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Aula 19 - Direitos Sociais Direitos de Nacionalidade

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Direito Constitucional – Direitos Fundamentais em Espécie
Professor Marcelo Novelino
Aula 19 – Intensivo II 
(Atualização em 01/09/2017: questões de concurso)
	- Direitos Sociais. Direitos de Nacionalidade.
(continuação)
3. “Reserva do possível”
A reserva do possível é uma expressão que surgiu na Alemanha em uma decisão do Tribunal Constitucional Federal (TCF) no caso conhecido como numerus clausus, julgado em 1972.
Este caso envolvia um pedido feito por um grupo de alemães para que o Judiciário determinasse ao Estado Alemão que fornecesse vagas em universidades públicas para todas as pessoas que pleiteassem. O argumento foi no sentido de que, embora ela não traga um rol de direitos sociais como a Constituição brasileira, a Constituição Alemã assegura, dentre os direitos individuais, a livre escolha de profissão. Se a Constituição garante a livre escolha de qualquer profissão, e se existem profissões que exigem o acesso à universidade (Ex.: Advogado), o Estado estaria obrigado a proporcionar tal acesso, pois, caso contrário, as pessoas não teriam plena liberdade para escolher a profissão. O Tribunal entendeu que, de fato, o argumento está correto. No entanto, o Tribunal decidiu que não se poderia obrigar o Estado a fazer algo impossível, algo que não estivesse dentro de seu alcance orçamentário. Surgiu a expressão “reserva do possível”, que significa que o Estado não pode ser obrigado a exercer determinadas obrigações, a cumprir determinadas demandas, quando não houver recursos suficientes para isso.
Essa ideia da reserva do possível, posteriormente, foi transposta para o Direito Brasileiro pelo Professor Ricardo Lobo Torres.
3.1. Dimensões da reserva do possível
A reserva do possível possui 3 dimensões:
I) Dimensão ou possibilidade fática: Consiste na disponibilidade de recursos necessários à satisfação do direito prestacional;
Para que se possa exigir do Estado uma determinada prestação, o primeiro requisito é a existência de recursos disponíveis. Se não há disponibilidade de recursos, não se pode obrigar o Estado a algo impossível. 
Obs.: inexistência de recursos não se confunde com alocação indevida de recursos. Uma coisa é o Estado não ter verba suficiente para atender algum tipo de demanda, outra coisa é o Estado aplicar mal a verba.
Ex.: A CF/88 consagra o direito à moradia (Art. 6º). Quando a CF dispõe que o direito à moradia é um direito social, ela não diz em que medida este direito deve ser assegurado aos indivíduos. Não seria razoável exigir do Estado que fornecesse uma casa para cada família, porque ele não teria recursos orçamentários suficientes para atender esse tipo de demanda.
II) Dimensão ou possibilidade jurídica: compreende dois aspectos: (i) existência de autorização orçamentária para cobrir as despesas pleiteadas; e (ii) competências;
A existência de autorização orçamentária não pode ser vista como um obstáculo intransponível, pois, caso contrário, o Estado, alocando mal os recursos, sempre teria uma “desculpa” para não atender às demandas.
O orçamento tem um papel fundamental no Estado de Direito, por ser uma concretização do princípio democrático, já que as escolhas orçamentárias são feitas por representantes do povo. Os representantes do povo que escolhem as prioridades (saúde, educação, segurança, transporte...).
No entanto, quando essa alocação de recursos é malfeita ou é feita de forma indevida, não se pode alegar a inexistência de previsão orçamentária como obstáculo intransponível.
Ex.: O Estado destinou mais verbas ao lazer ou à propaganda do que a uma determinada demanda na área da saúde – a demanda não será legítima e o judiciário poderá intervir.
Outro aspecto que deve ser analisado é sobre qual o ente federativo que tem competência para atender a determinado tipo de demanda.
Ex.: No caso do direito à saúde, o Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, adotou o entendimento no sentido de que o direito à saúde impõe uma responsabilidade solidária a todos os Entes federativos. A ação pode ser ajuizada contra todos os entes ou contra um deles, individualmente.
Outros direitos são de atribuição de determinados entes. Alguns são de competência dos Estados, outros do Município e outros da União. Portanto, é necessário verificar, quando se propõe uma ação, qual é o Ente federativo competente para atender àquela demanda. Se é uma competência municipal, não se pode exigir da União que assegure aquele direito.
III) Razoabilidade da universalização da prestação exigida, considerados os recursos efetivamente existentes (princípio da isonomia): para se exigir uma determinada prestação do Estado, é necessário que tal exigência seja razoável.
Esta razoabilidade deve ser analisada não individualmente, em razão do princípio da isonomia, que impõe que o mesmo direito seja assegurado a todos que se encontrem na mesma situação. Assim, se uma pessoa recorre ao Judiciário, pleiteando um determinado medicamento, se ela tem direito a receber esse medicamento gratuitamente do Estado, isso significa ou deveria significar que todas as outras pessoas que se encontram na mesma situação também devem ter esse direito assegurado, em razão do princípio da isonomia. 
Portanto, a análise da reserva do possível deve ser feita não sob o prisma individual, mas sob o aspecto coletivo. Se uma pessoa tem direito, deve-se analisar se o Estado tem condições de cumprir aquele dever para todos os demais que se encontram naquela situação.
3.2. Ações Coletivas 
Como consequência da análise acima, pode-se dizer que as ações sociais são o melhor instrumento para efetivar direitos sociais.
Como o princípio da isonomia exige que seja razoável universalizar uma prestação, as ações coletivas são mais apropriadas para tal tipo de demanda, pois, quando é dado provimento ao pedido, todas as pessoas que se encontram naquela situação são atendidas. O juiz tem condições de analisar a questão sob uma visão mais global do que aquela em que ele analisa quando a demanda é feita individualmente.
Contudo, na prática, as ações coletivas, muitas vezes, acabam não tendo a mesma efetividade que as ações individuais, porque os juízes, diante de uma pessoa concreta, tendem a ficar mais sensíveis à situação. Por isso, o Judiciário tende a ser muito mais generoso em ações individuais.
3.3. Matéria de defesa do Estado
A reserva do possível é matéria de defesa do Estado, ou seja, cabe ao Estado o ônus de alegar e provar que não tem como atender a uma determinada demanda. Não é a parte que está pleiteando um medicamento, por exemplo, que vai invocar a reserva do possível.
Como é o Estado que alega, cabe a ele o ônus da prova. Não basta alegar genericamente que não tem recursos. Tem que demonstrar, através de dados objetivamente aferíveis, um justo motivo para não ter como atender aquela demanda.
Na prática, muitas vezes, tal demonstração não ocorre, ou seja, o Estado não se desincumbe do ônus da prova, o que normalmente leva à procedência do pedido (professor Novelino menciona que nunca viu, até o momento, no STF, nenhuma decisão que tenha acolhido esse argumento). Contudo, isso não quer dizer que a reserva do possível nunca foi observada pelo Judiciário. Existem casos como o que segue:
TJRS - Apelação Cível Nº 70014417869: “[...] ASSISTÊNCIA À SAÚDE. FORNECIMENTO E TRATAMENTO ORTODÔNTICO. DESCABIMENTO. CLÁUSULA DA RESERVA DO POSSÍVEL. Tratamento ortodôntico, in casu, tem finalidade meramente estética, e não oferece risco à vida da criança. Interpretação das normas constitucionais não autoriza o atendimento ao pleito. Observância da cláusula da reserva do possível. Precedentes do STF e desta Corte.”
3.4. Direito à saúde: responsabilidade solidária
O direito à saúde, segundo o STF, é de responsabilidade solidária dos entes federativos. Todos podem ser demandados conjunta ou individualmente para atender a demanda.
Esse entendimento foi reafirmado em sede de repercussão geral no RE 855.178 RG/SE:
STF - RE 855.178 RG/SE: “[...] DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃOGERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente ou conjuntamente.
