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Organizadores Alexandre Elman Chwartzmann Gustavo Bahuschewskyj Corrêa Maurício Brum Esteves Rosângela Maria Herzer dos Santos Autores Adriana Carvalho Pinto Vieira Adriano M. G. Bedin Clarissa Melo Indalêncio Daniele Weber S. Leal Eduardo Henrique Hamel Geovana Bacim Gustavo Wentz Julio Cesar Zilli Kelly Lissandra Bruch Letícia S. Arrosi Lilian Hanel Lang Liz Beatriz Sass Maurício Brum Esteves Paula Lourenço Madeira Rafael Krás Borges Verardi Raphael Vieira Medeiros Raquel Von Hohendorff Vanessa Pereira Oliveira Soares Wilson Engelmann CADERNOS DE PROPRIEDADE INTELECTUAL - Coletânea de artigos apresentados no XVIII CICLO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL e I CONGRESSO NACIONAL DE PROPRIEDADE INTELECTUAL Porto Alegre OABRS 2019 Copyright © 2019 by Ordem dos Advogados do Brasil Todos os direitos reservados Membros da Comissão Especial de Propriedade Intelectual da OAB/RS Presidente Andre de Oliveira Schenini Moreira Vice-presidente Maurício Brum Esteves Secretária Sheila da Silva Peixoto Membros Alexandre Elman Chwartzmann Alberto Fett Carlos Ignacio Schmitt Sant'anna Claudia Denise Gimenez Cesar Alexandre Leão Barcellos Felipe Octaviano Delgado Busnello Felipe Pierozan Gustavo Bahuschewskyj Correa Kelly Lissandra Bruch Luiz Gonzaga Silva Adolfo Maria Cristina Gomes da Silva d'Ornellas Milton Lucidio Leão Barcellos Rafael Krás Borges Verardi Rodrigo Azevedo Pereira Organizadores Alexandre Elman Chwartzmann Gustavo Bahuschewskyj Corrêa Maurício Brum Esteves Rosângela Maria Herzer dos Santos Capa Carlos Pivetta C129 Cadernos de Propriedade Intelectual - Coletânea de artigos apresentados no XVIII Ciclo de Propriedade Intelectual e I Congresso Nacional de Propriedade Intelectual. Alexandre Elman Chwartzmann. et.al – (Organizador). Porto Alegre: OAB/RS. 2019. 206p. ISBN: 978-85-62896-16-3 1. Propriedade Intelectual 2. Direitos Autorais Legislação I. Brasil II Título. CDU: 347.77 Bibliotecária responsável: Jovita Cristina G. dos Santos (CRB 10/1517) Rua Manoelito de Ornellas,55 – Praia de Belas CEP: 90110-230 Porto Alegre/RS Telefone: (51) 3287-1838 biblioteca@oabrs.org.br O conteúdo é de exclusiva responsabilidade dos seus organizadores. mailto:biblioteca@oabrs.org.br ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - CONSELHO FEDERAL DIRETORIA/GESTÃO 2019/2021 Presidente: Felipe Santa Cruz Vice-Presidente: Luiz Viana Queiroz Secretário-Geral: José Alberto Simonetti Secretário-Geral Adjunto: Ary Raghiant Neto Diretor Tesoureiro: José Augusto Araújo de Noronha ESCOLA NACIONAL DE ADVOCACIA – ENA Diretor-Geral: Ronnie Preuss Duarte ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL Presidente: Ricardo Ferreira Breier Vice-Presidente: Jorge Luiz Dias Fara Secretária-Geral: Regina Adylles Endler Guimarães Secretária-Geral Adjunta: Fabiana Azevedo da Cunha Barth Tesoureiro: André Luis Sonntag ESCOLA SUPERIOR DE ADVOCACIA Diretora-Geral: Rosângela Maria Herzer dos Santos Vice-Diretor: Darci Guimarães Ribeiro Diretora Administrativa-Financeira: Graziela Cardoso Vanin Diretora de Cursos Permanentes: Fernanda Corrêa Osório, Maria Cláudia Felten Diretor de Cursos Especiais: Ricardo Hermany Diretor de Cursos Não Presenciais: Eduardo Lemos Barbosa Diretora de Atividades Culturais: Cristiane da Costa Nery Diretor da Revista Eletrônica da ESA: Alexandre Torres Petry CONSELHO PEDAGÓGICO Alexandre Lima Wunderlich Paulo Antonio Caliendo Velloso da Silveira Jaqueline Mielke Silva Vera Maria Jacob de Fradera CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS Presidente: Pedro Zanette Alfonsin Vice-Presidente: Mariana Melara Reis Secretária-Geral: Neusa Maria Rolim Bastos Secretária-Geral Adjunta: Claridê Chitolina Taffarel Tesoureiro: Gustavo Juchem TRIBUNAL DE ÉTICA E DISCIPLINA Presidente: Cesar Souza Vice-Presidente: Gabriel Lopes Moreira CORREGEDORIA Corregedora: Maria Helena Camargo Dornelles Corregedores Adjuntos Maria Ercília Hostyn Gralha, Josana Rosolen Rivoli, Regina Pereira Soares OABPrev Presidente: Jorge Luiz Dias Fara Diretora Administrativa: Claudia Regina de Souza Bueno Diretor Financeiro: Ricardo Ehrensperger Ramos Diretor de Benefícios: Luiz Augusto Gonçalves de Gonçalves COOABCred-RS Presidente: Jorge Fernando Estevão Maciel Vice-Presidente: Márcia Heinen PREFÁCIO Estamos devidamente inseridos numa revolução tecnológica, que afeta desde relações humanas até os mais diferentes de relações profissionais e de trabalho. Mudanças seguem ocorrendo rapidamente. É nesse ambiente frenético que o Direito vai se posicionando e, muitas vezes, atuando como mediador ou definidor de parâmetros. Nesse sentido, debates, estudos, discussões, troca de informações e conhecimento são fundamentais para atualizar os operadores do Direito. A realização do I Congresso Nacional de Propriedade Intelectual e o XVIII Ciclo de Propriedade Intelectual, em novembro de 2018, numa parceria da OAB/RS com a Comissão Especial de Propriedade Intelectual (CEPI), juntamente com a Escola Superior de Advocacia da OAB/RS (ESA/RS), é um exemplo desta realidade. No encontro realizado no TecnoPUCRS, em Porto Alegre, houve debates de extrema relevância, envolvendo direitos de autor, propriedade industrial, tecnologia da informação e direitos culturais. Cabe destacar que a riqueza de uma nação não é formada somente pelos bens materiais, mas também por sua riqueza e seu patrimônio intelectual. Até porque, marcas valem muito mais do que os terrenos, prédios e bens que elas possuem. Essas mudanças aceleradas que estamos vivenciando são acompanhadas e monitoradas pela OAB/RS. Enquanto a sociedade busca se adaptar a novas ferramentas e tecnologias, é imprescindível que direitos e garantias sejam respeitados. Em nome da atual Diretora-Geral da ESA/RS, Rosângela Maria Herzer dos Santos, e do Ex-Presidente da CEPI, Gustavo Bahuschewskyj Corrêa, registro meus cumprimentos pela realização do evento e pela produção do e-book. Somos entusiastas dessas práticas de registro e difusão dos conhecimentos, que seguirão recebendo incentivo e reconhecimento da direção da OAB/RS. Ricardo Breier Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil/RS APRESENTAÇÃO Com satisfação, que a Escola Superior de Advocacia da OAB/RS, em conjunto com Comissão Especial de Propriedade Intelectual da OABR/RS, disponibiliza a obra “CADERNOS DE PROPRIEDADE INTELECTUAL - Coletânea de artigos apresentados no XVIII CICLO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL e I CONGRESSO NACIONAL DE PROPRIEDADE INTELECTUAL”, em novembro de 2018, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e organizado por Alexandre Elman Chwartzmann, Gustavo Bahuschewskyj Corrêa e Maurício Brum Esteves, Membros da Comissão Especial de Propriedade Intelectual da OABR/RS. A obra contempla com onze artigos, abrange autores, alunos, professores, pesquisadores e especialistas em propriedade intelectual. Boa Leitura!! Rosângela Maria Herzer dos Santos Diretora-Geral da Escola Superior de Advocacia da OAB/RS SUMÁRIO TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA E INTERFACE COM A LEI DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA – Adriano M. G. Bedin .......................................................................... 9 DIREITOS DO AUTOR, MÚSICA E TECNOLOGIA: REFLEXÃO JURÍDICA SOBRE SUA CONCILIAÇÃO – Clarissa Melo Indalêncio, Adriana Carvalho Pinto Vieira, Julio Cesar Zilli e Kelly Lisandra Bruch ................................................................................. ...27 DIREITO AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO: PROPRIEDADE INTELECTUALE CONHECIMENTOS COLETIVOS – Geovana Bacim .................................................. 43 OS DIREITOS AUTORAIS NA SOCIEDADE DE INFORMAÇÃO: UM CONFLITO ENTRE DIREITOS FUNDAMENTAIS – Gustavo Wentz, Eduardo Henrique Hamel e Lilian Hanel Lang ................................................................................................................... 59 O COPYRIGHT E A PIRATARIA NA INDÚSTRIA DA MODA: FALHA DE MERCADO OU IMPULSO À INOVAÇÃO- Letícia Soster Arrosi ................................. 76 SOFTWARE LIVRE NA SOCIEDADE EM REDE: EM BUSCA DE UM REGIME JURÍDICO ADEQUADO – Maurício Brum Esteves e Liz Beatriz Sass .......................... 93 O PROJETO THE NEXT REMBRANDT E OS REFLEXOS NOS DIREITOS AUTORAIS – Paula Lourenço ............................................................................................ 113 O CONFLITO ENTRE SINAIS DISTINTIVOS EMPRESARIAIS E A TUTELA DA CONCORRÊNCIA – Rafael Krás Borges Verardi ........................................................... 124 VALE DOS VINHEDOS: O VINHO COMO EXPRESSÃO DE CULTURA- Raphael Vieria Medeiros..................................................................................................................... 