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Operações Imobiliárias Unidade 4 Aspectos jurídicos das operações imobiliárias Diretor Executivo DAVID LIRA STEPHEN BARROS Gerente Editorial CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA Projeto Gráfico TIAGO DA ROCHA Autoria LEONARDO GOMES DE AQUINO MILENA BARBOSA DE MELO AUTORIA Leonardo Gomes de Aquino Sou formado em Direito, com uma experiência técnico-profissional na área de Direito Empresarial de mais de 15 anos. Mestre em Direito. Pós-Graduado em Direito Empresarial. Pós-graduado em Ciências Jurídico Empresariais. Pós-graduado em Ciências Jurídico Processuais. Especialização em Docência do Ensino Superior. Autor na área jurídica, colunista e articulista em diversas revistas nacionais e internacionais. Autor dos Livros: (1) Curso de Direito Empresarial: Teoria geral e direito societário; (2) Legislação aplicável à Engenharia; (3) Propriedade Industrial. Conferencista. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Empresarial. Colaborador na Rádio Justiça. Membro da Comissão de Direito Empresarial da OAB/DF. Ex-Presidente da Comissão Nacional de Direito Empresarial da ABA. Diretor da RIEX DF. Membro Associado da TMA BRASIL (Turnaround Management Association). Professor do Uniceub, do Unieuro, da Escola Superior de Advocacia ESA/DF e do Gran Cursos (Cursinho). Advogado. Milena Barbosa de Melo Possuo graduação em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (2004). Doutora em Direito Internacional pela Universidade de Coimbra. Mestre e Especialista em Direito Comunitário pela Universidade de Coimbra. Atualmente sou Professora Universitária. Como jurista atuo principalmente nas seguintes áreas: Direito Internacional Público e Privado, Jurisdição Internacional, Direito Empresarial, Direito do Desenvolvimento, Direito da Propriedade Intelectual e Direito Digital. Por isso fomos convidados pela Editora Telesapiens a integrar seu elenco de autores independentes. Estamos muito felizes em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte conosco! ICONOGRÁFICOS Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez que: OBJETIVO: para o início do desenvolvimento de uma nova compe- tência; DEFINIÇÃO: houver necessidade de se apresentar um novo conceito; NOTA: quando forem necessários obser- vações ou comple- mentações para o seu conhecimento; IMPORTANTE: as observações escritas tiveram que ser priorizadas para você; EXPLICANDO MELHOR: algo precisa ser melhor explicado ou detalhado; VOCÊ SABIA? curiosidades e indagações lúdicas sobre o tema em estudo, se forem necessárias; SAIBA MAIS: textos, referências bibliográficas e links para aprofundamen- to do seu conheci- mento; REFLITA: se houver a neces- sidade de chamar a atenção sobre algo a ser refletido ou dis- cutido sobre; ACESSE: se for preciso aces- sar um ou mais sites para fazer download, assistir vídeos, ler textos, ouvir podcast; RESUMINDO: quando for preciso se fazer um resumo acumulativo das últi- mas abordagens; ATIVIDADES: quando alguma atividade de au- toaprendizagem for aplicada; TESTANDO: quando o desen- volvimento de uma competência for concluído e questões forem explicadas; SUMÁRIO Introdução aos contratos ........................................................................ 14 Ideias acerca do contrato .......................................................................................................... 14 Princípios norteadores dos contratos ........................................................... 15 Princípio da autonomia privada ......................................................................... 15 Princípio do consensualismo ............................................................................. 17 Obrigatoriedade ............................................................................................................ 17 Relatividade dos efeitos do contrato .......................................................... 18 Supremacia da ordem pública e dos bons costumes ...................... 19 Boa-fé objetiva ............................................................................................................... 19 Princípio da equivalência material das obrigações ........................... 20 Função social do contato ...................................................................................... 20 Formação do contrato ................................................................................................................ 20 Negociações preliminares ................................................................ 21 Proposta ou oferta ....................................................................................22 Aceitação ........................................................................................................23 Contrato preliminar e o contrato definitivo ............................24 Contratos imobiliários ..............................................................................26 Contrato de promessa de compra e venda .................................................................26 Obrigações decorrentes do compromisso de compra e venda ..................28 Conteúdo do contrato de promessa .................................................................................29 A execução do contrato de promessa de compra e venda ............................29 Contrato de compra e venda ................................................................................................. 30 Elementos do contrato de compra e venda ............................................................... 31 Efeitos do contrato .........................................................................................................................33 Cláusulas e regras especiais à compra e venda ......................................................33 Retrovenda ..........................................................................................................................................34 Preferência ou perempção ......................................................................................................34 Contrato de troca ou permuta ........................................................................... 36 Contrato de locação ................................................................................................. 36 Garantias contratuais ................................................................................40 Conceito de garantia.................................................................................................................... 40 Como se justifica a garantia .................................................................................................. 40 Tipos de garantias .......................................................................................................................... 41 Direitos reais em garantia ...................................................................42 Direitos reais de garantia .....................................................................44 Requisitos para validade da garantia real ..................................................45 Hipoteca ............................................................................................................................. 46 Características .......................................................................................... 48 Modalidades de hipoteca .................................................................. 49 Publicidade das hipotecas .............................................................. 49 Instituição de loteamento ou condomínio no imóvel hipotecado .................................................................................................... 50 Extinção da hipoteca ............................................................................ 50 Extinção da garantia, inadimplementoe execução da dívida .................................................................................................................. 51 Contrato de corretagem .........................................................................54 Tipos de pessoas que podem ser corretores .........................................55 Característica do contrato de corretagem ............................................... 56 Obrigações do corretor e do comitente ..................................................... 58 Objeto e conteúdo do contrato de corretagem ................................... 