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D o u t r i n a s B í b l i c a s Os F u n d a m e n t o s d a N o s s a Fé REIS BOOK WILLIAM W. MENZIES STANLEY M. H O R T O N Todos os Direitos Reservados. Copyright © 1995 para a língua portuguesa da Casa Publicadora das Assembléias de Deus. Título do original em inglês: Bible D octrines - A P entecostal Perspective Logion Press/Springfield, Missouri Primeira edição em inglês: 1993 Tradução: João Marques Bentes Projeto Gráfico e Diagramaçâo: Tiago Muhlethaler Capa: Marlon Soares CDD: 230 ־ Doutrina ISBN 85-263-0741-X As citações bíblicas foram extraídas da versão Almeida Revista e Corrigida, edição de 1995, da Sociedade Bíblica do Brasil, salvo indicação em contrário. Para maiores informações sobre livros, revistas, periódicos e os últimos lançamentos da CPAD, visite o nosso site: http://www.cpad.com.br SAC — Serviço de Atendimento ao Cliente: 0800-701-7373 Casa Publicadora das Assembléias de Deus Caixa Postal 331 20001-970, Rio de Janeiro, RJ, Brasil 10a Impressão Tiragem 5.000 http://www.cpad.com.br O estudo das doutrinas bíblicas faz-se cada vez mais indispen- sável, especialmente nestes últimos dias, quando se constata um contínuo aumento de falsos mestres e profetas. Conseqüentemen- te, um número demasiado grande de crentes acha-se agitado de um lado para outro, “levados em roda por todo vento de doutrina, pelo engano dos hom ens que, com astúcia, enganam fraudulosamente” (Ef 4.14). Como se não bastasse, alguns fiéis (talvez sem saberem que “doutrina” é apenas outra palavra para “ensino”) fazem objeção ao estudo das doutrinas, tornando-se vulneráveis aos “ventos de doutrina”. Eis a razão pela qual Deus quer que os crentes cresçam. Mas, para isto, faz-se necessário conhecer os ensinos básicos da Bíblia. Tal conhecimento haverá de proteger-nos dos falsos mestres e profetas. O livro intitulado Understanding Our Doctrine, de autoria do Dr. William W. Menzies, foi originalmente escrito para ser utiliza- do num curso de treinamento intitulado “Pontos Fundamentais para Obreiros da Escola Dominical”. O Dr. Menzies, atual presi- dente do Asia Pacific Theological Seminary (anteriormente Far East Advanced School of Theology), em Baguio, república das Filipinas, deu-me sua bondosa permissão para revisar e ampliar seu excelente livro para uso de todo o povo de Deus. Os capítulos deste livro seguem os 16 artigos da Declaração de Verdades Fundamentais, conforme aceitos pelas Assembléias de Deus. Nosso propósito, entretanto, não é promover as doutrinas das Assembléias de Deus, mas antes, salientar a base e as aplica- ções dessas verdades bíblicas fundamentais. Este estudo, pois, será útil para aqueles que crêem na Bíblia, sem importar sua denominação. Os crentes precisam saber onde estão no tocante às doutrinas da Bíblia. DOUTRINAS BÍBLICAS4 Este livro será útil para os pastores no treinamento de novos convertidos. Os professores de Escola Dominical achá-lo-ão útil tanto para o seu enriquecimento pessoal, quanto para ministrar a seus alunos em idade colegial, proporcionando-lhes sólida base para estudos mais vastos e profundos no campo da teologia. Enfim, esta obra será útil a todos, quer seminaristas, quer leigos, e obreiros de uma forma geral. Desejo agradecer ao Dr. G. Raymond Carlson, superintendente geral das Assembléias de Deus nos Estados Unidos; à Divisão de Missões Estrangeiras das Assembléias de Deus dos Estados Uni- dos; e a todos que, mediante sua generosidade, tornaram possível este projeto. Agradecimentos especiais também são devidos a Glen Ellard e sua equipe editorial por sua ajuda técnica. Para facilitar a leitura, as palavras em hebraico, aramaico e grego foram transliteradas por letras latinas. Stanley M. Horton, Th.D. Emérito Professor de Bíblia e Teologia no Assemblies of God Theological Seminary Sumário Prefácio, 3 Introdução, 9 1. A Inspiração das Escrituras, 15 A Regra Autorizada, 15 A Revelação de Deus à Humanidade, 17 A Verbalmente Inspirada Palavra de Deus, 19 A Regra Infalível, 22 O Cânon e as Traduções mais Recentes, 25 2. O Deus Único e Verdadeiro 33 A Existência de Deus, 36 A Natureza de Deus, 37 Os Atributos de Deus, 39 A Trindade, 42 3· A Deidade do Senhor Jesus Cristo, 49 A Pessoa de Cristo, 49 Os Ofícios de Cristo, 53 A Obra de Cristo, 54 4. A Queda do Homem, 63 A Origem da Humanidade, 63 A Natureza da Humanidade, 67 A Imagem de Deus, 69 A Origem do Pecado, 70 5· A Salvação do Homem, 81 O Conceito de Sacrifício, 81 A Expiação, 82 Resultados da Obra de Cristo no Calvário, 84 A Conversão, 85 6. As Ordenanças da Igreja, 93 Batismo em águas, 93 A Ceia do Senhor , 97 DOUTRINAS BÍBLICAS6 7. O Batismo no Espírito Santo, 103 A Promessa do Pai, 103 Terminologia Bíblica do Batismo, 104 O Propósito do Batismo no Espírito Santo, 105 Recebendo o Batismo no Espírito Santo, 108 8. A Evidência Física Inicial do Batismo no Espírito Santo, Sinais do Derramamento, 113 Funções do Falar em Línguas, 116 Questões Sobre o Falar em Línguas, 116 9. A Santificação, 123 Definindo Termos, 123 Três Faces da Santificação, 125 10. A Igreja e sua Missão, 133 Que é a Igreja? 133 Como Tornar-se Membro da Igreja, 137 A Obra da Igreja, 138 11. O Ministério, 147 Organização da Igreja, 147 Funções do Ministério, 151 A Chamada para o Ministério, 153 12. Cura Divina, 159 O Argumento em Favor das Curas, 159 O Grande Médico, 161 Cura na Expiação, 162 Curas Disponíveis Hoje, 165 Renovação Interior, 166 Ajuda à Fé, 167 As Enfermidades e os Demônios, 168 As Curas e a Profissão Médica, 169 O Propósito da Cura Divina, 170 Por que nem Todos São Curados? 170 13. A Bendita Esperança, 175 A Ressurreição dos Crentes, 175 Jesus Voltará, 176 O Arrebatamento, 179 Sumד ário A Grande Tribulação, 181 O Anticristo, 183 O Tempo da Vinda de Cristo, 184 14. O Reino Milenial de Cristo, 191 A Revelação de Cristo, 191 O Milênio, 192 Pontos de Vista do Milenismo, 193 Promessas Nacionais de Deus a Israel, 197 15. O Julgamento Final, 203 O Destino da Raça Humana, 203 Os Julgamentos, 205 A Rebelião Final de Satanás, 207 O Grande Trono Branco, 207 Lago de Fogo, 208 16. Os Novos Céus e a Nova Terra, 213 O Novo Substitui o Antigo, 213 A Nova Jerusalém, 215 Apêndice: A Declaração Original de 1916 sobre as Verdades Fundamentais, 219 Glossário, 225 Bibliografia, 237 índice de Assuntos, 243 As Assembléias de Deus vieram à existência em resultado do reavivamento pentecostal que começou no princípio do século XX. Este reavivamento teve início como a poderosa e sobrenatural resposta de Deus ao modernismo teológico que já estava tomando conta da maioria das denominações evangélicas na América do Norte e ao redor do mundo. Livros escritos para defender a fé eram ignorados pelos seminários. A possibilidade de milagres operados por Deus era negada. Um vácuo espiritual, por conse- guinte, se estava desenvolvendo de forma irremediável e crônica. Essa época foi assim retratada pelo Dr. William Menzies: Os Estados Unidos, nos anos entre a Guerra Civil e o término do século [XIX], estavam em estado de fermentação social e religiosa. A corrupção moral, política e econômica aumentava as tensões ocasionadas pela organização das diversas classes, pela industrialização e pela imigração. As grandes denominações, bem sucedidas na cristianização das fronteiras, tornaram-se compla- centes e sofisticadas, faltando-lhes a visão e a vitalidade para enfrentarem as necessidades em mutação de uma população aflita. Graus variegados de acomodação à idéias populares, recen- temente importadas da Europa, que assaltavam o evangelicalismo ortodoxo, debilitaram ainda mais as grandes comunhões evangé- licas. Contra a erosão na Igreja de Cristo surgiram os movimentos Fundamentalista e Holiness. Foi principalmente devido às preocu- pações espirituais geradas por esse segmento que nasceu o anseio por um novo Pentecoste. Antes do ano de 1900, havia manifesta- ções carismáticas, mas isoladas e episódicas em suanatureza. Mas estava sendo armado o cenário para o grande derramamento do Espírito Santo que, em breve, tomaria conta da terra, trazendo-nos o grande refrigério dos Últimos Dias. (William W. Menzies, Anointed DOUTRINAS BÍBLICAS10 to Serve: The Story o f the Assemblies o f God, Springfield, Mo.: Gospel Publishing House, 1971, pág. 33.) O atual movimento pentecostal traça sua origem desde ο reavivamento no Bethel Bible College, em Topeka, Kansas, que teve início a Io de janeiro de 1901. Estudantes, com base em seus estudos bíblicos, concluíram que o falar em línguas (ver At 2.4) é a evidência física e inicial do batismo no Espírito Santo. Uma das estudantes, Agnes Ozman, declarou que sentia “como se rios de água viva estivessem saindo de seu ser mais interior”. (Stanley H. Frodsham, With Signs Following, edição revisada, Springfield, Mo.: Gospel Publishing House, 1946, pág. 20.) O reavivamento tornou-se uma verdadeira explosão pentecos- tal quando, em 1906, W. J. Seymour obteve um edifício de dois andares na rua Azusa, 312, em Los Angeles, Estado da Califórnia. Durante cerca de três anos, houve cultos quase que continuamen- te, das dez da manhã à meia-noite. E muitos daqueles que receberam o batismo pentecostal no Espírito Santo foram espalha- dos para propagarem a mensagem. Muitas igrejas pentecostais independentes tiveram início. E então, Depois que os derramamentos pentecostais começaram, apare- ceram numerosas publicações advogando seus ensinos e servindo de canais para fornecer informações e sustentar missionários envi- ados além-mar. Uma dessas publicações, a Word and Witness, editada por Eudorus N. Bell, publicou um convite, em 1913, para uma conferência de crentes pentecostais a ser realizada em Hot Springs, Estado do Arkansas, no ano seguinte. Assim foi realizada a reunião de fundação do Concílio Geral das Assembléias de Deus (Gary B. McGee, “A Bried History of the Modem Pentecostal Outpouring”, Paraclete 