente. O labirinto e as condições manipuladas pelo experimentador são as variáveis independentes, e o comportamento é a variável dependente. A curva de aprendizagem operacionalizou os achados do Tolman e lhe possibilitou concluir que os ratos, nas primeiras dez tentativas, estabeleceram um mapa cognitivo (uma representação visuoespacial do ambiente), o que propiciou serem efetivos na busca por alimentos. Mesmo na ausência do reforço, os animais aprenderam sobre o espaço que estavam percorrendo no labirinto. Os mecanismos da construção desse mapa mental não podem ser observados diretamente, mas, na conclusão do autor, os efeitos sob o comportamento podem ser observados e correlacionados a tais processos. O problema do tabuleiro mutilado Vamos analisar um experimento? Ele é constituído de duas etapas: Na primeira etapa, um tabuleiro de xadrez é coberto por 32 peças de dominó, ocupando duas casas cada. Na segunda parte, duas casas são removidas do tabuleiro (em azul). Feito isso, vamos colocar um problema para você: é possível que as 62 casas quesobraram no tabuleiro sejam cobertas por 31 peças de dominó? Antes de continuar a leitura, responda a essa pergunta. O problema do tabuleiro de xadrez mutilado (EYSENCK; KEANE, 2017) compreende uma solução por insight. Inicialmente, quase todas as pessoas tentam cobrir, mentalmente, as casas com as peças de dominó e tentam concluir uma resposta. Dica Cada pedra do quadrado cobre uma casa branca e outra preta. Algumas pessoas se saem melhor com essa dica. E você? Como as casas do tabuleiro que foram mutiladas são da mesma cor, não é possível cobrir todo o tabuleiro com as 31 peças. Agora, pense no tipo de estratégia que você adotou para responder à questão proposta. Se a sua resposta foi que não é possível, pois houve a retirada de duas casas brancas, automaticamente, você ativou sua percepção de que uma peça cobre uma casa branca e outra preta. Logo, você acabou de vivenciar uma solução de problemas por insight, mesmo depois de receber a dica das peças. Porém, se você tentou cobrir, mentalmente, o tabuleiro com as peças, usou outra estratégia para resolver o problema. A maioria das pessoas, nesse caso, erra a resposta ou desiste, pois são mais de 700 mil combinações possíveis para os dominós sob o tabuleiro. O insight no cérebro No âmbito das atividades cerebrais, para construir uma solução de um problema por insight, o cérebro humano desencadeia uma série de mudanças que permitem uma compreensão súbita sobre algo. Sabe-se, por meio de algumas correlações, que o hemisfério direito cerebral é mais ativado do que o esquerdo. O hemisfério direito é associado à criatividade, enquanto o giro temporal desempenha um papel no reconhecimento de conexões. Isso é defendido por alguns pesquisadores ao evidenciarem que o cérebro tem um padrão específico de atividade cerebral no insight, com a ativação do giro temporal superior anterior, no hemisfério direito, o córtex do cíngulo anterior, uma área que é ativada quando temos conflitos cognitivos e a ativação do córtex pré-frontal, envolvido com processos cognitivos de níveis mais altos, por exemplo, as funções executivas como o planejamento psíquico, a execução, a tomada de decisão e a solução de problemas. Qual seria a sua resposta a partir dessa dica? Funções executivas: controlamos nossas ações? Segundo Fuentes, as funções executivas podem ser definidas da seguinte maneira: As funções executivas correspondem a um conjunto de habilidades que, de forma integrada, permitem ao indivíduo direcionar comportamentos a metas, avaliar a eficiência e a adequação desses comportamentos, abandonar estratégias ineficazes em prol de outras mais eficientes e, desse modo, resolver problemas imediatos, de médio e de longo prazo. (FUENTES et al., 2014, p. 115) Uma discussão antiga na Psicologia é a do livre-arbítrio versus posições deterministas, seja o determinismo ambiental, conforme visto no behaviorismo, ou o determinismo mental, observado na Psicanálise e por outros autores que postulam que nossas ações são governadas por processos não conscientes. Thomas Huxley (apud EYSENCK; KEANE, 2017) apresenta uma analogia de um apito de um trem a vapor: “O assobio nos fala algo sobre o que está acontecendo no interior da máquina, mas não apresenta um impacto causal no movimento do trem” (EYSENCK; KEANE, 2017, p. 686). Temos livre-arbítrio como algo natural ou precisamos apreender a controlar nossas ações? E esse controle inibitório, se apreendido, vai determinar processos decisórios, posteriormente, de modo não consciente, ou seja, por padrões sinápticos que são disparados na presença de determinados estímulos ou contextos? Para entendermos melhor o papel das funções executivas no nosso comportamento e possamos