59 Requisitos para validade do contrato de corretagem ....................60 Remuneração do corretor.....................................................................................60 Como construir um contrato de corretagem...........................................62 9 UNIDADE 04 Operações Imobiliárias 10 INTRODUÇÃO Você sabia que o profissional que atua na área imobiliária é um dos mais demandados no mercado brasileiro, e poderá também atuar como corretor de imóveis ou mesmo ter uma empresa na área de corretagem, por exemplo? Isso abrange as operações envolvendo a corretagem de imóveis e as transações imobiliárias sob a ótica do corretor, abordando os aspectos técnicos e jurídicos inerentes à profissão e ao seu vasto campo de atuação. Por isso, é importante compreender as regras legais desse ramo de atuação que só cresce no Brasil. Esta unidade tem o objetivo geral de discorrer acerca das operações imobiliárias, especialmente os contratos vinculados a essa atividade. Diante disso, apresentamos o seguinte questionamento introdutório: Qual a importância do estudo e quais os tipos de contratos na área das operações imobiliárias? As operações imobiliárias estão vinculadas ao direito civil e ao direito do consumidor, em especial às relações jurídicas entre os contratantes. Para compreender a importância do estudo, temos que observar os seguintes objetivos específicos: (i) estruturar o arcabouço de um contrato padrão, identificando suas variantes em função da natureza do objeto contratual; (ii) identificar elementos cruciais em contratos de transações imobiliárias, ajustando e adequando esses elementos de modo a gerar segurança jurídica para as operações e seus atores; (iii) mensurar o valor e qualificar as principais garantias contratuais, compreendendo as previsões legais de execução em caso de inadimplência, rescisão ou outro tipo de evento transacional envolvendo contratos imobiliários; e (iv) elaborar contratos de corretagem de modo a gerar segurança jurídica ao corretor e ao seu cliente. Operações Imobiliárias 11 Justifica-se o estudo das transações imobiliárias por causa do crescente comércio de unidades imobiliárias no Brasil, seja por meio dos programas do Governo Federal, como “minha casa minha vida”, seja na vontade do sujeito de ter a sua casa própria em que boa parte da parcela dos empreendimentos são construídos em forma de condomínio. A ideia de possuir moradia própria leva os indivíduos a adquirir empreendimentos, nas cidades brasileiras, o padrão de construção na modalidade de empreendimento condominial é crescente e se faz necessário descobrir e aprender como os negócios e contratos imobiliários se desenvolvem, em especial na formação, duração, garantias e espécies contratuais que envolvem este tipo de relação jurídica que são as operações imobiliárias. Vamos construir o conhecimento a partir do direito condominial e para tanto vamos analisar os seguintes pontos: (a) introdução aos contratos; (b) contratos imobiliários; (c) garantias contratuais; e (d) contrato de corretagem. Entendeu? Ao longo desta unidade letiva você vai mergulhar nesse universo! Operações Imobiliárias 13 OBJETIVOS Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 4. Nosso objetivo é auxiliar você no desenvolvimento das seguintes competências profissionais até o término desta etapa de estudos: 1. Estruturar o arcabouço de um contrato padrão, identificando suas variantes em função da natureza do objeto contratual. 2. Identificar elementos cruciais em contratos de transações imobiliárias, ajustando e adequando esses elementos de modo a gerar segurança jurídica para as operações e seus atores. 3. Mensurar o valor e qualificar as principais garantias contratuais, compreendendo as previsões legais de execução em caso de inadimplência, rescisão ou outro tipo de evento transacional envolvendo contratos imobiliários. 4. Elaborar contratos de corretagem de modo a gerar segurança jurídica ao corretor e ao seu cliente. “Nossa maior fraqueza está em desistir. O caminho mais certo de vencer é tentar mais uma vez”. Thomas Edison Operações Imobiliárias 14 Introdução aos contratos OBJETIVO: Ao término deste capítulo você será capaz de entender como funciona a relação contratual imobiliária. Isso será fundamental para o seu estudo. Este conteúdo tem por finalidade instruir o estudante ou profissional da área imobiliária sobre as operações envolvendo a corretagem de imóveis e as transações imobiliárias sob a ótica do corretor, abordando os aspectos técnicos e jurídicos inerentes à profissão e ao seu vasto campo de atuação. As pessoas que tentaram estudar e compreender o condomínio, as cobranças e despesas condominiais, o direito de vizinhança e a posse sem a devida instrução tiveram problemas ao aplicar o direito e ao exercer a profissão. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Ideias acerca do contrato As relações jurídicas denominadas de contrato decorrem de um negócio jurídico, tendo em vista ser essa uma maneira de auto regulamentar, por meio de uma declaração de vontade, o interesse econômico patrimonial dos contratantes e que deve ser adimplido pelas partes, sob pena de sanção. Os contratos são relações jurídicas decorrentes de negócios jurídicos bilaterais. Todo contrato possui riscos, alguns admissíveis outros inadmissíveis, o que os torna inseridos em ambiente de risco. Se o risco estiver dentro da área normal, teremos um contrato comutativo, se o risco estiver fora da área normal, temos um contrato aleatório. À criação de um contrato, as partes se submetem a uma relação jurídica, na busca de algo, que no caso das transações imobiliárias é um bem imóvel, de forma direta ou por meio de uma aproximador, que o corretor. Em suma, os contratantes estão realizando uma operação econômica jurídica tendo como objeto final a celebração de aquisição de um bem em regra imóvel. Operações Imobiliárias 15 Por isso, Aquino (2015, p. 70) afirma que: Este é o motivo determinante da importância da compreensão das funções essenciais do contrato como modo de realização do conjunto de interesses e finalidades dos respectivos sujeitos. Nessa perspectiva, o contrato deve corresponder às funções a que ele é chamado a desenvolver e que emergem do sistema jurídico, unilateralmente e dinamicamente reconstruído. Assim, o poder de desencadear efeitos jurídicos pela conclusão de acordos entre sujeitos justifica-se e se explica em razão das necessidades que eles têm, para proverem à satisfação dos seus interesses pessoais, profissionais e etc., de realizar negócios jurídicos de conteúdo e natureza muito variados, é por isso, a função que cada um deles desempenha e os caracteriza própria e distintamente, sendo também em razão dela esboçado o respectivo regime jurídico. Sendo assim, o contrato é uma relação jurídica em que as partes contratantes se vinculam por meio da autonomia privada para produzir efeitos legais estipulados pelos contratantes. Princípios norteadores dos contratos São princípios norteadores dos contratos: princípio da autonomia privada ou da vontade, princípio do consensualismo, princípio da relatividade dos efeitos dos contratos, princípio da obrigatoriedade, princípio da soberaniada ordem pública, princípio da boa-fé, princípio da equivalência material das obrigações e princípio da função social do contrato. Princípio da autonomia privada A vontade humana é um dos elementos caracterizadores dos contratos, porque as partes têm a liberdade de criar regras para regular a sua vida privada. Sendo assim, os contratantes podem criar qualquer tipo de contrato ou regra jurídica contratual, desde que não proibida pela lei. Então, ao realizar uma oferta de venda do imóvel ou oferta de compra, o sujeito está vinculando a sua manifestação de vontade e, se aceita pela outra parte, irá gerar o contrato. Operações Imobiliárias 16 A autonomia privada representa, no direito contratual, a própria vontade dentro da norma, portanto o contrato sem vontade não é contrato. O contrato observado pela ideia da autonomia privada nos mostra duas vertentes importantes: (i) autonomia material e (ii) autonomia conflitual. Vejamos como o Código Civil nos apresenta a autonomia privada: Art. 421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato. Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual. Dentro desse prisma legislativo podemos afirmar que, no âmbito material, as partes contratantes têm a liberdade de contratar e de não contratar, a liberdade de escolha com quem vai contratar e a liberdade de escolha do conteúdo do contrato. Figura 1 - Liberdades A liberdade não é ampla, pois há necessidade de complementação para adquirir direitos, como no caso do registro no cartório de imóveis. Há limitações na redação dos contratos em virtude de que cláusulas abusivas não têm valor jurídico. De contratar ou não contratar Do contéudo do contrato Há situações de impedimentos legais de contratação, como no caso de contrato entre descendentes e ascendentes e entre cônjuges. De escolha com que vai contratar Liberdade Fonte: Elaborado pelos autores (2021). EXEMPLO: Antônio decide abrir uma empresa e, para tanto, procura um ponto comercial para instalar a sua nova loja de doces. Estuda diversos locais (imóveis) por alguns meses e, ao final, seleciona dois deles. Entra em contato com os respectivos proprietários e inicia as negociações preliminares. Antônio decide prosseguir com as negociações com Beto. Ambos discutem os termos do futuro contrato e celebram um contrato preliminar para evitarem prejuízos. Há diversos contratos definitivos que Operações Imobiliárias 17 podem ser celebrados, tais como locação, compra e venda, comodato, built suit ou mesmo locação com opção de compra. Depois de diversas reuniões negociais, as partes resolvem celebrar um contrato de locação comercial pelo prazo de 5 (cinco) anos. Este exemplo nos mostra bem a caracterização do princípio da autonomia da vontade. No âmbito conflitual, as partes têm o direito de escolha do juízo que irá julgar problemas envolvendo o próprio contrato que fora assinado, como em caso de inadimplemento das obrigações, mas como em boa parte esses contratos estão subordinados ao direito do consumidor, tal amplitude é proibida, pois o juiz competente e regra é o domicílio do consumidor. Princípio do consensualismo Neste princípio, é a concordância das partes contratantes em relação ao objeto e ao preço, no caso do contrato de compra e venda de imóveis. IMPORTANTE: De forma que as partes ao manifestarem as suas vontades que são antagônicas, onde uma parte quer pagar o menor preço possível em relação àquele objeto e a outra quer receber o maior preço em relação àquele objeto. Quando passamos a ter um consenso acerca das regras contratuais, temos o contrato acordado, ou seja, temos a confiança que o contratante irá cumprir a obrigação