Com relação ao fornecimento de medicamentos de alto custo, até este momento não houve julgamento do STF (provável que seja julgado ainda esse ano). Mas foi admitida a existência da repercussão geral no julgamento do STF – RE 566.471 RG/RN. Segue Ementa:
STF - RE 566.471 RG/RN: “Ementa: SAÚDE ASSISTÊNCIA - MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO FORNECIMENTO. Possui repercussão geral controvérsia sobre a obrigatoriedade de o Poder Público fornecer medicamento de alto custo.”
4. “Mínimo existencial”
O “mínimo existencial” está intimamente ligado à reserva do possível. Em uma questão dissertativa, quando perguntarem sobre a reserva do possível, necessariamente deve ser abordado o “mínimo existencial” e vice-versa.
O “mínimo existencial” também é um conceito criado na Alemanha. Surgiu no Tribunal Federal Administrativo. Posteriormente, passou a ser utilizado nas decisões do TFC (Tribunal Federal Constitucional). A Suprema Corte Alemã abstraiu o “mínimo existencial” de três princípios: dignidade de pessoa humana, liberdade material (liberdade que pressupõe condições materiais básicas de existência) e Estado Social.
O conceito de “mínimo existencial” foi trazido para o Brasil pelo professor Ricardo Lobo Torres, passando a ser muito utilizado na jurisprudência do STF, de outros tribunais e pela doutrina.
4.1. Definição
Mínimo existencial compreende um conjunto de bens e utilidades indispensáveis à uma vida digna.
O “mínimo existencial” está intimamente relacionado à dignidade da pessoa humana. É o mínimo necessário para que a pessoa tenha uma existência digna.
4.2. Quais direitos compõem o mínimo existencial?
Há duas posições: 
1ª posição: para alguns, como o Professor Ricardo Lobo Torres, não se pode definir um conteúdo para o mínimo existencial, pois ele varia de acordo com cada época e com cada sociedade. Cada sociedade tem um determinado tipo de demanda específica. Cada época exige que determinados direitos sejam atendidos. Ex.: Pode ser que daqui a 20/30 anos, o direito de acesso à internet faça parte do mínimo existencial. Assim, é necessário analisar, em cada época específica e dentro de cada sociedade, quais direitos seriam esses.
2ª posição: Existem autores, no entanto, que buscam concretizar este conceito, tentando identificar determinados direitos nele contidos (caso contrário, ficaria muito abstrato). A Professora Ana Paula de Barcellos (UERJ) elenca como direitos que compõem o mínimo existencial:
- Direito à saúde, sobretudo quando indispensável à existência do indivíduo; 
- Educação Fundamental (aqui, trata-se da educação básica, não abrangendo educação superior ou do ensino médio); 
- Assistência aos desamparados, no caso de necessidade (ex. LOAS – benefício de 1 salário mínimo para pessoas deficientes ou que são maiores de 65 anos, cuja renda familiar per capita seja inferior a ¼ do salário mínimo); e
- Acesso à justiça (direito instrumental para que as pessoas possam fazer valer os três anteriores).
4.3. Absoluto ou relativo?
Questiona-se: O mínimo existencial é absoluto (regra) ou relativo (princípio)? Ele pode ser ponderado com a reserva do possível? Há 2 vertentes:
1ª Vertente (Prof. Daniel Sarmento) – Mínimo existencial como princípio: o mínimo existencial deve ser interpretado como um princípio, com caráter relativo. Seria necessário ponderá-lo frente à reserva do possível para se analisar qual deles iria prevalecer. Necessário analisar, em cada caso concreto, se aquele direito que pertence ao mínimo existencial pode ou não ser exigido do Estado.
Na Alemanha, isso faz sentido, pois a Constituição Alemã não consagra um rol de direitos sociais tão amplos quanto a Constituição Brasileira. Contudo, qual o sentido do mínimo existencial no Brasil, já que a Constituição consagra um rol muito mais amplo de direitos sociais do que esse (Direito à saúde, Educação Básica, Assistência aos desamparados e acesso à justiça para Ana Paula de Barcellos)?
No Brasil, como exposto, os direitos sociais têm o problema da efetividade, que dificulta a implementação desses direitos em um grau desejado. O mínimo existencial, neste caso, seria um subconjunto mais restrito dentro dos direitos sociais. A diferença, segundo o Professor Daniel Sarmento, é que esses direitos que compõem o mínimo existencial, como são mais próximos da dignidade da pessoa humana, devem ter um peso maior na ponderação do que um direito social que não compõe o mínimo existencial (Ex.: peso conferido ao direito ao lazer seria muito menor do que o peso conferido ao direito à saúde, por exemplo). Nessa visão, portanto, é questão de atribuir peso maior ou menor, conforme o direito esteja incluído ou não dentro da noção de mínimo existencial. 
Este entendimento do Professor Daniel Sarmento, no entanto, não é o entendimento que prevalece no direito brasileiro. O entendimento majoritário na doutrina e na jurisprudência do STF é no sentido de que o mínimo existencial teria a natureza de uma regra, com caráter absoluto.
2ª Vertente (Profa. Ana Paula de Barcellos, Prof. Ingo Sarlet e Ministro Celso de Mello) – Mínimo existencial como regra (absoluto): o mínimo existencial não se sujeita à ponderação e, por isso, não se sujeita à reserva do possível. Nesse sentido, a reserva do possível poderia ser invocada para a não implementação de outros direitos sociais, mas não daqueles que compõem o mínimo existencial. 
Se há um direito incluído dentro do mínimo existencial, não se pode alegar a reserva do possível para que este direito não seja atendido.
STF - RE 482611/SC: “[...] Impossibilidade de invocação, pelo Poder Público, da cláusula da reserva do possível sempre que puder resultar, de sua aplicação, comprometimento do núcleo básico que qualifica o mínimo existencial (RTJ 200/191-197).”
Obs.: De acordo com esta decisão, se a reserva do possível for invocada para comprometer a implementação de um determinado direito que compõe o mínimo existencial, esse argumento não irá prevalecer no julgamento. Em tal entendimento, entre a reserva do possível e um direito que faz parte do mínimo existencial, sempre o último irá prevalecer.
5. O “princípio da vedação de retrocesso”
5.1. Nomenclatura: 
“Proibição de retrocesso”, “vedação de retrocesso social”, “efeito cliquet”, “proibição de contrarrevolução social” (esse último quase ninguém utiliza, mas já foi cobrada em prova do MP/RJ), “proibição de evolução reacionária”, “eficácia vedativa/impeditiva de retrocesso” (utilizada pelo Barroso) e “não retorno da concretização”.
Obs.: já foi utilizado em prova do MPF: “Efeito cliquet” é um termo utilizado no alpinismo, cujo movimento tem que ser sempre contínuo, para frente, não podendo retroceder, pois uma trava de segurança impede que volte, para não cair. Direitos conquistados não podem retroceder.
Na aula sobre o Poder Constituinte Originário, a vedação de retrocesso foi abordada. Agora, neste tópico, estuda-se a vedação de retrocesso social, ou seja, a vedação de retrocesso sob um aspecto mais específico, a concretização dos direitos sociais pelos poderes públicos. Faremos a diferenciação. 
Ao estudar o Poder Constituinte Originário, vimos que, para alguns, ele teria limitações materiais ou extrajurídicas, dentre as quais se inclui o princípio da vedação de retrocesso (em sentido amplo). Dessa forma, o Poder Constituinte não poderia retroceder com relação aos direitos fundamentais já conquistados por uma sociedade, ainda que no contexto da consagração de uma nova Constituição. Nesse sentido, atua como uma vedação imposta ao Poder Constituinte originário. Ex.: vedação da pena de morte – uma nova Constituição não poderia consagrar a pena de morte para crimes hediondos.