18, primavera de 1984, pág. 22). Cinco razões básicas foram apresentadas para a convocação do Concílio Geral, que funcionou entre 2 e 12 de abril de 1914. Os convocados “(1) deveriam atingir uma melhor compreensão e unidade de doutrina; (2) saber como conservar a obra de Deus na própria pátria e no estrangeiro; (3) consultar os órgãos competen- tes quanto à proteção de fundos para os esforços missionários; (4) explorar as possibilidades de unificar as igrejas sob um nome legal; e (5) considerar o estabelecimento de uma escola de treinamento bíblico com uma divisão literária” (In the Last Days: An Early History ofthe Assemblies ofGod, Springfield, Mo.: Assemblies of God, 1962, pág. 11). Mais de trezentas pessoas fizeram-se presentes, e elegeram E. N. Bell como o presidente de sua nova comunhão - as Assembléi- as de Deus. Em 1916, foi preparada uma “Declaração de Verda 11In tro d u çã o des”, primariamente por Daniel Warren Kerr, de Cleveland, Ohio (Carl Brumback, Like a River: The Early Years o f the Assemblies o f God, Springfield, Mo.: Gospel Publishing House, 1977, pág. 55). Este documento foi adotado com o seguinte preâmbulo: Esta declaração de Verdades Fundamentais não tem por intui- to ser um credo da igreja, e nem a base da comunhão entre os cristãos, mas somente o alicerce da unidade para o ministério (ou seja, que todos digamos a mesma coisa, 1 Co 1.10 e At 2.42). A fraseologia empregada em tal declaração não é inspirada e nem a defendemos contenciosamente, mas a verdade nela exposta é considerada essencial para o ministério pleno do Evangelho. Embora não contenha ela toda a verdade da Bíblia, cobre nossas atuais necessidades quanto às questões fundamentais básicas da fé (Concílio Geral das Assembléias de Deus, Atos do Concílio Geral, 2 a 7 de outubro de 1916. A redação foi levemente modificada na atual declaração apresentada em forma de livrete: The General Council of the Assemblies of God Statement of Fundamental Truths, revisado, Springfield, Mo.: Gospel Publishing House, Í983). A declaração original serviu às Assembléias de Deus por muitos anos. Havia pouca insatisfação com qualquer dos 16 artigos. (Originalmente havia 17 artigos. A revisão combinou os artigos 2 e 13, adicionou um artigo sobre a deidade de Cristo, e combinou os artigos 10 e 11, restando assim 16 artigos ao todo.) Visto que algumas das doutrinas haviam sido formuladas de forma muito sucinta, sentiu-se mais tarde a necessidade de se reescrever e ampliar alguns artigos. Em I960, pois, uma comissão pôs-se a trabalhar em cima dessas declarações, surgindo daí uma redação nova e mais detalhada. O trabalho foi aprovado e adota- do pelo Concílio Geral, em 1961. A única mudança significativa foi o abandono da expressão “inteira santificação”, porquanto era compreendida de diferentes maneiras, gerando ambigüidades. Ό esclarecimento de 1961 especificou a crença de que a justiça imputada, outorgada ao crente, por ocasião de sua justificação, deveria ser evidenciada numa vida de santidade” (Menzies, Anointed, pág. 318). A preocupação com a preservação da integridade doutrinária, dentro do movimento, também resultou na promulgação de diver- sas manifestações. Eram estas feitas por ministros das Assembléias de Deus, que sentiam a necessidade de maior ajuda e esclareci- mento sobre vários assuntos atinentes ao campo de trabalho. A maior parte desses documentos foi preparada pela Comissão Sobre Pureza Doutrinária, uma comissão permanente nomeada pelo Pres DOUTRINAS BÍBLICAS12 bitério Executivo das Assembléias de Deus. Os mais diversos pastores, oficiais distritais e professores dos colégios bíblicos e seminários já fizeram parte dessa comissão. As declarações daí resultantes foram aprovadas pelo Presbitério Executivo e pelo Presbitério Geral, sendo a seguir publicadas. Todos os documen- tos, impressos até 1989, eram coligidos e publicados sob o título Where We Stand- Onde Estamos (Springfield, Mo.: Gospel Publishing House, 1990). Seguem-se os títulos desses documentos: (1) “A Inerrância das Escrituras”; (2) “Podem os Crentes Regenerados Ser Possuídos pelos Demônios?”; (3) “Divórcio e Novo Casamento”; (4) “O Ministério do Corpo de Cristo”; (5) “Curas Divinas: Uma Parcela Integral do Evangelho”; (6) “O Movimento do Discipulado e da Submissão”; (7) “Meditação Transcendental”; (8) “Diáconos e Encarregados”; (9) “Punição Eterna”; (10) “Visão das Assembléias de Deus Sobre a Ordenação”; (11) “A Doutrina da Criação”; (12) “A Segurança do Crente”; (13) “Homossexualismo”; (14) “O Arre- batamento da Igreja”; (15) “O Crente e a Confissão Positiva”; (16) “A Evidência Física Inicial do Batismo no Espírito Santo”; (17) “Uma Perspectiva Bíblica sobre o Jogo”; (18) “A Abstinência”; (19) “Uma Perspectiva Bíblica sobre o Aborto”; e (20) “O Reino de Deus Conforme Descrito nas Santas Escrituras”. Desde a publicação de Where We Stand, outro documento que manifesta posição veio a público: “Papel das Mulheres no Minis- tério, Conforme a Descrição das Santas Escrituras”. Há ainda outros trabalhos que surgiram em decorrência de várias necessi- dades. Eles são um valioso suplemento para a nossa compreensão acerca da doutrina e da prática das Assembléias de Deus. Sempre que nos parecer apropriado, parte do material constante nesses trabalhos e documentos será discutida neste livro. Verdade Fundamental A REGRA AUTORIZADA As Escrituras Sagradas, tanto o Antigo quanto o Novo Testa- mento, são inspiradas verbalmente por Deus. Elas são a revelação de Deus à humanidade, e nossa infalível e autorizada regra de fé e conduta (1 Ts 2.13; 2 Tm 3.15,16; 2 Pe 1.21). A REGRA AUTORIZADA Como posso saber qual a verdadeira religião? Eis uma impor- tante pergunta feita com freqüência. Ela merece ser respondida, visto que o bem-estar eterno de quem a faz está em jogo. A questão real é a da autoridade. Há três tipos básicos de autoridade religiosa: (1) a razão humana, (2) a Igreja e (3) a Palavra de Deus. Talvez o tipo maiscomum, hoje, seja a razão humana. Não perderemos tempo discutindo acerca das realizações do intelecto humano. Elas são realmente admiráveis. Nem poremos de lado a necessidade de se manusear os negócios da vida diária de uma maneira lógica. O processo de se abordar problemas de forma a corresponder ao bom senso chama-se racionalidade. Não é pecado agir com a razão. A racionalidade, porém, não deve ser confundida com o racionalismo. O racionalismo é aquela crença que coloca a razão humana como a mais elevada das autoridades. Alegam os racionalistas que, com o tempo, o gênio humano desvendará todos os segredos do Universo, e conduzirá o planeta a uma vida de paz, saúde e prosperidade para todos. Uma forma de racionalismo é o cientismo. Acredita ele que a ciência, com suas metodologias e instrumentos, será capaz de analisar e solucionar todos os problemas que fustigam a raça humana. Entretanto, tal ponto de vista sofre de severas restrições, pois falha em reconhecer a incapacidade da ciência em analisar determinadas coisas. Não pode, por exemplo, trabalhar diretamen- te com a cor e o som. E vê-se obrigada a expressar tais qualidades mediante termos quantitativos. Mas qualidades não são quantida- des. Exemplificando: apesar de os cegos de nascença serem capa- zes de compreender a ciência e a matemática dos comprimentos DOUTRINAS BÍBLICAS16 das ondas da luz, não significa que possam fazer a mínima idéia sobre o pôr-do-sol, a rosa vermelha ou o estranho colorido das asas da borboleta. O mesmo se pode dizer dos surdos. Embora possam vir a compreender a ciência e a matemática das ondas sonoras, jamais terão qualquer idéia acerca de uma sinfonia, ou de uma congregação que louva a Deus e glorifica a Jesus, no Espírito Santo. Á ciência é incapaz de estudar elementos que não possam ser pesados ou medidos, como a alma humana. E nem pode tratar com ocorrências ímpares, como os milagres, pois estes são uma mani- festação distinta e separada da graça e do poder de Deus. Logo, o milagre não pode ser repetido para análise em laboratório. Na realidade, os que tomam o racionalismo como sua autorida- de terminam por aceitar a própria razão como autoridade suprema. Mas, conforme Salomão observou: “Nada há de novo abaixo do sol”, esse mesmo tipo de arrogância também se manifestava nos tempos antigos. No capítulo 11 de Gênesis, lemos sobre aqueles que tentaram desafiar a Deus, edificando uma torre altíssima, em Babel. Os racionalistas de todos os séculos assemelham-se a estes: põem sua confiança final na própria capacidade de raciocinar. Nos dias dos juizes, “cada qual fazia o que parecia direito aos seus olhos” (Jz 17.6 e 21.25). O caos e a confusão, resultantes dessa atitude, são claramente retratados nas trágicas histórias registradas no livro de Juizes. A segunda crença comum aponta a Igreja como a autoridade suprema. Alguns alegam que, já que o Cristo outorgou sua autoridade a Pedro, este, ao impor as mãos sobre os bispos que ordenara, conferiu-lhes automaticamente a mesma autoridade. E, assim, surgiu a cadeia sucessória de Pedro. Através da “sucessão apostólica”, a autoridade vem sendo transmitida desde Cristo, através dos doze apóstolos, atravessando os séculos. Com base nessa idéia, certas igrejas consideram-se acima das demais, arro- gando-se como as únicas representantes autorizadas de Cristo. Seus líderes, por isso, procuram exercer uma autoridade que o Senhor jamais lhes outorgou. Associada ao ponto de vista da sucessão apostólica, acha-se a asserção de que o Novo Testamento é um produto da Igreja, conferindo a esta uma espécie de prioridade sobre a Bíblia. Devemos observar, no entanto, que a teoria da sucessão apostó- lica não apareceu senão já no segundo século de nossa era. Outrossim, o concilio de Cartago, efetuado em 397 d.C., jamais autorizou o cânon dos livros do Novo Testamento que hoje reconhecemos como inspirados pelo Espírito Santo. Limitou-se, porém, a