pactuada. Obrigatoriedade Seu fundamento é o de que, o contrato, se atendidos todos os pressupostos e requisitos legais, é lei entre as partes. Constitui-se na segurança do comércio jurídico. Dessa forma, a obrigatoriedade contratual estabelece para as partes o dever de adimplir as obrigações conforme contrato, dentro do tempo e condições contratadas. Operações Imobiliárias 18 Em caso de inadimplemento, a parte prejudicada poderá requerer em juízo do cumprimento forçado da obrigação contratual. O contrato obriga justamente por ser um instrumento adequado para garantir a estabilidade da ordem jurídica e social, por meio da combinação dos interesses individuais com a utilidade social. Por isso, uma vez celebrado o contrato, as obrigações contratadas passam a ser irretratáveis (em regra não podem se arrepender, salvo permissão no contrato) e intangíveis (as partes não podem unilateralmente modificar as regras contratadas). Relatividade dos efeitos do contrato O contrato gera efeitos, inicialmente aos contratantes, mas por força da vontade das partes ou por força da lei, os contratos podem também gerar efeitos para terceiros. O contrato poderá acarretar efeitos em relação a terceiros nos seguintes casos: no contrato de seguro de vida, o beneficiário será um terceiro (previsão legal). As partes podem estipular uma cláusula para que atinja um terceiro se o mesmo concorda com a regra. IMPORTANTE São formas contratuais de estender os efeitos em relação ao terceiro: • Estipulação em favor de terceiro: o terceiro será beneficiado pelo contrato, como por exemplo, o sujeito “A” compra dos sujeitos “B” um bem imóvel, mas coloca no contrato que o imóvel será registrado no nome do terceiro “C”. • Promessa de fato de terceiro: nessa situação o terceiro será obrigado a cumprir a prestação, como por exemplo: o sujeito “A” e o sujeito “B” celebram o contrato de compra e venda, sendo que o terceiro “C” será o obrigado a pagar o preço, caso concorde. • Contrato com pessoa a declarar: Nesse tipo de relação jurídica o terceiro terá o bônus e o ônus do contrato se aceitar. Vejamos o exemplo: O sujeito “A” contrata com o sujeito “B” e há uma Operações Imobiliárias 19 estipulação de que o sujeito “B”, que é adquirente no prazo estipulado, irá indicar um terceiro que vai pagar o imóvel e também terá o registro do bem em seu nome, caso concorde com o bônus e ônus atribuído a ele. Supremacia da ordem pública e dos bons costumes A liberdade de contratar encontra limite na supremacia da ordem pública e dos bons costumes, visto que as partes estão proibidas de criarem regras que afrontem o direito (normas protecionistas). Em suma, é preponderância do interesse social sob o interesse privado nas relações privadas e interindividuais. Assim, a liberdade de contratar (autonomia privada) estará sempre balizada pelos princípios maiores da coletividade, os quais, em seu conjunto, constituem a chamada ordem pública. Boa-fé objetiva A boa-fé objetiva foi positivada pelo Código Civil no art. 113, relativo à interpretação contratual, no art. 187, que trata do abuso de direito, como mecanismo de limitação, e no art. 422, como cláusula geral de boa-fé (mecanismo de integração), que deve ser observada pelos contratantes, no âmbito dos contratos internos e no âmbito dos contratos internacionais. No espectro do Direito, agir em conformidade com a boa-fé é adotar o comportamento jurídico e normalmente esperado dos agentes econômicos ativos e probos em determinado mercado, sempre de acordo com o Direito. IMPORTANTE: Antes de sua positivação pelo Código Civil (BRASIL, 2002), a boa-fé objetiva já podia ser verificada Código de Defesa do Consumidor nos arts. 4º, III, e 51, IV. Evidentemente, o fato de poder ser aplicada ao Direito Civil (deixando de se restringir ao Direito do Consumidor), disseminou sua aplicação no campo dos contratos. Operações Imobiliárias 20 A boa-fé objetiva é uma cláusula aberta de obediência necessária e obrigatória (norma cogente) e seu descumprimento pode propiciar o desfazimento do contratocom a imputação das perdas e danos à parte faltosa. Princípio da equivalência material das obrigações Segundo este princípio, as obrigações assumidas no momento da celebração do contrato devem se manter equilibradas no momento da execução do contrato. Se o contrato for celebrado de maneira desequilibrada, teremos a incidência da lesão contratual, que irá acarretar a revisão ou anulação do contrato. Se, no entanto, o desequilíbrio surgir somente após a celebração por causa imprevista e extraordinária, capaz de gerar uma onerosidade excessiva para uma parte e, para outra, uma desvantagem econômica, teremos a possibilidade de o prejudicado pedir a revisão ou a resolução do contrato, conforme seu interesse. Função social do contato A função social do contrato consiste em abordar a liberdade contratual em seus reflexos sobre a sociedade (terceiros) e não apenas no campo das relações entre partes que estipulam (contratantes). O princípio da função social do contrato é uma norma geral do ordenamento jurídico de ordem pública, pelo qual o contrato deve ser necessariamente visualizado e interpretado de acordo com o contexto da sociedade. Diante disso, para se analisar a função social do contrato, há de se partir da relação do contrato com o seu meio social externo. Formação do contrato Os contratos não nascem de “forma automática”, sendo necessária uma oferta e uma aceitação. A conjugação adequada da proposta e da aceitação irá gerar a formação do contrato, pois não há contrato sem uma oferta e sem uma aceitação. Operações Imobiliárias 21 Negociações preliminares A negociação preliminar consiste no modo eficiente de conseguir o que se almeja. E, para existir, se faz necessário observar a existência de alternativas a serem escolhidas, e a quem essas alternativas envolvem. Assim, as alternativas se apresentam como os interesses comuns e conflitantes, o que gera da guerra a paz, com a finalização do contrato, por força do ponto de equilíbrio alcançado pelas partes acerca dos termos do contrato. Dessa forma, a negociação preliminar consiste nas conversações precedentes, indagações e estudos sobre a vontades e os interesses das partes, vislumbrando a possibilidade de um acordo futuro, sem que ocorra a obrigação de realizar o contrato, sem qualquer responsabilidade contratual, mas podendo ocorrer responsabilidade por culpa extracontratual (por exemplo, perda de uma venda). A fase pré-contratual não cria obrigações contratuais, mas pode gerar o direito de indenização conforme o caso concreto, visto que na fase das tratativas preliminares só há uma análise de probabilidades, sem intenção definitiva de contratação. Antes da proposta, primeiro temos as negociações preliminares (sondagens preliminares e/ou as tratativas preliminares), nas quais ainda não há vinculação, embora as partes essencialmente tenham que cultivar a mais absoluta boa-fé e probidade, no sentido de as tratativas não indicarem expectativas na outra parte, no sentido de dar como certa a celebração do pacto, realizando despesas ou deixando de contratar com outrem. Isso porque o art. 422 do Código Civil (BRASIL, 2002), não inviabiliza a aplicação pelo julgador do princípio da boa-fé nas fases pré- contratual e pós-contratual, ou seja, durante as negociações preliminares e após a execução do contrato, quando tal exigência decorrer da natureza do contrato da lei dos usos e das exigências da razão e da equidade. Mamede (2010, p. 147) propõe o seguinte exemplo acerca do contrato de compra e venda para elucidar a questão: EXEMPLO: Que quadro lindo? Quem o pintou? Operações Imobiliárias 22 • É um óleo sobre tela de Miguel Gontijo, um importante pintor mineiro contemporâneo. É um dos raros pintores que trabalham com realismo fantástico. • Quanto custa? R$10.000,00. E parcelo em três vezes, sem juros. • O senhor não faz mais barato. Na primeira pergunta o autor afirma a existência de uma mera sondagem, mas, ao indagar o valor do quadro, estaríamos perante as negociações preliminares. Contudo, ao atribuir o valor e as condições de pagamento, estaríamos perante a proposta. Figura 2 - Gráfico de projeção das fases para alcançar o contrato definitivo Negociações preliminares Proposta Aceitação Contrato preliminar facultativo Contrato Definitivo Fonte: Elaborado pelos autores (2021). Isso demonstra que as negociações preliminares antecedem a formação do contrato preliminar, bem como do definitivo. Proposta ou oferta A proposta é uma declaração receptiva de vontade, dirigida pelo proponente (policitante ou ofertante) ao aceitante (policiado), com a finalidade de formação de um contrato (efeitos determinados pela norma). A proposta poderá ser direcionada ao público, por isso o art. 429 do Código Civil (BRASIL, 2002) declara que “a oferta ao público equivale à proposta quando encerra os requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das circunstâncias ou dos usos” e, normalmente, entende-se que é limitada ao estoque existente. O Código de Defesa do Consumidor tem um único dispositivo sobre interpretação dos contratos: “As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor” (art. 47). A regra legal deverá ser aplicada aos contratos que decorram de uma relação entre um consumidor e um fornecedor, tendo em vista o prisma da hipossuficiência do consumidor. Por isso, no momento de analisar uma questão envolvendo Operações Imobiliárias 23 o consumidor, deve-se ter em mente os seguintes aspectos: (i) como as partes vinham celebrando e executando os contratos; (b) na dúvida, o negócio deve ser analisado de forma a proteger a menor onerosidade; (c) as regras e cláusulas contratuais devem ser