A vedação do retrocesso “social”, por sua vez, atua como uma limitação aos poderes públicos encarregados de concretizara constituição (Legislativo, Executivo e Judiciário). Aqueles direitos que foram já concretizados no plano infraconstitucional não podem ser objeto de um retrocesso.
Alguns direitos sociais, por terem textura aberta, por se expressarem através de princípios, para serem implementados na prática precisam de uma concretização por parte dos poderes públicos. Esta concretização não pode ser objeto de um retrocesso. Portanto, essa limitação se dirige, sobretudo, ao Legislativo e ao Executivo quando da regulamentação/concretização de um direito social, embora possa pautar também a atuação do Judiciário quando da interpretação de um direito social. 
De onde o “princípio da vedação de retrocesso” poderia ser extraído? De acordo com a doutrina, ele estaria implicitamente consagrado no texto constitucional, conforme analisado no tópico a seguir.
5.2. Consagração constitucional: 
Segundo a doutrina, a vedação de retrocesso pode ser extraída de diversos outros princípios consagrados na constituição, dentre eles:
- Segurança jurídica – imporia uma não retroatividade com relação à concretização dos direitos conquistados; 
- Dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III) – conceito guarda-chuva, pois serve como justificação a tudo;
- Princípio da máxima efetividade (Art. 5º, §1º); 
- Princípio do Estado Democrático Direito (Art. 1º); e
- Sistema internacional de direitos humanos (já caiu na prova do MPF-2012, quando o princípio foi cobrado como contido no sistema internacional de direitos humanos).
5.3. Definição 
A vedação ao retrocesso consiste no impedimento, dirigido aos poderes públicos, de extinguir ou reduzir (varia de acordo com a ideologia de cada autor), de forma desproporcional e injustificada, o grau de concretização alcançado por um direito fundamental prestacional;
Obs.: Alguns autores, como Zagrebelsky, sustentam que não pode haver qualquer redução no grau de concretização dos direitos sociais. Outros dizem que a vedação do retrocesso não impede uma redução, mas sim a extinção da concretização alcançada pelo direito. A redução poderia até ocorrer, dependendo do caso. De toda forma, para que a extinção ou redução sejam legítimas, há que ser feita de forma proporcional e justificada.
Obs.: Observa-se que se está tratando de Poderes Públicos responsáveis pela concretização de um direito prestacional, os quais exigem do Estado não uma abstenção, mas uma atuação positiva. Muitos desses direitos têm eficácia limitada, ou seja, dependem de uma outra vontade para serem usufruídos no caso concreto. 
Ex.: O direito de greve dos servidores públicos até hoje não foi regulamentado pelo Congresso Nacional. Se o Congresso Nacional tivesse regulamentado o direito de greve, ele não poderia simplesmente revogar a lei, porque isso seria um retrocesso. Ele poderia até alterar a lei, mas não a revogar. Mesmo essa alteração, se reduzisse o direito de greve ou o âmbito de exercício desse direito, teria que passar pelo crivo da proporcionalidade e teria que haver uma justificativa legítima. Do contrário, seria uma violação à vedação de retrocesso.
5.3. Consenso profundo
Quando se fala de vedação de retrocesso, não significa que todo e qualquer aspecto de um direito não possa ser modificado. A vedação de retrocesso atinge o grau de concretização acerca do qual haja um consenso profundo na sociedade e não meros detalhes envolvendo determinado direito.
Ex. 1: Aviso prévio mínimo de 30 dias – a redução desse prazo para 25 dias, por exemplo, não pode ser considerada um retrocesso incompatível com a CF/88 ao ver do professor Marcelo Novelino; é necessário verificar se há uma justificativa plausível para a redução. 
Ex. 2: A CF/88 previa o prazo prescricional de ações trabalhistas de trabalhadores rurais como sendo indefinido. Houve uma mudança no texto constitucional, sendo que, hoje, qualquer trabalhador urbano ou rural tem 2 anos para propor a ação, podendo pleitear as verbas trabalhistas dos 5 anos anteriores. Houve uma redução no grau de concretização do direito dos trabalhadores rurais, mas atingiu um detalhe do direito, não atingiu sua essência. Assim, não se caracterizou uma violação à vedação do retrocesso.
STF – ARE 639.337: “A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. – O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive.
... A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina...
... Em consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar – mediante supressão total ou parcial – os direitos sociais já concretizados.”
DIREITOS DE NACIONALIDADE
1. ESPÉCIES
Há duas formas de se adquirir a nacionalidade de um determinado país.
Uma delas é pelo nascimento. Dependendo do local onde a pessoa venha a nascer ou dependendo da ascendência daquela pessoa, ela adquire uma nacionalidade. Trata-se de um ato natural que não está relacionado com a vontade da pessoa. É a chamada nacionalidade originária (primária).
A outra forma é uma espécie na qual a nacionalidade é adquirida, em regra, por um ato de vontade do indivíduo. O indivíduo adquire a nacionalidade não por ter determinada ascendência ou por ter nascido em um determinado local, mas sim por uma manifestação de vontade. É a nacionalidade secundária ou adquirida.
1.1. Nacionalidade primária (ou originária)
Art. 12. São brasileiros:
I - natos:
a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país;
b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil;
c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira; 
Quando se fala da nacionalidade primária ou originário, fala-se dos brasileiros natos, previstos no art. 12, I da CF. Vamos ver item por item.
a) “os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país” (critérios: “jus soli” – critério funcional);
Nota-se que a CF adotou um critério territorial (“Jus soli”). A atribuição da nacionalidade, neste caso, ocorre em razão do local de nascimento (mesmo que os dois pais sejam estrangeiros, em regra). Contudo, percebe-se que a CF exige a exclusão de um outro requisito: o critério funcional.
Para incidir a exceção quanto aos pais estrangeiros, é necessário que ambos estejam a serviço de seu país. Ex.: Um diplomata argentino vem para o Brasil, como representante de seu país, e se casa com uma venezuelana que trabalha na Petrobrás. Esse casal tem um filho. Neste caso, ele está a serviço de seu país, mas ela, embora seja estrangeira, não está a serviço de seu país. O filho será brasileiro nato, porque apenas um deles está a serviço de seu país. Se a mãe também estivesse a serviço da Venezuela, o filho não seria brasileiro nato.
Contudo, quando o cônjuge está apenas acompanhando o outro que está a serviço de seu país, considera-se como se ambos estivessem a serviço. Ex.: Um argentino veio para o Brasil com a esposa venezuelana. Ele está a serviço da Argentinae a esposa trabalha em um multinacional, mas veio apenas para acompanhá-lo. O filho não terá a nacionalidade brasileira originária.
Em resumo: nasceu no Brasil, é brasileiro nato, exceto se os dois pais (ambos) estiverem a serviço de seu próprio país. Critério jus soli menos critério funcional.
b) “os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil” (Critério: “jus sanguinis” + critério funcional);
Percebe-se que, agora, o critério não é mais o territorial. Neste caso, o indivíduo é considerado brasileiro nato, não por ter nascido no território brasileiro (nasceu no estrangeiro), mas por ser filho de pai brasileiro ou mãe brasileira. Pode ser um ou outro, não precisa ser os dois, desde que qualquer deles esteja a serviço do Brasil.
Nota-se que a hipótese prevista nesta alínea é o contraponto da anterior. Assim como não se reconhece a nacionalidade de um filho de um casal que esteja a serviço de seu país, se for um brasileiro a serviço da República Federativa do Brasil, a Constituição reconhece a nacionalidade originária. Ex.: O filho de um diplomata brasileiro que trabalha na França e se casa com uma alemã terá a nacionalidade brasileira originária reconhecida, pois ele está a serviço do Brasil.