corroborar o que já era reconhecido por todas as igrejas 17A In sp iração d as Escrituras da época. A morte de Cristo pôs a Nova Aliança em vigor (ver Hb 9.15-17). Após a sua ressurreição, Ele e o Espírito Santo trouxeram a Igreja à existência. Ato contínuo, o Espírito Santo inspirou os escritores que nos legaram os livros do Novo Testamento. Atual- mente, visto haverem disputas e querelas entre os corpos eclesiás- ticos, o coração do homem anela por uma autoridade superior a da organização eclesiástica terrena. A terceira alternativa consiste em se confiar explicitamente na autoridade da Palavra de Deus. Esse ponto de vista encontra-se baseado na convicção de que Deus, por sua natureza, é auto- revelador. (A diferença-chave entre as outras religiões e o Cristia- nismo é que elas vêem a humanidade no escuro, buscando por alguma coisa dentro de si mesma ou para além de si mesma. O Cristianismo revela o Deus que dissipa as trevas, que intervém na história humana e estende seu amor aos que se acham caídos.) Deus é um Deus que fala; Ele deseja comunicar-se com suas criaturas. Hebreus 1.1,2 disserta sobre esta característica do Supre- mo Ser: “Havendo Deus, antigamente, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos, nestes últimos dias, pelo Filho...” Sim, Deus falou. Sua declaração final e plena, conforme nos indica Hebreus 1.1,2, foi feita através da pessoa de seu Filho, Jesus Cristo. Chamamos a essa maneira de falar de encarnação, onde o divino foi revestido pelo humano. Essa é a medida mais completa pela qual Deus pode comunicar-se conosco. Trata-se de uma comunicação de pessoa para pessoa. Jesus Cristo, segundo nos lembra o primeiro capítulo do evangelho de João, é o “Verbo”, o mensageiro e a mensagem de Deus. Ora, assim como Jesus Cristo é a Palavra Viva, assim também a Bíblia é a Palavra escrita de Deus. Na ausência pessoal de Jesus, a Bíblia é a autoridade que o Espírito Santo usa para dirigir o Corpo de Cristo. O apóstolo Paulo, em Romanos 10.8-15, afirmou dramaticamente que, sem a proclama- ção das Boas Novas - a mensagem da Bíblia - o homem jamais poderá reatar sua comunhão com Deus. Ela é a base da nossa fé. Ela nos leva a confessar que “Jesus é o Senhor”. A REVELAÇÃO DE DEUS À HUMANIDADE Se admitirmos que Deus de fato fala, é a Bíblia o único meio de Ele se comunicar conosco? Deus também torna-se conhecido, até certo ponto, a todas as pessoas (1) mediante a criação e (2) através da consciência. Tal maneira de Deus falar é usualmente chamada de revelação geral ou natural. Os capítulos 1 e 2 da DOUTRINAS BÍBLICAS18 epístola aos Romanos esboça a forma pela qual Ele fala conosco. Romanos 1.20 refere-se ao conhecimento divino disponível a todas as pessoas, em todos os lugares; é o conhecimento colhi- do junto à natureza: “Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder como a sua divin- dade, se entendem e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis”. Noutras palavras, os seres humanos, sem exceção, têm condições de saber que nenhum deus feito de ouro, prata, bronze, madeira ou barro, poderia ter criado um Universo tão imenso e complexo como o nosso. E nem os muitos deuses pagãos, representados como quem luta uns contra os outros, poderiam ter criado a consistên- cia, a boa ordem e a beleza que encontramos na natureza. Quem haveria de negar a expressão inspirada do Salmo 19: “Os céus manifestam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos?” A Bíblia afiança que Deus fala através da consciência do indivíduo: “Porque, quando os gentios, que não têm lei, fazem naturalmente as coisas que são da lei, não tendo eles lei, para si mesmos são lei, os quais mostram a obra da lei escrita no seu coração, testificando juntamente a sua consciência e os seus pensamentos, quer acusando-os, quer defendendo-os” (Rm 2.14,15). O próprio fato de que as pessoas, em todos os lugares, possuem umaconsciência, uma idéia de certo e errado que se coaduna com a Bíblia, mostra-nos que há uma autoridade acima do indivíduo e das circunstâncias. Até aqueles que rejeitam a Bíblia retêm a consciência, embora esta opere à base daquilo em que se acredita ser o certo e o errado. Externamente, Deus fala através do Universo que Ele criou; e, internamente, por intermédio da consciência de cada indivíduo. Entretanto, a tragédia registrada nos capítulos 1 e 2 da epístola aos Romanos pode ser assim resumida: a humanidade, tendo recebido a luz difusa disponível no Universo, amaldiçoou a Deus, e rebelou-se contra Ele. Mesmo assim, há uma luz suficiente para que ninguém venha a afirmar que Deus é injusto. E, por haverem rejeitado voluntariamente a luz, não serão poucos os condenados à punição eterna. Não é Deus quem manda as pessoas para o inferno. São elas próprias que exigem que Ele as deixe em paz, para que possam vivèr de acordo com os seus desejos, luxurias e concupiscências. E, quando Deus, em meio à tristeza e à relutância, permite que os tais se entreguem aos seus próprios caminhos, só lhes pode restar a perversão, a destruição e o inferno. 19A In sp iração d a s E scrituras Uma mensagem especial, que somente a Bíblia pode transmitir, é a notícia de que Deus interveio no drama humano para redimir-nos. A natureza e a consciência não poderiam jamais revelar semelhante verdade. Mas o Antigo Testamento discorreu demorada e antecipa- damente acerca da vinda do Redentor; e o Novo mostra-nos como se deu a sua vinda e revela-nos a plenitude de seu significado. A VERBALMENTE INSPIRADA PALAVRA DE DEUS O termo grego que mais se aproxima do vocábulo português “inspiração” acha-se em 2 Timóteo 3-16. É a palavra theopneustos que, literalmente, significa “soprado por Deus”. Mediante o hálito e o poder divinos, o Espírito Santo moveu os autores da Bíblia com tal precisão que o que eles deixaram escrito reflete com exatidão o que o próprio Deus quis dizer. Os profetas e apóstolos deixaram bem patente os sinais da inspiração divina em suas respectivas obras. Isso significa que os 66 livros do cânon sagrado, que compõem a Bíblia, na sua expressão original, são inteiramente dignos de confiança, tanto quanto a voz do Espírito Santo (ver 2 Pe 1.17-21). Quanto à inspiração, diversos pontos devem ser levados em conta. A teoria do ditado mecânico afirma que Deus falou de tal forma através dos profetas e apóstolos a ponto de lhes suprimir a personalidade. Esta teoria, porém, é errônea. Personalidades e voca- bulários particulares dos vários escritores são facilmente distinguíveis. Entre os aproximadamente quarenta autores das Sagradas Escrituras, pode-se observar suas várias ocupações - pastores, estadistas, sacer- dotes, pescadores, os bem-educados e os de pouca cultura. Os escritores não foram manipulados como se fossem robôs, ou como se estivessem em transe. Deus não os apanhou ao acaso, e ordenou- lhes que escrevessem. Mas separou, por exemplo, a Jeremias para ser um profeta; e, para tanto, começou a prepará-lo desde que ele se encontrava no ventre materno (Jr 1.5). Enfim, o Senhor Deus prepa- rou os autores das Escrituras através de experiências, separando-os convenientemente a que trouxessem a lume a verdade exatamente como lhas revelara. Desse modo, a personalidade dos escritores foi cuidadosamente preservada pelo Espírito Santo. O Espírito Santo “impulsionou o pensamento original na esco- lha das palavras que melhor o expressassem (Êx 4.12,15). E, finalmente, Ele nos ilumina a mente para que compreendamos a sua Palavra conforme no-la transmitiram os autores sagrados (1 Co 2.12; Ef 1.17,18). Assim sendo, tanto o pensamento quanto a linguagem são igualmente inspirados e reveladores” ( Where We Stand, Springfield, Mo: Gospel Publishing House, 1990, pág. 7). DOUTRINAS BÍBLICAS20 Outro ponto de vista largamente defendido é o da inspiração dinâmica. Esta posição concebe a Bíblia não como a obra que tencionava transmitir “verdades proposicionais” - isto é, informa- ções reais, objetivas e racionais - a respeito do próprio Deus. Os advogados dessa idéia assim a defendem por haverem concluído que Deus se mantém irreconhecível. Alegam que Ele é infinitamen- te diferente dos seres humanos, e, que, por isso mesmo, não pode ser reconhecido na Bíblia. Nesta, complementam, Ele não se dá a conhecer; limita-se a mostrar como devem viver os seres humanos. Essa interpretação é conhecida também como funcional, pois a Bíblia, conforme dizem, nada pode revelar-nos sobre o que Deus é, mas somente acerca de seu trabalho. Negando o elemento sobrenatural, constitui-se tal posição no âmago dos temas moder- nistas ou teologicamente liberais. Em síntese: dá a idéia de que a Bíblia não passa, basicamente, de um folclore. De acordo com essa teoria, a ética suplanta a doutrina. Assim, abre a porta para o relativismo moral, levando as pessoas a interpretarem, por si mesmas, o que julgam ser apropriado aceitar ou rejeitar, como se tudo não passasse de meras tradições (Jz 17.6). Uma variante desse ponto de vista é a ênfase sobre a história da salvação. De acordo com esta postura, há de fato inegáveis indícios de que Deus vem atuando na história da humanidade visando a salvação desta. Semelhante teoria aceita a Bíblia como um registro da atividade salvadora de Deus, mas reivindica ser ela apenas um registro humano; logo, passível de erros, limitada pela experiência e visão dos que a escreveram. O aspecto positivo desse posiciona- mento é a aceitação da Bíblia como o registro dos eventos sobrena- turais de Deus em sua obra redentiva. Sua maior falha acha-se em afirmar que até a interpretação dos eventos narrados na Bíblia, tem de ser inspirada pelo Espírito Santo. Visto que os eventos, por si mesmos, são prenhes de ambigüidade, não haverá completa reve- lação enquanto eles não forem autorizadamente revelados. O que a Bíblia realmente ensina acerca da inspiração? Ela enfatiza a inspiração real dos escritores. Em alguns casos, Deus