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EBOOK_COMISSÃO ESPECIAL DE IGUALDADE RACIAL_2020

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Organizadoras: 
Karla Meura 
Rochele Oliveira Silva 
Evelin Ferreira 
 
 
 
 
 
 
 
 
TRAJETÓRIAS DA ADVOCACIA NEGRA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Porto Alegre, 2020 
 
 
 
 
 
Copyright © 2020 by Ordem dos Advogados do Brasil 
Todos os direitos reservados 
COMISSÃO ESPECIAL DA IGUALDADE RACIAL 
Presidente - Karla Meura 
Vice-Presidente - Artemio Prado da Silva 
Secretária-Geral Adjunta - Franchesca Rodrigues de Souza 
 
Organizadoras: 
Karla Meura 
Rochele Oliveira Silva 
Evelin Ferreira 
 
Capa: 
Carlos Pivetta 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Bibliotecária Jovita Cristina Garcia dos Santos – CRB 10/1517 
 
O conteúdo é de exclusiva responsabilidade dos seus autores. 
 
 
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL 
Rua Washington Luiz, 1110 – Centro – CEP 90010-460 – Porto Alegre –RS 
 
 
 
 
 
 
T248 
Trajetórias da Advocacia Negra /Meura, Karla et.al (Orgs.). Ada Elise 
de Araújo Leiria...[et.al] –. Porto Alegre: OAB/RS, 2020. 101p. 
il. 
 ISBN online: 978-65-88371-02-2 
1. Histórias Negras. 2. Advocacia Negra. 3. Biografia. I. Evelin 
Ferreira, Karla Meura, Rochele Oliveira Silva. II. Título 
CDU 929 
 
 
 
929 
 
 
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - CONSELHO FEDERAL 
DIRETORIA/GESTÃO 2019/2021 
 
Presidente: Felipe Santa Cruz 
Vice-Presidente: Luiz Viana Queiroz 
Secretário-Geral: José Alberto Simonetti 
Secretário-Geral Adjunto: Ary Raghiant Neto 
 Diretor Tesoureiro: José Augusto Araújo de Noronha 
 
ESCOLA NACIONAL DE ADVOCACIA – ENA 
 
Diretor-Geral: Ronnie Preuss Duarte 
 
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL 
 
Presidente: Ricardo Ferreira Breier 
Vice-Presidente: Jorge Luiz Dias Fara 
Secretária-Geral: Regina Adylles Endler Guimarães 
Secretária-Geral Adjunta: Fabiana Azevedo da Cunha Barth 
Tesoureiro: André Luis Sonntag 
 
ESCOLA SUPERIOR DE ADVOCACIA 
 
Diretora-Geral: Rosângela Maria Herzer dos Santos 
Vice-Diretor: Darci Guimarães Ribeiro 
Diretora Administrativa-Financeira: Graziela Cardoso Vanin 
Diretora de Cursos Permanentes: Fernanda Corrêa Osório, Maria Cláudia Felten 
Diretor de Cursos Especiais: Ricardo Hermany 
Diretor de Cursos Não Presenciais: Eduardo Lemos Barbosa 
Diretora de Atividades Culturais: Cristiane da Costa Nery 
Diretor da Revista Eletrônica da ESA: Alexandre Torres Petry 
 
CONSELHO PEDAGÓGICO 
 
Alexandre Lima Wunderlich 
Paulo Antonio Caliendo Velloso da Silveira 
Jaqueline Mielke Silva 
Vera Maria Jacob de Fradera 
 
 
 
 
 
CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS 
 
Presidente: Pedro Zanette Alfonsin 
Vice-Presidente: Mariana Melara Reis 
Secretária-Geral: Neusa Maria Rolim Bastos 
Secretária-Geral Adjunta: Claridê Chitolina Taffarel 
Tesoureiro: Gustavo Juchem 
 
TRIBUNAL DE ÉTICA E DISCIPLINA 
 
Presidente: Cesar Souza 
Vice-Presidente: Gabriel Lopes Moreira 
 
CORREGEDORIA 
 
Corregedora: Maria Helena Camargo Dornelles 
 
Corregedores Adjuntos 
 Maria Ercília Hostyn Gralha, 
Josana Rosolen Rivoli, 
Regina Pereira Soares 
 
OABPrev 
 
Presidente: Jorge Luiz Dias Fara 
Diretora Administrativa: Claudia Regina de Souza Bueno 
Diretor Financeiro: Ricardo Ehrensperger Ramos 
Diretor de Benefícios: Luiz Augusto Gonçalves de Gonçalves 
 
COOABCred-RS 
 
Presidente: Jorge Fernando Estevão Maciel 
Vice-Presidente: Márcia Isabel Heinen 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
PREFÁCIO – Ricardo Breier .......................................................................................................7 
APRESENTAÇÃO – Karla Meura, Artêmio Prado e Franchesca Souza ..........................................8 
Ada Elise de Araújo Leiria .........................................................................................................9 
Antonio Carlos P. Rosa ........................................................................................................... 12 
Artêmio Prado da Silva .......................................................................................................... 15 
Beatriz da Rosa Vasconcelos .................................................................................................. 18 
Carlos Antônio Carvalho Santos ............................................................................................. 21 
Daniela da Rosa ..................................................................................................................... 22 
Denilson José da Silva Prestes ................................................................................................ 24 
Denise Teresinha Pedroso Zilch .............................................................................................. 27 
Dorival Sebastião Ipê da Silva ................................................................................................ 30 
Franchesca Rodrigues de Souza .............................................................................................. 33 
Geisa Carmo da Silva ............................................................................................................. 35 
Jurema Praxedes Tubias Quadros ........................................................................................... 38 
Karla Regina Meura da Silva .................................................................................................. 42 
Lucia Helena dos Santos ......................................................................................................... 47 
Luis Alberto da Silva .............................................................................................................. 49 
Luiz Alves .............................................................................................................................. 52 
Maria do Carmo Santos da Silva ............................................................................................. 61 
Mauren Lisiane Acosta Amaral ............................................................................................... 65 
Nereidy Rosa Alves ................................................................................................................ 68 
Patrícia Alves Marques da Silva.............................................................................................. 71 
Patricia de Aguiar Soares Nunes ............................................................................................. 77 
Patricia Oliveira ..................................................................................................................... 80 
Renata Santos ....................................................................................................................... 83 
Rochele Oliveira Silva............................................................................................................. 85 
Romildo Marques da Rosa ..................................................................................................... 88 
Tainara Caceres Rodrigues ..................................................................................................... 94 
Tatiana dos Santos Schuster ................................................................................................... 99 
 
 
7 
 
PREFÁCIO 
 
É com grande satisfação que vemos ser entregue à sociedade gaúcha mais uma contribuição 
envolvendo as Trajetórias da Advocacia Negra. Os relatos trazidos neste e-book realizado pela 
Comissão Especial de Igualdade Racial (CEIR) da OAB/RS são fundamentais para termos a dimensão 
das dificuldades encontradas por advogados e advogadas negras em suas caminhadas 
profissionais. Ao mesmo tempo, registram trajetórias de superação e inspiração para novas 
gerações. 
A obra 'Trajetórias da Advocacia Negra' amplia o horizonte dos perfis trazidos no primeiro livro 
publicado pela CEIR OABRS, intitulado '(Re) conhecendo Histórias Negras', onde foram registradas 
52 figuras influentes em cinco áreas de atuação:direito, ciências, literatura, processo abolicionista 
e política. Desta vez, são 18 advogados e advogadas que dão seu testemunho e enriquecem a 
bibliografia da contribuição da advocacia negra no Rio Grande do Sul. 
A leitura das histórias de vida emociona e, ao mesmo tempo, provoca a reflexão da permanente 
necessidade de se assegurar espaços em busca da igualdade racial. Seja com colegas de Porto 
Alegre ou do interior do Estado, é possível perceber traços de similaridade na superação de 
obstáculos que existem em razão da questão racial. A questão do preconceito racial é um tema da 
atualidade, basta ver a repetição de casos envolvendo negros na sociedade. Enfrentar e jogar luzes 
sobre essa situação é papel fundamental exercido pela OAB/RS 
São esses testemunhos verdadeiros e objetivos que reforçam a importância de termos dentro da 
nossa Ordem a Comissão Especial de Igualdade Racial (CEIR). Embora relativamente nova, é uma 
comissão com um grande protagonismo e propositora de grandes eventos e distinções dentro da 
nossa instituição. 
Em nome das organizadoras do e-book, Karla Meura, Rochele Oliveira e Evelin Ferreira e da 
Diretora da Escola Superior da Advocacia da OAB/RS (ESA/RS), reconheço a valiosa contribuição de 
mais esta obra. É preciso seguir abrindo espaços e enaltecer aqueles que contribuem e fazem a 
diferença em suas áreas de atuação. 
 
Boa leitura a todas e todos! 
Ricardo Breier 
Presidente da OAB/RS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
 