O critério utilizado é o jus sanguinis (critério sanguíneo), conjugado com o critério funcional.
c) “os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira;” São duas possibilidades:
1ª hipótese: “os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente”[footnoteRef:1]. (Critério: “jus sanguinis” + registro na repartição brasileira competente); [1: (TJRR-2008-FCC): Nascido em dezembro de 2007, na França, filho de pai brasileiro e mãe argelina, João é registrado em repartição consular brasileira sediada naquele país. Nessa hipótese, nos termos da Constituição da República, João é considerado brasileiro nato. BL: art. 12, I, “c”, 1ª parte, CF/88.] 
Trata-se de uma hipótese introduzida pela Emenda Constitucional nº 54/07, em razão de um movimento ocorrido no exterior conhecido como “movimento dos brasileirinhos apátridas”.
Antes da Emenda 54/07, a nacionalidade do filho de um brasileiro ou brasileira (que não estivesse a serviço do país) nascido no exterior só era reconhecida se ele viesse morar no Brasil. Se continuasse morando no exterior, ficaria sem a nacionalidade brasileira. Nos países que adotam apenas o critério sanguíneo (como, e.g., a Itália), tais crianças ficavam sem nacionalidade. Aconteceu com o Ronald, filho do Ronaldo fenômeno.
A Emenda 54/2007 foi elaborada para impedir tal situação. Atualmente, basta fazer o registro da criança na repartição brasileira competente (consulado) para que seja considerada brasileiro nato. Se o país em que a criança nasceu reconhece a nacionalidade dela, os pais podem optar por não registrar. 
2ª hipótese: “ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira” (Critério: “jus sanguinis” + “jus domicilii” + opção).
Nesta hipótese, caso o pai ou mãe não faça o registro na repartição competente, será necessário que o indivíduo venha a residir, posteriormente, no Brasil. Além disso, não basta apenas a residência. Além de residir no Brasil, é necessário optar pela nacionalidade brasileira. Isso pode acontecer a qualquer tempo, desde que já tenha atingido a maioridade.
A jurisprudência do STF, embora anterior à modificação da CF/88, adota o entendimento no sentido de que a criança que não atingiu a maioridade, mas veio residir no Brasil, adquire provisoriamente a nacionalidade brasileira, sob uma condição suspensiva. Ao atingir a maioridade, a nacionalidade fica suspensa, dependendo da optação confirmativa ou não. Ex.: o Ronald (era apátrida, não pode ser registrado no consulado), quando veio para o Brasil com a Milene, adquiriu a nacionalidade brasileira provisória. Quando ele atingiu a maioridade, optou pela nacionalidade brasileira, sendo, portanto, brasileiro nato. 
1.1.1. Adoção: nato ou naturalizado?
A adoção pode ser considerada um critério para aquisição da nacionalidade originária? A Constituição não prevê essa hipótese expressamente, por isso há divergência na doutrina.
Alguns autores (Valério Mazzuoli) sustentam que um estrangeiro que é adotado por um casal brasileiro não pode adquirir a nacionalidade brasileira originária. Sustenta-se que esse tipo de nacionalidade só pode ser adquirido quando há previsão expressa. Assim, esse estrangeiro adotado poderia apenas ser naturalizado brasileiro.
No entanto, existe uma outra corrente (Alexandre de Moraes) que sustenta que, embora a Constituição não tenha previsto a adoção como critério de aquisição de nacionalidade originária, ela prevê, no art. 227, § 6º, uma equiparação entre filhos adotivos e os demais. Com base neste dispositivo, o estrangeiro adotado por brasileiros deveria ser considerado brasileiro nato.
CF, Art. 227, § 6º: Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
1.2. Nacionalidade secundária (ou adquirida)
Existem duas hipóteses de naturalização secundária: a naturalização tácita ou expressa.
1.2.1. Naturalização tácita (# involuntária) x expressa;
A naturalização tácita é adquirida sem manifestação expressa de vontade. Basta a omissão, o silêncio.
Já na naturalização involuntária, a pessoa adquire a nacionalidade de um país mesmo contra a sua vontade. Esta não se confunde com a naturalização tácita, pois a pessoa não pode recusar a nacionalidade. Ex.: se uma brasileira se casa, na Itália, com um italiano, ainda que ela não queira, ela adquire a nacionalidade italiana. 
A naturalização tácita geralmente é adotada naqueles países que estão em formação, cuja população é pequena para o território. O objetivo é povoar o país com nacionais. Isso foi feito, por exemplo, na Constituição Brasileira de 1824 e na Constituição dos Estados Unidos Brasileiros de 1891:
CPIB/1824, Art. 6. São Cidadãos Brazileiros: [...]
IV. Todos os nascidos em Portugal, e suas Possessões, que sendo já residentes no Brazil na época, em que se proclamou a Independencia nas Provincias, onde habitavam, adheriram á esta expressa, ou tacitamente pela continuação da sua residencia.
CREUB/1891, Art 69. São cidadãos brasileiros: [...]
4º) os estrangeiros, que achando-se no Brasil aos 15 de novembro de 1889, não declararem, dentro em seis meses depois de entrar em vigor a Constituição, o ânimo de conservar a nacionalidade de origem;
5º) os estrangeiros que possuírem bens imóveis no Brasil e forem casados com brasileiros ou tiverem filhos brasileiros contanto que residam no Brasil, salvo se manifestarem a intenção de não mudar de nacionalidade.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no entanto, só prevê a naturalização expressa:
Art. 12. São brasileiros:
II - naturalizados:
a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral;
b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira.
a) “os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral;”
1ª hipótese: “na forma da lei” – a nova Lei de Migração, que substituiu o estatuto do estrangeiro, trata da aquisição da nacionalidade, como será abordado mais adiante.
2ª hipótese:“originários de países de língua portuguesa”: A própria Constituição já prevê os requisitos (atenção: não se aplica apenas aos portugueses, mas a todos os originários de países de língua portuguesa – ex.: Angola, Açores, Cabo Verde, Moçambique, Portugal, Timor Leste, dentre outros).
Essa hipótese da alínea “a” é chamada de naturalização ordinária.
Nos casos previstos nesta alínea “a”, não há um direito público subjetivo da pessoa que cumpre os requisitos previstos na lei ou dos originários de países de língua portuguesa que cumprem os dois requisitos previstos na Constituição (“residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral”). 
A naturalização ordinária, a concessão ou não da nacionalidade brasileira é um ato de soberania estatal, um ato discricionário do Governo Brasileiro, ou seja, a pessoa pode cumprir todos os requisitos exigidos e, mesmo assim, o Governo Brasileiro pode negar a concessão da nacionalidade brasileira.
b) “os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira.”
Esta hipótese é conhecida também como naturalização extraordinária ou quinzenária.
A “ausência de condenação penal” é um requisito objetivo. A pessoa não pode ter tido nenhuma condenação penal, pois, do contrário, ela não pode adquirir a nacionalidade brasileira.
Além disso, como se trata de uma naturalização expressa, a pessoa só adquire se fizer o requerimento.
Nesta hipótese, o STF faz uma interpretação diferente da hipótese anterior, em virtude da expressão “desde que requeiram”. Se o indivíduo cumprir os requisitos e fizer o requerimento, a nacionalidade tem que ser concedida. Portanto, nesta hipótese, há um direito público subjetivo da pessoa que cumpre os requisitos de 15 anos ininterruptos, sem condenação penal, e que faz o requerimento. Não se trata de um ato de soberania estatal. 
1.3. Lei de Migração 
A Lei de Migração, editada em 2017, traz em seu texto quatro espécies (e não apenas duas) de naturalização. Cuidado com livros editados no início do ano – devemos procurar atualizações nesse sentido. 
Art. 64. A naturalização pode ser: 
I - ordinária; [equivalente à alínea “a” acima]
II - extraordinária; [equivalente à alínea “b” acima]
III - especial; ou 
IV - provisória. 
(i) Naturalização Ordinária
Art. 65. Será concedida a naturalização ordinária àquele que preencher as seguintes condições: 
I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira; 
II - ter residência em território nacional, pelo prazo mínimo de 4 (quatro) anos; [menor do que da naturalização extraordinária]
III - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e [deve-se analisar a idade, o país de origem da pessoa, etc.]