falou com eles em voz audível. Noutros, deu-lhes revelações por meio de sonhos e visões. Falou-lhes ainda de maneira que lhe viessem a reconhecer a voz. O trecho de Amós 3-8 enfatiza: “Bramiu o leão, quem não temerá? Falou o Senhor Jeová, quem não profetizará?” Jeremias, certa vez, decidiu não mais profetizar; parecia-lhe que ninguém o estava ouvindo. Mas a Palavra de Deus, em seu coração, tomou-se como um fogo que lhe ardia nos ossos, e ele viu-se compelido a dar prossegui- mento ao seu ministério (Jr 20.9)· Não admira, pois, que declarações como “assim diz o Senhor” ocorram 3808 vezes só no Antigo Testa- 21A In sp iração d as E scrituras mento. O trecho de 2 Pe 1.20,21 mostra-nos que nenhum dos autores das Escrituras jamais dependeu de seu próprio raciocínio ou imagina- ção no processo da escrita: “Sabendo primeiramente isto: que nenhu- ma profecia da Escritura é de particular interpretação; porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo”. A expressão “movidos pelo Espírito Santo” pode soar como se eles estivessem no meio da correnteza do Espírito Santo, e fossem impe- lidos por Ele. Porém, um exame mais detido das Escrituras mostra-nos que Deus mesmo ensinou-os e guiou-os (Êx 4.15). Voltando a 2 Timóteo 3.16, pode-se ver claramente que a inspiração das Escrituras também se estende às palavras e à inteireza do texto dos documentos originais, ou autógrafos. Jesus aceitou a plena inspiração do Antigo Testamento nesta sua assertiva: “... e a Escritura não pode ser anulada” (Jo 10.35; Mt 5.18). A essa abordagem chamamos de inspiração plenária (com- pleta, pois envolve até as próprias palavras). Romanos 3.2 faz eco com essa assertiva quando alude ao Antigo Testamento como “os oráculos de Deus”. Assim também se vê em Hebreus 3.7-11 ao mencionar o Salmo 95.7-11, introduzindo a citação com as pala- vras “como dizo Espírito Santo...” Alguém poderia perguntar: “Quanto ao Antigo Testamento, tudo bem. Mas, e quanto ao Novo?” De aldeia em aldeia, ia Jesus ensinando a Palavra de Deus e ministrando os mistérios concernentes ao Reino de Deus. Conforme as necessidades, repetia Ele muitos de seus ensinos, formando assim um corpo de doutrinas e ensinamen- tos que norteariam a vida de sua Igreja. Antes de sua paixão e morte, prometeu aos discípulos que “o Espírito Santo... vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito” (Jo 14.26). As doutrinas e ensinos de Cristo foram transmitidos à Igreja pelos apóstolos (At 2.42). O Espírito Santo também dirigiu os escrito- res dos evangelhos a selecionarem o material indispensável acerca da vida, ministério, morte e ressurreição de Jesus Cristo. Lucas, por exemplo, informa-nos ter feito uma “acurada investigação de tudo, desde o princípio” (Lc 1.3). Ele, sem dúvida alguma, foi movido pelo Espírito Santo para assim proceder. Durante a era apostólica, havia um processo de revelação em andamento, sendo Cristo o fiel cumprimento das profecias da Antiga Aliança. Portanto, o registro de seu nascimento virginal, ensinos, morte e ressurreição (como os encontramos nos evange- lhos) fez-se indispensável à Igreja. Fizeram-se necessários tam- bém a narrativa da instituição da Igreja com os seus padrões e normas, e um vislumbre da consumação da presente era. DOUTRINAS BÍBLICAS22 Que os apóstolos reconheceram a realidade de um novo pacto, ou testamento, constatamo-lo em passagens como 2 Pedro 3.15,16: “... e tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor, como também o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada, falando disto, como em todas as suas epístolas, entre as quais há pontos difíceis de entender, que os indoutos e inconstantes torcem e igualmente as outras Escrituras, para sua própria perdição”. Note o leitor a expressão “as outras Escrituras”. Tão claro testemunho, prestado na sétima década do primeiro século d.C., coloca os escritos de Paulo no mesmo plano das demais Escrituras do Antigo Testamento. Aliás, o próprio Paulo já o declarara ter uma palavra do Senhor para apoiar o que escrevia (1 Co 11.23; 1 Ts 4.1,2,15). Embora nem sempre o afirmasse, isso não significa que o restante de seus escritos fosse menos inspirado pelo Espírito Santo (1 Co 7.12). A própria Bíblia ensina que o Espírito Santo moveu de tal modo os profetas e apóstolos na produção das Sagradas Escritu- ras, que até as próprias palavras destas, nos documentos origi- nais, são plenamente autorizadas. Se elas não fossem inspiradas, teríamos então liberdade de alterá-las para que se ajustassem às nossas idéias e conveniências. Por conseguinte, a inspiração das palavras foi necessária a fim de proteger a verdade. Jesus indicou a importância de cada palavra ao declarar: “Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til se omitirá da lei sem que tudo seja cumprido” (Mt 5.18). A REGRA INFALÍVEL A origem divina e a autoridade das Escrituras asseguram-nos ser a Bíblia também infalível, ou seja: incapaz de erro, ou de orientar de maneira enganosa, ludibriadora ou desapontadora a seus leitores. Alguns eruditos estabelecem distinção entre a inerrância (“estar isenta de erro”) e a infalibilidade, mas ambos os termos são sinônimos bem próximos. “Se existe mesmo alguma diferença de significado entre ambos os termos, a inerrância enfatiza a veracidade das Escrituras, ao passo que a infalibilidade enfatiza quão dignas de confiança são as Escrituras Sagradas. Tal inerrância e infalibilidade aplicam-se a toda a Palavra de Deus, e inclui tanto a inerrância das revelações quanto a dos fatos narrados. As Escrituras revelam-nos a verdade (2 Sm 7.28; Sl 119.43,160; Jo 17.17,19; Cl 1.5)” (Where Wfe Stand, 7,8). A incredulidade engendrada no humanismo é a real fonte das objeções à autoridade e infalibilidade da Bíblia. Seus argumentos não são nenhuma novidade. Escritores cristãos antigos, como Irineu, Tertuliano e Agostinho, tiveram de combater algumas dessas obje- 23A In sp iração d a s Escrituras ções. E, ao fazê-lo, declararam sua plena confiança nas Escrituras. Os reformadores, como Zwínglio, Calvino e Lutero, também aceitaram sem reservas a autoridade das Escrituras (Where We Stand, 9). Através dos séculos, os incrédulos vêm fazendo extensas listas do que consideram discrepâncias da Bíblia. Alguns deles, inclusive, ousaram afirmar que a Bíblia era um erro indisputável e singular. Em 1874, J. W. Haley fez um completo estudo sobre o assunto, que ainda continua bastante atual (John W. Haley, Alleged Discrepancies o f the Bible, Grand Rapids: Baker Book House, 1988). Haley classificou essas alegadas discrepâncias, e descobriu que eram causadas por várias causas: 1. A falha em se ler exatamente o que a Bíblia diz. 2. Interpretações falsas, especialmente as que não levam em consideração antigos costumes e modos de falar. 3· Idéias erradas sobre a Bíblia como um todo, e a falha em reconhecer que ela, em várias circunstâncias, registra pala- vras até de Satanás e de pessoas por ele usadas. Exem- plificando, Deus disse aos amigos de Jó: “... porque vós não falastes de mim o que era reto como o meu servo Jó” (Jó 42.8). A Bíblia, entretanto, fornece-nos um minucioso regis- tro do que eles disseram, embora suas opiniões não fossem corretas. 4. O fracasso em reconhecer que algumas declarações são condensações do que foi dito ou feito. 5· Dificuldades cronológicas devido ao fato de os babilônios, egípcios, gregos e romanos usarem sistemas diferentes para medir o tempo e marcar datas. Até mesmo Israel e Judá diferiam ocasionalmente em seus métodos de contar os anos de reinado de seus respectivos monarcas. (Quanto a uma boa discussão sobre o assunto, ver Edwin R. Thiele, The Mysterious Numbers o f the Hebrew Kings, Grand Rapids; Zondervan Publishing House, 1983.) 6. Aparentes discrepâncias ocasionadas por passagens que usam números arredondados, ao passo que outras fornecem cifras mais exatas, dependendo do propósito de cada escritor. 7. Em alguns lugares, os erros dos copistas foram incorporados a manuscritos antigos. Uma comparação entre os manuscritos tem ajudado a corrigir a maior parte desses erros. De fato, a maioria dos eruditos concorda quanto ao que era o conteúdo original desses textos (R. K. Harrison e outros, Biblical Criticism: Historial, Literary and Textual, Grand Rapids: Zondervan Publishing House, 1980, pág. 150). DOUTRINAS BÍBLICAS24 8. Finalmente, algumas das chamadas discrepâncias são causadas pelas palavras hebraicas e gregas que apresentam mais de um significado, tal como acontece com o português. A palavra “manga”, por exem- pio, pode significar tanto manga de camisa como fruta. Um após outro, esses alegados equívocos e discrepâncias vêm se mostrando falsos. Vezes sem conta, as descobertas feitas pelos arque- ólogos e outros eruditos têm demonstrado que os aludidos erros apontados pelos críticos não têm quaisquer consistências. Para exemplificar, o Dr. Stanley Horton ouviu um professor de Harvard dizer que não havia lâmpadas com sete ramos nos tempos de Moisés. Por conseguinte, a Bíblia estava equivocada ao registrar que um candeeiro assim fora no tabernáculo - ver Êxodo 37.17-24. Entretanto, numa expedição arqueológica em Dotã, em 1962, com o Dr. Joseph Free, do Wheaton College, o Dr. Horton observou trabalhadores desenterrarem um candeeiro com sete lâmpadas datado de 1400 a. C., exatamente da época de Moisés (Stanley M. Horton, “Why the Bible is Reliable”, Pentecostal Evangel, 14 de janeiro de 1973, págs. 8-11). Alguns dos que negam a infalibilidade das Escrituras, acreditam não obstante ser a Bíblia um livro de real valor. Dizem que não importa se a história e a ciência da Bíblia são verdadeiras ou não, pois um pecador pode ser salvo sem conhecer toda a Bíblia ou suas reivindicações quantoà inspiração divina. É verdade que o pecador nada precisa saber acerca do nascimento virginal, das curas divinas, da santificação, do batismo no Espírito Santo e