APRESENTAÇÃO 
 
A publicação desta obra tem o objetivo de potencializar o trabalho de valorização da Advocacia 
Negra realizado pela Co-missão Especial de Igualdade Racial pela OAB do Rio Grande do Sul. Nossas 
ações são resultado de uma diretriz implementada pelo Presidente Ricardo Breier, no sentido de 
que a Instituição acolhe a Diversidade de forma ampla e democrática, repelindo o racismo, a 
homofobia, o machismo e a xenofobia, assim como todas as formas de discriminação. Tendo em 
vista de que a Ordem dos Advogados é a Casa da Cidadania, também é o lar daqueles que juraram 
respeitar e defender os ditames da Constituição Cidadã. 
Tomada de um ponto de vista individual, a trajetória da Advocacia Negra pode se resumir a um 
esforço singular. Entretanto ela é muito mais do que isso. Em verdade cada Trajetória é o resultado 
da união de esforços e competências de pessoas que vieram antes de nós. Cada advogada e 
advogado negro traz consigo a responsabilidade de honrar as oportunidades que recebem como 
fruto de muito trabalho, pesquisa, dedicação e perseverança que a coletividade investiu em nosso 
crescimento pessoal e profissional. 
Falamos de nossas avós e avôs, de nossos pais e mães, de tias e tios, madrinhas e padrinhos e toda 
a ancestralidade que sempre nos desejaram uma vida melhor e com mais oportunidades do que 
eles próprios tiveram. 
O fato de podermos retratar nossas experiências de vida profissional nesta obra é uma forma de 
testemunho de que eles tiveram pleno êxito em seus objetivos. E também nos dá a oportunidade 
de agradecê-los. Também acreditamos que é uma forma de mostrarmos que a jovem advocacia 
negra não está sozinha e que é importante caminharmos juntas e juntos para dar continuidade às 
conquistas no Sistema OAB, visto que é crescente o número de Advogadas e Advogados Negros 
em nossa Instituição. Pretendemos, assim, fortalecer o entendimento de que podemos ocupar 
todos os lugares, seja nos Conselhos, nas Comissões, nas Presidências, nas Caixas da Assistência, 
nas Escolas Superiores da Advocacia e nos demais departamentos da Ordem dos Advogados do 
Brasil. 
Acreditamos que a visibilidade da Advocacia Negra demorou a chegar a nossa Casa. Mas ficamos 
felizes em estarmos vivenciando este momento, que tomou forma com a Co-missão Especial de 
Igualdade Racial, que através de seu trabalho, busca dar forma ao preceito constitucional de 
igualdade entre todas as pessoas. Através do trabalho da Co-missão, nós podemos atingir aquelas 
pessoas mais necessitadas, assim como também podemos olhar por aqueles colegas negros que 
encontram problemas para o desempenho de seu trabalho dentro dos órgãos que compõem o 
Poder Judiciário. 
Por fim, com imensa alegria, ressaltamos que o lançamento dessa obra se dá também em 
comemoração ao aniversário de dois anos de criação da Co-missão Especial de Igualdade Racial da 
OAB/RS. Que esta Comissão possa continuar prestigiada em seu trabalho, ajudando a democratizar 
nossa Casa por dentro e por fora, e assim tornando cada vez mais visível o valor da Advocacia Negra 
do Rio Grande do Sul. E assim escrevemos: “Co-missão” porque entendemos que fazemos parte de 
uma ‘missão coletiva’ e de um projeto ancestral. 
Desejamos uma excelente leitura, de muitos aprendizados com “As Trajetórias da Advocacia 
Negra”. 
Karla Meura 
Presidenta da CEIR OABRS e Conselheira Seccional 
Artêmio Prado 
Vice-presidente da CEIR OABR 
Franchesca Souza 
Secretária Geral Adjunta da CEIR OABRS 
9 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESISTIR PARA EXISTIR 
Ada Elise de Araújo Leiria 
 
Acadêmica do Curso de Graduação em Direito – PUCRS OAB/RS 51E666 - 
E-mail: adaleiria@gmail.com 
 
Meu nome é Ada Elise, tenho 36 anos, nasci e cresci em Porto Alegre, no Rio Grande 
do Sul, sou estudante do curso de Direito, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande 
do Sul – PUCRS. 
A minha trajetória acadêmica teve início em 2003, quando ingressei no curso de 
Pedagogia, na Uniritter, mas devido às circunstâncias e das escolhas da vida o sonho de 
concluir o curso superior ficou para trás. 
Diante da busca por uma profissão e colocação no mercado de trabalho, decidi fazer 
um curso técnico em enfermagem, concluí em 2011 e no mesmo ano fui contratada para 
ocupar o cargo técnico na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. No decorrer do 
exercício da minha profissão refleti sobre a minha capacidade para dar continuidade aos 
estudos e pensei na graduação de Enfermagem, mas percebi que a área da saúde não era 
a minha paixão. 
Em 2012, ingressei no curso de Licenciatura em Ciências Sociais na PUCRS, porque 
acreditava que a sociologia era a minha vocação, porém, no percurso do primeiro semestre 
constatei que não. Diante dessa análise e reflexão, decidi solicitar a transferência interna 
para outro curso e escolhi o Direito. 
10 
 
No início do curso de Direito, observei as semelhanças com o curso anterior, pois as 
disciplinas introdutórias abordavam os fundamentos das Ciências Sociais e me deparei 
novamente com o meu principal obstáculo, a dificuldade na leitura. Pensei em desistir 
inúmeras vezes, mas prossegui. Esse é o meu caminho, hoje eu tenho certeza disso. 
Em 2017, decidi abandonar a minha profissão como técnica de enfermagem para 
acelerar e direcionar o foco na conclusão do curso de Direito, eu não consegui conciliar a 
faculdade, trabalho e família. A autora Djamila Ribeiro1 se posiciona em sua obra referindo 
que 
Muitas vezes, casos de pessoas negras que enfrentam grandes dificuldades para 
obter um diploma ou passar em um concurso público são romantizados. 
Entretanto, ainda que seja bastante admirável que pessoas consigam superar 
grandes obstáculos, naturalizar essas violências e usá-las como exemplos que 
justifiquem estruturas desiguais é não só cruel, como também uma inversão de 
valores. Não deveria ser normal que, para conquistar um diploma, uma pessoa 
precise caminhar quinze quilômetros para chegar à escola, estude com material 
didático achado no lixo ou que tenha que abrir mão de almoçar para pagar um 
transporte. 
No mesmo ano, me matriculei numa disciplina eletiva “Educação, Cultura, e 
Relações étnico-raciais”, ministrada pela professora Dra. Leunice Martins de Oliveira, a qual 
me inspirou a abordar sobre a temática racial no meu trabalho de conclusão de curso, 
principalmente, por me representar como mulher negra dentro de um espaço que 
raramente viabiliza a representatividadenegra em seu corpo docente. 
No final de 2019, apresentei o meu trabalho de conclusão como escopo principal a 
análise da constitucionalidade inerente à Lei nº 12.990 de 2014, a qual reserva aos negros 
20% (vinte por cento) das vagas oferecidas em concursos públicos, para provimento de 
cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal, das 
autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia 
mista controladas pela União, visando a observar a eficácia da política pública e ação 
afirmativa de promover a igualdade econômica e social, que viabiliza a inserção da 
população negra na sociedade, sobretudo, dos critérios adotados para a garantia do direito 
fundamental previsto no artigo 5º da Constituição Federal de 1988, acerca do princípio da 
igualdade. 2 
 
1 RIBEIRO, Djamila. Pequeno Manual Antirracista. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. p. 47-48. 
2 Artigo extraído como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, na Escola de Direito 
da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, sob a orientação da Prof. Dra. Caroline Vaz. 
11 
 
Obtive ótimo resultado, o trabalho de conclusão do curso foi nota DEZ e o artigo foi 
indicado à publicação. Foi um dia inesquecível e muito especial, pois recebei o apoio dos 
meus familiares e de pessoas amigas, que estavam presentes naquele momento. 
Naquele dia, eu pude compreender de fato o verdadeiro significado da palavra 
RESISTÊNCIA, falar sobre a nossa história reafirma a luta e a força que vem da nossa 
ancestralidade. 
Entretanto, precisamos reforçar cada vez mais a importância da abordagem sobre 
os temas raciais dentro da academia, o racismo não pode ser tratado como tema 
secundário, ele precisa ser debatido constantemente e com urgência, principalmente no 
cenário atual em relação à pandemia de COVID-19, que acentuou o racismo no Brasil e em 
outros países no mundo. 
Nesse seguimento, aproveita-se dos ensinamentos de Silvio Almeida3 que expõe: 
[...] o racismo é uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do 
modo “normal” com que se constituem as relações políticas, econômicas, 
jurídicas e até familiares, não sendo uma patologia social e nem um 
desarranjo institucional. O racismo é estrutural. Comportamentos 
individuais e processos institucionais são derivados de uma sociedade 
cujo racismo é regra e não exceção. 
A pandemia do novo coronavírus trouxe os desafios da adaptação de rotina e muitas 
incertezas para a maioria das pessoas, inclusive para mim, que também tive os planos 
frustrados e com a suspensão das aulas presenciais tive que me adequar à modalidade do 
ensino a distância, mas diante da dificuldade na aprendizagem decidi cancelar algumas 
disciplinas. 
Enfim, tive que superar as inquietações acerca dos preparativos para a formatura, 
das incertezas sobre a previsão do próximo exame da Ordem dos Advogados Brasil, 
sobretudo da minha perspectiva sobre o meu futuro profissional. 
Resistir para existir. A luta ainda não acabou! “Sempre que penso em Zumbi dos 
Palmares, reafirma-se a minha confiança na história, na capacidade do tempo de rever e 
recontar a história, em aliança com os seres humanos sinceramente empenhados na busca 
da verdade. ” (CARNEIRO, 2011, p. 103).4 
 
 
3 ALMEIDA, Silvio Luiz de. Racismo estrutural. São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen, 2019. p. 50. 
4 CARNEIRO, Sueli. Racismo, sexismo e desigualdade no Brasil. São Paulo: Selo Negro, 2011. p. 103. 
12 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ENSAIOS 
 Antonio Carlos P. Rosa 
Coordenador da Comissão Especial da Igualdade Racial da Subseção 
OAB/RS Pelotas da OAB/RS, Pelotas. 
 