156 CRITÉRIOS OBSERVADOS NA SOLUÇÃO DE CONFLITOS ENTRE REGISTRO DE MARCAS E NOMES EMPRESARIAIS IDÊNTICOS E/OU SEMELHANTES – Vanessa Pereira Oliveira Soares ........................................................................................................ 169 A NANOREVOLUÇÃO E NANOPATENTES? SEUS IMPACTOS NO SISTEMA INTERNACIONAL DE PATENTES E USO DO DIÁLOGO ENTRE AS FONTES DO DIREITO – Wilson Engelmann, Daniele Weber S. Leal e Raquel Von Hohendorff .... 188 9 INTRODUÇÃO No final dos anos 90, início dos anos 2000, surgia na Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Rio Grande do Sul a primeira comissão a tratar da temática da propriedade Intelectual no âmbito da OAB. Agora, já tendo adentrado na maioridade, a Comissão Especial de Propriedade Intelectual (CEPI) tem a alegria de lançar a presente publicação intitulada Cadernos de Propriedade Intelectual, obra coletiva criada a partir dos artigos apresentados no XVIII Ciclo de Propriedade Intelectual e I Congresso Nacional de Propriedade Intelectual e que conta com o apoio da Escola Superior de Advocacia – ESA-OAB/RS. É mais uma contribuição da CEPI para a comunidade jurídica, na esteira da Cartilha de Propriedade Intelectual lançada em 2015. Trata-se de obra composta por dezenove autores(as) que abordam os mais variados temas da propriedade intelectual, demonstrando a riqueza e diversidade do assunto. Entre eles podemos citar aspectos de propriedade intelectual e o meio ambiente, o universo do entretenimento, a questão dos softwares, as indicações geográficas, etc. Todos temas atuais e relevantes. São artigos de qualidade que serão referenciais tanto para os colegas que atuam quanto aqueles que pretendem se especializar na matéria. É inegável o interesse social e a importância da propriedade intelectual para o desenvolvimento econômico e tecnológico do País. Ocorre, porém, que ainda existe um grande desconhecimento da matéria e suas potencialidades. Mesmo no âmbito jurídico ainda há muito trabalho a realizar. Com esses desafios em mente, a CEPI vem, com a participação ativa dos seus membros, atuando de forma abnegada para promover o conhecimento acerca das criações intelectuais. Ao longo desses anos, diversas iniciativa foram realizadas, como projetos de sensibilização das universidades para a criação de disciplinas nos mais variados cursos afetos ao tema; apoio na criação de Câmara especializada no Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul; participação em consultas públicas; apoios em demandas da casa; realização de Ciclos de Palestras que rodaram todo interior do Estado; entre outros. É um trabalho coletivo, com o apoio da OAB/RS, em prol dos advogados e da sociedade como um todo. Esperamos que façam bom proveito dos artigos que seguem, se inspirem e no ajudem a construir um país com a cultura da propriedade intelectual, valorizando o trabalho criativo e conscientes dos direitos que possuem. Gustavo Bahuschewskyj Corrêa Ex-Presidente da Comissão Especial de Propriedade Intelectual 10 TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA E INTERFACE COM A LEI DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA TECHNOLOGY TRANSFER AND THE INTERFACE WITH ANTITRUST LAW Adriano M. G. Bedin1 Resumo: Esse artigo objetiva propiciar uma visão sobre os contratos de transferência de tecnologia, bem como analisar sua interface com a lei de defesa da concorrência e discorrer sobre as várias práticas anticoncorrenciais que podem ser perpetradas na transferência de tecnologia. Palavras-Chave: Contratos. Transferência de tecnologia. Defesa da concorrência. Abstract: This article aims to provide a view on technology transfer contracts, as well as to analyze its interface with the antitrust law and to discuss the various anticompetitive practices that may be perpetrated in the transfer of technology. Keywords: Technology transfer contracts. Anti trust Law. 1 INTRODUÇÃO Na sociedade atual é extremamente disseminada e aceita a relação entre inovação e desenvolvimento econômico. Entre as várias formas de inovação, reveste-se de grande importância a inovação tecnológica, a qual normalmente está associada a direitos de propriedade intelectual. Estes direitos podem ser objeto de negócios jurídicos e, como muitas vezes é economicamente mais interessante adquirir tecnologia do que desenvolvê-la, contratos de transferência de tecnologia são utilizados para a difusão destes conhecimentos. De um ponto de vista econômico, considera-se que estes contratos proporcionam eficiência alocativa, ao fazer que a tecnologia seja transferida de quem menos a valoriza para quem mais a valoriza e que tem melhores condições de colocá-la no mercado. Entretanto, a transferência de tecnologia pode também estar relacionada a práticas que potencialmente podem prejudicar a livre iniciativa e a livre concorrência em um determinado mercado relevante. Tais práticas podem sujeitar o negócio realizado ao escrutínio dos órgãos de defesa da concorrência, o que justifica a 1 Advogado, Agente da Propriedade Industrial e Mestrando em Direito de Empresa e Negócios. 11 realização de uma análise da interface entre os contratos de transferência de tecnologia e o direito concorrencial. 2 A TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA A tecnologia pode ser obtida ao adquirir equipamentos com a mesma incorporada, por desenvolvimento próprio ou por contratos de transferência de tecnologia. Neste tipo de contrato, uma pessoa física ou jurídica se obriga a transferir conhecimentos especiais que detém sobre processos industriais de fabricação, produtos, técnicas, experiências e práticas, em contrapartida ao pagamento de royalties2. Existem várias vantagens para ambas as partes. Por conta de uma tecnologia superior, o adquirente assume uma posição mais competitiva no mercado, atrai nova clientela e pode incrementar seu próprio programa de desenvolvimento, já o concedente, além de receber royalties, pode utilizar-se de aperfeiçoamento realizados pelo adquirente, entra em mercados sem riscos e obtém rendimentos novos com uma tecnologia já explorada.3 Deve-se ainda destacar que o custo para a criação de tecnologia própria, de maneira geral, é maior do que o valor para obtenção da mesma de quem já a domina.4 Quando nos referimos a contratos de transferência de tecnologia, na realidade estamos nos referindo a uma multiplicidade de contratos que tem como objeto a transferência de conhecimentos técnicos de diferentes naturezas. João Marcelo de Lima Assafim divide a tecnologia emtrês níveis: um primeiro de tecnologia menor - composto por conhecimentos que são a expressão das habilidades e experiências de seu criador – que não reúnem os requisitos necessários para receber uma proteção jurídica própria; um segundo – constituído por conhecimentos e informações que proporcionam vantagens competitivas sem apresentar um grau de criatividade intrínseco - já merecedores de um determinado grau de proteção pelo ordenamento jurídico, e; um terceiro – formado por conhecimentos e informações que satisfazem requisitos mínimos para merecer uma tutela jurídica específica – capazes de proporcionar um direito de exclusividade de exploração ao seu criador5. Os conhecimentos do primeiro grupo estão disponíveis para qualquer interessado e podem ser livremente aproveitados6. Os do segundo grupo têm valor econômico agregado e são usualmente mantidos em sigilo por seu criador, encontrando proteção como segredo de indústria e nas regras gerais de repressão a concorrência 2 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos. São Paulo: Saraiva, 2002.p.3. 3ASSAFIM, João Marcelo de Lima. A transferência de tecnologia no Brasil: aspectos contratuais e concorrenciais da propriedade industrial. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2010. p.26. 4 DINIZ, op.cit., p.4. 5 ASSAFIM, op.cit., p.3. 6 ASSAFIM, loc.cit. 12 desleal7. Por fim, o terceiro grupo compreende conhecimentos amparados pela propriedade intelectual. Os conhecimentos protegidos por segredo de indústria podem ser transferidos através de um contrato de fornecimento de tecnologia. Este é o nome pelo qual é conhecido no Brasil o contrato de “know-how”, que objetiva a aquisição de técnicas e conhecimentos não protegidos pela propriedade industrial8. Este tipo de contrato compreende obrigações de dar (plantas, blue prints, listagens, etc.) e obrigações de fazer (transmitir experiências, técnicas e conhecimentos práticos)9. O bem negociado neste tipo de contrato é constituído por conhecimentos confidenciais de caráter tecnológico, em que a perda do caráter sigiloso implicaria na falta de amparo legal para a proteção das informações10. É o caráter secreto das informações que atrai as normas repressoras da concorrência desleal e, ainda, que gera o valor econômico para as empresas, pois a posição competitiva que proporcionam depende de serem mantidas fora do conhecimento público11. Os conhecimentos protegidos por um direito de exclusiva são passíveis de transferência por meio de contratos de licenciamento de uso e exploração. O contrato de licença de patente [ou de desenho industrial] permite a exploração econômica da patente [ou do desenho] por terceiro, sendo admissível que recaia tanto sobre a solicitação de patente como sobre a patente já concedida12. O contrato de licença de uso de programas de computador autoriza o licenciado a utilizar o programa nas condições estipuladas, nos moldes da legislação do direito autoral, enquanto no contrato de transferência de tecnologia propriamente dito o autor disponibiliza informações técnicas do programa em si13. Por fim, o contrato de licença sobre topografia de circuitos integrados confere ao licenciado o direito, exclusivo ou não, de explorar uma topografia e de excluir terceiro, sem seu consentimento, de reproduzir dita topografia protegida14. 