da segunda vinda de Cristo a fim de ser salvo. Mas uma vez que o pecador se converta, tais ensinos servirão para tomá-lo mais maduro na fé (Hb 5.11 e 6.2). Para os que se perturbam com o que consideram imprecisões da Bíblia, principalmente quanto à descrição dos fenômenos naturais, recomendamos-lhes que levem em conta o seguinte fato: a termi- nologia científica somente começou a desenvolver-se a partir do início do século XIX. Além do mais, cada ciência adquiriu o seu próprio vocabulário. A palavra “núcleo”, por exemplo, significa uma coisa para o biólogo e outra bem diferente para o astrofísico. Os cientistas empregam as palavras nos mais variados sentidos. Mas a linguagem da Bíblia não é científica. Ela usa termos como “erguer-do-sol” ou “pôr-do-sol”, tal como o fazemos, embora saiba- mos que é a terra que se movimenta e não o sol. Todavia, quando a Bíblia declara que “Deus criou os céus e a terra”, não há o que se duvidar: a Bíblia realmente é infalível. A Bíblia jamais nos induzirá ao erro. Ela é a admirável revelação de Deus como nosso Criador e Redentor; um Deus pessoal que nos ama e se interessa por nós; um Deus que tem um plano e que enviou a seu Filho a fim de morrer em nosso 25A In sp iração d as Escrituras lugar (1 Co 15.3). Um Deus que continuará a operar até que Satanás seja esmagado, e estabelecidos novos céus e nova terra. A Bíblia toda mostra-nos que Ele é digno de confiança; pode- mos depender totalmente dEle. Sua própria natureza garante a autoridade, a infalibilidade e a inerrância de sua Palavra. O CÂNON E AS TRADUÇÕES MAIS RECENTES Embora estejamos convictos de que os autógrafos foram realmen- te inspirados por Deus, não mais os possuímos. Mui provavelmente hajam sido desgastados devido ao uso e ao trabalho incessante dos copistas. Todavia, como podemos confiar no texto que aparece em nossas Bíblias? A natureza fidedigna das Bíblias atuais está vinculada à história do cânon, à transmissão e às traduções dos livros das Sagradas Escrituras. A palavra “cânon” significa: “regra, padrão, vara de medir”. Portan- to, canônico é o livro que satisfaz a certos critérios ou padrões. Na época de Jesus, os 39 livros do Antigo Testamento já eram plenamente aceitos pelo judaísmo como divinamente inspirados. O Senhor referiu- se repetidas vezes ao Antigo Testamento, reconhecendo-o como a Palavra de Deus (Mt 19.4 e 22.29). Para se conferir a confiança que os escritores do Novo Testamento tinham no Antigo, basta conferir as centenas de citações da Lei, dos Profetas e dos Escritos feitas por eles. Há apenas uma ocasião em que, talvez, seja citado um livro apócrifo (espúrio ou duvidoso): versículos 14 e 15 de Judas, onde parece haver uma similaridade com o livro de Enoque 1.9· E, mesmo nesse caso, não é difícil de se atribuir a ocorrência a uma tradição oral, disponível tanto para o escritor do livro de Enoque quanto para Judas. E o que dizer do cânon do Novo Testamento? Eis uma história fascinante e toda própria. Movamo-nos, porém, para a conclusão da história, já no século IV. Em 367 d.C., o mais ortodoxo dos teólogos da época, o grande campeão da verdade bíblica, Ataná- sio, fez uma seleção de todos os livros que até então circulavam no mundo mediterrâneo, e que se diziam documentos apostóli- cos. Seu exame concluiu que apenas 27 livros (os mesmos que temos hoje no Novo Testamento) podiam ser considerados de fato como a infalível e inspirada Palavra de Deus (Everett F. Harrison, Introduction to the New Testament, Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Pub. Co., 1982, pág. 108). Trinta anos mais tarde, de forma muito independente de Atanásio, reuniu-se um concílio eclesiástico em Cartago, com o intuito de discutir a genuinidade dos livros tidos como Sagrada Escritura (idem). DOUTRINAS BÍBLICAS26 Nesse concílio, foram aplicados quatro testes aos documentos que reivindicavam inspiração divina: (1) Apostolicidade: O livro era da lavra de um apóstolo ou de alguém relacionado com o colégio apostólico? (2) Universalidade: O livro era largamente aceito e usado pelas igrejas? (3) Conteúdo: O assunto do livro parece estar em pé de igualdade com as Escrituras conhecidas? (4) Inspiração: O livro trazia aquela qualidade especial que deixa transparecer a inspiração divi- na? Note o leitor, que dos quatro testes a que os livros foram submetidos, três eram objetivos, e um implicava numa questão de evidência factual. Somente o quarto teste (o da inspiração) poderia ser considerado subjetivo, ou seja: de juízo pessoal. O Concüio de Cartago, após levar em conta todos esses fatos, concluiu que os 27 livros, que atualmente temos em nosso Novo Testamento, eram os únicos que estavam de conformidade com os critérios estabelecidos. Para todos os propósitos práticos, a questão do cânon estava devida- mente encerrada até ser reaberta pelo racionalismo moderno. A outra questão que continuava pendente era quanto à exati- dão da transmissão do texto sagrado. A inspiração divina estende- se somente até ao autógrafo; nenhum argumento é apresentado acerca da inspiração das traduções ou versões da Bíblia. Você, então, poderia indagar: Até que ponto minha Bíblia conforma-se aos documentos originais inspirados por Deus? Examinemos primeiramente o Novo Testamento por estar mais próximo de nós do que o texto do Antigo. O fato mais notável é que há mais de 5.300 cópias manuscritas, de respeitável antigüi- dade, do Novo Testamento no grego original. Algumas dessas cópias são dos séculos III e IV. Há um fragmento do evangelho de João, por exemplo, datado de cerca de 125 d.C., ou seja: apenas trinta anos após ter sido copiado. Que tremendo contraste com as cópias de outros escritos. O mais antigo manuscrito de que dispomos - de Virgílio - é de aproximadamente 350 anos após o seu falecimento. A maior parte dos manuscritos de Platão é de 1.300 anos após a sua morte (Sir Frederic Kenyon, The Story o f the Bible, 2a edição, Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Pub. Co., 1964, pág. 26). Sir Frederic Kenyon, notável erudito bíblico, discorrendo acer- ca das descobertas modernas feitas pela arqueologia bíblica, afirmou: “Elas têm estabelecido, com uma riqueza de evidências que nenhuma outra obra da literatura antiga é capaz de apresen- tar, a autenticidade substancial e a integridade do texto sagrado, conforme o encontramos em nossas Bíblias” (Sir Frederic Kenyon, Our Bible and the Ancient Manuscripts, 5a edição revisada, Lon- dres: Eyre & Spottiswoode, 1958, págs. 318 e 319). 27A In sp iração d as Escrituras O texto do Antigo Testamento alcançou uma dramática e inesperada vitória neste século. Em 1947, nas cavernas de Cumram, jã nas vizinhanças do mar Morto, foram encontrados diversos manuscritos dos livros do Antigo Testamento, com exceção do de Ester. Eles eram de 250 a.C., fazendo-nos recuar cerca de mil anos antes dos melhores manuscritos hebraicos até então disponíveis. A mais importante contribuição dos papiros do mar Morto foi a luz lançada sobre o texto do Antigo Testamento, proporcionando- nos inequívoca segurança quanto à precisão e autenticidade do texto que aparece em nossas Bíblias. Eles tornaram possível a comparação de um grande número de textos, levando-nos a reconhecer que o texto do Antigo Testamento “permaneceu virtu- almente sem mudanças durante os últimos dois mil anos” (Geza Vermes, The Dead Sea Scrolls in English, 2a edição, Harmondsworth, Middlesex, Inglaterra: Penguin Books, Ltd., 1975, pág. 12). De fato, há notável conformidade entre os documentos do mar Morto e os textos que atualmente conhecemos. O propósito de Deus, na chamada de Abraão e na escolha de Israel como seu servo (ver Isaías 44.1), foi preparar o caminho para gerar bênção a todas as nações da terra (Gn 12.3; 22.18). Importava, pois, fosse a Bíblia posta nas línguas dasvárias famílias da terra. Todos os povos precisam da Bíblia por ser esta a espada do Espírito (Ef 6.17). Ela é o único meio de ganharmos vitórias espirituais; é igualmente o martelo de Deus. É o instru- mento que temos para esmigalhar a oposição e construir o edifício da fé (Jr 23.29)· Sim, a Palavra de Deus é uma lâmpada para iluminar-nos a vereda (SI 119-105). Até mesmo quando as pessoas se acham cegas pelo pecado, e a Bíblia lhes parece loucura, ainda assim Deus usa tal “loucura” para salvar os que confiam em Cristo (1 Co 1.18,21). A Bíblia é também necessária para o crescimento dos crentes. Conseqüentemente, assim que a Igreja começou a espalhar-se por países onde não se falavam nem o hebraico nem o grego, os crentes começaram a reivindicar fosse a Bíblia traduzida aos seus respectivos idiomas. A história das versões da Bíblia é comovente. (Grande parte da discussão que se segue sobre as traduções foi extraída do livro de Stanley M. Horton, “Perspective of Those New Translations”, Pentecostal Evangel, 11 de julho de 1971, págs. 6-8.) Na verdade, essa história começou antes da era cristã. Em virtude das conquis- tas de Alexandre, o Grande, o grego tornou-se a língua do comércio, dos negócios e da educação no Oriente Próximo e no Médio Oriente. A cidade de Alexandria, no Egito, veio a tornar-se o grande centro da erudição e da cultura gregas. Foi exatamente DOUTRINAS BÍBLICAS28 nesse período, que vai de 250 a 150 a.C., que veio a lume a famosa versão da Septuaginta (Gleason L. Archer, Jr., A Survey o f Old Testament Introduction, edição revisada, Chicago: Moody Press, 1981, pág. 44). A Septuaginta era freqüentemente usada pelos cristãos primiti- vos na pregação do Evangelho, conforme nos indica o uso que dela faz o Novo Testamento. Ao mesmo tempo, o Espírito Santo dirigiu os autores do Novo Testamento a escreverem não no grego clássico, usado pelos grandes filósofos, mas no grego falado pelo povo comum nas ruas e mercados. Deus sempre quis que a sua Palavra fosse pregada na linguagem comum do povo. Moisés, ao escrever a Lei, não se utilizou