Sou Antonio Carlos, advogado, preto, Coordenador da CEIR da OAB/RS, Pelotas. 
Minha cidade foi um dos berços escravagistas da região sul. 
Me formei na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pelotas no ano de 
2004, em uma turma composta por 42 (quarenta e dois) formandos, na qual eu era o único 
preto. 
Em 2005 fui aprovado no Exame da OAB, mas, somente pude passar a exercer a 
advocacia em 2011, quando me aposentei na carreira pública de Escrivão de Polícia da 
Polícia Civil do Rio Grande do Sul. 
Avalio que o reconhecimento de minha trajetória como advogado representa o 
rompimento abrupto com o processo de submissão ao regime de trabalho braçal que fez 
parte de todas as gerações de minha família paterna e materna, nas quais, até então, a 
regra era “ter um trabalho”. Meu pai era pedreiro e músico e minha mãe, transitava entre 
as lides e do lar, empregos como doméstica, faxineira e trabalhadora safrista. 
Fui o primeiro de todas as gerações de minha família (paterna e materna) a ingressar 
e concluir o ensino superior. 
Reconheço que a minha caminhada profissional na advocacia foi bastante 
impulsionado por minha trajetória anterior no serviço público, mais precisamente, no 
Corpo de Bombeiros e também na Polícia Civil Gaúcha. 
13 
 
Tal circunstância me concedeu certa bagagem funcional um pouco diversa daqueles 
advogados negros iniciantes na carreira, pois estava vindo de ambientes onde o racismo se 
fazia presente, rotineiramente, nos quais haviam apenas duas escolhas: enfrentar ou 
silenciar. E minha escolha foi sempre a primeira alternativa. 
E essa opção me rendeu algumas intercorrências profissionais, em especial, na 
carreira interior, dentre elas, uma ameaça de demissão do serviço público, por um 
delegado de polícia, após eu ter afirmado, durante uma discussão a respeito de trabalho, 
que “a escravidão já havia acabado no Brasil”, que respondeu nos seguintes termos: “vou 
dar um jeito de botar esse negro ‘pra’ rua da polícia, por me desrespeitar. ” Não conseguiu! 
Digo isto, para concluir que a advocacia já estava em mim, escondida naquela 
“rebeldia sadia”, por essa sede de justiça social que eu não entendia muito bem, até 
determinado momento da minha trajetória. 
E ao longo dos anos, em contato com a juventude negra da minha cidade, em 
especial, os jovens da ONG ODARA, os meninos da Escolinha de Futebol “Moleques de 
Vila”, além de jovens estudantes de escolas públicas e de nossas universidades locais, fui 
me dando conta da importância desta representatividade personificada na minha presença 
nestes espaços. 
Isto me trouxe uma consciência e amadurecimento a respeito da importância da 
minha presença, enquanto advogado, seja na comunidade propriamente dita, seja nos 
espaços públicos ou privados, nos quais os pretos, infelizmente, ainda se fazem ausentes, 
a exemplo de nossos tribunais e outros tantos lugares. 
Interpreto que antes de mim, outros pretos se doaram, literalmente; muitos 
perderam a vida, para que a minha geração pudesse chegar até aqui. 
Sendo assim, entendo que nosso processo evolutivo, nos próximos tempos, nos 
permitirá caminharmos no sentido de nos colocarmos, tanto na advocacia, como em outras 
tantas áreas do conhecimento, na condição de maioria. 
E exemplificativamente, a imagem acima, relativa à Faculdade de Direito da UFPel, 
nos demonstra esse caminho. Já não somos mais apenas um acadêmico preto, por turma; 
estamos chegando, e chegando em massa, com o objetivo de ocupar os espaços que nos 
foram negados. 
14 
 
Temos muito ainda a conquistar, em termos de reconhecimento e para isto, 
entendo que a advocacia negra precisa trabalhar unida e sintonizada, de forma que as 
diferenças de pensamentos e opiniões de natureza pessoais, sejam encaradas 
positivamente, no sentindo de crescimento e amadurecimento conjunto, para que todos 
possamos, efetivamente, evoluir em todos os aspectos pretendidos, pois afinal, nossa 
filosofia é UBUNTU. 
Antonio Carlos P. Rosa 
Advogado militante, formado em Direito pela Faculdade de Direito da UFPel, em 
2004; 
Especialista em Educação e Relações Étnico-Raciaispela Faculdade de Educação da 
UFPel; 
Membro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil – 
Subseção de Pelotas, gestão 2016/2018. 
Ex-Presidente do Núcleo Regional da UGEIRM Sindicato dos Escrivães, Inspetores e 
Investigadores de Polícia do RS; 
Sócio Fundador da ONG ODARA – Centro de Ação Social Educacional, Social e 
Cultural; Membro da Comissão de Hetero identificação da UFPel, 2016/2017. Escrivão de 
Polícia, aposentado, da Polícia Civil do RS. 
 . 
15 
 
 
ENSAIOS 
Artêmio Prado da Silva 
 
Formado em Ciências Jurídicas e Sociais na Universidade Federal do Rio 
Grande do Sul em 23 de dezembro de 1987, e inscrito na Ordem dos 
Advogados do Brasil Secção Rio Grande do Sul em 1988. Advogado 
Civilista, e atual Vice-Presidente da Comissão Especial de Igualdade Racial 
da OAB/RS. Inscrito OABRS 25.211 
 
O que representa o reconhecimento de minha trajetória como um advogado negro 
para você, para a comunidade e para a sociedade? 
Para responder a esta questão, eu preciso retornar ao momento em que decidi fazer 
o Curso de Ciências Jurídicas e Sociais, e me tornar especificamente um advogado. 
Basicamente a Advocacia é aquele ramo do Direito que nos dá uma visão ampla das 
formas de relações que permeiam e movimentam a vida em sociedade. O que nos leva a 
ter um sentimento do quanto as pessoas têm suas vidas tocadas e influenciadas quando 
ocorre o entrechoque de suas pretensões com as pretensões de seus semelhantes. 
Naquele momento em que termina o direito de um e começa o direito do outro. 
E no meio desse fenômeno social, o Advogado surge como o agente que vai 
representar o indivíduo na busca do seu direito perante a Justiça. O advogado é um 
elemento ativo, que na representação de seu cliente, ele provoca Poder Judiciário (Juiz), o 
que vai desencadear a Relação Processual. 
16 
 
Diferentemente de Juízes e Membros do Ministério Público, o Advogado não está 
inserido em uma redoma de vidro, vivendo numa realidade virtual, onde se acredita que 
vivemos num Conto de Fadas, onde o mundo é perfeito. 
Nós vivenciamos a dura realidade da vida no Brasil. Onde as injustiças sociais 
permeiam todos os principais campos do direito. Seja nas áreas Cível, criminal, trabalhista 
e previdenciária. Na prática a lei não é igual para todos e o acesso à Justiça é por demais 
oneroso. As pessoas mal possuem renda para se alimentarem, para tratarem de sua saúde, 
para se locomoverem, para sustentarem seus filhos, quanto mais para buscarem seus 
direitos perante o Judiciário. 
As pessoas das quais eu me reporto são as pessoas pobres e dentre estas, a maioria 
é a População Negra. 
Um grupo social invisível perante as autoridades dos Poderes Executivo, Legislativo 
e Judiciário de União, Estados e Municípios. 
Nossa população apesar de ser a maior em termos populacionais, não possui a 
menor representatividade nas esferas de poder em nosso país. E isto contribui para o 
aumento abissal da desigualdade no Brasil, o que se reflete de forma ainda mais acentuada 
no Estado do Rio Grande do Sul, onde está chaga social se mostra ainda mais acentuada. 
Esta chaga tem um nome, Racismo. E ele é resultado dos 400 anos de escravidão 
impostos aos negros trazidos a este país e que apesar de contribuírem com seu sangue 
literalmente, para impulsionar seu desenvolvimento. Os mesmos foram “libertos”, ou seja, 
forma simplesmente largados na natureza, o que sedimentou a marginalização dos negros 
e cujos reflexos são sentidos até os dias de hoje. 
O que me levou a abraçar a Advocacia foi a possibilidade de poder ajudar meus 
irmãos, e todas aquelas pessoas que precisam buscar seus direitos, e que por sua condição 
não são ouvidas por outros profissionais do Direito, e mesmo por Defensores Públicos, mas 
que apesar do descaso, merecem reclamar seus direitos. 
E como advogado negro, eu me sinto no dever de procurar ajudar a todas as pessoas 
que buscam por ajuda profissional, conselhos e muitas vezes até para uma palavra amiga. 
Eu procuro não apenas ajudar, como estimular as pessoas a lutarem por seus objetivos. E 
se no processo, eu posso inspirá-las, é algo muito gratificante. 
17 
 
Mas nem tudo são flores, existem os espinhos... O fato de sermos negros e por 
atuarmos numa profissão predominantemente branca, nos deparamos com o Racismo 
dentro do Poder Judiciário. E que nos aborda desde o momento em que entramos nos foros 
ou tribunais, até o momento em que somos atendidos nos cartórios ou secretarias. O Poder 
Judiciário não sabe lidar com advogados negros, e nisso se incluem estagiários, 
terceirizados, funcionários, juízes e desembargadores. Necessário se faz um treinamento 
educacional de combate ao racismo para membros e funcionários do Judiciário. 
Em relação ao nosso Órgão de Classe, eu não me sentia acolhido pela Casa da 
Cidadania. Não via na OAB/RS, um catalisador da Advocacia Negra. Porém esta visão 
mudou em 2018, quando o Presidente Ricardo Breier criou a Comissão Especial de 
Igualdade Racial, que tem como primeira Presidente a Dra. Karla Meura. 
No primeiro semestre de 2019, após conversar com a Dra. Karla, eu fui conhecer a 
Comissão, de forma totalmente despretensiosa, e hoje estou vice-presidente, e pude ter a 
oportunidade de conhecer colegas maravilhosos, e que me acolheram de forma muito 
afável. E começamos a desenvolver um trabalho de forma promissora, em perdermos a 
consciência de que estamos no começo e que muito ainda deve ser feito. 
A partir do momento em que começamos a nos tornar visíveis dentro da OAB/RS, 
sendo que o processo ainda não está completo, mas estamos caminhando para concluí-lo. 
Penso que este pode ser o começo do nosso reconhecimento como profissionais do direito, 
consequentemente como advogados negros dentro da comunidade da advocacia, e 
perante nossa sociedade. 
É uma porta que se abre, porém ainda temos um caminho a fazer para que este 
conhecimento seja pleno. Acredito que ele estará completo quando formos visíveis e 
reconhecidos pelos outros elementos formadores do Poder Judiciário, como juízes, 
promotores, e outras autoridades. 
Ou seja, quando formos efetivamente reconhecidos como advogados e respeitados 
como tal independente da corda pele e do sexo. 
 