7 ASSAFIM, João Marcelo de Lima. A transferência de tecnologia no Brasil: aspectos contratuais e concorrenciais da propriedade industrial. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2010. p.200. 8 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos. São Paulo: Saraiva, 2002.p.18. 9 BARBOSA, Denis Borges. O contrato de know how. 2002. Disponível em <http://denisbarbosa.addr.com/paginas/home/pi_tipos_knowhow.html> Acesso em 23 de julho de 2016.p.3 10 FEKETE, Elisabeth Kasznar. O regime jurídico do segredo de indústria e comércio no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.224. 11 ASSAFIM, op.cit.,p.200. 12 Ibidem. p.157. 13 Ibidem.p.231. 14 ASSAFIM, João Marcelo de Lima. A transferência de tecnologia no Brasil: aspectos contratuais e concorrenciais da propriedade industrial. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2010. p.235. 13 3 INTERFACE COM O DIREITO DE PROTEÇÃO DA CONCORRÊNCIA A propriedade sobre bens intelectuais tem como característica intrínseca a exclusão de terceiros em relação à matéria protegida, o que gera uma aparente oposição ao direito de defesa da concorrência (antitruste), já que este tutela a livre concorrência no mercado. Esta aparente contradição pode levar a conclusão de que estes ramos do direito se contrapõem, entretanto, hoje em dia se considera que o direito da propriedade intelectual e o direito antitruste são instrumentos complementares de promoção da inovação e da concorrência15. Existe uma convergência de propósitos, uma vez que os direitos de exclusividade propiciados pela propriedade intelectual estimulam a inovação e também a concorrência, já que as empresas necessitam investir em qualidade e inovação para se diferenciar de seus concorrentes e obter parcelas maiores do mercado16. Por esta perspectiva, um direito de exclusividade sobre determinada tecnologia é um estímulo aos concorrentes para desenvolverem tecnologias substitutas. Por outro lado, a extensão dos limites dos direitos de propriedade intelectual é limitada por este mesma função de fomentar a concorrência, do que decorre que a titularidade de um direito de propriedade intelectual não coloca ninguém em uma posição absoluta, imune a qualquer restrição no exercício desse direito17. É incontroverso que situações de tensão entre a propriedade intelectual e o direito de defesa da concorrência ocorrem frequentemente e devem ser enfrentadas. Tanto é assim que o Acordo TRIPS – que estabelece padrões mínimos de proteção de propriedade intelectual para os países que pertencem a Organização Mundial do Comércio (OMC) – autoriza que os países membros tomem as medidas necessárias para evitar abusos de direito de propriedade intelectual e práticas que restrinjam de maneira injustificada o comércio ou prejudiquem a transferência de tecnologia18. Trata-se de uma permissão para incorporação nas legislações nacionais de mecanismos aptos para enfrentar o problema. 15 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin, 2014. p.147. 16 Ibidem.p.64 17 GRAU-KUNTZ, Karin. O desenho industrial como instrumento de controle econômico do mercado secundário de peças de reposição de automóveis: uma análise crítica a recente decisão da Secretaria de Direito Econômico (SDE). Revista Eletrônica do IBPI – Edição Especial. 2013. p.32.Disponível em: http://ibpieuropa.org/book/326 >. Acesso em: 12 dez. 2016. 18 BRASIL. Decreto nº 1.355, de 30 de dezembro de 1994. Promulga a Ata Final que Incorpora os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do GATT. Disponível em < http://www.inpi.gov.br/legislacao-1/27-trips-portugues1.pdf/view>. Acesso em 09 dez. 2016. Artigo 8.2. http://ibpieuropa.org/book/326 http://www.inpi.gov.br/legislacao-1/27-trips-portugues1.pdf/view 14 Em consonância com o TRIPS, a lei de defesa da concorrência brasileira considera infração da ordem econômica exercer ou explorar abusivamente direitos de propriedade industrial, intelectual, tecnologia ou marca19 e, assim, atua como controle externo, impedindo que os agentes econômicos abusem de direitos de propriedade industrial com fins anticoncorrenciais20. O abuso de um direito ocorre quando este é exercido excedendo manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social. Neste caso particular, ocorre abuso quando o titular tenta exercer controle fora das formasde exploração normais dos bens intangíveis21. O problema é distinguir uma prática concorrencial normal e uma prática abusiva, principalmente considerando que provocar prejuízos aos concorrentes é inerente à própria concorrência. Para fornecer um panorama geral das possíveis práticas anticoncorrenciais que podem ocorrer em contratos de transferência de tecnologia, é útil recorrer ao direito comparado. Um bom ponto de partida é iniciar com os “Nine No-Nos”, uma lista de cláusulas publicada pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos em 1970 que, se incluídas em contratos de transferência de tecnologia, seriam consideradas ilícitos per se22. “A regra per se determina que, uma vez configuradas certas práticas, o ato poderá ser julgado como ilegal sem a necessidade de aprofundamento da investigação”23. Em outras palavras, a mera inclusão da cláusula já seria considerada ilegal e não seria necessária qualquer outra análise subsequente. As cláusulas proibidas eram: cobrar royalties não relacionados de forma razoável com as vendas dos produtos patenteados; restrições ao comércio do licenciado fora do âmbito das patentes; exigir do licenciado a compra de material não patenteado do licenciante; pacotes de licenças obrigatórias; exigir do licenciado a cessão ao licenciante de patentes emitidas após o acordo de licenciamento ser executado; poder de veto do licenciado sobre concessões de novas licenças; restrições nas vendas de produtos não patenteados por meio de um processo 19 BRASIL. Lei nº 12529, de 30 de novembro de 2011. Estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência; dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm>. Acesso em 09 dez. 2016. art 36. 20 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin. 2014, p.57-58. 21 RODRIGUES JR, Edson Beas. Abuso no exercício de direito da propriedade intelectual e as contribuições do caso ANFAPE. Revista da ABPI nº 140, p.40, jan/fev de 2016. 22 LILLA, op.cit. p.136. 23 GABAN, Eduardo Molan; DOMINGUES, Juliana Oliveira. Direito antitruste. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p.83. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm 15 patenteado; restrições pós-venda na revenda; e a fixação de preços mínimos de revenda dos produtos patenteados24. No decorrer dos anos 80 e 90 do século passado, os órgãos de defesa da concorrência dos Estados Unidos revisaram sua posição, deixando de considerar muitas dessas práticas como ilícitos per se e passando a analisá-las caso a caso, à luz da “regra da razão” 25. “Pela regra da razão, somente são consideradas ilegais as práticas que restringem a concorrência de forma não razoável” 26. Esta regra afasta a ilicitude ao fazer com que não se configure o suporte fático necessário para a incidência do dispositivo pertinente da legislação antitruste27. Em última análise, isto significa que uma prática que efetivamente restrinja a concorrência pode ser permitida se o bem-estar econômico geral criado pela operação for positivo. Assim, a regra da razão compreende uma ponderação entre os efeitos pró-competitivos do contrato e os efeitos anticoncorrenciais, sendo a operação autorizada se os primeiros superarem os segundos. De forma coerente com o novo entendimento, em 1995 o Governo Americano lançou novas Diretrizes Antitruste para o Licenciamento de Propriedade Intelectual. Estas diretrizes tinham três princípios fundamentais: (i) um reconhecimento expresso de que em geral contratos de licenciamento têm natureza pró-competitividade; (ii) uma rejeição clara a qualquer presunção de que a propriedade intelectual proporcionaria necessariamente poder de mercado a seu titular, e; (iii) um endosso a validade de aplicar à propriedade intelectual a mesma abordagem antitruste adotada para outras formas de propriedade28. Como as diretrizes partem do pressuposto que normalmente o licenciamento apresenta ganhos de eficiência, há a necessidade de analisar as operações sob a regra da razão e, ainda, o abandono da presunção que a propriedade intelectual gera poder de mercado significa que a avaliação de restrições impostas pelo licenciamento requer uma análise das circunstâncias do mercado para determinar os efeitos anticompetitivos29. Existem várias cláusulas restritivas que podem ser incluídas em contratos de transferência de tecnologia, algumas delas ainda são tratadas como ilícitos per se, tanto nos 24 GILBERT, Richard; SHAPIRO, Carl. Antitrust Issues in the Licensing of Intellectual Property: The Nine No-No's Meet the Nineties. Brooking Papers: Microeconomics 1997. p.284-285.Disponível em: < http://faculty.haas.berkeley.edu/shapiro/ninenono.pdf>. Acesso em 11 dez 2016. 