dos hieroglíficos usados pelos eruditos do Egito, mas lançou mão do hebraico falado nas tendas de Israel. Jesus pregou e ensinou com tal simplicidade que levava a gente humilde a ouvi-lo com deleite (Mc 12.37). Quando o Evangelho se espalhou, os vários povos, naturalmente, começaram a traduzir a Bíblia para seus próprios idiomas. Quatro séculos depois de Cristo, quando já não era falado nem o grego, nem o antigo latim, Jerônimo encetou nova tradução da Escritura para o latim “vulgar” ou “comum”. Essa versão tomou- se conhecida como a Vulgata Latina (idem, pág. 80). Infelizmente, a Vulgata tornou-se a versão oficial da Europa Ocidental e da Inglaterra. E, assim, as diversas tentativas para se traduzir a Bíblia para outras línguas foram desencorajadas, embo- ra a população européia já não mais falasse o latim. O que faltava realmente era colocar a Palavra de Deus nas mãos do povo. Foi o que fez o inglês Wycliffe. Ele traduziu a Vulgata Latina para o inglês. E, como resultado desse seu trabalho pioneiro, muitas pessoas converteram-se a Cristo. Deus, porém, estava trabalhando. A invenção da imprensa foi responsável pela grande mudança. Entre 1462 e 1522, aparece- ram, só em alemão, pelo menos dezessete versões e edições da Bíblia. Tais versões ajudaram a preparar o caminho para a Refor- ma Protestante que, sob o comando de Martinho Lutero, levou o povo a compreender melhor a salvação pela graça. O próprio Martinho Lutero apelou para os originais hebraico e grego a fim de preparar uma melhor tradução da Palavra de Deus em alemão. Influenciado por Lutero, William Tyndale elaborou, em 1525, a primeira tradução impressa do Novo Testamento em inglês (idem, págs. 20 e 21). A primeira tradução da Bíblia em português foi iniciativa de um pastor evangélico: João Ferreira de Almeida. Ele nasceu em 29A In sp iração d as E scrituras Portugal, nas proximidades de Lisboa, em 1628. Abraçando os ideais da Reforma Protestante, Almeida passou a freqüentar a Igreja Reformada Holandesa, da qual tornou-se ministro. Um dos maiores anseios de João Ferreira de Almeida era traduzir para o português. Mas, para levar adiante o seu trabalho, viu-se obrigado a refugiar-se na Ilha de Java, no Oceano Índico. E, assim, pôs-se a trabalhar. Primeiro, ele traduziu o Novo Testa- mento, que foi publicado na Holanda em 1681. Quanto ao Antigo Testamento, não o pôde traduzir todo. O Senhor o recolheu quando ele completava o livro de Ezequiel. Mas a sua obra não ficaria imcompleta. Seus amigos encarre- gar-se-iam de traduzir o restante do Antigo Testamento. Hoje, onde quer que se fale o português, João Ferreira de Almeida é lembrado pela bravura e pioneirismo de seu espírito. A tradução de João Ferreira de Almeida já foi submetida a diversas revisões. Em 1951, a Imprensa Bíblica Brasileira publicou a edição revista e corrigida, mais conhecida como ARC. E, em 1958, era lançada, pela Sociedade Bíblica do Brasil a edição revista e atualizada de Almeida - a ARA. Tanto a ARC quanto a ARA foram relançadas, em segunda edição, em 1995, pela Socie- dade Bíblica do Brasil. Eis outras versões da Bíblia em português: IBB - Imprensa Bíblica Brasileira; Tradução Brasileira; Figueiredo; Matos Soares e outras traduções usadas pela Igreja Católica. PERGUNTAS PARA ESTUDO 1. Por que o racionalismo é insuficiente como base para a auto- ridade religiosa? 2. Por que a Bíblia é uma base melhor para se fundamentar a autoridade religiosa do que a Igreja? 3. O que a própria Bíblia nos ensina sobre sua inspiração? 4. Como devemos cuidar dos alegados erros e discrepâncias existentes na Bíblia? 5. Quais as principais bases para se aceitar os 66 livros da Bíblia como canônicos? 6. Quais as principais razões por que novas versões da Bíblia têm sido preparadas? 7. Por que é importante obter a Bíblia traduzida na linguagem que o povo realmente fala? 8. Como podemos receber a iluminação do Espírito Santo nos estudos da Bíblia hoje em dia? a Verdade Fundamental O DEUS ÚNICO E VERDADEIRO O Deus Único e Verdadeiro revelou-se como o eterno e auto- existente “Eu Sou”, o Criador dos céus e da terra, e o Redentor da humanidade. Ele também se revelou como aquEle que incorpora os princípios de relação e associação como Pai, Filho e Espírito Santo (Dt 6.4; Is 43.10,11; Mt 28.19; Lc 3.22). o Deus Único Verdadeiro Em 1913, reuniu-se uma grande multidão em Arroyo Seco, no Estado norte-americano da Califórnia, para ouvir a Sra. Maria Woodworth-Etter, durante a realização do Acampamento Mundial Pentecostal (William W. Menzies, Annointed to Serve: The Story o f the Assemblies o f God, Springfield, Mo.: Gospel Publishing House, 1971, pág. 111). Numa noite, John Scheppe despertou a todos ao gritar o nome de Jesus. Esse imigrante alemão acabara de ter uma visão de Jesus, que o fez sentir que o Salvador deveria ser verdadeiramen- te honrado. Frank J. Ewart, ex-ministro batista, procurou logo tirar partido da situação, insinuando que a melhor maneira de o crente honrar a Cristo era ser rebatizado na água apenas no nome de Jesus (Menzies, Anointed, págs. 112 e 113). Tanto Scheppe quan- to Ewart haviam sido influenciados por um sermão de R. E. McAlister sobre o batismo em água no nome de Jesus Cristo. Não demorou muito, e os mais afoitos já estavam declarando que os que rejeitassem o rebatismo acabariam por perder a salvação. O incidente foi narrado por Myrle M. Fisher, em 1913■ Embora tenha sido rebatizada, ela, através de seus próprios estudos das Escrituras, acabou por retornar à posição trinitária. A irmã Myrle M. Fisher casou-se pouco depois com Harry Horton, e tornou-se a mãe de Stanley M. Horton, o qual, por muitas vezes, ouviu-a referir-se ao lamentável ocorrido. Os autores do incidente declararam ainda que só existe uma pessoa na deidade: Jesus, o qual sempre cumpriu os papéis e ofícios do Pai, doFilho e do Espírito Santo, conforme o tempo ou a ocasião o requeressem. Os promotores dessa heresia tomaram- se logo conhecidos como Nome de fesus, fesus Somente ou Unida- de. Eles referiam-se à sua doutrina como “A Nova Questão”, mas DOUTRINAS BÍBLICAS34 na realidade não passava de uma antiga heresia reavivada: era defendida pelos sabelianos e monarquianos do terceiro século. Os cristãos da época condenaram-na energicamente. Pouco depois de as Assembléias de Deus serem formadas, em 1914, houve ainda quem teimasse em propagar tal doutrina. Para combatê-la, a igreja, em 1916 (quanto à discussão dessa contro- vérsia ver Thomas F. Harrison, Christology, 2a edição revisada, Springfield, Mo.: págs. 35-77), incluiu um artigo, em sua Declara- ção de Verdades Fundamentais, intitulado “A Adorável Deidade”. Essa declaração, hoje, traz a seguinte redação: (a) Definição de Termos Os termos “trindade” e “pessoas”, relacionados à deidade, ape- sar de não serem encontrados nas Escrituras, acham-se em plena harmonia com as mesmas Escrituras, mediante as quais podemos transmitir nossa compreensão imediata da doutrina de Cristo com referência ao Ser de Deus, distinguindo-o dos “muitos deuses e senhores”. Professamos, por conseguinte, ser Deus o Único Deus e Senhor, subsistindo Ele na Trindade. Deus, pois, é um Ser compos- to por três pessoas. E nem por assim professarmos deixamos de ser absolutamente bíblicos (Mt 28.19; Jo 14.16,17; 2 Co 13.14). (b) Distinção e Relações Dentro da Deidade Cristo ensinou como se processa as relações entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Mas tais distinções e relações são, em si mesmas, inexcrutãveis e incompreensíveis, por serem inexplicáveis (Mt 11.25-27; 28.19; Lc 1.35; 1 Co 1.24; 2 Co 13.14; 1 Jo 1.3,4). (c) Unidade do Ser do Pai, Filho e Espírito Santo De acordo com esse pressuposto, há algo específico no Filho que o identifica de fato como Filho, diferenciando-o do Pai. E há, no Espírito Santo, algo que o identifica como o Espírito Santo, diferenciando-o do Pai e do Filho. Portanto, o Pai é o gerador, o Filho é o gerado, e o Espírito Santo é aquele que procede do Pai e do Filho. Visto estarem as três pessoas da Trindade em perfeita unidade, há então um só Senhor Deus Todo-poderoso, e seu nome é um só (Zc 14.9; Jo 1.18; 15.26; 17.11,21). (d) Identidade e Cooperação na Deidade O Pai, o Filho e o Espírito Santo não são idênticos como pessoas·, e jamais foram confundidos quanto à relação. Não estão divididos no tocante à deidade, nem estão em oposição no que tange à cooperação. Concernente à relação, o Filho está no Pai e o Pai está no Filho. O Filho está com o Pai, e o Pai está com o Filho, quanto à comunhão. Quanto à autoridade, o Pai não vem do Filho, mas o Filho vem do Pai. O Espírito Santo, por sua vez, 35O D eu s Ú nico e V erdadeiro vem tanto do Pai quanto do Filho, no tocante à natureza, à relação, à cooperação e à autoridade. Portanto, nenhuma pessoa da Trindade existe, ou trabalha, separada e independentemente das outras (Jo 5.17-30,32,37; 8.17,18). (e) O Título, Senhor Jesus Cristo O título “Senhor Jesus Cristo” é um nome próprio. Jamais é aplicado ao Pai ou ao Espírito Santo. Este nome pertence exclusi- vãmente ao Filho de Deus (Rm 1.1-3,7; 2 Jo 3). Quanto à sua natureza divina e eterna, o Senhor Jesus Cristo é o Unigénito do Pai, mas concernente à sua natureza humana, é Ele o próprio Filho do Homem. Portanto, Jesus é reconhecido tanto como Deus quanto como homem. E por ser Ele verdadeiro homem e verdadeiro Deus, apresenta-se como “Emanuel” - “Deus conosco” (Mt 1.23; 1 Jo 4.2,10,14; Ap 1.13,17). (0 O Título, Filho de Deus Visto que o nome “Emanuel” abrange a Jesus Cristo tanto como Deus quanto como homem, numa única pessoa, segue-se que o título “Filho de Deus” descreve-lhe a deidade, enquanto que “Filho do Homem” ressalta-lhe a humanidade. Por isso, o título Filho de Deus pertence à ordem da eternidade, ao passo que Filho do homem acha-se ligado à ordem do tempo (Mt 1.21- 23; Hb 1.1-13; 7.3; 1 Jo 3.8; 2 Jo 3). (g) Transgressão Contra