IV - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei. 
(ii) Naturalização Extraordinária: como a própria CF/88 já prevê os requisitos, a lei apenas reproduz o que está no texto constitucional. 
Art. 67. A naturalização extraordinária será concedida a pessoa de qualquer nacionalidade fixada no Brasil há mais de 15 (quinze) anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeira a nacionalidade brasileira. 
(iii) Naturalização Especial: Primeira inovação da lei de migração, visto que não há previsão constitucional. 
Art. 68. A naturalização especial poderá ser concedida ao estrangeiro que se encontre em uma das seguintes situações:
I - seja cônjuge ou companheiro, há mais de 5 (cinco) anos, de integrante do Serviço Exterior Brasileiro em atividade ou de pessoa a serviço do Estado brasileiro no exterior; ou
II - seja ou tenha sido empregado em missão diplomática ou em repartição consular do Brasil por mais de 10 (dez) anos ininterruptos. 
Obs.: Nota-se que o dispositivo diz que “poderá ser concedida”. Portanto, não se trata de direito público subjetivo. É um ato de soberania estatal, discricionário.
O art. 69 da lei 13.445/2017 prevê os requisitos para concessão da naturalização especial. A diferença entre naturalização especial e a ordinária é que, na especial, não se exige a residência no Brasil.
Art. 69. São requisitos para a concessão da naturalização especial: 
I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira; 
II - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e 
III - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei. 
(iv) Naturalização provisória: poder
Art. 70. A naturalização provisória poderá ser concedida ao migrante criança ou adolescente que tenha fixado residência em território nacional antes de completar 10 (dez) anos de idade e deverá ser requerida por intermédio de seu representante legal.
Parágrafo único. A naturalização prevista no caput será convertida em definitiva se o naturalizando expressamente assim o requerer no prazo de 2 (dois) anos após atingir a maioridade. 
Novamente, nota-se que o dispositivo diz que “poderá ser concedida”. Portanto, não se trata de direito público subjetivo. É um ato de soberania estatal, discricionário.
Como a criança não tem como manifestar a sua vontade, a lei reconhece, para crianças e adolescentes nessa situação (veio para o Brasil antes de completar 10 anos), a naturalização provisória, mediante requerimento do seu representante. Assim que completada a maioridade, há um prazo de dois anos para o requerimento da nacionalidade brasileira secundária. Se o requerimento não for feito, o indivíduo que tinha a naturalização provisória perde a nacionalidade.
Obs.: Percebe-se que este caso é diferente do brasileiro nato, que pode, a qualquer tempo após atingida a maioridade, requerer a nacionalidade brasileira.
2. QUASE NACIONALIDADE
Na quase nacionalidade, a CF (art. 12, § 1º, equipara o estrangeiro ao brasileiro. Esta hipótese aplica-se única e exclusivamente aos portugueses.
§ 1º Aos portugueses com residência permanente no País, se houver reciprocidade em favor de brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, salvo os casos previstos nesta Constituição. 
Dessa forma, o português que tenha residência permanente no país continua sendo português. Ele não precisa se naturalizar brasileiro para ter os mesmos direitos dos brasileiros, desde que Portugal também atribua tais direitos aos brasileiros lá residentes. Ex.: Se um brasileiro residente em Portugal puder votar ou ser votado, o português residente aqui no Brasil também poderá, mesmo não sendo brasileiro.
Obs.: Trata-se da única hipótese em que a pessoa, mesmo não tendo nacionalidade brasileira, pode exercer direitos políticos. Para tanto, necessário que haja reciprocidade.
2.1. Brasileiro nato ou naturalizado?
O art. 12, §1º, da CF dispõe que “serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro”. Mas que brasileiro é esse? O nato ou o naturalizado?
Observa-se que, após dizer que serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, a CF diz “salvo os casos previstos nesta Constituição”. Os casos a que se refere a CF/88 são os casos de diferenças de tratamento entre o brasileiro nato e o brasileiro naturalizado (próximo tópico).
CUIDADO: já caiu em prova (DPC/RJ e MP/SP) “aos portugueses com residência permanente no país, se houver reciprocidade em favor dos brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes aos brasileiros natos, salvo os casos previstos na CF” e muita gente marcou como errado justamente por causa da palavra “natos”. Mas está correto, pois a própria questão excepcionou os casos previstos na CF. 
Conclusão: Se são atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro nato, com exceção daqueles previstos na Constituição, os portugueses são equiparados aos brasileiros naturalizados. Os direitos que os brasileiros naturalizados têm são os mesmos direitos dos brasileiros natos, excetuados os previstos na CF e que serão analisados em seguida.
3. DIFERENÇAS DE TRATAMENTO
Importante destacar que a lei não pode estabelecer qualquer tipo de diferença de tratamento entre os brasileiros natos e naturalizados, nos termos do art.12, § 2º da CF
§ 2º A lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo nos casos previstos nesta Constituição.
Obs.: a lei pode apenas regulamentar as hipóteses que a própria Constituição prevê, não podendo criar novas diferenças de tratamento.
3.1. Cargos privativos (CF, Art. 12, § 3º)
§ 3º São privativos de brasileiro nato os cargos:
I - de Presidente e Vice-Presidente da República;
II - de Presidente da Câmara dos Deputados;
III - de Presidente do Senado Federal;
IV - de Ministro do Supremo Tribunal Federal;
V - da carreira diplomática;
VI - de oficial das Forças Armadas.
VII - de Ministro de Estado da Defesa
Esse dispositivo leva em consideração dois critérios para reservar apenas a brasileiros natos determinados cargos:
(i) linha sucessória do Presidente da República: Toda e qualquer pessoa que puder, potencialmente, assumir a Presidência da República tem que ser um brasileiro nato. Ninguém que esteja na linha sucessória do Presidente pode ser um brasileiro naturalizado.
(ii) segurança nacional: alguns cargos, por serem estratégicos, só podem ser ocupados por brasileiros natos.
Obs.: Como já estudado, para ser Deputado ou Senador, a pessoa não precisa ser, necessariamente, um brasileiro nato. Contudo, os cargos de Presidente da Câmara dos Deputados e Presidente do Senado só podem ser ocupados por brasileiros nato. Uma pessoa que não é brasileira nata (brasileiro naturalizado ou português equiparado) pode se candidatar ao congresso nacional, mas não poderá se candidatar à presidência da respectiva casa. [footnoteRef:2] [2: (TJSP-2013-VUNESP): É (São) cargo(s) eletivo(s) privativo(s) de brasileiros natos o cargo de Presidente das Casas Legislativas (Câmara dos Deputados e Senado Federal). BL: art. 12, §3º, II e III, CF/88] 
Obs.: Os quatro primeiros incisos (I, II, III e IV) estão relacionados ao critério linha sucessória do Presidente da República (inclusive, no STF, como há um revezamento na presidência, TODOS os ministros devem ser brasileiros natos). Já os três últimos incisos (V, VI, VII) estão relacionados ao critério segurança nacional.[footnoteRef:3] [3: (MPPE-2014-FCC): Renomado advogado, brasileiro naturalizado, com 36 anos de idade e 12 de exercício profissional, pretende exercer cargo público, ao qual possa aceder por intermédio de eleição ou nomeação, independentemente de concurso público. Seu interesse recai sobre os cargos de Presidente da República, Senador, Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ministro do Superior Tribunal de Justiça ou Ministro do Tribunal de Contas da União. Em tese, preenchidas as demais condições pertinentes a cada cargo considerado, poderá o interessado vir a ser apenas Senador, Ministro do Superior Tribunal de Justiça ou Ministro do Tribunal de Contas da União. BL: art. 12, §3º, CF/88] 
3.1.1. Presidente CNJ (CF, art. 103-B, § 1º)
A Constituição não menciona o Presidente do Conselho Nacional de Justiça no art. 12, § 3º. No entanto, de acordo com o art. 103-b, §1º da CF, o Presidente do CNJ é o Presidente do Supremo Tribunal Federal. Como o Presidente do Supremo tem que ser brasileiro nato, necessariamente, o Presidente do CNJ também o será.[footnoteRef:4] [4: (MPMG-2013): O brasileiro naturalizado pode ocupar os seguintes cargos, EXCETO o de: Presidente do Conselho Nacional de Justiça. 