25 Ibidem.p. 286. 26 FORGIONI, Paula A. Os fundamentos do antitruste. 8ª ed. rev, atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p.197. 27 Ibidem p.199. 28 GILBERT, Richard; SHAPIRO, Carl. Antitrust Issues in the Licensing of Intellectual Property: The Nine No-No's Meet the Nineties. Brooking Papers: Microeconomics 1997. p. 287. 29 GILBERT; SHAPIRO. loc.cit. http://faculty.haas.berkeley.edu/shapiro/ninenono.pdf 16 Estados Unidos como na Europa. As diretrizes americanas tratam como ilícitos per se a fixação pura de preços, restrições de produção, divisão de mercado entre competidores horizontais, fixação de preços de revenda e alguns boicotes de grupos. Para determinar se a uma restrição deste tipo será aplicada a regra per se ou a regra da razão, é feita uma avaliação se pode ser esperado que a restrição contribua para uma integração de aumento de eficiência da atividade econômica, se isto for provável será utilizada a regra da razão, em caso contrário aplica-se a regra per se30. De modo similar, a Europa trabalha com as restrições hard-core, empregando diferentes tratamentos se a relação é horizontal (concorrentes diretos) ou vertical (diferentes níveis da cadeia produtiva). Em relações horizontais são restrições proibidas: a fixação de preços para o licenciado na venda do produto para terceiros; limitações recíprocas de produção; alocação ou divisão de mercados; restrições ao licenciado de explorar sua própria tecnologia ou de realizar atividades de pesquisa e desenvolvimento. Em relações verticais proíbe-se: fixação de preços mínimos de revenda; restrição dos territórios ou dos consumidores para os quais o licenciado pode vender de forma passiva; restrição de vendas ativas ou passivas aos usuários finais por um licenciado que é membro de um sistema de distribuição seletiva31. De maneira geral, as Diretrizes Americanas se preocupam com acordos que prejudicam a competição entre empresas que seriam efetivas ou potenciais concorrentes na ausência de dito acordo32. Por esta perspectiva, competição intratecnologia não é uma competição que ocorreria na ausência da licença e as restrições acima explicadas não são a princípio consideradas anticompetitivas quando aplicadas a licenciados da mesma tecnologia33, ou seja, o foco está na competição intertecnologia (entre tecnologias concorrentes). As Diretrizes e Regulamento da Comunidade Europeia são mais rígidos ao analisar estas restrições, levando em consideração o impacto do acordo no mercado intratecnologia e intertecnologia34. Ao comparar os princípios de antitruste dos Estados Unidos e Europa, Richard J. Gilbert afirma que as restrições intratecnologia são um incentivo para o titular da tecnologia licenciar a mesma amplamente e que, na ausência dessas cláusulas restritivas, não se pode assumir que as tecnologias serão licenciadas e que haverá investimentos complementares35. Gilbert ainda enfatiza que,de acordo 30 Ibidem. p.16. 31 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin. 2014. p.156. 32 Ibidem. p.7. 33 GILBERT,Richard J. Converging Doctrines? US and EU Antitrust Policy for the Licensing of Intellectual Property (february 2004). University of California, Berkeley, Competition Policy Working Paper nº CPC04-44. p.3.Disponível em: < https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=527762>. Acesso em: 11 dez 2016. 34 Ibidem. p.4. 35 Ibidem. p.6. https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=527762 17 com as diretrizes americanas, a análise das cláusulas restritivas compreende aferir se podem ser justificadas diante de alternativas menos restritivas, verificando se são “razoavelmente necessárias”, enquanto na análise da Comissão Europeia as cláusulas devem ser “objetivamente necessárias”, adotando novamente um critério mais rígido36. 4 CLÁUSULAS QUE PODEM TER EFEITOS ANTICONCORRENCIAIS A primeira restrição importante que pode estar presente em um contrato de transferência de tecnologia é a exclusividade. Os contratos de licenciamento podem ser firmados com exclusividade, ou seja, apenas o licenciado poderá explorar a tecnologia, excluindo inclusive o próprio licenciante e impedindo que este conceda licenças para outros37. Esta exclusividade pode ser restrita a um determinado território, ou pode se referir apenas a determinados consumidores, ou pode estar restrita a um determinado campo de aplicação tecnológico38. Estas restrições podem ser pró-competitivas: ao permitir que o licenciante explore a propriedade intelectual da forma mais eficiente possível e, ainda, ao protegê-lo da competição em nichos de mercado que deseje manter para si, enquanto no outro extremo, protege o licenciado da competição de outros licenciados e do próprio licenciante, propiciando incentivos para investir na comercialização e distribuição de produtos com a tecnologia licenciada e desenvolver novas aplicações para a mesma39. Entretanto, tais restrições podem levantar preocupações anticoncorrenciais se bloquearem o acesso a tecnologias concorrentes, impedirem o desenvolvimento pelo licenciado de tecnologias próprias, ou facilitarem alocação de mercado ou fixação de preços de qualquer produto ou serviço do licenciado40. Um contrato de transferência de tecnologia pode incluir cláusulas de não concorrência que impedem o licenciado de licenciar, vender, usar ou distribuir tecnologias concorrentes41. Este tipo de cláusula gera preocupações para as autoridades de defesa da concorrência, na medida em que podem afetar a concorrência intertecnologias e fechar o mercado a terceiros 36 Ibidem. p.8. 37 US DEPARTMENT OF JUSTICE AND FEDERAL TRADE COMISSION. Antitrust Guidelines for the Licensing of Intellectual Property. 1995. Disponível em: <https://www.justice.gov/atr/antitrust-guidelines- licensing-intellectual-property>. Acesso em 09 dez.2016. p.19. 38 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin. 2014. p.166. 39 US DEPARTMENT OF JUSTICE AND FEDERAL TRADE COMISSION. Antitrust Guidelines for the Licensing of Intellectual Property. 1995. Disponível em: <https://www.justice.gov/atr/antitrust-guidelines- licensing-intellectual-property>. Acesso em 09 dez.2016. p.5. 40 Ibidem. p.6. 41 Ibidem. p.28.. 18 detentores de tecnologias alternativas ou substitutas, bem como aumentar os custos dos concorrentes ao impedir o acesso a insumos de produção e distribuição detidos pelos licenciados42. Por outro lado, estas restrições podem ter efeitos pró-competitivos, encorajando os licenciados a desenvolver e comercializar a tecnologia licenciada ou aplicações especializadas de dita tecnologia, aumentando os incentivos do licenciante para desenvolver ou aperfeiçoar a tecnologia, ou de outro modo aumentando a concorrência e a produção no mercado relevante43. Por este motivo, estas restrições são analisadas à luz da regra da razão nos Estados Unidos, sendo considerado o grau de fechamento do mercado relevante, a duração do contrato, a concentração do mercado, a dificuldade de entrada no mercado e os efeitos na oferta e na demanda ocasionados por mudanças de preço no mercado relevante44. Na Europa também se aplica a regra da razão para analisar restrições deste tipo, porém, não se admite que as restrições limitem direta ou indiretamente atividades de pesquisa e desenvolvimento45. Uma cláusula de retrolicenciamento cria uma obrigação para o licenciado de estender ao licenciante direitos de uso sobre melhoramentos realizados sobre a tecnologia licenciada, podendo ter efeitos positivos se for sem exclusividade, ao proporcionar meios para ambas as partes compartilharem risco, recompensar o licenciante por possibilitar inovações adicionais baseadas em sua tecnologia, promover inovações subsequentes e licenciamento dessas inovações46. É lógico supor que a possibilidade de aproveitar-se de aperfeiçoamento realizados pelo licenciado pode ser um poderoso incentivo para licenciar uma tecnologia. Uma cláusula de retrolicenciamento encontra justificativa ao assegurar que o licenciante não seja impedido de competir por lhe ser negado acesso a melhoramentos realizados sobre a sua própria tecnologia, entretanto, esta cláusula não pode prever o licenciamento com exclusividade dos aperfeiçoamentos para o titular da tecnologia original – excluindo da exploração o seu criador e impedindo que a licencie para terceiros – já que isto reduziria os incentivos para o licenciado realizar atividades de pesquisa e desenvolvimento e limitaria a competição em mercados de inovação47. Importante ainda ressaltar que “[...] cláusulas de grantback com exclusividade podem 42 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin. 2014. p.170. 