observadas e analisadas dentro do contexto em que foram pactuadas, observando o contrato como um todo; (d) por ser um contrato de adesão, as cláusulas devem ser interpretadas a favor do aderente, que no caso é consumidor. A proposta deve ser verbal (oral) ou escrita, expressa ou tácita, séria (bases razoáveis de mercado), precisa, firme, consciente, clara, inequívoca, compreensível, concreta e completa (contendo preço, objeto, tempo de entrega etc.), pois vincula o proponente e, por ser um negócio unilateral receptivo, deve ser dirigida a um sujeito determinado ou determinável, sendo que nessa situação caracteriza-se como oferta ao público. O art. 427 do Código Civil (BRASIL, 2002) estipula que “a proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso”. Em nome da segurança jurídica e do princípio da irrevogabilidade, a proposta obriga o ofertante, que não poderá voltar atrás, salvo as exceções legais de retirada da oferta (art. 427 e 428 do Código Civil (BRASIL, 2002) ou se ocorrer o arrependimento, situação na qual responderá pelas arras ou por perdas e danos (se injustamente retirar a oferta). Assim, a proposta perde a sua eficácia nas seguintes situações: (a) se o contrário (a não obrigatoriedade) resultar dos termos dela; (b) se o contrário (a não obrigatoriedade) resultar da natureza do negócio; e (c) se o contrário (a não obrigatoriedade) resultar das circunstâncias do caso. Aceitação A aceitação da proposta, ou seja, aquele momento em que a contratante aceita (adere ou reconhece) os termos da proposta realizada, manifestando a sua vontade de contratar, dentro do prazo estabelecido ou de um prazo razoável, que poderia fazê-lo de forma expressa ou tácita, com o que estará vinculando-se ao outro contratante surgindo, assim, dessa conjugação de vontades, o contrato. Operações Imobiliárias 24 IMPORTANTE: A aceitação deve ser externada, podendo ser expressa (declarada - seja pessoalmente, ou por outras vias acrescidas pela sociedade contemporânea, avulta o consenso, dispensando-se formalidades) ou tácita (comportamentoconcludente, como o início da execução), escrita ou verbal, pelo silêncio ou decorrer de um comportamento declaratório, como no caso de mímica. O critério adotado pelo Código Civil (BRASIL, 2002), acerca do momento da celebração do contrato entre ausentes, é o da teoria da expedição, ao afirmar que os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida. Contrato preliminar e o contrato definitivo As partes podem estipular um contrato preliminar (promessa de compra e venda) ou o contrato definitivo de compra e venda. Na promessa de compra e venda, as partes assinam o instrumento e assumem a obrigação de, no futuro, celebrarem o contrato definitivo. Deve obedecer às regras legais do contrato definitivo, salvo quanto à forma. O contrato definitivo está concluído com a proposta e aceitação em união. É importante ressaltar que o contrato definitivo tem fins distintos, pois cada contrato tem uma regra diferente e visa situações diferentes. Cada contrato tem um objeto peculiar. Na compra e venda, por exemplo, as prestações, que constituem o seu objeto, são a entrega do objeto, por parte do vendedor, e o pagamento do preço, pelo adquirente. Operações Imobiliárias 25 RESUMINDO: E então? Gostou do que lhe apresentamos? Aprendeu tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente compreendeu o tema estudado deste capítulo, vamos resumir tudinho o que vimos. Inicialmente, compreendemos a estrutura do Direito Contratual, observando as regras de negociações preliminares, como poderá ocorrer a oferta e a aceitação do contrato. Além dos princípios norteadores dos contratos, que se não observados tais princípios, as partes podem ter prejuízos econômicos que podem acarretar o cancelamento do documento. Assim, no texto, buscamos identificar as variantes contratuais em função do objeto contratual que, no caso das operações imobiliárias, podem variar conforme o tipo de contrato celebrado. Dessa forma, a autonomia privada é a vontade do contratante em celebrar determinado contrato, com determinadas pessoas, observando determinadas regras legais, previstas na lei e estipuladas pelas partes. Após o exercício da autonomia das partes e ocorrendo a conciliação das vontades, por meio do princípio do consensualismo, as regras pactuadas no contrato obrigam os contratantes, de forma que o contrato faz lei entre eles. E por força das regras legais, os contratantes devem se guiar pelo princípio da supremacia da ordem pública e dos bons costumes e da função social do contrato (contexto social do contrato), se limitar a não pactuar regras ilegais, pois o princípio da boa-fé objetiva faz com os contratantes observem, durante todo o transcorrer da relação contratual, a proibição de comportamentos maliciosos ou mesmo lesivos aos interesses do contrato. As partes, ao celebrarem contratos de execução no tempo, acabam por estipularem regras e situações que, projetadas no futuro, podem não se concretizar, por isso, o direito permite que, caso as prestações estipuladas no contrato não forem equivalentes materialmente no futuro, será permitido revisão do contrato, observando as regras legais. Operações Imobiliárias 26 Contratos imobiliários OBJETIVO: Identificar elementos cruciais em contratos de transações imobiliárias, ajustando e adequando esses elementos de modo a gerar segurança jurídica para as operações e seus atores. Podemos apontar os seguintes contratos imobiliários: (a) promessa de compra e venda; (b) contrato de compra e venda; (c) permuta ou troca; (d) contrato de locação. Contrato de promessa de compra e venda Promessa de compra e venda, contrato promessa, contrato preliminar ou pré-contrato deve ser compreendido como o negócio jurídico ajustado com caráter preliminar, no qual alguém (promitente- comprador) promete concluir, no futuro, um contrato definitivo com outro sujeito (promitente-vendedor). A promessa de compra e venda é um contrato preliminar e, para produzir os efeitos necessários, deve observar as regras legais (art. 462 a 466 do Código Civil/2002). Primeiramente, as partes contratantes estipulam que, em um momento futuro, irão realizar o contrato definitivo. Como os contratantes assinaram a promessa de contrato, é formado com qualquer outra modalidade de negócio jurídico bilateral, ou seja, é necessário verificar a existência, a validade e a eficácia da relação. Sendo assim, trata-se de um negócio, formado como qualquer outra modalidade de contrato, ou seja, no qual se verifica a existência necessária de um acordo de vontades das partes contratantes, denominadas de promitentes, que possuem interesses antagônicos, visando constituir uma relação negocial patrimonial definitiva no futuro. As partes, muitas vezes, desejam celebrar um contrato de compra e venda, conciliam o preço e o objeto, mas convencionam que o contrato só se celebrará, em caráter definitivo, em momento posterior a esse acordo. Operações Imobiliárias 27 Assim, ficam vinculadas entre si, mas apenas para a celebração do contrato definitivo em data posterior. A esse acordo preventivo dá-se o nome de promessa de compra e venda. Daí dizer que o pacto preliminar de compra e venda é um acordo visando fazer com que os contratantes que o integram, posteriormente realizem outro contrato, este definitivo, dentro das bases negociais celebradas anteriormente, sobre o preço, a coisa e condições. Por isso, a promessa de compra e venda faz parte dos negócios bilaterais preliminares, pois os contratantes não visam modificar direta e efetivamente a situação mas, apenas, criar a obrigação de, no futuro, arcar com o compromisso. A promessa de compra e venda é negócio jurídico bilateral que produz obrigações para ambos os contratantes, ou seja, o promitente vendedor se obriga a vender a coisa e o promitente comprador a pagar o preço. Trata-se de um contrato preliminar de compra e venda que acarreta a obrigação de celebrar (assinar) o contrato principal e definitivo, que no caso seria a compra e venda do imóvel. A justificativa da existência do contrato preliminar de compra e venda decorre da ideia que as partes nem sempre têm todos os elementos para que possa celebrar o contrato principal, que é a compra e venda. Por isso, vinculam-se a um compromisso preliminar e irretratável, salvo previsão de arras (cláusula de arrependimento), expressa no pacto preliminar. IMPORTANTE: A promessa de compra e venda se distingue do contrato de compra e venda, visto que aquele tem como objetivo a conclusão deste. A promessa de compra e venda pode ser um compromisso de comprar ou vender, enquanto a compra e venda constitui uma aquisição definitiva, capaz de gerar o direito de registro da transferência da propriedade. O Código Civil (BRASIL, 2002), no art. 463, parágrafo único, determina que o contrato preliminar deve ser registrado no cartório competente, no entanto, tal obrigação, se realizada, terá efeito erga omnes, ou seja, o contrato preliminar sem registro continua a ter validade e eficácia perante Operações Imobiliárias 28 os promitentes contratantes. Se um dos promitentes não realizar a sua obrigação, que é assinar o contrato principal, a outra parte poderá exigir judicialmente adimplemento da obrigação. Obrigações decorrentes do compromisso de compra e venda Podemos apresentar as seguintes obrigações decorrentes do compromisso de compra e venda. As obrigações do promitente vendedor são: a. Realizar a entrega da coisa, ou seja, o promitente vendedor é obrigado a realizar o contrato definitivo que determina a transferência do direito que possui. b. Ao celebrar o contrato definitivo, surgirá a responsabilidade pelos vícios da coisa. c. Obrigação