OBS: A questão exige a conjugação de alguns artigos da CF. Vejamos: 1º) O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é presidido pelo Presidente do STF (art. 103-B, §1º - CF); 2º) O Presidente do STF é um dos ministros que integram o STF. 3º)Para ser ministro do STF, o sujeito deve ser, obrigatoriamente, brasileiro nato (art. 12, §3º, inc. IV). Conclusão: O Presidente do CNJ é um brasileiro nato.] 
3.2. Assentos no Conselho da República
CF, Art. 89. O Conselho da República é órgão superior de consulta do Presidente da República, e dele participam: [...]
VII - seis cidadãos brasileiros natos, com mais de trinta e cinco anos de idade, sendo dois nomeados pelo Presidente da República, dois eleitos pelo Senado Federal e dois eleitos pela Câmara dos Deputados, todos com mandato de três anos, vedada a recondução.
Em outras palavras, dos membros que compõem o Conselho da República, órgão consultivo do Presidente, seis têm que ser cidadãos brasileiros natos.
3.3. Propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão
CF, Art. 222. A propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País.
No caso da propriedade dessas empresas, não só o brasileiro nato, mas também o brasileiro naturalizado, podem ser proprietários. Contudo, no caso do naturalizado, ele tem que ter, pelo menos, 10 anos de naturalização. 
Por que esse critério tão específico? Dizem que, à época da edição da Constituição Federal de 88, esse dispositivo foi inserido para evitar que o Roberto Civita perdesse o comando da Editora Abril. 
3.4. Extradição
No que se refere à extradição, a CF/88 faz uma diferença entre o brasileiro nato e o naturalizado. 
A extradição é regulamentada pela Lei 13.445/2017, dos arts. 81 a 99. Veremos, a princípio, o conceito de extradição para a diferenciar da expulsão, deportação e entrega. 
Art. 81. A extradição é a medida de cooperação internacional entre o Estado brasileiro e outro Estado pela qual se concede [extradição passiva – Brasil concede] ou solicita [extradição ativa – Brasil solicita] a entrega de pessoa sobre quem recaia condenação criminal definitiva ou para fins de instrução de processo penal em curso.
Em resumo, quando se fala em extradição, significa que a pessoa cometeu determinado crime e foi condenada ou está sendo investigada e foge para outro país. O país requerente, então, solicita ao país requerido a extradição do indivíduo para que ele cumpra a pena ou responda ao processo penal em curso. 
a) Extradição de brasileiro
Lei 13.445, Art. 82. Não se concederá a extradição quando: 
I - o indivíduo cuja extradição é solicitada ao Brasil for brasileiro nato; 
O brasileiro nato não pode ser extraditado em nenhuma hipótese. O art. 82 da Lei 13.445 apenas regulamenta o disposto no art. 5º, LI, da CF:
CF, art. 5º, LI: nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei;
Se o brasileiro naturalizado praticou um crime comum antes da naturalização, esta pode ter ocorrido com o intuito de se esquivar da persecução penal. Nesse caso, a extradição pode ser concedida.
Na primeira hipótese, a extradição só é permitida se o crime tiver sido praticado antes da naturalização. 
Já na segunda hipótese, é diferente, pois, se houver comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas afins, não importa se o comprovado envolvimento ocorreu antes da naturalização ou depois da naturalização.[footnoteRef:5] [5: (TJMG-2009): Os brasileiros naturalizados podem ser extraditados em caso de tráfico de entorpecentes. BL: art. 5º, LI, CF.] 
A jurisprudência do STF não admite, em qualquer hipótese, a extradição de brasileiro nato:
STF – HC 83.113 MC/DF: “O brasileiro nato, quaisquer que sejam as circunstâncias e a natureza do delito, não pode ser extraditado, pelo Brasil, a pedido de Governo estrangeiro, pois a Constituição da República, em cláusula que não comporta exceção, impede, em caráter absoluto, a efetivação da entrega extradicional daquele que é titular, seja pelo critério do “jus soli”, seja pelo critério do “jus sanguinis”, de nacionalidade brasileira primária ou originária...
... Esse privilégio constitucional, que beneficia, sem exceção, o brasileiro nato (CF, art. 5.º, LI), não se descaracteriza pelo fato de o Estado estrangeiro, por lei própria, haver-lhe reconhecido a condição de titular de nacionalidade originária pertinente a esse mesmo Estado (CF, art. 12, § 4.º, II, “a”);”(g.n.)
Conforme exposto no julgado acima, mesmo que o indivíduo também possua a nacionalidade do Estado requerente, a extradição não poderá ser concedida. Ex.: Brasileiro nato, que tem também nacionalidade originária italiana, comete um crime na Itália e foge para o Brasil. O Estado Italiano requer sua extradição. A extradição não será concedida.
Questiona-se: O fato de o extraditando ser casado com uma brasileira ou ter um filho brasileiro impede a extradição (DPE/RR/2012)? Não, conforme Súm. 421 do STF.
STF – Súmula n. 421: “Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditado casado com brasileira ou ter filho brasileiro”.
Cuidado! Existe uma outra Súmula do STF (Súmula n. 1) que trata da expulsão. Se o sujeito for casado(a) com brasileiro(a) ou tiver filho cujo sustento dele dependa, não poderá haver a expulsão.
STF – Súmula n. 01: “É vedada a expulsão de estrangeiro casado com Brasileira, ou que tenha filho Brasileiro, dependente da economia paterna.”.
Alguns dizem que uma decisão do Supremo (STF – Ext 1.462/DF) autorizou a extradição de uma brasileira nata para os EUA. Contudo, isso não é verdade. Segue o julgado:
STF – Ext 1.462/DF: “[...] 1. Conforme decidido no MS 33.864, a Extraditanda não ostenta nacionalidade brasileira por ter adquirido nacionalidade secundária norte-americana, em situação que não se subsume às exceções previstas no § 4º, do art. 12, para a regra de perda da nacionalidade brasileira como decorrência da aquisição de nacionalidade estrangeira por naturalização.”
O caso acima envolve uma brasileira que havia adquirido a nacionalidade norte-americana. Ela tinha o green card, que conferia a ela os mesmos direitos dos demais cidadãos. Ela não precisava da nacionalidade americana para exercer direitos civis no país, mas, voluntariamente, adquiriu a naturalização norte-americana. Já havia sido declarada a perda da nacionalidade brasileira (estudaremos as regras de perda da naturalizada adiante). Portanto, quando o Governo dos EUA solicitou a extradição, a extraditanda já não era mais uma brasileira nata, mas sim uma estrangeira.
Ainda, falando em extradição, importante ressaltar que algumas regras devem ser observadas para que ela ocorra (aqui, falamos da extradição passiva, em que o Brasil figura como país requerido). A primeira é o princípio da dupla punibilidade. 
b) Princípio da dupla punibilidade
O Estado Brasileiro só autoriza a extradição quando o fato é considerado crime no Brasil e no Estado requerente e quando esse fato ainda é punível em ambos.