43 US DEPARTMENT OF JUSTICE AND FEDERAL TRADE COMISSION. op.cit. p.27. 44 Ibidem,p.27. 45 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin. 2014. p.174. 46 US DEPARTMENT OF JUSTICE AND FEDERAL TRADE COMISSION. Antitrust Guidelines for the Licensing of Intellectual Property. 1995. Disponível em: <https://www.justice.gov/atr/antitrust-guidelines- licensing-intellectual-property>. Acesso em 09 dez.2016. p.30. 47 Ibidem.p.30. 19 estender de forma indevida o poder de mercado do licenciante, permitindo-lhe controlar e acumular todas as melhorias e aprimoramentos desenvolvidos por seus licenciados [...]”48. Cláusulas de não impugnação são previsões contratuais que impedem os licenciados de questionar a validade dos direitos de propriedade intelectual objeto do licenciamento e não são bem vistas pelo direito antitruste, uma vez que podem dissimular a invalidade e permitir a manutenção de direitos de propriedade intelectual que deveriam estar em domínio público, prejudicando não só a concorrência como o próprio processo de inovação49. Não há justificativa para aceitar cláusulas contratuais que proporcionam a manutenção de uma exclusividade concedida sem as condições mínimas que a justificam. Além disso, ao licenciar um direito de propriedade intelectual de questionável validade, o licenciante outorga ao licenciado um título cuja exclusividade pode a qualquer momento ser desafiada por qualquer pessoa com legítimo interesse para instaurar processo administrativo de nulidade ou propor ação de nulidade de patente50. Impedir quem está em melhor posição para avaliar as condições de fundo da propriedade intelectual de impugnaro objeto do licenciamento, quando todos os demais são legitimados para tanto, não faz sentido. Uma prática que levanta um alerta em contratos de transferência de tecnologia é a venda casada, que “[...] pode ser definida como a obrigação pela qual o licenciante condiciona o licenciamento de um direito de propriedade intelectual ou tecnologia à aquisição de um produto ou serviço pelo licenciado”51. O caso clássico é o da Motion Picture Patents Co. de Thomas Edison, empresa de que detinha uma tecnologia inovadora de projeção de filmes e incluiu nos contratos de licenciamento dos projetores uma cláusula que condicionava a licença ao uso somente de filmes obtidos com a MPPC52. O problema é que em certas circunstâncias este é um meio para o agente econômico estender poder de um mercado primário para um mercado secundário53, quando há uma relação de complementaridade entre estes mercados, como: impressoras e cartuchos; barbeadores manuais e lâminas; cafeteiras e filtros de café; automóveis 48 LILLA, op.cit. p.185. 49 Ibidem. pp.186,187. 50 PROVEDEL, Letícia. Adjudicação e nulidade de patente. In: BARBOSA, Denis Borges.(org.). Reivindicando a criação usurpada. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2010.p.60. 51 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin. 2014. p.174. 52 HOVENKAMP, Herbert. IP and Antitrust Policy: A Brief Historical Overview. University of Iowa Legal Studies Research Paper Number 05-31.December, 2005. p.12-13. Disponível em: < https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=869417>. Acesso em 20 nov. 2016. 53 SILVA, Alberto Luís Camelier da. Desenho Industrial: abuso de direito no mercado de reposição. São Paulo: Saraiva. 2014. p.94. https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=869417 20 e peças de reposição; aspiradores e sacos de pó, entre inúmeros outros54. Esta extensão de poder de mercado de um mercado para outro é explicada pela doutrina da alavancagem, que presume que uma empresa com monopólio em um mercado sempre terá incentivos para estender este monopólio para o mercado de um produto complementar, a fim de poder cobrar preços de monopólio em ambos os mercados e aumentar seus lucros55. Esta teoria considera que uma empresa com poder de monopólio em um mercado pode usar a alavancagem proporcionada por este poder para impedir vendas em um segundo mercado e monopolizá-lo56. Nos dias atuais a venda casada é analisada à luz da regra da razão, pois, apesar de poder resultar em efeitos anticompetitivos, pode também estar associada a eficiências e efeitos pró-competivivos (que devem ser sopesados), sendo o acordo questionado se o vendedor tem poder de mercado no produto vinculante, o arranjo provoca efeitos adversos na concorrência do mercado relevante do produto vinculado e as justificativas de eficiências não superam os efeitos anticoncorrenciais57. Podemos citar alguns exemplos de eficiências econômicas que podem estar relacionadas a vendas casadas, como a redução dos custos de produção, de custos de transação e de custos informação para os consumidores, bem como proporcionar maior conveniência e variedade para os mesmos58. Se o produto ou serviço vinculado for também protegido por um direito de propriedade intelectual na realidade trata-se de um pacote de licenças e não de uma licença casada59. Um pacote de licenças tem como objeto o licenciamento de múltiplos itens de propriedade intelectual em uma única licença ou em um grupo de licenças relacionadas, sendo que ditos pacotes podem estar relacionados a aumentos de eficiência quando múltiplas licenças são necessárias para utilizar um único item de propriedade intelectual60. Em outras palavras, estes 54 GRAU-KUNTZ, Karin. O desenho industrial como instrumento de controle econômico do mercado secundário de peças de reposição de automóveis: uma análise crítica a recente decisão da Secretaria de Direito Econômico (SDE). Revista Eletrônica do IBPI – Edição Especial. 2013. p.2. Disponível em: http://ibpieuropa.org/book/326 >. Acesso em 11 dez. 2016 55 EVANS, David S.; PADILLA, A. Jorge. Designing Antitrust Rules for Assessing Unilateral Practices: A Neo- Chicago Approach. University of Chicago Law Review: Vol. 72: Iss. 1, Article 5. 2005. p.76. Disponível em: <http://chicagounbound.uchicago.edu/uclrev/vol72/iss1/5>. Acesso em: 11 dez. 2016. 56 WHINSTON, Michael D. Tying, Foreclose and Exclusion. The American Economic Review. 1990. p.838. Disponível em: < http://www.haas.berkeley.edu/Courses/Spring2000/BA269D/Whinston90.pdf>. Acesso em: 13 nov. 2016. 57 US DEPARTMENT OF JUSTICE AND FEDERAL TRADE COMISSION. Antitrust Guidelines for the Licensing of Intellectual Property. 1995. Disponível em: <https://www.justice.gov/atr/antitrust-guidelines- licensing-intellectual-property>. Acesso em 09 dez.2016. p.26. 58 AHLBORN, Christian; EVANS, David S.; PADILLA, A. Jorge. The antitrust economics of tying: a farewell to per se illegality. Antitrust Bulletin 2003. p.3. Disponível em: < https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=381940>. Acesso em 11 dez. 2016. 59 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin. 2014. p.174. 