 
18 
 
 
ENSAIOS 
Beatriz da Rosa Vasconcelos 
Advogada negra e feminista, formada pela URCAMP, em Bagé. OABRS- 
22018. 
Advogo há 35 anos. Pautei minha vida profissional na perspectiva dos direitos 
humanos, trabalhando com os temas de gênero, raça e acesso à Justiça. 
Nasci numa família de trabalhadores: meu pai era operário e minha mãe 
eratrabalhadora doméstica. Com o esforço do trabalho, eles oportunizaram estudos para 
suas duas filhas, uma formou-se emDireito, a outra, em História. Poucas mulheres negras 
da minha geração tiveram a chance de estudar eexercer a advocacia. Assim, minha ação 
política se focou na defesa dos/dasexcluídos/das. 
Ao longo da vida, tive a oportunidade de trabalhar em organizações sociais eem 
órgãos governamentais. Trabalhei no Sindicato das Trabalhadoras Domésticas,onde 
prestei assessoria jurídica por sete anos. 
Na organização feminista Themis – Gênero, Justiça e Direitos Humanos, euacolhia 
e ajuizava ações de mulheres em situação de violência doméstica,moradoras da periferia 
de Porto Alegre. Nessa instituição não governamental, também participei do programa 
de formação das Promotoras Legais Populares (PLPs). Essas lideranças comunitárias 
femininas, mulheres pobres e mestiças,recebem formação em Direito para a qualificação 
do ativismo social e a atuação em redede solidariedade. 
Minha prática advocatícia foi sendo direcionada para a defesa das trabalhadoras 
19 
 
domésticas e de mulheres populares em situação de violência, em sua maioria mulheres 
negras.Em 2014/2015,coordenei o projeto - TrabalhadorasDomésticas: construindo 
igualdade no Brasil -, realizado em oito capitais brasileiras, com oobjetivo de fortaleceros sindicatos da categoria 
frente à nova legislação,que estendia direitos aostrabalhadores e às trabalhadoras 
domésticas, equiparando-os as demais categorias profissionais. 
Na esfera governamental, trabalhei na equipe técnica da Ouvidoria da Segurança 
Pública do Rio Grande do Sul. A função era o atendimento às pessoas vítimas de abusos 
cometidos pelas polícias civil e militar, em sua maioria, jovens negros e pobres. 
Na Secretaria Municipal de Segurança Pública de São Leopoldo prestei assessoria 
jurídica e atuei na formação em direitos humanos para a Guarda Municipal e no 
atendimento à população vitimada pela violência. No Ministério Público do Rio Grande 
do Sul (MP/RS), trabalhei no Centro de Apoio e Operações de Direitos Humanos e na 
Promotoria da Violência Doméstica e Familiar. 
Em paralelo a minha atividade profissional, desenvolvo ações de formação 
política com comunidades periféricas.Com o Centro Ecumênico de Cultura Negra 
(CECUNE), ministrei cursos para mulheres negras, em escolas no Rio Grande do Sul. Com 
o Instituto de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (IDHESCA), 
participei de atendimentos aos familiares de presos junto à Promotoria de Controle e 
Execução Criminal (MP/RS). Com o Movimento de Consciência Negra Palmares de São 
Leopoldo atuei na assessoria jurídica para vítimas de racismo e crianças e adolescentes 
em situação violência e vulnerabilidades. 
Atualmente, faço parte do Instituto AKANNI de Pesquisa e Assessoria em Direitos 
Humanos, Gênero, Raça e Etnias. A entidade desenvolve projetos de prevenção de 
violência racista e de gênero, especialmente junto a escolas, no fortalecimento de 
políticas afirmativas, na garantia de direitos aos quilombolas e no apoio aos refugiados 
de origem africana e centro-americana. 
O meu trabalho cotidiano tem sido sistematicamente realizado para estabelecer 
dignidade entre homens, mulheres e crianças, diminuindo asdesigualdades econômicas 
e sociais e promovendo os direitos humanos enquanto plataforma de garantia de 
20 
 
políticas de promoção de equidade com respeito às diferenças. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
21 
 
 
ENSAIOS 
Carlos Antônio Carvalho Santos 
 
Me formei em na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica, no ano 
de 1976. 
Iniciei minha carreira com o Dr. Obede Vianna quando ainda não estava formado, 
sendo estagiário. Após a formatura ingressei no escritório como sócio. Foi um passo 
importante e que me encorajou a seguir incentivando outros colegas a investirem na 
advocacia. 
Sempre atuei com foco nas áreas trabalhista e do Direito da Família. Lembro que 
1990 o cenário da advocacia era muito favorecido pela conjuntura do país, eu recebia em 
dólares, inclusive. Desde minha formação o escritório sempre foi localizado no bairro 
Santana, na Cidade de Porto Alegre/RS. 
Já estou totalizando 44 anos de atuação na profissão. Já aposentado, permaneço 
exercendo minhas atividades com a mesma dedicação e empenho de sempre. Destaco que 
sempre tive muito carinho e atenção por meus clientes, mesmo fora do horário comercial, 
quando eventualmente necessário. 
 
 
 
22 
 
 
ENSAIOS 
Daniela da Rosa 
 OAB/RS 71.236 
 
 Sou Daniela da Rosa, filha de Eloir Oscar da Rosa e Vera Maria da Rosa, a caçula entre 
quatro irmãos, e talvez por isso, a única que pode escolher fazer um curso de nível superior, 
pais de profissão pedreiro e empregada doméstica, com pouca escolaridade, mesmo com 
as dificuldades financeiras que enfrentaram sempre acreditaram e apoiaram o meu sonho. 
 Com muito esforço cursei graduação na Unisinos ingressando no ano 2000, colando 
grau em 2006/2, regressei a minha cidade em Capão da Canoa e no ano de 2009 montei 
meu próprio escritório na casa de meus pais, de forma muito simples, mas com muita 
coragem empreendi em carreira solo na profissão da advocacia, vencendo todos os 
obstáculos financeiros, preconceitos raciais e sociais. 
A cada vitória processual, a cada novo cliente sentia que honrava a minha 
ancestralidade pois muitos deram a sua vida na formação da nossa sociedade brasileira e 
que até hoje ainda é negado a nossa história e o reconhecimento da nossa fundamental 
participação na construção do nosso país. 
No ano de 2015, desejando ampliar a área de atuação fui buscar parceria em outros 
escritórios, oportunidade em que fui trabalhar com o colega Miguel Glashorester Severo, 
23 
 
ex presidente da OAB subseção de Capão da Canoa, de quem recebi importante incentivo 
para participar do sistema OAB/RS, começando então a minha trajetória fui conselheira na 
gestão de 2015, assumi a presidência da Comissão da Mulher Advogada da OAB subseção 
Capão da Canoa em 2016, dois anos depois, para minha surpresa fui convidada pela futura 
candidata, na época à Presidência da subseção Rosana Brogni para ser vice-presidente. 
Eleitas então, chego hoje como Vice-presidente da subseção, superando muitos desafios, 
mas com muito orgulho do trabalho que desenvolvo no escritório e junto a sociedade 
dentro do sistema OAB, agradeço imensamente esta instituição que muito se dedica a fazer 
o seu papel enquanto defensores da cidadania colocando em prática atitudes antirracistas 
construindo ações para a visibilidade da advocacia negra. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
24 
 
 
 
A TRAJETÓRIA PROFISSIONAL E A DESCONSTRUÇÃO RACIAL EM NOSSA SOCIEDADE 
 
Denilson José da Silva Prestes 
OAB/RS 35.465 
 
Quando se fala em trajetória profissional, inegável lembrar que durante toda a 
minha formação, o fato de ser o único negro entre o restante dos estudantes nos bancos 
acadêmicos, já me remete ao enfrentamento das dificuldades que pautariam a minha 
caminhada profissional. 
Nesse processo de qualificação, busquei no mundo acadêmico e com vistas a galgar 
futuramente no âmbito profissional, um concurso vestibular em um dos cursos mais 
concorridos, o Curso de Ciências Jurídicas e Sociais- Direito. 
Registre-se, que nessa trajetória fui desbravando corajosamente os espaços aos 
quais almejei conquistar, pois como disse anteriormente, ainda vivemos em uma sociedade 
que discrimina e que exclui um grande número de pessoas negras. E neste cenário, em 
busca de uma qualificação profissional, não é diferente ressalta-se aqui os gestores de 
25 
 
empresas, calcados com animus preconceituoso e racista no qual alijam os profissionais 
negros do mercado. 
Nesse diapasão, para citar dados de acordo com o Censo Jurídico 2018, os 
advogados negros representam menos de 1% do corpo jurídico em grandes escritórios 
ressaltando que estamos falando de um país onde a maioria da sua população é composta 
por negros (60%). 
Todavia, algumas vezes, ouvi pessoas dizerem que eu não tinha cara de advogado, 
ou me confundirem com alguém que trabalha no escritório em qualquer outro cargo, ou 
então me questionei qual a cara que deve ter um advogado diante a sociedade? Somente 
brancos são capazes de ocupar determinados cargos? Onde está a diferença? Na nossa 
capacidade como indivíduo? No nosso intelecto? Ou será que a cor5 da nossa pele explica 
com maior clareza essa discriminação? Estas são algumas provocações que divido com 
vocês. 
Neste triste cenário, ao que parece está longe de deixar atingir nossa comunidade 
negra, e porque refiro isto! Faço esta afirmação, pois se depreende que diariamente fatos 
como este referido anteriormente, acontecem diariamente em todos os rincões do Brasil, 
nas empresas, e inclusive em nossos Tribunais! 
A repercussão dessas ponderações na ordem jurídica e social, são reais e bem 
comuns ainda nos dias atuais. Neste contexto, sempre pautei com objetivos bem definidos, 
finalizei minha graduação e segui meus estudos com pós-graduação e mestrado, sempre 
me atualizando em cursos de extensão até o presente momento! 
Não resta dúvida, e acima de qualquer dificuldade que tenha cruzado em minha 
vida profissional, jamais penseiem desistir! Desta forma, é preciso que persistamos e que 
possamos conscientizar a juventude, os universitários, aqueles que estão iniciando uma 
carreira, que apesar de nossa luta ser um tanto árdua pelo reconhecimento dos nossos 
direitos, ela só é capaz de ser vencida através da nossa persistência, da nossa voz em 
espaços que ainda hoje são reduzidos, como os cargos de maior visibilidade e ascensão 
profissional nas organizações. 
 