de garantir ao promitente comprador a posse indireta da coisa, respondendo após a conclusão do contrato definitivo pela evicção. d. A obrigação de outorgar ou assinar o contrato definitivo de comprae venda, tão logo o preço seja integralmente pago pelo promitente comprador, a fim de possibilitar ao promitente comprador o exercício pleno do direito de propriedade, salvo a situação de aquisição com a limitação do domínio (alienação fiduciária, por exemplo). e. Obrigação de obter a anuência dos demais promitentes vendedores na alienação de parte de coisa em condomínio. As obrigações do promitente comprador são: a. Pagar o preço, uma vez que o promitente comprador está obrigado a pagar integralmente o preço ajustado em contrato para conquistar o direito de propriedade. A obrigação é apenas do valor do preço ajustado podendo, conforme o contrato, o pagamento ser parcelado ou até mesmo por financiamento. Operações Imobiliárias 29 b. Obrigação de receber a coisa, após a conclusão do contrato definitivo. c. Obrigação de firmar o contrato definitivo de compra e venda, a fim de desonerar o promitente vendedor dos encargos que porventura incidam sobre a coisa vendida. Conteúdo do contrato de promessa Exceto quanto à forma, a promessa de compra e venda deve conter todos os elementos obrigatórios ao contrato a ser celebrado (assinado). O contrato deverá conter: a qualificação das partes, o objeto do contrato, preço e condições de pagamento, prazo de validade, arras e eleição do foro, entre outras cláusulas. A execução do contrato de promessa de compra e venda A execução do contrato de promessa de compra e venda irrevogável se efetiva das seguintes formas: • Pela celebração do contrato definitivo de compra e venda. • Pela sentença de adjudicação compulsória da coisa prometida, com efeito de declaração de vontade do promitente vendedor. • Resolução (extinção pelo inadimplemento do contrato). • Resilição (desistência e distrato). Na promessa de compra e venda de imóveis, nenhuma das partes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o adimplemento do outro. Os dois promitentes, comprador e vendedor, assumiram a obrigação de realizar o contrato definitivo de compra e venda, tão logo se verifique o pagamento integral do preço (ou contrato de financiamento) estipulado no contrato preliminar. Portanto, o contrato definitivo de compra e venda não é outro negócio jurídico, mas o definitivo, o negócio necessário para a aquisição Operações Imobiliárias 30 da propriedade, que comprova expressamente o adimplemento da obrigação oriunda do contrato preliminar. No entanto, nas hipóteses de uma das partes não vir a adimplir a obrigação, que é a assinatura do contrato definitivo de compra e venda, cabe à outra parte requerer em juízo o cumprimento da obrigação ou o ressarcimento com perdas e danos provocados pelo inadimplemento do contrato de promessa de compra e venda. Esgotado o prazo poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isso se opuser a natureza da obrigação. VOCÊ SABIA? O mecanismo judicial que o credor tem para obrigar a outra parte a cumprir o acordo é a execução ou a adjudicação compulsória. Contrato de compra e venda O ponto fulcral na criação do contrato de compra e venda é a existência da moeda como padrão de aquisição de mercadorias. Por isso, é possível afirmar que a compra e venda decorre da evolução natural da economia, notadamente com a universalização da moeda (com valor em pecúnia, que permanece até a atualidade), superando o contrato de permuta, quando uma coisa era trocada por outra e evoluindo do rem por rem (coisa por coisa) para ganhar uma feição rem pro pretio (coisa por dinheiro). O contrato de compra e venda objetiva a troca de bens por dinheiro. Um contratante (vendedor) compromete-se a transferir a propriedade de um bem para o patrimônio de outrem (comprador), mediante o pagamento do preço em uma quantia em dinheiro ou documento equivalente (cheque). Operações Imobiliárias 31 O Código Civil (BRASIL, 2002), o enuncia desta forma: “art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro”. O contrato de compra e venda pode ser classificado: sinalagmático (tem duas vontades – prestação e contraprestação), oneroso (pagamento em dinheiro), consensual (as partes se obrigam pelo acordo), comutativo (as obrigações das partes são equilibradas), em regra, formação livre (salvo em caso de aquisição de imóvel que deve ser por escrito), de adesão (as cláusulas contratuais são construídas apenas por um contratante) e de execução no tempo (pelo menos uma das prestações é realizada no futuro), em regra. O contrato de compra e venda não transfere a propriedade do bem, pois se faz necessário o registro do documento no cartório de imóveis, para que ocorra a transferência da propriedade. Elementos do contrato de compra e venda Os elementos essenciais do contrato de compra e venda são três: (a) coisa (res); (b) preço (pretium); e (c) consenso (consensus). Quando se fala em elementos essenciais da compra e venda, deve-se ter em vista a sua natureza específica, a par dos elementos constitutivos em geral, comum a todos eles, como pressupostos (requisitos) de existência e de validade. A venda de imóvel por pessoa casada necessita de outorga conjugal, salvo as exceções legais. O art. 1.656 do Código Civil (BRASIL, 2002) permite que “os nubentes ao escolher o regime da participação final de aquestos convencionem a livre disposição de bens particulares”. Operações Imobiliárias 32 Quadro 1 - Tipos de regimes e autorização de venda Regime Outorga Comunhão parcial Necessita Comunhão Universal Necessita Separação Total de bens (Absoluta) Convencional Não necessita Obrigatória ou Legal Depende Participação final de Aquestos Pacto antenupcial permite Não necessita Pacto antenupcial omisso Necessita Fonte: Elaborado pelos autores (2021). É legal a celebração do contrato de compra e venda entre pessoas casadas, com relação a bens não incluídos na comunhão (art. 499 do Código Civil/2002), ou seja, os bens exclusivos de cada cônjuge podem ser alienados ao outro. Aqueles comuns aos cônjuges não poderão ser vendidos entre eles, por ser objeto proibido por lei, logo o ato negocial de venda será nulo (art. 166, II do Código Civil/ 2002). A venda dos bens imóveis de ascendentes a descendentes deve revestir de autorização expressa (não pode ser tácita) dos demais descendentes (filhos, netos, bisnetos, trinetos, etc.) e do cônjuge ou do companheiro do alienante, pois caso contrário será anulável a venda (princípio da disponibilidade do interesse privado). Em caso de venda de bem imóvel que esteja em condomínio é necessário, inicialmente, que o alienante da cota parte conceda o direito de preferência aos demais condôminos e somente em caso de recusa deles poderá oferecer a terceiros (art. 504 do Código Civil/2002). Em relação ao objeto do contrato é possível que os contratantes o façam da seguinte forma: ad mensuram ou ad corpus. Operações Imobiliárias 33 Figura 3 - Tipos de venda quanto ao objeto É aquela feita como coisa certa e determinada com relação a bens imóveis, mesmo que isto não conste expressamente no contrato. Nesse caso, nao interessa o tamanho da área, motivo pelo qual não se pode exigir complementação ou devolução do excesso de uma área. ad corpus É aquela feita por medida de extensão (metro quadrado, alqueire, hectare). É toleravel a variação de área de 1/20 (ou 5%) do imóvel. Temos a presunção juris tantum de tolerância. ad mensuram Tipo de venda quanto ao objeto Fonte: Elaborado pelos autores (2021). Efeitos do contrato O principal efeito é a obrigação do vendedor de entregar a coisa e seus acessórios, transferindo a propriedade ao comprador, e este, o de pagar o preço, na forma e valor acordados. Além dele, existe a obrigação de o vendedor garantir a efetividadedo direito sobre a coisa, responsabilizando-se pelos prejuízos decorrentes da evicção e de eventuais vícios aparentes e redibitórios. Outra consequência diz respeito à responsabilidade pelos riscos quanto à coisa, antes da tradição ou registro, que correm por conta do vendedor, uma vez que, até este momento, a propriedade do bem lhe pertence. Mas, se o fato se der posteriormente, sem culpa do vendedor, este terá o direito ao preço, sendo que o comprador sofrerá as consequências, por já ser o proprietário. Cláusulas e regras especiais à compra e venda São cláusulas e regras especiais próprias que podem ser inseridas nos contratos de compra e venda de imóveis: a retrovenda e a preferência ou perempção. Operações Imobiliárias 34 Retrovenda Trata-se de cláusula em que o vendedor se reserva o direito de reaver, em certo prazo, o imóvel alienado, restituindo ao comprador o preço, mais despesas por ele realizadas, inclusive as empregadas no melhoramento do imóvel (art. 505 do Código Civil/2002). EXEMPLO: António vende para Maria um imóvel que possui a cláusula de retrovenda pelo prazo de 3 (três) anos. Assim, António dentro deste prazo poderá comprar a coisa vendida, mesmo que Maria não deseje vender, pagando o preço recebido mais o reembolso das despesas a Maria. Se Maria recusar o recebimento dos valores e de transferir o imóvel a António, poderá este requerer judicialmente o seu direito, depositando os valores em juízo. Art. 508. Se as duas ou mais pessoas couber o direito de retrato sobre o mesmo imóvel, e só uma o exercer, poderá o comprador intimar as outras para nele acordarem, prevalecendo o pacto em favor de quem haja efetuado o depósito, contanto que seja integral. São características da retrovenda: 1) só é possível em bens imóveis; 2) o prazo máximo é de três anos; 3) o direito é intransmissível inter vivos, podendo ser