60 US DEPARTMENT OF JUSTICE AND FEDERAL TRADE COMISSION. op.cit. p.27. http://ibpieuropa.org/book/326 http://chicagounbound.uchicago.edu/uclrev/vol72/iss1/5 http://www.haas.berkeley.edu/Courses/Spring2000/BA269D/Whinston90.pdf https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=381940 21 pacotes de licenças podem ser eficientes quando para fabricar um único produto é necessário licenciar uma multiplicidade de tecnologias relacionadas ao mesmo, tal como um smartphone, uma vez que a negociação de todas as tecnologias em conjunto reduz os custos de transação61. Quando múltiplas empresas controlam patentes que são necessárias para fabricar determinado produto, o preço total é superior ao que seria cobrado se estes direitos pertencessem e fossem negociados com um único titular e, ainda, os lucros individuais de cada titular são menores em presença das patentes complementares dos demais, o que torna interessante se juntarem e criarem um pacote de licenças, compartilhamento de patentes ou licença cruzada62. As licenças cruzadas e os compartilhamentos de patentes são semelhantes aos pacotes de licenças, no sentido de que são acordos entre dois ou mais titulares de direitos de propriedade intelectual diferentes para licenciar estes direitos entre si ou para terceiros63. As licenças cruzadas são arranjos contratuais pelos quais dois titulares de patente concedem licenças recíprocas de suas respectivas tecnologias, de modo que cada parte pode utilizar a patente da outra64. Sob o pálio dessas licenças cada empresa pode projetar e fabricar seus produtos sem o medo de infringir as patentes do outro65. Em determinados setores, como o de semicondutores, grandes empresas buscam obter patentes mais para estar em melhor posição para negociar estas licenças cruzadas do que para utilizá-las contra terceiros66. Este tipo de licença é considerado pró-concorrencial se integrar tecnologias complementares, reduzir custos de transação, eliminar bloqueios de patentes e evitar custosos litígios por contrafação67. No outro extremo, o direito anticoncorrencial as considera nocivas quando forem utilizadas para a fixação pura de preços ou para divisão de mercado. Além disso, quando as partes envolvidas mantém entre si um relacionamento horizontal, as autoridades antitruste verificarão se não é efeito do 61 LILLA, op.cit. p.176. 62 SHAPIRO, Carl. Navigating the Patent Thicket: Cross Licenses, Patent Pools, and Standard Setting.In: Innovation Policy and the Economy, Volume 1. MIT Press. 2001. p.119. Disponível em: < http://www.nber.org/chapters/c10778.pdf>. Acesso em: 12 dez. 2016. 63 US DEPARTMENT OF JUSTICE AND FEDERAL TRADE COMISSION. Antitrust Guidelines for the Licensing of Intellectual Property. 1995. Disponível em: <https://www.justice.gov/atr/antitrust-guidelines- licensing-intellectual-property>. Acesso em 09 dez.2016. p.28. 64 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin. 2014. p.190. 65 SHAPIRO, Carl. Technology cross-licensing practices: FTC v. INTEL. In: KWOKA Jr, John E.; LAWRENCE, J. White. The Antitrust Revolution. New York: Oxford University Press. 2003. p.356. 66 HALL, Bronwyn H.; ZIEDONIS, Rosemarie Ham. The Patent Paradox Revisited: An Empirical Study of Patenting in the Us Semiconductor Industry, 1979-95. RAND Journal of Economics. p.12. Disponível em: < https://www.nuffield.ox.ac.uk/economics/papers/2000/w16/hzmay2000.pdf>. Acesso em: 12 dez. 2016. 67 US DEPARTMENT OF JUSTICE AND FEDERAL TRADE COMISSION. op.cit.p.28. http://www.nber.org/chapters/c10778.pdf https://www.nuffield.ox.ac.uk/economics/papers/2000/w16/hzmay2000.pdf 22 contrato diminuir a competição que ocorreria entre entidades que seriam concorrentes reais ou potenciais no mercado relevante na ausência da licença cruzada68. O compartilhamento de patentes é um negócio jurídico pelo qual uma multiplicidade de detentores de patentes pode realizar a exploração conjunta desses direitos de propriedade industrial e formam um pacote de licenças a ser ofertado para terceiros interessados69. Em mercados muito fragmentados, tal como o de biotecnologia, tecnologia da informação e telecomunicações, um único produto final pode envolver centenas de patentes que teriam que ser licenciadas. Os custos de transação para encontrar todos os titulares dos direitos de propriedade intelectual e negociar individualmente com cada um podem ser tão altos que simplesmente inviabilizariam o negócio, o que justifica a negociação conjunta destas tecnologias, porém, os contratos devem incluir as seguintes salvaguardas: limitação do portfólio de patentes apenas aquelas que são essenciais para obter o produto (e que por definição não concorrem entre si); as patentes do portfólio serem claramente identificadas e poderem ser licenciadas individualmente por seus respectivos titulares; emissão de licenças não exclusivas a nível mundial; responsabilidade do licenciado por royalties condicionada ao uso real das patentes; liberdade aos licenciados para desenvolver e utilizar tecnologias alternativas; obrigação dos licenciados de conceder retrolicenças não exclusivas e não discriminatórias sobre patentes que são essenciais para cumprir com a tecnologia70. Neste contexto é importante citar o conceito de patentes dependentes, que são patentes que se sobrepõe, isto é, em que a exploração de qualquer delas é impossível sem infringir as demais71. Como a introdução de um novo produto no mercado geralmente envolve o desenvolvimento de várias tecnologias complementares distintas, tais como partes componentes e processos de fabricação72, isto pode representar um obstáculo. Em teoria, uma empresa pode simplesmente inventar em torno (invent around) de tecnologias detidas por terceiros e evitar potenciais problemas, o que pode ser vantajoso dependendo do tempo, viabilidade e custos de 68 US DEPARTMENT OF JUSTICE AND FEDERAL TRADE COMISSION.loc.cit. 69 LILLA, Paulo Eduardo. Propriedade Intelectual e Direito de Concorrência: uma abordagem sob a perspectiva do Acordo TRIPS. São Paulo: Quartier Latin. 2014. p.192. 70 GILBERT, Richard J. Antitrust for Patent Pools: A Century of Policy Evolution. Stanford Technology Law Review 3. 2004. p.1.Disponível em: < https://journals.law.stanford.edu/sites/default/files/stanford-technology- law-review/online/gilbert-patent-pools.pdf>. Acesso em 12 dez. 2016. 71 LILLA, op.cit. p.190. 72 FERSHTMAN, Chaim; KAMIEN, Morton. Cross Licensing of Complementary Technologies. Kellogg Graduate School of Manegement. Discussion Paper nº 866. Jan. 1990. p.1. Disponível em: < http://www.kellogg.northwestern.edu/research/math/papers/866.pdf > . Acesso em 12 dez. 2016. https://journals.law.stanford.edu/sites/default/files/stanford-technology-law-review/online/gilbert-patent-pools.pdf https://journals.law.stanford.edu/sites/default/files/stanford-technology-law-review/online/gilbert-patent-pools.pdf http://www.kellogg.northwestern.edu/research/math/papers/866.pdf 23 contratação ex ante73. Entretanto, muitas vezes uma empresa que poderia facilmente criar alternativas para tecnologias complementares nos estágios iniciais do desenvolvimento de produtos novos, o que a colocaria em uma posição de negociação favorável para licenciar direitos de propriedade industrial pré-existentes, estaria em uma posição de negociação muito mais fraca ao descobrir a existência da patente depois de incorporar a tecnologia em projetos ou processos que são dispendiosos ou difíceis de reimplantar, já que neste ponto a invenção representa um ativo altamente específico74. Setores estratégicos - como a indústria de semicondutores, biotecnologia, software e internet – são particularmente sensíveis ao risco de bloqueio de novos produtos que infringem inadvertidamente patentes publicadas depois de terem sido projetados, risco este que é especialmente pronunciado em indústrias em que a escolha de padrões técnicos é uma parte essencial para trazer um novo produto ao mercado, como as indústrias de telecomunicações e computação75. De acordo com Shapiro, licenças cruzadas e compartilhamento de patentes são dois métodos efetivos para superar uma rede de direitos de propriedade industrial que impeça a comercialização de uma tecnologia, mas o autor ressalva que ambos envolvem custos de transação, inclusive decorrentes da hostilidade histórica do direito antitruste com acordos entre concorrentes em relação horizontal76. 5 CONCLUSÃO O direito de propriedade intelectual e o direito de defesa da concorrência são instrumentos complementares para incentivar a inovação tecnológica e o desenvolvimento econômico. Apesar de compartilharem este objetivo, os direitos de exclusão da propriedade intelectual podem ser utilizados para efetivamente limitar ou mesmo eliminar a livre concorrência ou a livre iniciativa em determinado mercado relevante. Nesse sentido, um contrato de transferência de tecnologia pode ser um terreno fértil para que agentes econômicos com posição dominante em determinado mercado relevante abusem de seus direitos de 73 ZIEDONIS, Rosemarie Ham. Fragmented Markets for Technology and the Patent Acquisition Strategies of Firms, Management Science 50, nº6, jun. 2004. p. 806. Disponível em: < http://business.illinois.edu/josephm/BA549_Fall%202014/Session%204/4_Ziedonis%20(2004).pdf>. Acesso em: 12 dez. 2016. 74 ZIEDONIS, Rosemarie Ham. Fragmented Markets for Technology and the Patent Acquisition Strategies of Firms, Management Science 50, nº6, jun. 2004. p. 806. Disponível em: < http://business.illinois.edu/josephm/BA549_Fall%202014/Session%204/4_Ziedonis%20(2004).pdf>. Acesso em: 12 dez. 2016. 75 SHAPIRO, Carl. Navigating the Patent Thicket: Cross Licenses, Patent Pools, and Standard Setting. In: Innovation Policy and the Economy, Volume 1. MIT Press. 2001. p.119. Disponível em: < http://www.nber.org/chapters/c10778.pdf>. Acesso em: 12 dez. 2016. 