5 Ao reduzir o corpo e o ser vivo a uma questão de aparência, de pele e cor, outorgando a pele e a cor o 
estatuto de uma ficção de cariz biológico, os mundos euro-americanos em particular fizeram do negro e da 
raça duas versões de uma única e mesma figura։ a da loucura codificada. (Miriam Eliav-Feldon, Benjamin Isaac 
e Joseph Ziegler, The Original of Racism in the West, Cambridge University Press, Cambridge, 2009. (Grifei). 
26 
 
Sob este ângulo, fundamental conhecer sobre as relações raciais no Brasil e no 
mundo para questionar e atuar de maneira mais contundente para desnaturalizar os 
lugares raciais de cada grupo: Estado no sentido macro, Sociedade e no Poder Judiciário. A 
resiliência e resistência fazem parte da minha caminhada profissional! A minha luta 
continua sim, e a sua? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
27 
 
 
ENSAIOS 
Denise Teresinha Pedroso Zilch 
 
Toda história tem um início, um porque, como diz Mano Braw, tudo começa com 
"um motivo para". Eu posso dizer que meu motivo foi descoberto com 12 anos, enquanto 
fazia a 6º série do ensino fundamental. 
Até então, eu era a única filha mulher, da família negra, pobre, periférica, sem 
qualquer histórico de estudo ou diplomas. Meu pai pedreiro sempre trabalhou 
incansavelmente para dar o melhor para os três filhos, mesmo não tendo tudo que 
desejamos tínhamos o suficiente para viver. Minha mãe dividia o tempo das faxinas com a 
educação dos filhos. 
Sempre frequentei escola pública e posso dizer que gostava de me dedicar aos 
estudos. Com 11 anos comecei a trabalhar como baba e auxiliar a mãe nas faxinas, 
enquanto meus irmãos já estavam puxando carrinho nas obras junto com o pai. O estudo 
sempre foi prioridade lá em casa. 
Com 12 anos, uma professora de chegou pra mim e perguntou que profissão 
gostaria de seguir, eu fiquei sem resposta, porque até aquele momento, pra minha 
realidade, não tinha essa história de profissão, o importante era trabalhar para sobreviver. 
Depois de plantar essa sementinha, a mesma professora começou a me incentivar 
de várias formas. Descobri então a facilidade na escrita, na fala e na comunicação, que me 
levou a objetivar a profissão de repórter. A partir daí, meu sonho estava direcionado para 
o Jornalismo, mesmo sem ter qualquer noção do caminho a ser percorrido. 
28 
 
Me formei no ensino médio, já com emprego fixo (na área administrativa de um 
hospital), podendo então arcar com as mensalidades de uma faculdade. No mesmo ano fiz 
a prova do Enem e prestei vestibular para a tão sonhada habilitação em jornalismo. Nesta 
época o direito era a penúltima opção de uma lista de cinco possíveis graduações. 
Ao receber uma boa pontuação na prova e me inscrever na universidade, pelo 
sistema de cotas para pardos e negros, acabei conseguindo uma bolsa integral, justamente 
para direito. 
Enquanto a família e amigos próximos vibraram com tudo isso, eu só conseguia 
alimentar a dúvida: ir atrás do sonho ou fazer uma faculdade sem custo? 
E nesse momento a razão falou mais alto, iniciei no direito no ano de 2006. 
Alguns meses depois acabei perdendo o emprego e iniciei os estágios em vários 
escritórios e órgãos públicos da Cidade. Tudo isso agregou muito conhecimento, 
experiências e me fez apaixonar pela carreira. 
Nesse meio tempo teve casamento, filhos, mudanças, novos empregos e alguns 
semestres interrompidos. Lembro muito bem dos dias que chegava em casa as 18 horas, 
depois de um do trabalho, pegava meu filho no colo enquanto comia qualquer coisa e em 
meia hora estava embarcando no ônibus até a universidade. 
Nessa época, minha forca vinha da minha rede de apoio: marido, pais, sogra. Eu 
tinha motivos para ir além. 
Diferente dos filmes, a Universidade não era um lugar alegre, de sorrisos, festas e 
muitos amigos. Eu era a única negra da sala, isso por longos semestres, nunca me encaixei 
nos grupos dos nerds, dos festeiros, dos almofadinhas, das modeletes, dos zoeiros ou dos 
zuados. Era simplesmente eu, só queria aprender e terminar tudo aquilo. 
Em 2015 eu estava planejando meu último ano: conciliar trabalho, estágios e 
projeto de TCC. Então descobri minha terceira gravidez, um grande susto, agora mais do 
que nunca precisa me formar. 
Em um surto, nada heroico, resolvi conciliar em um semestre, trabalho, filhos, 
casamento, estágios, ultimas disciplinas da graduação (as 6 que ainda faltavam) projeto de 
tcc e tcc, e ainda, a prova da ordem; resumindo, me formei em agosto de 2015, grávida de 
seis meses. 
Foram lágrimas de alegria, alivio e orgulho. Nunca vou esquecer meu pai e minha 
mãe sentadinhos na primeira filha, com uma rosa na mão, acompanhando cada passo. A 
única formanda da família que se tem notícia. 
Minha mãe, sonhadora, sempre dizia que depois da formatura tudo ia melhorar, 
mal sabia ela (e eu também) que este seria só a primeira batalha. 
Trabalhava em um bom escritório, mas como de praxe em início de carreira, a rotina 
era massante, o salário era baixo e a valorização, zero. 
29 
 
Um ano depois da formatura, uma amiga fez uma proposta de sociedade, um 
escritório próprio, no início relutei, afinal, a minha zona de conforto incluía a estabilidade 
de um emprego fixo. 
Em uma das nodas conversas (eu razão, ela emoção), chegamos a conclusão que 
nosso objetivo era o mesmo, não queríamos enriquecer na advocacia (utopia?), mas 
sermos reconhecidas, entrar em uma sala de audiência e ser reconhecida pelo nosso 
trabalho, ter uma cartela de clientes suficientes para os boletos do final do mês. 
Arriscamos. Essa foi minha "virada na chave". Em junho de 2016, as duas recém-
formadas, sem um pila no bolso, abriram as portas do escritório. 
Nestes quase cinco anos, posso dizer que alcançamos nosso primeiro objetivo, ser 
reconhecidas pelo nosso trabalho. Ainda tenho muitos objetivos pessoais e profissionais e 
toda essa trajetória tem possibilitado sonhar com voos mais altos. 
A menina de 12 anos nunca imaginou estar neste lugar hoje. 
Ingressar nesse mercado jurídico (com padrões ainda de branquitude e nobreza, 
dotado de ternos, saltos e escritórios luxuosos) não e fácil, é um choque de realidade, mas 
tudo isso se torna necessário ao processo de reconhecimento e fortalecimento, tanto 
pessoal, como coletivo. 
Sou sim uma advogada negra, em início de carreira, com muitos sonhos já realizados 
e uma lista gigante de objetivos. O que desejo é que a minha história, como a de muitos 
outros, sirva de inspiração para meninas e meninos negros, de família pobre, de escola 
pública, bolsistas e cotistas. 
Nossa trajetória pode até ser invisual a alguns olhos, mas as marcas deixadas no 
caminho são permanentes. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
30 
 
 
 
ENSAIOS 
Dorival Sebastião Ipê da Silva 
 
Não há como reconhecer quem sou hoje sem observar quem fui no passado. Meu 
nome é Dorival Sebastião Ipe da Silva, nascido no dia 08.11.1953, em Linha Capão - Distrito 
de Vila Tereza - Santa Cruz do Sul, hoje município de Vera Cruz. Sou filho de pessoas 
admiráveis que não tinham estudo nem "letramento", mas tinham muita sabedoria. 
Até vir para a capital do Estado, não havia completado o Ensino Fundamental 
(antigamente conhecido como primário). Até aquele momento, trabalhei na lavoura, na 
roça, plantando e colhendo fumo, milho, mandioca, etc. Trabalhei como jardineiro e 
fazendo hortas até os anos de 1967/68. Depois, como servente de obras (construção civil),bem como em uma funilaria como auxiliar. Em janeiro de 1971 passei a servir o Exército, 
onde permaneci pelo período de dois anos e quatro meses. 
Durante aquele tempo, aprendi lições importantíssimas para minha vida, 
principalmente pela base firme, elogiável e destemida recebida do meu pai, um analfabeto 
no sentido literal, mas um "doutor" de fato, um homem inteligente, agregador, 
aconselhador, uma verdadeira autoridade, que encontrou no MOBRAL uma forma de me 
motivar a estudar ao frequentá-lo. 
31 
 
Já em Porto Alegre em 1974, indicado para trabalhar em uma metalúrgica por 
possuir em meu currículo um cursinho de Mecânico Ajustador, terminei a escola através 
do Supletivo (atual EJA), no Colégio Ana Neri, no bairro Parque São Sebastião. Além disso, 
possuía no meu currículo um certificado de Técnico de Enfermagem. Diante dos problemas 
de segurança do trabalho existentes na empresa na qual trabalhei, de "peão de fábrica” 
virei enfermeiro. Em seguida, passei a exercer os cargos de Assessor de Recursos Humanos 
e, por fim, Gerente de Recursos Humanos. 
Conto toda essa história, parte de uma sofrida caminhada, para dizer que aprendi 
sobre pessoas antes mesmo de aprender sobre Direito. Logo, eu aprendi muito, apesar de 
todo esse conhecimento não ser passível de constar em um currículo. 
Em 1993 iniciei a graduação em Direito na UNISINOS e em janeiro de 1999 colei 
grau, aos 45 anos de idade. Na época, eu já era casado e pai de três filhas. Logo, eu não sou 
um Advogado que se formou cedo e contou com o tempo a seu favor – sou um Jovem 
Advogado. 
Existe um detalhe que não explicitei: eu sou negro. Minha cor é um detalhe, mas 
infelizmente é um critério de exclusão. Ao olhar para trás, percebi que eu era o “único 
negro”, seja porque num determinado tempo exerci cargo administrativo, seja porque, de 
um momento para outro, passei exercer um alto cargo na empresa na qual trabalhei por 
muitos anos, e as circunstâncias exigiam de mim compromissos diversos daqueles 
comumente proporcionados às pessoas da minha cor. 
 Não foi diferente na graduação, ou na OAB - Subseção de Cachoeirinha/RS, onde 
fui Secretário Geral e Presidente – cargo exercido por três mandatos consecutivos. 
Também vivo essa situação no Conselho Estadual da OAB/RS, estando, hoje, no meu 
terceiro mandato. Importa registrar minha gratidão ao Presidente Ricardo Breier por ter 
dado este importante pontapé inicial visando o debate quanto à questão racial, tendo sido 
criada, em sua gestão, a Comissão Especial da Igualdade Racial. 
Não é fácil se sentir solitário nos lugares, principalmente porque as pessoas que 
estavam no meu entorno não compreenderiam o quanto a caminhada foi mais difícil em 
decorrência não da minha cor, mas do racismo alheio. Além disso, eu estava ciente de que, 
para muitos, a minha presença nos locais bastava. “Não somos racistas, o Ipe está aqui”. 
“Eu não olho cor, eu até tenho o Ipe como amigo”. 
32 
 