a Doutrina de Cristo Constitui-se grave transgressão doutrinária afirmar que Jesus Cristo haja derivado o título “Filho de Deus” de sua encarnação, ou de sua relação com a economia da redenção da raça humana. Negar, pois, que o Pai seja real e eterno Pai, e que o Filho também o seja, significa anular a distinção e relação que existe na divindade. É uma negação tanto do Pai quanto do Filho; é negar que Jesus Cristo tenha vindo em carne (Jo 1.1,2,14,18,29,49; Hb 12.2; 1 Jo 2.22,23; 4.1-5; 2 Jo 9). (h) Exaltação de Jesus Cristo como Senhor Nosso Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, tendo, por si mesmo, nos expurgado de nossos pecados, sentou-se à mão direita da Majestade, nas alturas. Tendo em vista sua exaltação, os anjos, principados e poderes se lhe sujeitaram. E, feito tanto Senhor como Cristo, enviou-nos Ele o Espírito Santo para que, no nome de Jesus, ajoelhemo-nos e confessemos que Cristo Jesus é o Senhor. Mas, quando da consumação de todas as coisas, o próprio Filho sujeitar-se-á ao Pai para que Deus seja tudo em todos (At 2.32-36; Rm 14.11; 1 Co 15.24-28; Hb 1.3; 1 Pe 3.22). DOUTRINAS BÍBLICAS36 (i) Honra Igual ao Pai e ao Filho Visto ter o Pai entregue todo o julgamento ao Filho, não é somente dever expresso de todos, quer no céu, quer na terra, dobrarem os joelhos, mas, acima de tudo, alegria indizível, no Espírito Santo, atribuir ao Filho todos os atributos da divindade, e dar-lhe toda a honra e toda a glória contidas em todos os títulos e nomes da divindade, exceto os que servem para individuar as outras pessoas da Trindade (ver os parágrafos b, c e d). Assim agindo, haveremos de honrar tanto ao Pai quanto ao Filho (Jo 5.22,23; Fp 2.8,9; 1 Pe 1.8; Ap 4.8-11; 5.6-14; 7.9,10). A EXISTÊNCIA DE DEUS A Bíblia não se preocupa em provar a existência de Deus. O livro de Gênesis começa reconhecendo que Ele é: “No princípio Deus...” E Hebreus 11.6 afirma enfaticamente: “... é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe...” As Escrituras deixam bem claro que acreditar na existência de Deus constitui a base da experiência humana. Dizer que não existe um Ser Supremo - ou viver como se Ele não existisse - equivale a negar o que todos sabem de maneira intuitiva (Jo 1.9; Rm 1.19)· A existência de Deus é algo tão fundamental ao pensamento huma- no que abandonar tal conceito significa embarcar no encapelado mar da irracionalidade, onde nada tem significado ou propósito. Embora a Bíblia não apresente argumentos em favor da existência de Deus, há não poucas implicações que apoiam plenamente tais argumentos. Argumentos clássicos vem sendo apresentados desde a era medieval. Apesar de limitados em si mesmos, provêem eles, em seu conjunto, o apoio intelectual suficiente para corroborar a verdade da Bíblia. O primeiro desses argumentos é o ontológico. Defende este que um Ser Perfeito implica numa existência real. A idéia de um Ser Perfeito que não se manifeste genuinamente na realidade, pressupõe que este Ser não seja totalmente perfeito. Por conseguinte, para se conceber um Ser Perfeito, é necessário se acreditar que este Ser Perfeito realmente exista (para uma discussão sobre o valor do argumento ontológico, ver James Oliver Buswell, A Systematic Theology o f the Christian Religion, vol. 1, Grand Rapids: Zondervan Publishing House, 1962, págs. 98-100). O segundo argumento clássico é o cosmológico. Segue-se de maneira coerente ao ontológico. O universo, como todos o admi- timos, não existe por si mesmo. Todos os eventos que presencia- mos dependem de alguma causa além deles mesmos. Se você buscar a origem dessas causas primeiras, eventualmente chegará 37O D eu s Ú n ico e V erdadeiro à Primeira Causa: um Ser auto-existente que não depende de qualquer outra coisa, além de si, para existir. O terceiro argumento clássico em prol da existência de Deus é o teleológico, ou argumentodo desígnio. O mundo maravilhoso descoberto pela inquirição científica desvenda uma notável e espantosa ordem em toda a natureza. As improbabilidades mate- máticas de todas estas maravilhas terem ocorrido por mero acaso, leva-nos a enaltecer aquEle que é o autor de quanto vemos e admiramos. Com o salmista, juntemos nossas vozes: “Os céus manifestam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos” (Sl 19.1; quanto a uma discussão acerca do Salmo 19 e outras passagens referentes à revelação geral por meio da natureza, ver Millard J. Erickson, editor, Christian Theology, Grand Rapids: Baker Book House, 1986, págs. 166-171). O quarto argumento clássico é o moral. Ele apresenta-se como o senso inato do que é certo e do que é errado. Que ser humano não o possui? A realidade de um grande Legislador é a evidência mais que lógica da vida moral de nossa consciência. Embora os padrões de moralidade variem largamente de cultura para cultura, a consciência dos valores morais permanece intacta. Similar ao anterior é o quinto argumento. Acha-se ele alicerçado sobre a estética ou beleza. Que todas as pessoas possuam um conceito de valores relativos acerca da beleza (por mais larga- mente que variem seus padrões), é algo que aponta na direção de alguém que, em si mesmo, é o doador da beleza. Seu amor não conhece limites. A NATUREZA DE DEUS Romanos 1.19,20 indica que a existência de Deus é algo que pode ser apreendido por todos através da revelação geral. Entretanto, para conhecermos a natureza divina, será mister voltarmo-nos à revelação especial que o próprio Deus nos proporciona. Em sua Palavra, Ele revela-se de variadas maneiras. Uma das maneiras mais empolgantes de o conhecermos é através de seus diversos nomes. ΈΙ (no hebraico, “Deus”), que se encontra no singular, ocorre cerca de 250 vezes na Bíblia, e enfatiza a idéia de força (ver Gênesis 14.18-22). Uma outra forma singular, ‘Eloah, ocor- re apenas no livro de Jó, 42 vezes. Mas sua forma plural, ‘Elohim, pode ser encontrada mais de 2.000 vezes no Antigo Testamento. Usualmente acha-se vinculada ao poder criativo de Deus, e ao cuidado que Ele dispensa ao Universo e à humanidade. Além disso, implica na pluralidade existente no Supremo Ser (ver Gn 1.26; 3.22). DOUTRINAS BÍBLICAS38 Yahweh é outra palavra hebraica. Em muitas versões da Bíblia, foi traduzida por “Senhor” (as consoantes do nome pessoal de Deus: YHWH, foram transliteradas para o latim novo como JHVH, e, combinando-as com os sinais vocálicos do substantivo hebraico “Senhor”, deu origem a uma forma não-bíblica: “Jeová”). Trata-se de um nome que manifesta a observância do pacto (Ml 2.5; 3•6). Esse nome ocorre cerca de 7.000 vezes no Antigo Testamento. Eis o seu significado: “Ele continuará [ativamente] a ser”. Subentende que Deus mostrara que tipo de Deus é Ele realmente. Ele o fará através de seus atos que se acham ligados à promessa que diz: Eu serei contigo” (Êx 3.12). Nomes especiais, compostos com El e Yahweh, enfatizam a natureza de Deus e seu relacionamento com os vários pactos estabelecidos com o seu povo. Entre estes nomes, podemos citar: El Shaddai, “Deus Todo-poderoso” (Gn 17.1, derivado de uma raiz, shadu, que significa “montanha”); El Elyon, “Deus Altíssimo” (Gn 14.18); ‘ElRo’i, “o Deus que me vê” (Gn 16.13); ‘El ‘Olam, “o Deus eterno” (Gn 21.33); El Elohe Yisra’el, "Deus, o Deus de Israel” (realça a relação especial de Deus com Israel, Gn 33.20); Yahwehw-ropheka, “o Senhor, teu Médico [pessoal]” (Êx 15.26); Yahweh-nissi, “o Senhor minha Bandeira” (Êx 17.15); “ahweh- shalom, “o Senhor é Paz” (Jz 6.24); Yahweh-ro’i, “o Senhor é meu Pastor” (Sl 23-1). Aquele que perdoa é denotado por Yahweh- tsidkenu, “o Senhor, Justiça Nossa” (Jr 23.6). O nome da Nova Jerusalém será Yahweh-shammah, “o Senhor está ali” (Ez 48.35). E o nome celestial de Deus é Yahweh-sabaoth, “o Senhor dos exércitos [incluindo as hostes angelicais]” (Sl 148.2; cf. Mt 26.53). Existem, ainda, outros termos importantes que descrevem a natureza de Deus: ‘Adonai (hebraico), Kurios (grego), “Senhor”; ‘Attiq Yomin (aramaico), “o Ancião de Dias”, um título que se acha em conexão com os juízos divinos na administração dos reinos deste mundo (Dn 7.9,13,22); Qedosh Yisra’el (hebraico), “o Santo de Israel” (usado vinte e nove vezes por Isaías); Tsur (hebraico), “Rocha”; Ah (hebraico; ‘Abba, aramaico; Ho Pater, grego), “Pai” ou “ó Pai” (uma forma de tratamento que demons- trava grande respeito nos tempos bíblicos); Melek (hebraico), “Rei” (Isaías 6.1,5); Co !el (hebraico), “Redentor”; Despotes (grego), “senhor”, “proprietário”; e, finalmente, Rishon w a-’acharon (he- braico; no grego é Ho Protos kai Ho Esxatos), “o Primeiro e o Último” (fala de seu governo sobre o curso da história, Is 44.6; 48.12; Ap 2.8). Passando dos nomes e títulos de Deus usados nas Escrituras, e que falam de sua natureza, examinemos, de forma abreviada, 39O D eu s Ú nico e V erdadeiro alguns conceitos importantes acerca da natureza divina. Deus é, antes de tudo, infinito, nada o pode limitar. É maior do que o Universo; foi Ele quem o criou. Este é um quadro demasiado grande para que as nossas mentes finitas o apreendam, mas é uma descrição imprescindível à nossa compreensão de Deus (1 Rs 8.27). Intimamente relacionada a essa idéia acha-se o conceito da unidade divina - só existe um Deus (Dt 6.5; Is 44.6,8). Deus é, ao mesmo tempo, transcendental (acima, além e maior do que o Universo que Ele criou) e imanente (presente e ativo nesse mesmo Universo). Somente o ensino cristão sobre Deus une adequadamente ambos os conceitos. A transcendência pre- serva a distinção entre Deus e o Universo. Ignorar tal distinção leva-nos a cair no panteísmo, onde Deus e o Universo são irremediavelmente confundidos. A doutrina panteísta ensina que o Universo, com suas forças e leis, é tudo quanto existe; e, ato contínuo, chama o Universo de Deus, eliminando, assim, a possi- bilidade de um Deus pessoal. A idéia da imanência divina, por sua vez, reconhece ser a presença de Deus, no