76 SHAPIRO, loc.cit. http://business.illinois.edu/josephm/BA549_Fall%202014/Session%204/4_Ziedonis%20(2004).pdf http://business.illinois.edu/josephm/BA549_Fall%202014/Session%204/4_Ziedonis%20(2004).pdf http://www.nber.org/chapters/c10778.pdf 24 propriedade intelectual e da posição dominanteque detém para impingir restrições à concorrência. Devido ao fato da experiência de defesa da concorrência nacional ser relativamente recente, a análise da jurisprudência estrangeira em ordenamentos em que a mesma está muito mais consolidada, pode fornecer não somente um panorama das práticas anticoncorrenciais mais comuns, como critérios objetivos para analisar e valorar estes ilícitos, determinando se as restrições impostas são justificáveis ou se o Estado deve intervir na esfera privada dos agentes econômicos para proteger a concorrência, a livre iniciativa e o consumidor. 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Acesso em 12 dez. 2016. 27 DIREITOS DO AUTOR, MÚSICA E TECNOLOGIA: REFLEXÃO JURÍDICA SOBRE SUA CONCILIAÇÃO AUTHOR'S RIGHTS, MUSIC AND TECHNOLOGY: LEGAL REFLECTION ON YOUR RECONCILIATION Clarissa Melo Indalêncio1 Adriana Carvalho Pinto Vieira2 Julio Cesar Zilli3 Kelly Lissandra Bruch4 Resumo: A origem de novos instrumentos de tecnologia se pôs como um enorme desafio a ser encarado pelos meios de comunicação. O fácil e rápido acesso à amplitude de conteúdos proporcionada aos usuários pelo ambiente virtual, permitindo o alcance e o armazenamento de um número bastante extenso de todo e qualquer tipo de obra ou criação, vem rebelando as possibilidades de reprodução das obras protegidas por direitos autorais, e deste modo, gerando inquietação no campo jurídico. O presente estudo cuida da natureza jurídica do direito de autor de músicas no Brasil. Analisa-se o mercado de música não vendida e os efeitos da tecnologia na sua distribuição. Propõe-se a rediscussão da Lei nº 9.610/1998 que trata da matéria. Utilizou-se o método de pesquisa dedutivo, em pesquisa teórica e qualitativa, com emprego de material bibliográfico e documental legal. O constante desenvolvimento dos meios de comunicação deixa evidente o grau de importância que os meios modernos de interação efetuam sobre a convivência entre os indivíduos e os impactos econômicos. Palavras-Chave: Direitos do autor. Música. Tecnologia. Abstract: The origin of newtechnology tools began as a challenge to be faced by the media. The quick and easy access to the breadth of content offered to users through the virtual environment, allowing the scope and storage of a very large number of any type of work or creation, is rebelling playback possibilities of works protected by copyright, and thus generating unrest in the legal field. This study takes care of the legal nature of copyright music in Brazil. It analyzes the music market not sold and the effects of technology in its distribution. It is proposed to re-discussion of Law No. 9,610 / 1998 dealing with the matter. We used the method of deductive research in theoretical and qualitative research, with the use of library materials and legal documents. The constant development of the media makes clear the degree of importance that modern means of interaction perform on the coexistence of individuals and economic impacts. Keywords: Author's rights. Music. Technology. 1 UNESC, Email: cacah_melo_@hotmail.com 2 PPGAD/UNESP; INCT/PPED/UFRJ. Email: dricpvieira@gmail.com, 3 UNESC, Email: zilli42@hotmail.com 4 CEPAN/UFRGS, Email: kellybruch@gmail.com mailto:dricpvieira@gmail.com 28 1 INTRODUÇÃO A origem de novos instrumentos de tecnologia se pôs como um enorme desafio a ser encarado pelos meios de comunicação. O fácil e rápido acesso à amplitude de conteúdos proporcionada aos usuários pelo ambiente virtual, permitindo o alcance e o armazenamento de um número bastante extenso de todo e qualquer tipo de obra ou criação, vem rebelando as possibilidades de reprodução das obras protegidas por direitos autorais, e deste modo, gerando inquietação no campo jurídico. Neste estudo se busca analisar os conflitos de interesses no Direito Autoral no concernente à esfera musical na atualidade, observando a Lei nº 9.610/1998, pertencente ao ordenamento jurídico brasileiro, bem como irrefreável desenvolvimento tecnológico, sobretudo, da internet. Averigua-se a natureza jurídica do Direito Autoral, considerando os direitos morais e patrimoniais. Demonstra-se a realidade sobre o comércio musical no Brasil, e revela-se os problemas para a resolução de litígios e proteção dos direitos do autor que, devido ao rápido avanço dos meios virtuais de distribuição, tornaram a Lei de Direitos Autorais falha e omissa ao se tratar dos fatos atuais. 2 NATUREZA JURÍDICA DOS DIREITOS DO AUTOR DE MÚSICAS O Direito Autoral encontra-se regulado pela Lei n° 9.610 de 1998, e busca garantir ao autor o direito sobre suas obras e criações. Ao criador reserva o direito personalíssimo e exclusivo de reprodução ou publicação, ou mesmo licenciar ou ceder seu conteúdo. Moraes (2004, p.38) expõe a relevância dos direitos do autor: O Direito Autoral é do autor e para o autor, que é o horizonte em relação ao qual tudo deve ser pensado. Assim como “o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado”, o Direito Autoral existe em função do autor, e não o contrário. Numa perspectiva dualista, aqui adotada, divide-se em direito moral e direito patrimonial. O primeiro é responsável por garantir a autoria da obra intelectual ao criador, direito este personalíssimo, inalienável e irrenunciável. Assegura-se que o autor terá direito de reconhecer a obra como sua e preservá-la da maneira que esta fora originalmente criada ou até mesmo modificá-la antes ou depois de publicada (KISCHELEWSKI, 2014). Em relação ao direito patrimonial, associado ao proveito econômico que a obra pode trazer ao autor, atribui o direito exclusivo de usar, fruir e dispor de sua criação. Com 29 isto, pode o autor permitir que terceiros reproduzam e usem de sua obra, seja de maneira total ou parcial, para sempre ou por tempo determinado; escolher o local e se haverá custo para tal reprodução; e ainda, receber o valor de no mínimo 5% sobre o aumento do preço da revenda (MENEZES, 2007). Assegura-se a viabilidade legal da exploração econômica da obra por parte do autor, obtendo por meio dela seu proveito pecuniário. Quando a criação possuir apenas um criador, após seu falecimento, o direito patrimonial se desloca aos seus herdeiros, perdurando por setenta anos, a serem contados a partir do dia 1º de janeiro do ano subsequente ao seu óbito. Nas obras em que houver co-autoria e em sendo indivisíveis, o prazo se inicia a partir da morte do último co-autor. Ainda em relação aos direitos morais e patrimoniais, Duarte e Pereira (2009, p. 10) esclarecem: O direito de autor tem por objetivo assegurar ao criador uma participação financeira e outra moral, no que diz respeito ao uso da obra que criou (isso, quando não se tratar de uma autorização gratuita). Vale salientar que as obras é que são protegidas e não os autores. Portanto, é desta forma que eles se tornam favorecidos dessa proteção. Para tanto, o surgimento do direito de autor se deu com a criação da obra intelectual, dado que não se pode falar de direito de autor sem a existência de uma obra. O direito de autor protege as formas de expressão das ideias e não as ideias, propriamente ditas. É necessário que elas tomem um corpo físico, expresso mediante um livro, um desenho, um filme ou etc. No direito autoral, também se regula os direitos de artistas que venham a interpretar ou executar as obras, as quais podem ser, por exemplo, músicos, dançarinos, atores, cantores, entre outros; que são designados como direitos conexos aos de autor, conforme estipulado no artigo 1º da Lei n° 9.610/1998. (BRASIL, 2016). O direito autoral, conforme Silva Junior (2006), vem sendo considerado como sui generis, especial e peculiar, evoluindo dos direitos de personalidade individuais, expressão clara de sua pisque. Para Carlos Alberto Bittar (2008, p.20), os direitos autorais: [s]ão direitos de cunho intelectual, que realizam a defesa dos vínculos, tanto pessoais, quanto patrimoniais do autor, com sua obra, de índole própria, ou sui generis, a justificar a regência específica que recebem nos ordenamentos jurídicos do mundo atual. A música é uma das mais antigas e mais populares entre as artes, está presente em diferentes ramos comerciais e civis, que fazem uso desta buscando maior conforto aos seus clientes, bem como atraí-los, entre outras diversas aplicações, integrando forma de expressão artística que constitui o patrimônio cultural de toda a população (DIAS, 2000). A música é instrumento de linguagem, de expressão e comunicação. Guerreiros Junior (2005, p. 03) apresenta: 30 A música é parte integrante da vida do homem e até dos animais e das plantas. O apelo musical estimula e comove. Em quase todos os momentos significativos da história humana, em reuniões