A verdade é que se eu estou solitário, então somente a minha presença nos espaços 
não basta. Aceito ouvir frases como “o Ipe foi o primeiro presidente negro da Subseção de 
Cachoeirinha”, mas não quero mais ouvir que sou o único. 
Tenho orgulho da minha trajetória, pois sei o quão difícil foi chegar até onde estou. 
Fico feliz de saber que garanti às minhas filhas melhores condições para alcançarem os seus 
sonhos de forma menos sofrida e tardia. Emociono-me ao ouvir que inspiro pessoas, e que 
querem me ouvir. 
Porém, não estou satisfeito. Quero que os advogados negros da nova geração não 
precisem se arrumar mais que os advogados brancos para que não sejam confundidos com 
os réus dos processos. Quero que sejam igualmente ouvidos e considerados, como 
profissionais e como pessoas. Não quero que se sintam solitários nos espaços. 
Apesar de tudo, meu prognóstico é positivo. A juventude negra está se fazendo 
ouvir, e está adentrando nos espaços. Com as cotas, creio que ganharão o tempo que eu 
não tive. Vejo uma advocacia negra no futuro mais forte que a atual, o que me faz sentir 
esperança. O momento que vivemos hoje me dá substrato para pensar assim. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
33 
 
 
 
TRAJETÓRIA INSTITUCIONAL 
Franchesca Rodrigues de Souza 
 
Meu primeiro contato com a instituição OAB/RS foi através de um estágio que 
realizei no Tribunal de Ética e Disciplina durante o período de 16/07/2012 a 04/06/2013. 
No estágio desempenhei muitas atividades, mas a que mais gostava era secretariar as 
audiências de instrução para adentrar nos detalhes de cada caso. Foi um período de muito 
aprendizado, no qual pude aprofundar meu conhecimento sobre o código de ética e 
estatuto da OAB, infelizmente, precisei interromper o estágio para cursar estágio 
obrigatório da faculdade durante período integral no Foro da Restinga. 
Durante todo o período da graduação sempre prestigiei os cursos e eventos 
realizados pela OAB/RS para atualização e qualificação profissional, como também para 
cumprimento das horas complementares exigidas pela faculdade. 
Recebi minha carteira pelas mãos do Presidente, Dr. Ricardo Breier na primeira 
prestação de compromisso da gestão 2016/2018, no dia 25/01/2016. 
Após o recebimento da credencial, continuei prestigiando os eventos realizados 
pela instituição e, no dia 16/05/2018, participei da Conferência Estadual de Direitos 
Humanos na OAB Cubo. Este evento marcou bastante porque foi nesta Conferência que 
tive a oportunidade de conhecer a Dra. Beatriz Peruffo, Presidente da CMA na época, que 
34 
 
era uma das palestrantes, lembro bem de quando ela disse que as portas da CMA estavam 
abertas à todas advogadas que quisessem participar, então fiz contato e manifestei 
interesse via e-mail e recebi convite para a primeira reunião ordinária realizada no dia 
24/05/2018. Ao chegar na reunião já fui recepcionada pela Dra. Beatriz com um PIN das 
Mulheres de Ordem e achei o máximo, nunca mais esqueci de usá-lo nas reuniões 
seguintes. 
Na primeira reunião da CMA conheci a Dra. Karla Meura, Coordenadora do Grupo 
de Trabalho Gênero e Raça da CMA e posteriormente as Dras. Bruna Rosa, Fernanda Cabral, 
Mariana Ferreira, Izabel Calixto, Daniela da Rosa, Rochele Oliveira, Evelin França e Patrícia 
Alves que participavam do Grupo de Trabalho. Passei a integrar o Grupo de Trabalho e 
participei ativamente de vários eventos e atividades realizadas dentro e fora da instituição, 
pois também realizávamos um lindo trabalho nas comunidades, chamado Mulheres de 
Ordem nas Comunidades. Na reunião do dia 24/08/2018, também conheci a Dra. Ellen 
Martins, Coordenadora do Grupo de Trabalho OAB Vai à Escola e também tive a 
oportunidade de acompanhar este projeto muito importante em algumas visitas. 
Os integrantes do Grupo de Trabalho Gênero e Raça da CMA apresentou o pedido 
de criação da Comissão Especial da Igualdade Racial da OAB/RS para a Diretoria da Ordem, 
o projeto foi aprovado e no dia 13/12/2018 ocorreu a instalação e posse da nossa tão 
esperada e amada CEIR, que tem o objetivo de destacar as contribuições civilizatórias dos 
povos de ascendência africana, fortalecer e complementar a luta pela garantia dos direitos 
humanos, bem como articular estratégias institucionais de combate ao racismo, 
valorizando a advocacia negra. 
A criação da CEIR é fruto de um trabalho coletivo capitaneado com maestria pela 
Dra. Karla Meura. Hoje sou Secretária desta Co-Missão tão importante e necessária, com 
muito orgulho, realizo um trabalho árduo, juntamente com todos os membros, que acaba 
tomando parte considerável do nosso tempo, mas toda vez que vejo um (a) colega negro 
(a) participando da entrega de credenciais, das mesas de variados eventos, ocupando 
lugares de destaque dentro da instituição, vejo que todo o esforço despendido por todos 
nós valeu a pena. Ainda temos muito a avançar no tocante a equidade racial dentro da 
instituição e nós estaremos sempre na luta, ocupandotodos os espaços. 
35 
 
 
O QUE VOCÊ ESPERA DO FUTURO DA ADVOCACIA PARA ADVOGADOS NEGROS (AS) 
COMO VOCÊ? 
Geisa Carmo da Silva 
 
O que eu espero? Esperar é o que mais esperamos, somos esperançosos. Há se não 
fossemos movidos pela esperança. 
Esperança: Sentimento de quem vê como possível a realização daquilo que deseja; 
confiança em coisa boa; fé. 
Agradeço de forma pensativa a homenagem bem como o reconhecimento do 
OAB/RS, através da Comissão de Igualdade Racial, pela indicação do meu nome para 
escrever sobre o futuro da advocacia negra. 
 
DO PRIMEIRO e ÚLTIMO CAPÍTULO: 
Tomarei a liberdade de escrever sobre a Dra. Miria de Almeida Vieira, OAB/RS 
26.861, porque ela reflete a maioria de nossa realidade, portanto, ela sou eu, tenho 
esperança de saber, quantas Dras. Miria têm na verdade no Rio Grande do Sul. 
Daí meu questionamento, a história da Dra. Miria é linda, ou seja, ela é todas nós, 
por isso, nossas histórias de vida são lindas, mas ela não fora homenageada, com mais 
trinta anos de exercício da atividade. Por quê? 
Não estava em dia com a anuidade. 
Ela é a homenageada no meu texto, o que nos separa é apenas a anuidade. 
36 
 
 Obrigada Dra. Miria, por ter começado antes, com certeza, abrira caminhos para 
nós, é invisível para alguns colegas, a trajetória da Dra. Miria, mas para nós negras 
advogadas não. 
Certa feita, por coincidência, uma advogada chamada Dra. Miria, no exercício de 
sua atividade profissional, chegara no Cartório Criminal, do Foro Regional do Partenon, e a 
pergunta dirigida a ela fora: A Sra. É esposa de presidiário? Irmã? Mãe? 
Ela é todas nós, quantos advogados negros temos a final no registro da OAB/RS? 
Têm nosso cadastro, eu tenho esperança. 
Quantas constrangimentos passamos nos cartórios todos os dias, há 
aproximadamente cem anos, eu sei dizer, todos os constrangimentos. Tudo bem, entendi, 
sem vitimismo. Vitimismo será? 
Meu querido, fiel, revolucionário, conhecedor de nossas angustias, nossas dores, 
nossos gritos silenciosos, ter sido homenageada pela Comenda que leva teu nome Dr. 
Osvaldo Ferreira dos Reis, me dá sim, esperanças. 
Lembra das nossas resenhas, a OAB/RS não sabe de nós. 
Não sabe, que não temos grandes escritórios nos esperando, com grandes 
aparelhamentos, nossos pais tem sobrenome Silva Santos. 
Nossos pais têm as mãos calejadas, somos heróis da advocacia gaúcha, sozinhos, 
quase únicos nas salas de aula, vencemos, há se não fossem nossas esperanças e o olhar 
de crença de nossos pais. 
Eu espero, investimentos, para que possamos ter esperanças, Vavá meu amigo, que 
nossos jovens, saiam das faculdades, e tenham um lugar parecido com Quilombo, podendo 
todos terem o direito de se prepararem para a prova da ordem, nas mesmas condições de 
igualdade. 
Ah, ia esquecendo, no momento atual, talvez o Sr. Presidente não saiba, somos com 
certeza a maioria dos que não estão “usufruindo” dos serviços na sala da OAB/RS, por quê? 
Não estamos em dia com a anuidade, pode chamar de vitimismo, juro não compreendo Sr. 
Presidente, para que tantas salas? Se não podemos entrar na casa grande. 
Esperança Sr. Presidente, é acreditar na possibilidade para pessoas de baixa renda, 
que saem dos cursos de direito e possam prestar as provas da Ordem, eu ouso dizer, que a 
37 
 
maioria, com raras exceções, são pretos, podres de periferias, que não estão conseguindo 
passar na prova da Ordem. Vitimismo? Queremos a lição do Quilombo. 
Obrigada Dra. Miria e Dr. Osvaldo Reis. Vocês são nossas esperanças. 
 Esperança: Sentimento de quem vê como possível a realização daquilo que deseja; 
confiança em coisa boa; fé. 
 