transferido apenas aos herdeiros; 4) cabe ação reivindicatória; 5) os frutos e rendimentos ficam com o comprador; 7) o perecimento por caso fortuito ou força maior extingue o direito de resgate. Preferência ou perempção É a regra estipulada no contrato, no qual o adquirente de um bem fica no dever de oferecê-lo novamente ao vendedor, por meio de notificação, caso resolva vendê-lo ou dar em dação de pagamento, para que este tenha o direito de usar a cláusula de preferência em relação a terceiros. Art. 513. A preempção, ou preferência, impõe ao comprador a obrigação de oferecer ao vendedor a coisa que aquele vai vender, ou dar em pagamento, para que este use de seu direito de prelação na compra, tanto por tanto. Operações Imobiliárias 35 Parágrafo único. O prazo para exercer o direito de preferência não poderá exceder a cento e oitenta dias, se a coisa for móvel, ou a dois anos, se imóvel. A cláusula de preferência também poderá ser usada pelo vendedor, notificando o comprador quando desejar alienar o bem (art. 514 do Código Civil/ 2002). Tanto o comprador como o vendedor que desejar fazer uso da cláusula de preferência é obrigado a manter as mesmas regras contratuais, em especial o preço e condições de pagamento. O direito de prelação é intransferível, mesmo em caso de herança. São características deste tipo de cláusula: 1) o direito é personalíssimo; 2) o prazo máximo é de 180 dias para bem móvel e de dois anos para os imóveis; 3) deve conter uma notificação. Após a notificação para o exercício do direito de preferência, conforme o prazo estipulado no contrato, não podendo ser superior a 2 (dois) anos em caso de imóveis. Mas, se não existir prazo estipulado pelas partes no contrato, o Código Civil (BRASIL, 2002), determina que o prazo será 60 (sessenta) dias contados do recebimento da notificação, para o exercício do direito de prelação. EXEMPLO: António e Maria possuem o direito de preferência em caso de venda do imóvel, caso um deles deseje não exercer o direito de preferência, por qualquer motivo, o outro deverá exercê-lo na sua totalidade (art. 516 do Código Civil/ 2002). Caso não seja concedido o direito de preferência, ou seja, o vendedor do bem não informar, ao titular do direito de preleção, que irá vender o bem, responderá por perdas e danos, podendo o adquirente responder solidariamente, se tiver agido de má-fé. Em caso de desapropriação do bem, o titular do direito de preferência não poderá reclamar em juízo o seu direito, salvo se o motivo da desapropriação não for observado pela administração pública (art. 519 do Código Civil/2002). Operações Imobiliárias 36 Contrato de troca ou permuta O contrato de troca ou permuta ocorre quando as partes estipulam a transferência de bens entre si, sendo possível a complementação em dinheiro, desde que o valor da complementação seja inferior a 50% (cinquenta por cento) do valor do bem imóvel. O Código Civil (BRASIL, 2002), estipula que: Art. 533. Aplicam-se à troca as disposições referentes à compra e venda, com as seguintes modificações: I - salvo disposição em contrário, cada um dos contratantes pagará por metade as despesas com o instrumento da troca; II - é anulável a troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes, sem consentimento dos outros descendentes e do cônjuge do alienante. A preferência do condômino na aquisição de parte indivisa (Código Civil, art. 504/2002) e a do locatário, quanto ao imóvel locado posto à venda (Lei nº 8.245/1991, art. 27), são exemplos de preferência legal, não podendo ser mudadas por regra contratual. Contrato de locação O contrato de locação poderá ser de bens móveis ou imóveis. No caso dos bens imóveis, poderá ser residencial e não residencial. A legislação que trata da locação de bens imóveis residenciais e não residenciais é a Lei nº 8.245/1991. Locação é o contrato pelo qual o locatário (possuidor direto) paga uma certa remuneração ao locador (possuidor indireto), para ter o uso e gozo de certo bem imóvel. A remuneração é livremente estipulada entre as partes e o prazo de contrato poderá ser por dia, por temporada, ou mesmo outro tempo convencionado. Mas, se as locações forem ajustadas “por escrito e por prazo igual ou superior a trinta meses, a resolução do contrato ocorrerá findo o prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso” (art. 46 da Lei nº 8.245/1991). Operações Imobiliárias 37 Poderá ser estipulada a cláusula de respeito, segundo a qual, se o bem for alienado, o novo proprietário deverá aguardar o resto do contrato de locação para tirar a posse do inquilino. Só valerá se registrada em cartório, porém, no caso de no caso de inexistência da cláusula, o novo proprietário deverá aguardar o prazo de 90 (noventa) dias para que o locatário desocupe o imóvel. Em caso de inadimplemento, poderá o locador requerer a cobrança do aluguel em atraso ou, se desejar retirar o inquilino do imóvel, poderá intentar ação de despejo. O contrato de locação poderá ser celebrado por escrito ou verbal e a relação jurídica poderá ser desfeita por mútua vontade (distrato), por descumprimento das obrigações previstas na lei ou em contrato, por falta de pagamento dos encargos e do aluguel ou, então, pela necessidade de reformas urgentes determinadas pelo Poder Público. A legislação permite que o locador possa estabelecer as seguintes formas de garantia no contrato de locação: “I - caução; II - fiança; III - seguro de fiança locatícia; IV - cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento”. É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação (art. 37 da Lei nº 8.245/1991). Caso o locador deseje alienar, prometer a venda ou ainda cessão do direito de aquisição do imóvel ou dação em pagamento, o inquilino terá o direito de prelação em relação ao imóvel locado, sempre em iguais condições com os demais interessados, sendo necessário que o locador realize a notificação ao inquilino, paraque o mesmo possa exercer o seu direito de preferência. E caso não seja dado ao inquilino o direito de preferência, o mesmo poderá adquirir o direito de aquisição, depositando o valor da venda em consignação em pagamento, situação na qual será revertida a venda em favor do inquilino. Na locação não residencial, o contrato para produzir os efeitos da lei deverá ser realizado por escrito, por prazo de cinco anos, ou quando a soma deles perfazer cinco anos e que os últimos três, dos cinco, sejam na mesma atividade. Operações Imobiliárias 38 Preenchidos os requisitos legais, o inquilino terá o direito à renovação compulsória pelo prazo do último contrato. O shopping center possui regras diferenciadas da locação comum, por ser uma atividade peculiar, com características próprias. O shopping center não é um empreendimento imobiliário comum, pois é organizado de forma a haver uma oferta de produtos e serviços centralizados em seu complexo. Essa organização é chamada de tenant mix. Por isso, deverão prevalecer as regras pactuadas entre as partes, no contrato de aluguel em shopping center, salvo as questões processuais. RESUMINDO: E então? Gostou do que lhe apresentamos? Aprendeu tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente compreendeu o tema estudado deste capítulo, vamos resumir tudinho o que vimos. Identificamos os principais contratos imobiliários, apresentando as regras jurídicas permitidas no momento da contratação. Os principais contratos apresentados foram: promessa de compra e venda, Contrato de compra e venda, contrato de troca e o contrato de locação. Promessa de compra e venda, contrato promessa, contrato preliminar ou pré-contrato deve ser compreendido como o negócio jurídico ajustado com caráter preliminar, no qual alguém (promitente-comprador) promete concluir no futuro, um contrato definitivo com outro sujeito (promitente-vendedor). A promessa de compra e venda distingue do contrato de compra e venda, visto que aquele tem como objetivo a conclusão deste. A promessa de compra e venda pode ser um compromisso de comprar ou vender, enquanto a compra e venda constitui uma aquisição definitiva, capaz de gerar o direito de registro da transferência da propriedade. O contrato de compra e venda objetiva a troca de bens por dinheiro. Um contratante (vendedor) compromete-se a transferir a propriedade de um bem para o patrimônio de outrem (comprador), mediante o pagamento do preço em uma quantia em dinheiro ou documento equivalente (cheque), podendo as partes estipularem regras especiais, como o direito de preferência ou mesmo de retrovenda. Operações Imobiliárias 39 RESUMINDO: A principal consequência do contrato de compra e venda é a obrigação do vendedor de entregar a coisa e seus acessórios, transferindo a propriedade ao comprador, e a de este pagar o preço, na forma e no preço acordados. O contrato de troca ou permuta ocorrerá quando as partes estipulam a transferência de bens entre si, sendo possível a complementação em dinheiro, desde que o valor da complementação seja inferior a 50% (cinquenta por cento) do valor do bem imóvel. Locação é o contrato pelo qual o locatário (possuidor direto) paga uma certa remuneração ao locador (possuidor indireto), para ter o uso e gozo de certo bem imóvel, podendo ter como objeto um imóvel para locação residencial ou não residencial e, no caso deste, há regras específicas que conferem ao inquilino o direito de renovação compulsória. Mas, no caso dos contratos de locação de espaço em shopping center, as regras estipuladas pelas partes se sobrepõem. Operações Imobiliárias 40 Garantias contratuais OBJETIVO: Mensurar o valor e qualificar as principais garantias contratuais, compreendendo as previsões legais de execução em caso de inadimplência, rescisão ou outro