Universo que Ele criou, sumamente neces- sária para preservar sua amorável relação com os seres que Ele também criou (Êx 8.22; At 17.24,25,27,28). Eis o que afirmou Paulo a este respeito: “...ainda que não está longe de cada um de nós” (At 17.27). Os que não reconhecem a presença divina, acabam por cair no deísmo, que, embora admita a existência de Deus, considera-o meramente como uma grande Primeira Causa. É uma noção parecida com a do “fabricante de relógios” desinte- ressado: depois de haver criado o Universo, foi-se embora, e deixou o aparelho a funcionar por conta própria. Deus também é imutável (não sucetível a mudanças) e eterno. A natureza divina não muda, jamais mudará (Ml 3.6). No Antigo Testamento, há duas palavras hebraicas, mui relevantes, para descrever a Deus: chesed (amor fiel, permanente, cumpridor do pacto) e ‘emeth (dependência, permanência, continuação, fideli- dade, verdade). Deus é o ‘Elohe ‘emeth, “o verdadeiro Deus” (2 Cr 15.3). Ele será sempre fiel a si mesmo. Esses termos, que ocorrem repetidas vezes no Salmo 89, demonstram vividamente que pode- mos depender inteiramente de Deus. OS ATRIBUTOS DE DEUS Além dos atributos que descrevem a natureza interior de Deus, há também os atributos que lhe realçam os relacionamentos especiais com a criação. Tais atributos são chamados comunicá- veis, porquanto podem ser encontrados (ainda que em menor DOUTRINAS BÍBLICAS40 grau) na natureza humana. Eles são divididos em duas categorias: naturais e morais. Entre os atributos naturais de Deus, encontra-se a onipotência (a qualidade que o faz Todo-poderoso). Isto significa que Deus pode fazer tudo quanto estiver em conformidade com a sua natureza santa e justa. Sua soberania sobre o Universo é incontes- tável. Isaías 40.15 descreve-lhe a majestade: “Eis que as nações são consideradas por ele como a gota de um balde e como o pó miúdo das balanças; eisque lança por aí as ilhas como a uma coisa pequeníssima”. Todavia, alguém poderia perguntar: “Mas se Deus é soberano, porque há pecado no mundo?” A resposta jaz no fato de que Deus é soberano sobre si mesmo, e tem o poder de limitar-se. Uma das maiores evidências desta sua qualidade é vista na vinda de Jesus como um bebê deitado na manjedoura, e em sua vida, ministério e morte sobre a cruz (Fp 2.6-8). Em sua liberdade e onipotência, Deus optou por criar seres (pessoas e anjos) com a integridade da escolha moral. Ele não invade a liberdade de nosso arbítrio. Finalmente, devemos reco- nhecer que Deus, embora nos conceda semelhante liberdade, continua Senhor da História. Ele controla o destino das nações e de todo o Universo. O Apocalipse, juntamente com importantes passagens de Daniel (4.34,35; 5.20,21; 7.26,27; 8.19-25) e de Ezequiel (37.24-28; 38.3; 39-1), desvenda claramente o controle que Deus exerce sobre o futuro de tudo quanto criou. Mas, nesse ínterim, Ele tem, por razões que só mesmo Ele conhece, concedi- do livre arbítrio às suas criaturas morais. Deus é onipresente, ou seja, está presente em todos os lugares ao mesmo tempo (Sl 139-7-10). Ele não se acha limitado pelo espaço, mas está presente em todos os lugares. E a todos quantos criou, de maneira maravilhosa e múltipla, dispensa amor e cuidado. Nem mesmo os pardais caem por terra sem que Ele o saiba (Mt 6.25-29). Embora esteja Ele presente em todos os lugares, devemos nos lembrar de que Ele somente habita com aqueles que se humilham, e o admitem no santuário de seus corações (Is 57.15; Ap 3.20). Deus é onisciente. Ele é dotado de conhecimento e discernimento infinitos, universais e completos. Vê a realidade por uma perspec- tiva diferente da nossa. Vemos as coisas através de uma corrente de consciência. Para nós, seres mortais e limitados, a vida é um fluxo ao longo da linha do tempo. Olhamos à frente, ao futuro, e logo tudo se faz passado. Para Deus, entretanto, toda a realidade lhe é presente. Todos os acontecimentos, quer passados, quer presentes ou futuros, lhe estão mais que patentes (Rm 8.27,28; 1 Co 3-20). 41O D eu s Ú n ico e V erdadeiro Há os que perguntam, por exemplo, como pode Deus saber quem há de se perder, e mesmo assim, permitir que os tais se percam. O conhecimento prévio de Deus, porém, não predetermina as escolhas individuais, porquanto Ele respeita nosso arbítrio. Em Efésios 1.3-14, temos o esboço da história predeterminada do mundo. Mas esse vislumbre da predestinação do Universo não elimina as “ilhas da liberdade” que Deus nos reservou, pois Ele nos fez indivíduos e livres. Ele permite que as pessoas escolham o próprio destino: Céu ou inferno. Entre os atributos comunicáveis de Deus, há também os morais. A bondade é um deles. Deus é realmente bom. Ele se dispõe a zelar continuamente pelo bem-estar de sua criação. Não se inclina por armar-lhe ciladas. O mal é um inimigo tanto da criação quanto de Deus. A Bíblia encontra-se repleta de descrições sobre a bondade divina. Seus servos atribuem- lhe amor (1 Jo 4.8), benignidade e fidelidade (Sl 89.49), graça (At 20.24) e misericórdia (Ef 2.4). O maior ato do amor de Deus foi mostrado no clímax do plano de redenção na cruz do Calvário. Ninguém tem um amor maior que este! Deus é santo. Este é o cerne da mensagem bíblica sobre o caráter de Deus. “Santo”, na Bíblia, significa basicamente “separa- do”, “dedicado”. Há dois importantes aspectos na santidade de Deus. (1) Ele está separado, e acha-se acima de tudo quanto é transitório, permanente, finito, imperfeito, mau, pecaminoso e errado. (2) Ele também encontra-se separado para dedicar-se inteiramente ao cumprimento do grande plano da redenção, do Reino vindouro e do estabelecimento da nova terra e do novo céu. Tal conceito é totalmente necessário à devida adoração do Supremo Ser. Deus evoca admiração porque Ele é santo (Is 6.1-5). Deus é também justo. Ele sempre agirá com justiça (Dt 32.4; Dn 4.37; Ap 15.3). Mais do que isso. Deus é essencialmente justo (Sl 71.19). É de sua natureza ser justo. Ele jamais será incoerente com a sua natureza (Is 51.4-6). Sem essa característica, a ordem moral do Universo não teria qualquer base. Deus é a concretização da verdade em toda a sua pureza e transparência. Eis porque a justiça e a verdade apresentam-se juntas sempre que Deus se ira contra o pecado (Ap 16.1-5). Todavia, Deus anela por redimir o ser humano (2 Pe 3-9). Isto é amor! Foi na cruz de Cristo que a ira e o amor de Deus conjuntamente fluíram para resgatar a pobre humanidade (Rm 3-22-25)· DOUTRINAS BÍBLICAS42 A TRINDADE Um grande mistério está à nossa espreita: há somente um Deus, e uma só Trindade (ou “triunidade”). Para desvendar tal mistério, não dispomos de analogias ou comparações adequadas. Mas a realidade da Palavra de Deus aí está: o Supremo Ser subsiste numa unidade de três pessoas igualmente divinas e distintas. O Dr. Nathan Wood, ex-presidente do Gordon College e da Gordon Divinity School, acreditava ver a marca da Trindade sobre a natureza. Sugeriu, inclusive, que o espaço tridimensional nos mostra a Trindade. Se as dimensões de uma sala fossem tomadas como unidades iguais, verificar-se-ia, segundo Gordon, que o comprimen- to percorre a sala inteira, o mesmo acontecendo com a sua largura e altura. Mas cada uma dessas três dimensões é distinta. E para se obter o referido espaço, não se adiciona 1 + 1 + 1; mas multiplica-se l x l x 1, tendo como resultado: um. A semelhança das outras analogias, essa também fracassa, pois as dimensões não são pessoais. Por mais difícil que nos seja compreender toda essa verdade, temos aí, não obstante, uma doutrina vital e urgente. A história eclesiástica traz dramáticos relatos de grupos cristãos que teima- ram em não fazer caso da Trindade. A oração familiar e cotidiana dos judeus, extraída de Deuteronômio 6.4, enfatiza a suprema grandeza da unidade divina: “Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus ■é o único Senhor”. A palavra “único”, aqui usada, corresponde ao hebraico, ‘echad', que pode representar uma unidade composta ou complexa. Embora o hebraico possua uma palavra que signifique “somente um” ou “o único”, yachid, esta jamais é usada em relação a Deus. Paralelamente a unidade de Deus, deparamo-nos com o con- ceito de sua personalidade. A personalidade envolve o conheci- mento (ou inteligência), os sentimentos (ou afetos) e a vontade. O Pai, o Filho e o Espírito Santo, cada um de per si, revelam tais características à sua própria maneira. O Espírito Santo, por exem- pio, faz coisas que o mostram realmente como uma pessoa distinta, e não como mero poder impessoal (At 8.29; 11.12; 13.2,4; 16.6,7; Rm 8.27; 15.30; 1 Co 2.11; 12.11). A personalidade também requer comunhão. Todavia, antes da existência do Universo, onde estava a possibilidade de comu- nhão? A resposta jaz no complexo arranjo dentro da deidade. A unidade de Deus não exclui a possibilidade de nela haver perso- nalidades compostas. Há três personalidades distintas, cada qual inteiramente divina, mas encontram-se tão harmonicamente inter- relacionadas que resultam numa única essência. Como se vê, seria totalmente errado afirmar que na Trindade haja três deuses. 43O D eu s Ú n ico e V erdadeiro Uma maneira de se desvendar as distinções das pessoas, na divindade, consiste em se observar as funções atribuídas especifica- mente a cada uma delas. Exemplificando: Deus Pai é relacionado à obra da criação; Deus Filho é o principal agente da obra de redenção da humanidade; e Deus Espírito Santo é a garantia de nossa herança futura. Esta tríplice distinção é esboçada no primeiro capítulo de Efésios. Contudo, não devemos pressionar tais distin- ções, pois há abundante testemunho bíblico quanto à cooperação do Filho e do Espírito Santo na obra da criação: o Pai criou através do Filho (Jo 1.3); o Espírito Santo pairava gentilmente sobre a terra, preparando-a para os seis dias da criação (Gn 1.2).
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