Obrigada pela oportunidade. 
CURRICULO 
VOU TRANSCREVER O TEXTO QUE UMA ESTAGIÁRIA DE JORNALISMO FEZ, ACHO QUE 
DEFINE MEU CURRICULO 
O DIREITO ME ESCOLHEU 
ADVOGADA HÁ 28 ANOS, GEÍSA CARMO DA SILVA ENCONTROU NO DIREITO UMA FORMA 
DE AJUDAR OS SEUS. MULHER, NEGRA E DA PERIFERIA, DESDE PEQUENA OUVIA DE SUA 
MÃE, QUE ERA DOMÉSTICA, QUE O ESTUDO ERA SUA ÚNICA SAÍDA. SUA MÃE NÃO QUERIA 
QUE ELA E SEUS OUTROS DOIS IRMÃO TIVESSEM A MESMA VIDA QUE A DELA. 
GEÍSA TEM 53 ANOS E ESTE É O TEMPO EM QUE ELA MORA NA RUA JUVENAL CRUZ, NA 
VILA BRASÍLIA, COMUNIDADE DA ZONA LESTE DE PORTO ALEGRE. “ NÃO EXISTE FELICIDDAE 
MAIOR QUE PERTENCER A ESSE LUGAR”. 
RESPEITADA PELOS MORADORES DA BRASÍLIA OU “DISTRITO FEDERAL”, COMO O CHAMA, 
A ADVOGADA NÃO SE IMAGINA VIVENDO EM OUTRO LUGAR MESMO DEPOIS DE TER 
CONSEGUIDO ASCENSÃO. “EU NÃO SAIO DA BRASÍLIA E ELA NÃO SAI DE MIM”. 
MESMO SENDO ADVOGADA, ENTENDE A JUSTIÇA COMO NÃO SENDO JUSTA PARA TODOS. 
“ PARA QUEM TEM DINHEIRO É UMA, PARA QUEM NÃO TEM É OUTRA. QUESTIONADA DE 
O PORQUÊ TER ESCOLHIDO O DIREITO, RESPONDE O “ DIREITO ME ESCOLHEU”. 
NO LUGAR ONDE VIVO, SEMPRE SENTI NECESSIDADE DE DIALOGAR, DE DEFENDER E DE 
DEBATER. VI NO DIREITO A POSSIBILIDADE DE FAZER ISSO. EU PRECISO ADVOGAR. 
GEISA TÊM DUAS PAIXÕES: CARNAVAL BAMBAS DA ORGIA E INTERNACIONAL.COLORADA, 
PORQUE O TIME SEGUNDA ELA COMBINA COM SEU PERFIL POPULAR E O CARNAVAL FAZ 
PARTE DE MIM, DIZ ELA, QUE DEFENDE COM UNHAS E DENTES A MANIFESTAÇÃO 
POPULAR. 
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ENSAIOS 
Jurema Praxedes Tubias Quadros 
OAB/RS 27.282 
 
É com imenso prazer que saúdo a Comissão Especial da Igualdade Racial OAB/RS na 
pessoa da sua Presidente, Digníssima Sr.ª Dr.ª Karla Meura e, estendo aos demais colegas, 
Nobres Juristas, minhas saudações. Não poderia me furtar de atender ao convite de narrar 
minha trajetória como profissional apaixonada, pertencente ao universo jurídico 
oficialmente desde o dia 22 de dezembro do ano de 1989, quando jurei honrar a advocacia 
e me fazer útil a todos de quem dela necessitasse e, é dessa prorrogativa que comungo até 
os dias atuais. 
Minha história se confunde com a de muitos colegas: Sou oriunda de uma família 
humilde, formada por trabalhadores incansáveis e honestos que fizeram dos valores morais 
dos quais eram convictos, base para solidificar a estrada para que seus descendentes 
pudessem trilhar na busca pelo conhecimento. Quando decidi que seria Advogada 
entreguei-me de forma desmedida aos estudos, ação esta que se tornara uma constante 
em minha vida. Recordo que eram tempos onde era grande a concorrência para frequentar 
uma Faculdade de Direito, sendo motivo de orgulho para quem ingressava na Universidade 
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e também para os familiares, que ostentavam a conquista dos seus. No decorrer do curso 
o empenho era redobrado para estar entre os primeiros da classe, pois esses após colarem 
grau seriam privilegiados na busca por um espaço no mercado de trabalho. Eram poucos 
os Negros que ocupavam a academia, em razão da condição socioeconômica, ou por falta 
de motivação, uma vez que muitos dos algozes segregadores disseminavam a errônea ideia 
que nós possuíamos baixa capacidade intelectual. Aprendi que para galgar degraus cada 
vez mais altos eu deveria estar em constante aprendizado, sendo assim segui na busca pelo 
saber, absorvendo todas as qualificações que me foram proporcionadas. Após conquistar 
o direito à advogar, atuei na Área Trabalhista por longos anos para um conceituado banco. 
Posteriormente disponibilizei meu ofício à uma empresa igualmente bem vista na área da 
saúde e, concomitantemente prestava trabalho em meu próprio escritório que hoje 
encontra-se inabilitado em virtude de ter sido acometida por um acidente vascular 
cerebral. Superando as limitações que a vida me impôs, voltei a advogar como servidora 
do município de Jacuizinho e militar nas causas políticas na região. 
Sou a primeira integrante da minha família a possuir formação de nível superior e 
acredito que fiz desse marco a motivação para impulsionar que os meus também se 
sentissem capazes de repetir esse feito. Em toda a sua simplicidade, minha base familiar 
sempre conscientizou minha irmã e a mim do nosso papel na sociedade e, nos segmentos 
sociais e culturais os quais transitávamos, capturávamos todos oselementos que ajudaram 
a construir nossa identidade. Ao trilhar as vias da evolução confirmei a sensação de 
pertencimento cultivada pelos meus mentores, fazendo valer todos os nossos esforços. 
Entendi que como cidadã, como mulher negra, eu deveria dar continuidade às 
responsabilidades social e afetiva plantadas pela minha família. A partir de então todos os 
espaços conquistados foram vitórias coletivas, todas as ações vencidas passaram a ser 
êxitos nossos. Com base nos alicerces herdados, construí dia após dia degraus para que a 
nossa continuidade também pudesse ascender. Sem pretensão alguma tornei-me 
responsável pelo desenvolvimento intelectual não somente de membros da minha família, 
mas também de tantas outras pessoas que apostaram em minha vida e que me permitiram 
instigar suas aptidões. Quando dei-me por conta havia me tornado referência e abrigo para 
aqueles que o destino havia levado ao meu encontro. 
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Receber o reconhecimento pelos trabalhos prestados no decorrer desses 30 anos 
de atividade profissional e fulgurar entre tantos Juristas Negros atuantes nessa comarca, 
vai além de ser um motivo de orgulho, iluminando a memória daqueles que tornaram-se 
ancestrais e confirmando a certeza de que realizei a melhor escolha. Acredito que honro o 
juramento feito quando me ponho a disposição daqueles que formam a comunidade a qual 
pertenço para auxilia-los, sem fazer distinção, despindo-me de qualquer vaidade para 
defende-los quando preciso for. Penso que sou mais um dos tantos elos que formam essa 
corrente forte e indissolúvel, simbolizando a luta incessante pelo respeito e, também pela 
conquista dos espaços que nos são de direito e que devemos ocupar. Reconhecer minha 
atuação no exercício da defesa é potencializar a marcha que se mantém viva a cada um dos 
nossos que torna realidade o seu anseio de um dos nossos. 
Por fim, agradeço a todos a oportunidade de contar sucintamente minha trajetória 
no universo da transformação e da justiça. 
 
BREVE BIOGRAFIA: 
 
Nascida em 06 de janeiro de 1955 em Porto Alegre, recebe o nome de batismo em 
homenagem à fé e também à sua Avó e Madrinha, a qual seria uma de suas maiores 
incentivadoras. Filha de um Militar da 3ª Região do Exército atuante na Subsistência e de 
uma Costureira que também trabalhava na Subsistência do Exército, viveu sua infância no 
bairro Partenon, onde transitava livremente entre as festas da Paróquia São Jorge e os ritos 
da religiosidade de matriz africana. Estudante da rede pública Estadual, cursou o “Primário” 
e o “Ginásio” no Grupo Escolar General Aparício Borges e, formando-se Técnica em 
Mecânica Industrial pela Escola Técnica Parobé. Como voluntária do Mobral lecionou na 
alfabetização para adultos na Pequena Casa da Criança. Na década de 1970 ingressa no 
Curso de Direito na Faculdade Ritter dos Reis no município de Canoas. Na mesma época 
inicia as atividades no Banco Sul Brasileiro como Escriturária, permanecendo no quadro de 
colaboradores da empresa quando surgia o novo Banco Meridional. Em 22 de dezembro 
de 1989 cola grau e por tornar-se Advogada é transferida para o Departamento Jurídico do 
Instituição Bancária, onde havia cumprido o período obrigatório de estágio. Permaneceu 
na empresa até 1996, quando a instituição passava novamente por uma transição. A partir 
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de então abriu seu próprio escritório, prestando assessoria jurídica para empresas e 
defendendo causas nas áreas civil e trabalhista. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Construções Coletivas, Conquistas Coletivas 
Karla Regina Meura da Silva 
 