tipo de evento transacional envolvendo contratos imobiliários. Conceito de garantia A expressão garantia, em sentido lato sensu, quer dizer proteção ou segurança que se dispensa a alguém que é titular de um direito subjetivo ou de um poder jurídico, no sentido de que possa efetivamente exercitá-lo, ou que, ocorrendo falha ou omissão de uma vantagem ou possibilidades jurídicas originalmente devidas, possam ser essas falhas ou omissões supridas mediante o acionamento de uma situação equivalente e substitutiva das primeiras. EXEMPLO: O sujeito “A” celebra um contrato de empréstimo com a instituição financeira no valor X para a aquisição de um imóvel. A instituição financeira poderá celebrar um contrato de alienação fiduciária em garantia ou constituir um direito real de garantia, denominado hipoteca. Como se justifica a garantia As operações de crédito que as instituições financeiras costumam realizar, mediante as quais investem ou empregam, junto a terceiros, recursos que no momento possuem disponíveis, serão em si mesmas providas ou desprovidas de garantias especiais. As do primeiro tipo representam os negócios que, na linguagem bancária, são chamados de cobertos; os segundos, envolvem os negócios ditos sem cobertura ou em branco. A garantia, no assunto em foco, é todo meio hábil a excluir ou reduzir perigos capazes de impossibilitar a restituição dos valores com que o banco operou. Operações Imobiliárias 41 Não se pode esquecer que o dinheiro emprestado pelos bancos a crédito foi muitas vezes por eles recebido a crédito, o que, frequentemente, não é todo seu. Está nisso a mais forte das razões que invocam para cerca de maior segurança os negócios de empréstimos de dinheiro. Os direitos reais de garantia estão vinculados a uma limitação, visto que têm por finalidade asseverar o cumprimento de uma prestação ou obrigação contratual. Por isso, as garantias são acessórias, pois devem assegurar uma dívida ou obrigação. Tipos de garantias O direito permite diversas formas de garantias, algumas de forma pessoal e outras de forma real. As garantias pessoais também são denominadas de fidejussória, que é aquela garantia em que a obrigação do devedor é garantida por um terceiro, assim, se o credor não receber a obrigação do devedor poderá, conforme o caso, cobrar do terceiro a dívida. Figura 4 - Tipos de garantia fidejussória ou pessoal Fiança Aval Garantia pessoal Somente concedida por meio de contrato Somente concedida em títulos de crédito Fonte: Elaborado pelos autores (2021). O aval é uma garantia fidejussória, autônoma e independente, que somente poderá ser utilizada nos títulos de crédito. A fiança é uma garantia acessória e dependente do contrato principal. A hipoteca, o penhor, a anticrese e a alienação fiduciária são modalidades de direitos reais, que fornecem algum tipo de garantia ao credor. As garantias reais são divididas em duas espécies: Operações Imobiliárias 42 Figura 5 - Tipos de garantias reais Direitos reais de garantia Direitos reais de garantia Garantia real Procuram assegurar o adimplemento da obrigação mediante a instituição de um direito real titulado pelo credor sobre o bem da propriedade do devedor O adimplemento da obrigação é garantido pela transferência do bem onerado à propriedade do credor. Fonte: Elaborado pelos autores (2021). Aquino (2009, p. 222) dispôs o seguinte: As garantias reais classificam-se em duas categorias: direitos reais de garantia e direitos reais em garantia. Dessa forma, os direitos reais de garantia procuram assegurar o adimplemento da obrigação mediante a instituição de um direito real titulado pelo credor sobre o bem da propriedade do devedor. Por vezes, a posse direta do bem onerado é transmitida ao titular da garantia real, como o penhor comum, mas em nenhuma hipótese o devedor deixa de ser o seu proprietário, podendo até mesmo, se achar interessado, alienar o bem gravado. A seu turno, nos direitos reais em garantia, o adimplemento da obrigação é garantido pela transferência do bem onerado à propriedade do credor. Osujeito ativo da obrigação garantida passa a titular a propriedade resolúvel do bem. Aqui, também, por vezes, a posse direta do bem onerado é transmitida ao titular da garantia, como na cessão fiduciária do direito creditório, por vezes fica em mãos do devedor, na condição de depositário. Direitos reais em garantia Os direitos reais em garantia têm, como seu principal meio, o contrato de alienação fiduciária, que é uma propriedade resolúvel. A Súmula 308 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que “a hipoteca (ou alienação fiduciária) firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”. Operações Imobiliárias 43 O Código Civil (BRASIL, 2002) estipula que: Art. 1.361. Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor. § 1º Constitui-se a propriedade fiduciária com o registro do contrato, celebrado por instrumento público ou particular, que lhe serve de título, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, ou, em se tratando de veículos, na repartição competente para o licenciamento, fazendo- se a anotação no certificado de registro. § 2º Com a constituição da propriedade fiduciária, dá- se o desdobramento da posse, tornando-se o devedor possuidor direto da coisa. § 3º A propriedade superveniente, adquirida pelo devedor, torna eficaz, desde o arquivamento, a transferência da propriedade fiduciária. O contrato que instituir a alienação fiduciária deverá conter as regras do art. 104 do Código Civil (BRASIL, 2002) e também o valor total da dívida, a época de pagamento, podendo ser a prazo, o valor da taxa de juros incidente no contrato e a exposição descritiva do bem que incide o contrato de alienação fiduciária. O sujeito que concede à instituição financeira a propriedade fiduciária poderá usar do bem como depositário e, caso não seja realizado o pagamento, deverá devolver o bem à instituição financeira que estará proibido de ficar com o bem para quitar a dívida e, caso prevista tal possibilidade, a mesma será nula. Diante da proibição, a instituição financeira deverá proceder à venda por meio de processo judicial ou administrativo, a terceiros. O resultado apurado da venda será para quitar a dívida e, se o saldo for a maior, deverá ser entregue ao devedor, mas se o saldo for a menor, o devedor continuará a ser devedor pela diferença. O terceiro adquirente da coisa sub-roga-se nos direitos emergentes da sua aquisição, tornando-se proprietário da coisa. Operações Imobiliárias 44 Direitos reais de garantia Os direitos reais de garantia são aqueles em que o devedor, ou alguém no lugar dele, entrega em garantia um determinado bem para garantir a dívida do devedor. As garantias reais são direitos reais, que estão predeterminados na lei, ou seja, somente são garantias reais as previstas na lei. Figura 6 - Direitos reais de garantia Hipoteca Penhor Direitos reais O bem dado em garantia é um imóvel O bem dado em garantia é um móvel Anticrese O bem dado em garantia é um direito Fonte: Elaborado pelos autores (2021). Ao conceder a garantia, o titular do bem não concede ao credor o direito de usar e gozar da coisa gravada e tão pouco usufruir de seus frutos e produtos. E no caso da dívida não ser paga pelo devedor, o credor poderá executar o próprio bem. Aquino (2009, p. 224-225) dispõe que: No caso de hipoteca, penhor e alienação fiduciária, ocorrendo à impontualidade, o bem dado em garantia é oferecido à penhora e o produto por ele alcançado na praça destina-se ao pagamento da obrigação assumida. No caso da anticrese o bem é transferido para que possa com as rendas produzidas pelo mesmo efetuar o pagamento, após o pagamento o bem volta ao domínio do proprietário. O credor, ao exigir o cumprimento do seu direito, poderá requerer em juízo o pagamento da dívida, mas não poderá exigir que o bem fique com ele, pois o valor apurado com a venda irá pagar a dívida e, se não for suficiente, o devedor continua devendo. Por outro lado, se o valor arrecadado com a venda for superior, paga-se a dívida e o restante devolvem ao devedor. Operações Imobiliárias 45 Requisitos para validade da garantia real Para que a estipulação da garantia real tenha validade jurídica, é fundamental que preencha os requisitos legais e, caso não observe essas regras legais, o negócio jurídico da garantia poderá ser considerado anulável ou nulo. Esses elementos estão previstos no art. 104 do Código Civil (BRASIL, 2002), que estipula: “(i) Agente capaz; (ii) objeto lícito, possível e determinável ou determinado; e (iii) forma prescrita ou não defesa em lei”. Mas há necessidade dos contratantes, ao estipularem o tipo de garantia, observarem também se o consentimento das partes (vontade) decorre de uma declaração de vontade sem vícios, que podem acarretar os defeitos jurídicos (art. 142 a 159 do Código Civil/2002). O agente capaz é o maior de idade ou o emancipado, contudo, o incapaz pode conceder a garantia real, mas deverá ser representado ou assistido, de autorização judicial. Outro ponto imprescindível de observância é o caso de os contratantes serem casados. Nesse caso, deve-se ter a autorização conjugal para prestarem a garantia. Caso o bem esteja vinculado a um inventário, a parte ideal de um herdeiro poderá ser dada em garantia, assim como o inventariante poderá hipotecar os bens do acerto da herança, mas nesse caso deverá ter autorização no inventário. O Código Civil (BRASIL, 2002), estipula, no art. 1.420, § 2.