responder a esses questionamentos, vamos acompanhar um interessante estudo nesse seguimento. O teste marshmallow O teste marshmallow é um estudo conduzido pelo psicólogo Walter Mischel (1930–2018) na Universidade de Stanford. Realizado com crianças em idade pré-escolar, o teste consistia em oferecer uma recompensa (um marshmallow) que poderia ser consumido de imediato. Marshmallow Doce à base de açúcar tipicamente associado à cultura norte-americana. E como funcionava o experimento? A criança deveria aguardar sozinha em uma sala, por 20 minutos, com aquele marshmallow em um prato à sua frente. Se não comesse o doce enquanto esperasse, ganharia o dobro de marshmallow após transcorrido o tempo. Isso era informado para a criança, ou seja, um adulto entrava na sala, oferecia o doce e avisava que, se não o comesse, ganharia dois quando ele voltasse para sala. Na sala, a criança era exposta aos doces sendo convidada a escolher um. O doce era separado e uma campainha era disponibilizada para criança tocar, chamando o pesquisador, caso quisesse comer o doce de imediato. Se aguardasse os 20 minutos, o pesquisador entrava e escolhia o doce. Essas crianças foram acompanhadas até os 27 e 32 anos, em um estudo longitudinal. As crianças que haviam conseguido resistir na idade pré-escolar e não comeram o doce de imediato, na vida adulta, apresentaram um índice de massa corporal mais baixo e autoestima mais elevada. Elas também tiveram mais persistência e resiliência na busca por objetivos e mais resistência à frustação (MISCHEL, 2016). Curiosidade Embora o experimento tenha ficado conhecido como o teste marshmallow, a criança poderia escolher entre uma variedade de guloseimas. Funções executivas nucleares Adele Diamond, professora de Neurociências na Universidade de British Columbia, no Canadá, destaca que existem funções executivas nucleares (DIAMOND, 2013 apud FUENTES, 2014), sendo elas: Memória operacional Capacidade de sustentar temporariamente uma representação mental que será utilizada na realização de operações cognitivas. Controle inibitório Controle sobre interferências internas, externas e inibição de respostas prepotentes. Flexibilidade cognitiva Capacidade de alternar planos de ação e encarar uma realidade a partir de diferentes perspectivas. Existem controvérsias acerca dos componentes inatos, hereditários, envolvidos na nossa capacidade de inibir impulsos. Mas podemos facilmente constatar, em nossa sociedade, que vamos encontrar, na maioria das pessoas, uma tendência a buscar satisfações imediatas ao invés de retardar recompensas. Precisamos oferecer às nossas crianças experiências que propiciem o desenvolvimento das funções executivas nucleares desde sempre. O nosso autocontrole e o adiamento da satisfação envolvem experiências que favoreçam um desenvolvimento emocional saudável, desconsiderando as discussões da hereditariedade nesse processo. Estudos demonstram que estados somáticos afetivos são programados e envolvem nossas tomadas de decisão. Damásio (1994, apud EYSENCK; KEANE, 2017) apresentou uma proposta para compreendermos as alterações socioafetivas. Quando uma escolha é seguida por uma consequência não satisfatória, ocorre uma reação emocional que fica associada a essa escolha. Quando a escolha é seguida de resultados satisfatórios, em momentos futuros, a reação ocorre antes que a escolha seja feita. Isso significa dizer que as melhores escolhas não são necessariamente de uma racionalização, mas baseadas em emoções boas ou ruins. Uma escolha racional, nessa perspectiva, é guiada por uma experiência emocional. Na prática, isso significa dizer que precisamos criar ambientes para nossas crianças, que estados afetivos satisfatórios sejam seguidos quando temos que adiar uma recompensa ou lidar com situações estressantes e, assim, desenvolver uma capacidade aprimorada de tomadas de decisão, perseverança, resiliência e de planejamento de metas e comportamentos objetivando ganhos futuros. O desenvolvimento das funções executivas nucleares Vamos refletir sobre como os estados somáticos afetivos e as experiências afetivas satisfatórias propiciam o desenvolvimento do controle inibitório e suas implicações. Falta pouco para atingirseus objetivos. Vamos praticar alguns conceitos? Questão 1 A capacidade de adiar uma recompensa não funciona da mesma maneira para todas as pessoas. Diante de um bem de consumo, mesmo não precisando e com a vida financeira desorganizada, para algumas pessoas, é difícil de resistir e não comprar. Chamamos de funções executivas um conjunto de operações cognitivas no cérebro que nos auxilia não só a direcionar nosso comportamento a metas, mas também a avaliar o nosso desempenho diante delas. Quais dessas funções estão diretamente associadas a essa