Art. 82. Não se concederá a extradição quando:
II - o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil ou no Estado requerente;
VI - a punibilidade estiver extinta pela prescrição, segundo a lei brasileira ou a do Estado requerente;
Ainda que seja considerado crime nos dois países (requerente e requerido), se já houver ocorrido a prescrição em qualquer dos países, não há mais punibilidade e não poderá haver a extradição. Ou seja, o fato deve ser crime e punível nos dois países. Vejamos o seguinte precedente do STF:
STF - Ext 866/PT: [...] “EXTRADIÇÃO E PRINCÍPIO DA DUPLA PUNIBILIDADE. - Consumada a prescrição penal, seja em face da legislação do Estado requerente, seja à luz do ordenamento positivo brasileiro, impõe-se o indeferimento do pedido extradicional, porque desatendido, em tal hipótese, o princípio da dupla punibilidade. Ocorrência, na espécie, de prescrição penal, fundada na legislação brasileira, referente a um dos delitos motivadores do pedido de extradição...”
c) Vedação de duplo risco
A pessoa não pode correr o risco de ser punida pelo mesmo fato em dois países, ou seja, responder no Brasil e também no Estado requerente.
Art. 82. Não se concederá a extradição quando:
V - o extraditando estiver respondendo a processo ou já houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido;
STF – Ext 890/PT: “[...] A extradição não será concedida, se, pelo mesmo fato em que se fundar o pedido extradicional, o súdito estrangeiro estiver sendo submetido a procedimento penal no Brasil, ou, então, já houver sido condenado ou absolvido pelas autoridades judiciárias brasileiras. - Ninguém pode expor-se, em tema de liberdade individual, à situação de duplo risco. Essa é a razão pela qual a existência de situação configuradora de "double jeopardy" atua como insuperável obstáculo ao atendimento do pedido extradicional. Trata-se de garantia que tem por objetivo conferir efetividade ao postulado que veda o ‘bis in idem’. Precedentes.”
d) Crime político ou de opinião
CF, Art. 5º, LII: não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião;
Art. 82. Não se concederá a extradição quando: [...]
VII - o fato constituir crime político ou de opinião; [...]
§ 1º A previsão constante do inciso VII do caput não impedirá a extradição quando o fato constituir, principalmente, infração à lei penal comum ou quando o crime comum, conexo ao delito político, constituir o fato principal. [...]
§ 4º O Supremo Tribunal Federal poderá deixar de considerar crime político o atentado contra chefe de Estado ou quaisquer autoridades, bem como crime contra a humanidade, crime de guerra, crime de genocídio e terrorismo. 
O § 1º do art. 82 da Lei de Migração pode gerar divergências na doutrina e pode ser que o STF entenda que ela é incompatível com a Constituição (embora o Estatuto do Estrangeiro dissesse algo muito similar), mas, como a lei é recente, sua constitucionalidade poderá ser questionada. Além disso, de acordo com o Professor Marcelo Novelino, a constitucionalidade do § 4º também é questionável, embora ele entenda que está dentro da margem de ação do legislador. 
Existem algumas hipóteses em que não se pode considerar o crime político nem para fins de agravamento da pena. O art. 96 da Lei 13.445/2017 dispõe:
Art. 96. Não será efetivada a entrega do extraditando sem que o Estado requerente assuma o compromisso de: [...]
V - não considerar qualquer motivo político para agravar a pena;
A extradição poderá, inclusive, ser negada ao Estado requerente se ele não se comprometer a não agravar a pena em razão de motivos políticos. Trata-se de uma política internacional para evitar perseguições políticas de determinadas pessoas.
e) Direitos fundamentais
É necessário que os direitos humanos sejam respeitados para que o STF possa conceder a extradição. Portanto, quando o país requerente tem regras diferentes da Constituição Brasileira no tocante às penas, se não houver um compromisso de comutação da pena, o Estado Brasileiro não admite a extradição. Ex.: Pena de morte; pena de prisão perpétua.
Art. 82. Não se concederá a extradição quando: [...]
VIII - o extraditando tiver de responder, no Estado requerente, perante tribunal ou juízo de exceção; ou
Assim como a Constituição Brasileira de 1988 não admite Tribunal ou juízo de exceção, a lei também não autoriza que haja extradição para um Estado onde o extraditando vá ser julgado por um Tribunal ou juízo de exceção. É uma forma de proteger direitos fundamentais.
Art. 96. Não será efetivada a entrega do extraditando sem que o Estado requerente assuma o compromisso de: [...]
III - comutar a pena corporal, perpétua ou de morte em pena privativa de liberdade, respeitado o limite máximo de cumprimento de 30 (trinta) anos;
[...]
VI - não submeter o extraditando a tortura ou a outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.
As penas de caráter corporal, perpétua e de morte são vedadas pela Constituição Brasileira. O Estado requerente tem que se comprometer a comutá-las por uma pena privativa de liberdade, que não pode ultrapassar 30 anos, prazo máximo previsto na legislação penal brasileira. 
STF - Ext 855/CL: “[...] A extradição somente será deferida pelo Supremo Tribunal Federal, tratando-se de fatos delituosos puníveis com prisão perpétua, se o Estado requerente assumir, formalmente, quanto a ela, perante o Governo brasileiro, o compromisso de comutá-la em pena não superior à duração máxima admitida na lei penaldo Brasil (CP, art. 75), eis que os pedidos extradicionais - considerado o que dispõe o art. 5º, XLVII, "b" da Constituição da República, que veda as sanções penais de caráter perpétuo - estão necessariamente sujeitos à autoridade hierárquico-normativa da Lei Fundamental brasileira. Doutrina. Novo entendimento derivado da revisão, pelo Supremo Tribunal Federal, de sua jurisprudência em tema de extradição passiva.”
Obs.: a jurisprudência do STF já exigia a comutação da pena antes da lei de migração (Lei 13.445/2017) ser elaborada. Exigia mesmo sem haver previsão expressa na Lei 6.815/80 (estatuto do estrangeiro).
f) Princípio da especialidade
De acordo com o princípio da especialidade, o extraditando só pode ser processado e julgado, no país estrangeiro, pelo objeto do pedido da extradição. Ex.: Se o Estado estrangeiro requereu a extradição em razão de um processo penal pela morte do cônjuge, não pode, após a extradição ter sido concedida, o Estado requerente processar e julgar por outros crimes diversos daquele que foi objeto do pedido de extradição.
Este princípio, que já era adotado pela jurisprudência do STF, também foi expressamente consagrado na Lei 13.445/2017:
Art. 96. Não será efetivada a entrega do extraditando sem que o Estado requerente assuma o compromisso de: [...]
I - não submeter o extraditando a prisão ou processo por fato anterior ao pedido de extradição;
No entanto, embora a lei não preveja, o STF admite uma exceção a esta regra, que é o chamado pedido de extensão, analisado a seguir.
g) Pedido de extensão
O Estado requerente pode solicitar ao STF a permissão para julgar crimes que foram praticados antes da extradição e diversos daquele que motivou o pedido.
STF – Ext 943 Extn/ITA: “[...] 1. A pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal autoriza a análise do pedido de extensão formulado após o deferimento do pedido de extradição, desde que os crimes relacionados sejam diversos aqueles que motivaram o pedido inicial e que eles tenham sido cometidos em data anterior ao pleito extradicional.”
h) Aplicação imediata dos tratados de extradição
Ronald Biggs (pai do Mike do Balão Mágico) assaltou o trem pagador e fugiu para o Brasil. Quando ficou mais velho, preferiu voltar para a Inglaterra e cumprir a pena do que ficar em liberdade no Brasil, tendo pedido para ser extraditado. Á época em que ele praticou o crime, não havia tratado de extradição entre Brasil e Inglaterra. 
Pergunta: Quando um tratado de extradição é celebrado após a prática de um determinado crime, ainda assim a pessoa pode ser extraditada (por um fato anterior à celebração do tratado)? Isso seria uma retroatividade mais gravosa vedada pela CF/88? 
Segundo o STF, o tratado não é norma penal, devendo ser aplicado imediatamente. Assim, se a pessoa praticou um crime hoje, fugiu para o Brasil e o país no qual ela praticou o crime não tem tratado de extradição, nada impede que, amanhã, o Brasil celebre esse tratado e a pessoa seja extraditada.