º, que o imóvel que se encontra em condomínio poderá ser dado em hipoteca, desde que haja autorização dos demais condôminos. Em relação ao sujeito, se faz necessário observar a seguinte regra legal: Art. 1.420. Só aquele que pode alienar poderá empenhar, hipotecar ou dar em anticrese; só os bens que se podem alienar poderão ser dados em penhor, anticrese ou hipoteca. § 1º A propriedade superveniente torna eficaz, desde o registro, as garantias reais estabelecidas por quem não era dono. § 2º A coisa comum a dois ou mais proprietários não pode ser dada em garantia real, na sua totalidade, sem o consentimento de todos; mas cada um pode individualmente dar em garantia real a parte que tiver. Operações Imobiliárias 46 Em relação ao objeto dado em garantia, deve-se observar qual o tipo de garantia concedida. Pode ser um bem imóvel, móvel ou um direito, mas é importante que o sujeito que concedeu o direito real em garantia seja titular do bem. Art. 1.419. Nas dívidas garantidas por penhor, anticrese ou hipoteca, o bem dado em garantia fica sujeito, por vínculo real, ao cumprimento da obrigação. Em relação à forma de celebração da garantia, é fundamental que seja realizada de forma escrita, dada a necessidade de especialização e publicidade. A especialidade é a necessidade de descrever detalhadamente o objeto dado em garantia, bem como o valor da dívida, prazo de pagamento e taxa da de juros se existir (art. 1.424 do Código Civil/2002). A publicidade ocorrerá com o registro da garantia no cartório. Se o bem for imóvel, caberá hipoteca, que será registrada no cartório e registro de imóveis. Se o bem for móvel, caberá penhor, a publicidade ocorrerá com a tradição do bem. O direito de garantia “vinculado a certo bem móvel ou imóvel é um direito real por ter efeito erga omnes (contra todos).” Hipoteca A hipoteca em geral tem como objeto um bem imóvel, salvo as situações previstas na lei que determina que os navios, os aviões e os motores de aviões, entre outros, podem ser objetos dados como garantia a dívidas. Somente os objetos que se podem ceder poderão ser hipotecados. Dessa forma, a hipoteca incide sobre bens imóveis, embora possa recair, em casos especiais, sobre bens imóveisque, por lei, são passíveis de ser hipotecados sem perderem a mobilidade natural. Art. 1.473. Podem ser objeto de hipoteca: I - os imóveis e os acessórios dos imóveis conjuntamente com eles; II - o domínio direto; III - o domínio útil; Operações Imobiliárias 47 IV - as estradas de ferro; V - os recursos naturais a que se refere o art. 1.230, independentemente do solo onde se acham; VI - os navios; VII - as aeronaves; VIII - o direito de uso especial para fins de moradia; (Incluído pela Lei n.º 11.481, de 2007) IX - o direito real de uso; (Incluído pela Lei n.º 11.481, de 2007). X - a propriedade superficiária. (Incluído pela Lei n.º 11.481, de 2007). § 1º A hipoteca dos navios e das aeronaves reger-se-á pelo disposto em lei especial. (Renumerado do parágrafo único pela Lei nº 11.481, de 2007). § 2º Os direitos de garantia instituídos nas hipóteses dos incisos IX e X do caput deste artigo ficam limitados à duração da concessão ou direito de superfície, caso tenham sido transferidos por período determinado. Observe que a hipoteca será outorgada por escritura pública. Pode ser concedida tanto pelo devedor da obrigação de que é garantia, como por terceiro, titular do domínio ou propriedade da coisa que lhe serve como objeto. O Código Civil (BRASIL, 2002), estipula que “é nula a cláusula que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento” (Art. 1.428). Da mesma, forma, será nula a cláusula que “que proíbe ao proprietário alienar imóvel hipotecado” (Art. 1.475 o Código Civil/2002). E claro é que, quando realizada por terceiro, o credor (a instituição bancária) que com ela se irá garantir, exigirá que seu outorgante se obrigue a substituí-la e reforçá-la, desde que expressamente previsto no contrato (Art. 1.427 do Código Civil/2002). Os bens que possuem dois ou mais titulares estão em estado de condomínio e, por serem indivisíveis (um apartamento com vários donos), podem ser hipotecados, mas necessitam de anuência de todos os donos. Operações Imobiliárias 48 Agora, se o bem for de vários donos, mas passível de divisão (como uma fazenda) é possível realizar a divisão da terra e cada um conceder a hipoteca da sua parte, porém não será possível hipotecar mais do que possui como dono (art. 1.314, e art. 1.420, § 2º, do Código Civil/2002). Características As principais características da hipoteca são: (i) sequela e preferência; (ii) posse; (iii) indivisibilidade; e (iv) acessoriedade. É direito real de garantia sobre coisa alheia, porque esse direito se prende à coisa que fica sujeita à solução da obrigação. Por isso, a hipoteca, assim como os demais direitos reais de garantia, se encontra munida da prerrogativa de sequela e do direito de preferência. Pode, também, a hipoteca, propiciar a venda judicial da coisa dada em garantia, para o credor poder receber a quantia que lhe é devida, preferencialmente a qualquer outro credor do devedor, exceto pelas custas judiciais, tributos e salário do trabalhador. É preciso não esquecer que o próprio Código Civil (BRASIL, 2002), inclui a hipoteca entre os direitos reais (art. 1.225, inc. IX). A hipoteca admite que o devedor ou terceiro hipotecante continue na posse do bem gravado. Pelo art. 1.428, do Código Civil (BRASIL, 2002), “é nula a cláusula que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento”. Contudo, após o vencimento, poderá ocorrer a dação em pagamento por parte do devedor, ou seja, para quitar a dívida. A hipoteca é indivisível, no sentido que o ônus real grava o bem em sua totalidade (art. 1.474, do CC), por isso, enquanto não quitada a obrigação por inteiro, o bem ainda permanecerá gravado e ligado à dívida como um todo. A hipoteca é um direito acessório, não há garantia sem que haja dívida. Nessas condições, o pacto complementar da hipoteca segue o destino da dívida principal, extinguindo-se quando está para se extinguir, salvo no caso de a obrigação principal ser considerada nula, a garantia apenas será considerada inexistente, mas não nula. Operações Imobiliárias 49 Não se admite no direito brasileiro a hipoteca abstrata, onde é constituída independente do seu crédito ou obrigação. Modalidades de hipoteca A hipoteca convencional “é aquela que deriva da livre anuência das partes e em que, para assegurar a execução de uma obrigação, o devedor, ou alguém designado por ele, oferece bens em garantia de seu cumprimento” (RODRIGUES, 2005, p. 403). A hipoteca convencional realiza-se por contrato bilateral. Para a sua constituição, exige-se: a) que o sujeito que concedeu a hipoteca deve ser o titular do bem, que irá garantir o adimplemento da dívida ou obrigação pecuniária principal; b) que o sujeito que concedeu a hipoteca deve ter a capacidade de ceder o bem; c) que o negócio de concessão da hipoteca tenha observado a forma prescrita na lei (escritura pública ou particular); d) que a titularidade esteja devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis que lhe é peculiar. A hipoteca legal é determinada por lei, concedida a certos e determinados credores, de maneira a gerar uma proteção no recebimento do seu crédito, por estarem em situação que a norma especial e por seus bens estarem sob gestão alheia. Publicidade das hipotecas O devedor ou terceiro prestador da garantia não podem renunciar ao direito de constituir várias hipotecas, de forma sucessiva ou não, sobre o mesmo imóvel, o que se denomina de “sub-hipotecas”. Nada obsta uma segunda ou uma terceira hipoteca sobre o mesmo bem, em favor do mesmo ou de outro credor. Desde que o valor do bem dado em garantia exceda o da obrigação garantida pela hipoteca e deixe margem para a nova garantia, é possível a pluralidade de hipotecas. Operações Imobiliárias 50 Instituição de loteamento ou condomínio no imóvel hipotecado Nenhuma dúvida há de que o lote de terreno, objeto de registro imobiliário, pode ser alienado e, consequentemente, hipotecado. A mesma certeza se declara com relação ao apartamento ou dependência autônoma de um edifício. Quando um imóvel for hipotecado e nele, posteriormente, for constituído um condomínio, loteado ou desmembrado, ônus real de garantia (hipoteca) vinculará todos os proprietários de maneira correspondente a sua quota parte da dívida ou obrigação. O Código Civil (BRASIL, 2002) determina que “as hipotecas serão registradas no cartório do lugar do imóvel, ou no de cada um deles, se o título se referir a mais de um” (art. 1.492). Extinção da hipoteca A hipoteca poderá ser extinta, por um dos motivos discriminados na legislação, conforme a regra prevista no art. 1.499, do Código Civil (BRASIL, 2002). Dispõe a regra legal que: A hipoteca extingue-se: I - pela extinção da obrigação principal; II - pelo perecimento da coisa; III - pela resolução da propriedade; IV - pela renúncia do credor; V - pela remição; VI - pela arrematação ou adjudicação. As regras legais de extinção não seguem o padrão da taxatividade, ou seja, é possível outras maneiras de extinção da hipoteca, como por exemplo a anulação do documento que criou a hipoteca ou, ainda, a aquisição do bem hipotecado pelo credor. Operações Imobiliárias 51 Extinção da garantia, inadimplemento e execução da dívida A extinção das garantias reais ocorrerá com o adimplemento da obrigação. O Código Civil (BRASIL, 2002) estipula no art. 1.421, que “o pagamento de uma ou mais prestações da dívida não importa exoneração correspondente da garantia, ainda que esta compreenda vários bens, salvo disposição expressa no título ou na quitação”. O contratante poderá solicitar a resilição unilateral, caso não deseje mais ficar vinculado ao contrato, situação na qual deverá acerca com a indenização por perdas e danos. Poderá, ainda,
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