ideia? Parabéns! A alternativa D está correta. Precisamos da flexibilidade cognitiva para compreender as demandas do cotidiano em diferentes perspectivas. Comprar ou não comprar? A resposta para essa pergunta não deve ser respondida apenas pela força do desejo de comprar, mas também por um conjunto de outras variáveis, por exemplo: posso comprar? Preciso A Memória operacional. B Controle inibitório. C Flexibilidade cognitiva. D Controle inibitório e flexibilidade cognitiva. E Memória operacional e controle inibitório. desse item? Após as ponderações, o controle inibitório passa a inibir aquela resposta mais impulsiva. Questão 2 Sobre as funções executivas, é verdadeiro afirmar que Parabéns! A alternativa A está correta. Evidências corroboram a premissa de que usamos nossas funções executivas mediadas por codificações, representações mentais, que estão associadas à forma como nos sentimos em relação às experiências que vivenciamos. Considerações �nais A estão correlacionadas diretamente aos processos de controle emocional. B estão relacionadas ao reconhecimento de um objeto usando alguns dos sentidos corporais. C são as sequências de movimentos que o corpo realiza para concluir determinado ato motor. D envolvem células nervosas, os neurônios em específico, que são encontradas apenas no encéfalo e medula espinhal. E se referem à linguagem expressiva e/ou receptiva geralmente no hemisfério esquerdo. O método científico e o método experimental nos propiciam conhecer como determinadas variáveis se relacionam, assim como teorias são construídas e evidenciadas por testes empíricos. Não basta afirmarmos que estamos fazendo ciência, pois, acompanhada dessa palavra, também podemos encontrar pseudoargumentos científicos, ou seja, falsos. Conhecer as nuances do método científico e aplicar esse raciocínio na análise de ideias, hipóteses, teorias, são atitudes que nos permitem fazer tomadas de decisão mais criteriosas e seguras, principalmente nos exercícios de nossas profissões. Podcast Confira uma reflexão sobre a importância do método experimental na construção do conhecimento da Psicologia como ciência, com ilustração por meio dos experimentos psicológicos clássicos. Explore + Leia os artigos a seguir para ampliar a compreensão de aspectos abordados neste material: Uma introdução aos delineamentos experimentais de sujeito único, de Angelo Augusto Silva Sampaio e outros autores, publicado no periódico Interação em Psicologia, v. 12, n. 1, p. 151-164, jun. 2008. Relação entre comportamento supersticioso e estímulo reforçador condicionado: uma replicação sistemática de Lee (1996), de Ghoeber Morales dos SantosI e Nilza Micheletto, publicado na Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, v. 12, n. 1- 2, p. 146-175, jun. 2010. Referências BANDURA, A.; AZZI, R. G.; POLYDORO, S. Teoria social cognitiva: conceitos básicos. Porto Alegre: Artmed, 2008. BREAKWELL, G. M. et al. Métodos de pesquisa em Psicologia. Porto Alegre: Artmed, 2010. CATANIA, A. C. Aprendizagem: comportamento, linguagem e cognição. Porto Alegre: Artmed, 1999. EYSENCK, M. W.; KEANE, M. T. Manual de Psicologia cognitiva. Porto Alegre: Artmed, 2017. FUENTES, D. et al. Neuropsicologia: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 2014. GAZZANIGA, M. S.; HEATHERTON, T. F. Ciência psicológica: mente, cérebro e comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2005. GOODMAN, J. Place vs. Response Learning: History, Controversy, and Neurobiology. Frontiers in Behavioral Neuroscience, v. 14, 2020. MISCHEL, W. O teste do marshmallow: Por que a força de vontade é a chave do sucesso. Rio de Janeiro: Objetiva, 2016. MOREIRA, M. B.; MEDEIROS, C. A. Princípios básicos de análise do comportamento. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2019. NOLEN-HOEKSEMA, S. et al. Introdução à Psicologia: Atkinson & Hilgard. São Paulo, SP: Cengage Learning, 2018. PANETTA, P. A. B.; HORA, C. L. da; BENVENUTI, M. F. L. Avaliando o papel do comportamento verbal para aquisição de comportamento "supersticioso". Revista brasileira terapia comportamental e cognitiva, v. 9, n. 2, p. 277-287, dez. 2007. REEVE, J. Motivação e emoção. São Paulo: LTC, 2006. SAMPAIO, A. A. S. et al. Uma introdução aos delineamentos experimentais de sujeito único. Interação em Psicologia, v. 12, n. 1, p. 151-164, jun. 2008. SCHULTZ, D. P.; SCHULTZ, S. E. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cengage Learning, 2019. SHAUGHNESSY, J. J.; ZECHMEISTER, E. B.; ZECHMEISTER, J. S. Métodos de pesquisa em Psicologia. Porto Alegre: Artmed, 2012. Material para download Clique no botão abaixo para fazer o download do conteúdo completo em formato PDF. Download material O que você achou do conteúdo? Relatar problema javascript:CriaPDF()