tribais ou familiares, e mais tarde em encontros políticos, militares ou religiosos a música tem servido como agente catalisador de emoções e iniciativas. Com música se faz a guerra e se decreta a paz, coroam-se monarcas, depõem-se tiranos, evocam-se prazeres e martírios. Uma simples melodia traz a tona os mais recônditos sentimentos, resgata imagens perdidas, une e afasta pessoas, forma ideologias, celebra conquistas, homenageia os mortos e entretém a sociedade. É uma arte abstrata, mas influi de forma irresistível em todos os corações e mentes. É a companheira inseparável do homem, malgrado e desdenhosa sentença de Napoleão que a classificou como o mais tolerável dos ruídos. Compreende-se por obra ou composição musical todo gênero de combinações de sons, ora composições, as quais englobam tanto melodia, quanto melodia e letra em justaposição, que possa ser executada ou interpretada por instrumentos musicais ou pela voz humana e, assim, caracterizada como obra artística protegida pela Lei de Direitos Autorais (COSTA, 1998). Rege o artigo 7º, em seu inciso V, da Lei nº 9.610/98 (BRASIL, 2016):Art. 7º. São obras intelectuais protegidas as criações de espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: [...] V – as composições musicais, tenham ou não letra. Para que se reconheça uma composição musical, faz-se necessária a presença de melodia, harmonia e ritmo (BENNET, 1986). Para Chaves (1987), melodia é o envio de quantia indeterminada de sons sucessivamente, sons esses que se encaixam um após o outros. Harmonia é decorrente do envio simultâneo de várias melodias. Já o ritmo é a relação decorrente entre o espaço de tempo de cada som de uma melodia. Assim, a obra constituída apenas por harmonia, melodia e ritmo, considera-se música; enquanto que, quando existirem todos estes elementos, acrescidos de título e letra, designa-se como obra lítero-musical; e, quando fixada em suporte, recebe o nome de fonograma. Independentemente da discriminação, toda e qualquer tipo de música recebe proteção da lei brasileira. 3 O MERCADO DA MÚSICA NÃO VENDIDA E A TECNOLOGIA A cada cd vendido, parte deste valor implica direitos autorais aos músicos e intérpretes. A cada faixa vendida em lojas online, serviços iTunes ou GooglePlay, por exemplo, também são devidos direitos autorais aos músicos e intérpretes. Nesses casos, 31 é relativamente simples quantificar a venda e calcular os royalties dos detentores dos direitos autorais. Entretanto, quanto se passa à publicação em rádios FM e eventos a complexidade de verificação e a necessidade de fiscalização aumentam consideravelmente. Cabe ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) arrecadar e distribuir valores, referentes às execuções públicas de obras musicais. Para que se faça possível o recebimento dos direitos autorais de execução pública aos titulares e artistas, é indispensável que o artista se encontre associado a uma das associações que integram o ECAD, hoje no total de nove. O titular tem o dever de registrar seu repertório junto a sua respectiva associação e mantê-lo atualizado; a obra musical deve ser executada de modo público; deve haver o pagamento da remuneração autoral por estabelecimentos, rádios ou shows que executarem as músicas e, por fim, a execução pública da obra musical deve ser captada pelo ECAD ou informada no roteiro musical (ECAD, 2016a). A distribuição de valores é feita conforme regulamento próprio de arrecadação que divide em classes o grau de importância da música conforme o local ou a finalidade de uso, sendo indispensável, necessária ou secundária, bem como a frequência deste uso, em eventual ou permanente, e se é apresentada ao vivo ou de maneira mecânica, com ou sem dança (ECAD, 2016b). Observa-se o alcance de relevância da execução de música para a atividade; o tipo de atividade do usuário; a forma de utilização da obra (mecânica ou ao vivo); uma quantia percentual sobre a receita bruta nos casos de venda de ingressos, pagamento de couvert ou outro tipo de coleta de valores como permissão para se possa entrar no estabelecimento; entre outros. Na sequência, define-se quantia autoral a ser paga pelo usuário (ECAD, 2016b). Conforme o entendimento do ECAD (2016b), é considerado usuário de música: Usuários de música são pessoas físicas ou jurídicas, que utilizam música publicamente, sendo eles: Promotores de eventos e audições públicas (shows em geral, circo etc), cinemas e similares, emissoras de radiodifusão (rádios e televisões de sinal aberto), emissoras de televisão por assinatura, boates, clubes, lojas comerciais, micaretas, trios, desfiles de escola de samba, estabelecimentos industriais, hotéis e motéis, supermercados, restaurantes, bares, botequins, shoppings centers, aeronaves, navios, trens, ônibus, salões de beleza, escritórios, consultórios e clínicas, pessoas físicas ou jurídicas que disponibilizem músicas na internet, academias de ginástica, empresas prestadoras de serviço de espera telefônica. Como se depreende, o universo é bem amplo. Em geral, cerca de 76% dos valores vão para os músicos, 7% para as associações e o restante para administração do ECAD (ECAD, 2016a). 32 Dos valores que vão aos músicos, segundo o ECAD (2016a), há uma distribuição percentual por decisão na assembleia geral do órgão: Do montante a ser distribuído, 2/3 são direcionados aos compositores, adaptadores, versionistas e editoras, que são os titulares de direitos de autor, e 1/3 para os intérpretes, produtores fonográficos/gravadoras e músicos executantes, classificados como titulares de direitos conexos. O valor total correspondente ao conexo será rateado, cabendo 41,70% para intérpretes, 41,70% para os produtores fonográficos/gravadoras e 16,60% para os músicos executantes. Vale ressaltar que é de responsabilidade do produtor fonográfico informar à sua associação, no momento do cadastro do fonograma, se houve ou não participação de músico executante na gravação. Apresenta-se na tabela abaixo, os valores arrecadados e distribuídos no período de 2010 a 2014: Tabela 1: Resultados de arrecadação ECAD Ano Valor Arrecadado Valor Distribuído 2010 R$ 432.953.853,00 R$ 346.465.496,88 2011 R$ 540.526.597,00 R$ 411.775.388,13 2012 R$ 624.638.884,00 R$ 470.226.912,50 2013 R$ 1.190.083.620,00 R$ 804.194.836,76 2014 R$ 1.219.931.315,00 R$ 902.906.548,67 Fonte: elaboração a partir de dados do ECAD Na área da música, a tecnologia apresentou várias soluções, que hoje, talvez, sejam o desafio da indústria fonográfica. Partindo-se do vinil, perpassando pelo cd, encontra-se hoje a música na mídia sem suporte. Compram-se faixas em lojas online. Escutam-se músicas na nuvem, no etéreo, no não-físico. A internet ampliou o acesso e dificultou a fiscalização. Do ponto de vista legal, no que concerne à reprodução e à distribuição da obra, pouco importa o meio usado. Conforme a lei de direitos autorais (BRASIL, 2016): Art. 5º. Para os efeitos desta Lei, considera-se: [...] VI - Reprodução - a cópia de um ou vários exemplares de uma obra literária, artística ou científica ou de um fonograma, de qualquer forma tangível, incluindo qualquer armazenamento permanente ou temporário por meios eletrônicos ou qualquer outro meio de fixação que venha a ser desenvolvido. [...] IV - Distribuição - a colocação à disposição do público do original ou cópia de obras literárias, artísticas ou científica, interpretações ou execuções fixadas e fonogramas, mediante à venda, locação ou qualquer outra forma de transferência de propriedade ou posse. 33 No meio digital, é possível que a música seja distribuída ou reproduzida por simulcasting e do streaming. Segundo Jalil (2004), “simulcasting é a transmissão simultânea inalterada de emissões de rádio e televisão aberta, ou via cabo, através da Internet”, isto é, a emissora transmite sua programação tradicional em dois serviços ao mesmo tempo, seja ele televisivo ou via rádio, juntamente com a rede. No tocante ao streaming, este é o termo em inglês empregado para designar a disponibilização de músicas via internet, onde é possível montar sua própria sequência musical sem armazená-la na memória do computador, permitindo que o usuário reproduza conteúdos protegidos por direitos autorais sem violar os mesmos. Em ambas as situações, não há download permanente da música no dispositivo eletrônico. Então, no ambiente doméstico ou privativo, dispensa-se a autorização do autor para a execução da música, uma vez que se assemelha ao rádio convencional, no qual a emissora se responsabiliza pelo pagamento dos direitos autorais. Porém, no caso do download no formato MP3 ou equivalente, exige-se a licença prévia e expressa dos titulares de direitos autorais, conforme o artigo 29, inciso VII da lei de direitos autorais (BRASIL, 2016): Art. 29. Depende de autorização
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