Eu sou Karla Meura, filha da Regina Helena Meura e do Carlos Roberto da Silva. Irmã 
mais velha de Douglas Meura, do Diego, da Kelly e da Áure. Sou uma mulher negra 
Advogada, formada em 2008/2, pelo Centro Universitário Metodista-IPA, em Porto 
Alegre/RS, através do Programa de Ações Afirmativas pactuado entre o IPA e o Centro 
Ecumênico de Cultura Negra-CECUNE, que garantiu bolsa integral para alunos 
afrodescendentes. No Trabalho de Conclusão da Graduação pesquisei sobre Ações 
Afirmativas e o Princípio da Dignidade Humana no Estado Democrático de Direito, onde 
estudei os obstáculos da inclusão da população negra no acesso aos direitos sociais e 
mercado de trabalho. A referida Pesquisa que foi aprofundada no Curso de Pós-Graduação 
em Direito Penal e Processo Penal, concluído em 2016/2, cujo Trabalho de conclusão teve 
como título: Direito Fundamental de Acesso à saúde no Sistema Prisional do RS. Minha 
segunda Pós-Graduação foi no Curso de Direitos Humanos e Contemporaneidade, 
realizado pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia – UFBA. 
Entendo que a qualificação técnica permanente é essencial para o fortalecimento da 
advocacia negra, pois somos instrumentos da transformação social e o direito é uma 
importante ferramenta que temos ao nosso dispor. 
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Minha atuação jurídica está diretamente ligada ao enfrentamento da violação dos 
Direitos Humanos, especialmente tratando da promoção da equidade racial e de gênero. 
Desde o início da minha trajetória acadêmica realizo trabalho em comunidades com altos 
índices de violação de direitos, buscando subsídios para a promoção da cidadania e 
garantia de direitos das pessoas privadas de liberdade no Sistema Prisional e 
Socioeducativo. 
Entre os anos de 2013 e 2015 trabalhei na Coordenação Estadual de Saúde Prisional 
da Secretaria Estadual de Saúde do RS. Participei do grupo de trabalho responsável por 
conduzir a transformação do Plano Nacional em Política Nacional de Atenção Integral à 
Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP). 
Considerando a necessidade de reintegração social das pessoas 
privadas de liberdade por meio da educação, do trabalho e da saúde, de acordo com a 
Lei de Execuções Penais - LEP, através da construção técnica e coletiva, foi publicada a 
Portaria Interministerial Nº 1 de 02 de janeiro de 2014. Acompanhar este 
processo de transformação de Plano em Política Pública revelou meu perfil de abertura 
para mudanças e habilidade em gerenciar complexidades, assim como demonstra 
facilidade para trabalhar em equipe e na resolução de conflitos. 
Para garantir a efetivação e operacionalização das 
diretrizes de implementação da PNAISP, foi também foi necessária a 
elaboração de diagnósticos locais acerca do funcionamento das execuções judiciais e dos 
serviços penais. Deste modo, as normas, critérios e fluxos de operacionalização foram 
estabelecidas través da Portaria nº 482, de 1º de abril de 2014. 
A realidade do sistema prisional global, além da forte incidência sobre setores 
sociais desprivilegiados, é marcada por condições desumanas de sobrevivência. Nos 
modelos em que se apresentam as cadeias reforçam e reproduziam a lógica excludente 
pela qual era marcada a sociedade brasileira, configurando-se em importante instrumento 
para manutenção da ordem social. A experiência na Coordenação da 
Política de Saúde Prisional exigiu destreza e o desenvolvimento de minhas habilidades 
para gerenciar e subsidiar a atuação das equipes técnicas locais, pois eram realizados 
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monitoramento e avaliação dos produtos e metas previstas pela gestão do Sistema 
Prisional. 
Nos anos de 2017 e 2108 atuei como advogada do Centro de Referência 
Especial de Assistência Social-CREAS Lomba do Pinheiro, onde fui Coordenadora das 
medidas sócio educativas -MSE. Uma das principais funções era elaborar subsídios para a 
produção de relatórios técnicos de acompanhamento da implementação das MSE. Como 
unidade de referência, foi desenvolvido um trabalho no intuito de estruturar uma rede 
efetiva de proteção especial, e para isso contou com uma estreita articulação entre o Poder 
Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Conselhos Tutelares e outras 
Organizações de Defesa de Direitos, que buscavam construirestratégias com foco no 
fortalecimento do monitoramento e da fiscalização do sistema socioeducativo. 
Após esta breve apresentação de parte da minha caminhada profissional, penso que 
devo compartilhar também a participação na política institucional do nosso órgão de 
classe. Me tornei oficialmente advogada em 18 de julho de 2011, no mesmo dia de 
aniversário de meu pai. Recebi a Cartei da OAB das mãos do Presidente Cláudio Lamachia. 
Os primeiros quatro anos da advocacia dediquei exclusivamente à organização e atuação 
do meu escritório de Advocacia na verdade, do nosso escritório, pois na época eu trabalha 
em parceria com a Dra. Viviane Santos e o Dr. Carlos Antônio Carvalho dos Santos, colegas 
pelos quais tenho admiração e gratidão imensa. 
Em 2015 ingressei voluntária e efetivamente no Sistema OAB, quando vi no site a 
criação da Sub-Comissão da Verdade Sobre a Escravidão Negra no Brasil, uma pauta que 
sempre me interessou e fez parte de minhas pesquisas. Entrei em contato com a Secretaria 
da Seccional e manifestei interesse em colaborar com a valiosa Comissão. 
Em dezembro de 2016 participei de um Seminário sobre direitos humanos e 
discriminações. Chamou minha atenção a ausência da palavra “racismo” no título, 
especialmente porque entre as 4 pessoas palestrantes 3 eram negras. Assim, despertei 
para a necessidade de realizarmos um trabalho mais direto de enfrentamento e combate 
ao racismo no sistema OAB RS. Deste modo, eu e outras pessoas colegas da advocacia 
negra nos organizamos e propusemos a realização do “1º seminário Internacional pela 
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Promoção da Igualdade Racial”, ideia que foi imediatamente aceita pelo presidente Ricardo 
Breier e o seminário realizado pela ESA em março de 2017. 
Logo depois recebi um telefonema da Dra. Beatriz Peruffo, presidenta da Comissão 
da Mulher Advogada- CMA na época, me convidando para fazer parte da CMA. Fiquei 
imensamente honrada e passei a compor também esta Comissão. Logo no 1º encontro 
percebi que eu era a única mulher negra da sala, num grupo de quase 100 colegas. 
Obviamente percebi que alguma coisa estava errada e convidei outros colegas negros para 
participarem na CMA conosco. Aos poucos fomos fomentando as discussões sobre gênero 
e raça e no dia 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Negra Afro-latino Americana e 
Caribenha, sugeri à Dra Beatriz que fosse criado um Grupo de Trabalho sobre Gênero Raça. 
Novamente, minha proposta foi aceita de forma imediata. A partir de então as reuniões da 
CMA ficaram mais coloridas. O grupo de advogadas negras aumentava a cada encontra. Na 
reunião seguinte foram 8 advogadas negras, depois foram 12 depois 20 e assim nosso GT 
Gênero e Raça conseguiu realizar grandes projetos. O mais notório foi o que chamamos de 
MOC - Mulheres de Ordem nas Comunidades. Este projeto é fruto de nossas conversas e 
desabafos nas reuniões do GT, que nos fizeram enxergar a importância de colocarmos 
nosso conhecimento à serviço das nossas comunidades. Cumpre salientar que o MOC 
consiste em encontros mensais e itinerantes com o objetivo de realizar rodas de conversa 
com as mulheres que são lideranças em suas comunidades e com toda a sociedade que 
estivesse disposta a trocar conhecimentos e saberes. 
 Em fevereiro de 2018 protocolamos junto ao Gabinete do presidente o pedido de 
criação da Comissão da Igualdade Racial da OAB RS, solicitação foi votada pelo conselho 
Pleno da Seccional em setembro de 2018 e em dezembro do mesmo ano tomamos posse. 
Foi um momento histórico. Muitas pessoas felizes, emocionadas e conscientes desta 
construção coletiva que nos move. 
Desde então viemos realizando inúmeras ações institucionais para a promoção da 
igualdade racial, da igualdade de direitos e oportunidades. 
 Junto com a conquista da criação da CEIR OABRS veio o convite para compor o 
Conselho Seccional da OABRS na gestão 2019/2021. Minha reação foi perguntar: por que 
eu? As colegas que construíram esta trajetória ao meu lado, não me deixaram titubear e 
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responderam que este era o meu momento e que em breve estaríamos ampliando a 
participação da Advocacia Negra nos espaços decisórios. Aceitei o desafio e hoje sou uma 
das vozes negras no Conselho Seccional, a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira no 
Conselho Pleno da Seccional RS, mas como sempre destaco, sou a ‘única por enquanto’. 
Estou imensamente grata por compartilhar esta construção com vocês. Todas as 
ações aqui referidas foram pensadas estratégica e coletivamente, e digo isso sem 
demagogia. Somos muito mais producentes quando nós reconhecemos que tem espaço 
para ‘todo mundo’, porque tem trabalho para todo mundo! Somos muit@s, somos 
divers@as e tod@s nós temos legitimidade. 
Eu sei que uma mulher negra quando chega em um espaço nunca chega sozinha. E é 
fortalecedor saber que não estamos sozinhas. Continuemos construindo nossas trajetórias 
negras, fortalecendo a advocacia negra e oportunizando a ampliação dos espaços para que 
possamos exercer nossas potencialidades num movimento que honra a oportunidade que 
recebemos da nossa ancestralidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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ENSAIOS 
Lucia Helena dos Santos 
 
Natural de Porto Alegre/RS; Advogada membro da Ordem dos Advogados 
do Brasil, Seccional Rio Grande do Sul. Graduada em Direito pela 
UNISINOS/RS, 1993. Pós-Graduada com Especialização em Direito 
Processual Civil pela PUCRS, 2006. 
Coordenadora do Grupo Afro Juristas do Rio Grande do Sul. Ativista dos 
Direitos Humanos com ênfase à vulnerabilidade econômica e social da 
população afrodescendente. Professora com formação no Magistério do 
ensino fundamental. Escritora na modalidade poesia e texto literário. 
Acadêmica na Academia de Letras do Brasil seccional Rio Grande do Sul, 
cadeira n° 50, Patrono Castro Alves. Acadêmica na Academia de Letras, 
Ciências e Artes do Estado do Rio Grande do Sul, cadeira n° 20, Patronesse 
Clarice Lispector. Representante no Brasil da Associação Internacional de 
Escritores e Artistas Afrodescendentes, California /USA; 
 
A representatividade na função de Advogada, mulher e afrodescendente na 
sociedade em que vivemos é de primordial importância como plano de espelho de 
referência e luta frente a família por pertencer a primeira geração com formação 
acadêmica diante da historicidade ancestral africana, bem como junto às mulheres e jovens 
negros, principalmente para aquelas pessoas que não conseguiram alcançar o sonho de 
cursar uma universidade, tão como completar o curso acadêmico em Direito. 
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Entendo ser um instrumento em prol da justiça de mudança de pensamento, 
comportamento e transformação na vida de muitas pessoas, os quais se destacam as 
crianças, adolescentes e jovens egressos da periferia que podem se inspirar e seguir os 
nossos passos para crescer e melhorar a sua qualidade de vida e contribuir para a sociedade 
brasileira. Nas muitas andanças em contato com essa realidade diversa e sofrida, ao me 
conhecer, se surpreendem por saber que sou Advogada, pois até então nunca tinham 
estado em contato com uma profissional do Direito da etnia afrodescendente, o que releva 
à responsabilidade e representatividade afirmativa de sonho para muitos jovens negros 
que não tem acesso e oportunidade à educação 
Além da representatividade junto à sociedade civil organizada, também me sinto 
muito útil exercendo a função jurídica nos fóruns, em defesa das pessoas no cumprimento 
do ofício na difícil tarefa que é fazer justiça num país desigual que é o Brasil, bem como 
respirar a atmosfera das audiências, mesmo sabendo que somos as vezes inexistentes 
diante de um poder judiciário discriminador e opressor que ainda se espanta ao abrirmos 
a porta para nos adentrarmos nas audiências e ainda sermos confundidos por réus ou 
prepostos, mas mesmo diante dessa realidade, sigo adiante contemplada lembrando 
apenas de mostrar o meu trabalho com competência, eficiência e conhecimento

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