STF – Ext 864/ITA: “I. Extradição: lei ou tratado: aplicabilidade imediata. 1. As normas extradicionais, legais ou convencionais, não constituem lei penal, não incidindo, em conseqüência, a vedação constitucional de aplicação a fato anterior da legislação penal menos favorável...”.
3.4.1. Expulsão
A lei da migração define a expulsão nos seguintes termos: 
Art. 54. A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional, conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado.
§ 1º Poderá dar causa à expulsão a condenação com sentença transitada em julgado relativa à prática de:
I - crime de genocídio, crime contra a humanidade, crime de guerra ou crime de agressão, nos termos definidos pelo Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, de 1998, promulgado pelo Decreto no 4.388, de 25 de setembro de 2002; ou
II - crime comum doloso passível de pena privativa de liberdade, consideradas a gravidade e as possibilidades de ressocialização em território nacional.
Na expulsão, o indivíduo é retirado compulsoriamente do território brasileiro por ter praticado algum tipo de ato considerado grave pelas autoridades brasileiras.
Cuidado! Vimos que é permitida a extradição de alguém casado com um brasileiro ou que tenha filho brasileiro. No caso da expulsão é diferente:
STF - Súmula 1: “É vedada a expulsão de estrangeiro casado com brasileira, ou que tenha filho brasileiro, dependente da economia paterna”; [é muito antiga e, por isso possui esse viés machista, mas pode ser aplicada, também, para a mulher]
A lei ainda prevê as hipóteses nas quais não se procederá à expulsão. 
Art. 55. Não se procederá à expulsão quando:
I - a medida configurar extradição inadmitida pela legislação brasileira;
II - o expulsando:
a) tiver filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva ou tiver pessoa brasileira sob sua tutela; [similar à súmula 1 do STF]
b) tiver cônjuge ou companheiro residente no Brasil, sem discriminação alguma, reconhecido judicial ou legalmente;
3.4.2. Deportação
A expulsão não se confunde com a deportação, que ocorre quando a pessoa entra ou permanece de forma irregular dentro de um Estado. 
Art. 50. A deportação é medida decorrente de procedimento administrativo que consiste na retirada compulsória de pessoa que se encontre em situação migratória irregular em território nacional;
Percebe-se que, na deportação, a pessoa não praticou nenhum tipo de crime no Estado Brasileiro nem no Estado estrangeiro, mas ela está de forma irregular em território nacional. De qualquer forma, também não se permite a deportação que possa configurar extradição não admitida no Brasil.
Art. 53. Não se procederá à deportação se a medida configurar extradição não admitida pela legislação brasileira.
3.4.3. “Surrender” (entrega)
Esta hipótese é a prevista em relação ao Tribunal Penal Internacional. O Brasil assinou o Estatuto de Roma (em que há previsão de entrega de pessoas para responder ao Tribunal Penal Internacional, inclusive brasileiros natos). Importante ressaltar que o tratado não admite ressalvas a seus dispositivos e, por isso, muitos questionam como compatibilizar esta entrega ao Tribunal Penal Internacional com a vedação de extradição de brasileiro nato.
A fundamentação constitucional para esse tratado está no art. 5º, § 4º da CF/88:
Art. 5º, § 4º. O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.
O Estatuto de Roma prevê uma distinção entre entrega e extradição com o intuito de diferenciar os dois institutos, pois, em geral, os países não admitem a extradição de seus nacionais originários (não apenas o Brasil). A diferença está para quem a pessoa é entregue – o TPI é formado por diversos países e não apenas de um determinado Estado. Portanto, Marcelo Novelino entende que a entrega ao TPI é compatível com a vedação da extradição de brasileiros natos. 
Estatuto de Roma, Artigo 102. Termos Usados Para os fins do presente Estatuto:
a) Por "entrega", entende-se a entrega de uma pessoa por um Estado ao Tribunal nos termos do presente Estatuto.
b) Por "extradição", entende-se a entrega de uma pessoa por um Estado a outro Estado conforme previsto em um tratado, em uma convenção ou no direito interno.
4. PERDA DA NACIONALIDADE
CF/88, Art. 12, § 4º - Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que:
I - tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional;
II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos:  
a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira;  
b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis;  
I) tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional;[footnoteRef:6] [6: (DPESC-2017-FCC): Sobre o tema da nacionalidade na ConstituiçãoFederal de 1988, é correto afirmar: Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional. BL: art. 12, §4º, I, CF/88.] 
Esta hipótese do inciso I se aplica apenas aos brasileiros naturalizados; não se aplica aos brasileiros natos, porque é uma ação de cancelamento da naturalização, ou seja, é uma ação de cancelamento da nacionalidade secundária.
A única hipótese em que a pessoa pode readquirir a nacionalidade brasileira, neste caso, é por ação rescisória para desconstituir a decisão judicial.
II) adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos:
Em regra, se um brasileiro adquire outra nacionalidade, ele perde a nacionalidade brasileira – entende-se que ele não quer mais a nacionalidade brasileira. As exceções estão previstas na própria CF.
a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira;
Esse dispositivo dá margem a diferentes interpretações. O STF entende que, se a legislação de um outro país reconheceu a nacionalidade originária da pessoa, esta mantém a nacionalidade brasileira, por se tratar de um ato independente da vontade da pessoa. Portanto, a pessoa manteria sua nacionalidade.
b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis.[footnoteRef:7] [7: (MPPE-2002-FCC): Rebeca, brasileira nata, casou-se em país estrangeiro com um natural de lá. Sabendo-se que a lei estrangeira concede automaticamente a nacionalidade local em virtude do casamento, Rebeca não perderá a nacionalidade brasileira, porque assumiu a outra nacionalidade como condição para o exercício do direito ao casamento. BL: art. 12, §4º, II, “b”, CF/88.] 
Neste segundo caso, a naturalização não é voluntária, mas imposta pelo país, para que a pessoa possa permanecer no território ou exercer os direitos civis.
Obs.: Esta hipótese do inciso II se aplica, não só aos brasileiros naturalizados, mas também aos brasileiros natos.
EM RESUMO: Se um brasileiro adquire outra nacionalidade, ele perde a nacionalidade brasileira. Em princípio, ele não quer mais ter a nacionalidade brasileira e, por isso, deixa de ser brasileiro para adquirir a nacionalidade daquele país. Contudo, nas situações previstas nas alíneas “a” e “b”, por não ser uma naturalização voluntária, a pessoa mantém a nacionalidade brasileira.
4.1. Reaquisição da Nacionalidade
Lei 13.445/2017, Art. 76. O brasileiro que, em razão do previsto no inciso II do § 4º do art. 12 da Constituição Federal [aquisição de outra nacionalidade], houver perdido a nacionalidade, uma vez cessada a causa, poderá readquiri-la ou ter o ato que declarou a perda revogado, na forma definida pelo órgão competente do Poder Executivo.
A grande polêmica é: A reaquisição fará da pessoa um brasileiro nato ou naturalizado?
O Professor José Afonso da Silva sustenta que o brasileiro nato que perder a nacionalidade brasileira e depois readquirir volta a ser brasileiro nato. No entanto, esse é um posicionamento minoritário. 
A doutrina majoritária entende que, se o brasileiro nato perde a nacionalidade brasileira, para ele readquiri-la é necessário um ato de vontade. Se é necessário um ato de vontade, ele só readquire a nacionalidade secundária e não a originária.
O brasileiro nato que perder a nacionalidade, caso venha a readquirir a nacionalidade, será brasileiro naturalizado.[footnoteRef:8] [8: (TJSP-2011-VUNESP): A autoridade competente para declarar a perda e a reaquisição da nacionalidade brasileira é o Ministro da Justiça.
OBS: A competência é do PRESIDENTE DA REPÚBLICA, mas, atualmente está competência está delegada ao MINISTRO DA JUSTIÇA, através do DECRETO Nº 3.453, DE 9 DE MAIO DE 2000.]

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