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Organizadoras Camile Costa Alyane Dornelles DIREITO E INOVAÇÃO: UMA COMBINAÇÃO NECESSÁRIA Porto Alegre, 2021 Copyright © 2021 by Ordem dos Advogados do Brasil Todos os direitos reservados Grupo de Estudos em Direito e Inovação ESA-OAB/RS Organizadoras Camile Costa Alyane Dornelles A revisão de Língua Portuguesa e a digitação, bem como os conceitos emitidos em trabalhos assinados, são de responsabilidade dos seus autores. Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Rio Grande do Sul Rua Washington Luiz, 1110 –Centro Histórico CEP 90010-460 - Porto Alegre/RS D536 Direito e inovação: uma combinação necessária/. Camile Costa, Alyane Dornelles. (Organizadoras). Porto Alegre: OABRS. 2021. 125p. ISBN: 978-65-88371-10-7 1. Direito 2. Inovação I. Título 340 ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - CONSELHO FEDERAL DIRETORIA/GESTÃO 2019/2021 Presidente: Felipe Santa Cruz Vice-Presidente: Luiz Viana Queiroz Secretário-Geral: José Alberto Simonetti Secretário-Geral Adjunto: Ary Raghiant Neto Diretor Tesoureiro: José Augusto Araújo de Noronha ESCOLA NACIONAL DE ADVOCACIA – ENA Diretor-Geral: Ronnie Preuss Duarte ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL Presidente: Ricardo Ferreira Breier Vice-Presidente: Jorge Luiz Dias Fara Secretária-Geral: Regina Adylles Endler Guimarães Secretária-Geral Adjunta: Fabiana Azevedo da Cunha Barth Tesoureiro: André Luis Sonntag ESCOLA SUPERIOR DE ADVOCACIA Diretora-Geral: Rosângela Maria Herzer dos Santos Vice-Diretor: Darci Guimarães Ribeiro Diretora Administrativa-Financeira: Graziela Cardoso Vanin Diretora de Cursos Permanentes: Fernanda Corrêa Osório, Maria Cláudia Felten Diretor de Cursos Especiais: Ricardo Hermany Diretor de Cursos Não Presenciais: Eduardo Lemos Barbosa Diretora de Atividades Culturais: Cristiane da Costa Nery Diretor da Revista Eletrônica da ESA: Alexandre Torres Petry CONSELHO PEDAGÓGICO Alexandre Lima Wunderlich Paulo Antonio Caliendo Velloso da Silveira Jaqueline Mielke Silva Vera Maria Jacob de Fradera CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS Presidente: Pedro Zanette Alfonsin Vice-Presidente: Mariana Melara Reis Secretária-Geral: Neusa Maria Rolim Bastos Secretária-Geral Adjunta: Claridê Chitolina Taffarel Tesoureiro: Gustavo Juchem TRIBUNAL DE ÉTICA E DISCIPLINA Presidente: Cesar Souza Vice-Presidente: Gabriel Lopes Moreira CORREGEDORIA Corregedora: Maria Helena Camargo Dornelles Corregedores Adjuntos Maria Ercília Hostyn Gralha, Josana Rosolen Rivoli, Regina Pereira Soares OABPrev Presidente: Jorge Luiz Dias Fara Diretora Administrativa: Claudia Regina de Souza Bueno Diretor Financeiro: Ricardo Ehrensperger Ramos Diretor de Benefícios: Luiz Augusto Gonçalves de Gonçalves COOABCred-RS Presidente: Jorge Fernando Estevão Maciel Vice-Presidente: Márcia Isabel Heinen SUMÁRIO PREFÁCIO – Camile Costa ............................................................................................... 1 APRESENTAÇÃO – Rosângela Maria Herzer dos Santos e Fernanda Corrêa Osório ............................................................................................................................................... 2 TECNOLOGIA E SOFT SKILLS PARA INOVAÇÃO NOS SERVIÇOS JURÍDICOS – Camile Costa ..................................................................................................................... 3 METODOLOGIAS ÁGEIS EM ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA – Vitória Tavares Della Valentina ..................................................................................................................... 8 PROVA DOCUMENTAL E DIREITO DIGITAL: UMA ANÁLISE SOBRE A UTILIZAÇÃO DA TECNOLOGIA BLOCKCHAIN – Otávio Macedo Ronchi ......... 23 ERA DO BIG DATA: REFLEXÕES SOBRE O DIREITO À PRIVACIDADE E À PROTEÇÃO DE DADOS – Leiluce Guedes ................................................................... 42 MULTIDISCIPLINARIDADE NA ADEQUAÇÃO DA LGPD E AS BOAS PRÁTICAS – Vivian Mara Millan Araújo ..................................................................... 58 MAPEAMENTO DE DADOS – DATA MAPPING – Alyane Dornelles e Marina Risson ............................................................................................................................................. 63 LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS E AS PEQUENAS E MÉDIAS EMPRESAS – Daniel Dias da Silva ................................................................................. 74 COMPLIANCE DIGITAL E PROTEÇÃO DE DADOS EM LOJAS VIRTUAIS (E- COMMERCE) – Francieli Librelotto da Rosa ................................................................ 78 RESOLUÇÃO DE DISPUTAS: MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS – Fernanda Campos Garcia e Caroline Baetriz Doelle ...................... 101 1 PREFÁCIO O contexto global atual convida, mais do que nunca, a inovar. A agilidade das mudanças e seu impacto sistêmico exige uma constante reinvenção e aprimoramento de soluções nas mais diversas áreas. Novos problemas surgem e antigos problemas buscam novas soluções. Neste contexto, os desafios são evidentes e o mesmo pode ser dito para as oportunidades. A escolha está nos olhos de quem vê. Escolhendo o olhar das oportunidades, o Grupo de Estudos em Direito e Inovação da ESA- OAB/RS, que tive a honra e satisfação de co-fundar, vê nos desafios o impulso para fazer mais e melhor, buscando no compartilhamento de experiências e conhecimentos a inspiração para inovar com consistência e autenticidade. É neste espírito que o presente e-book é apresentado, como a compilação de trabalhos produzidos pelos membros do Grupo ao longo dos anos de sua existência. Os temas abordados unem aspectos inovadores do Direito material com a prática da advocacia, trazendo de forma clara e acessível temas de importante relevo para uma atuação cada vez mais responsável e multidisciplinar. Além de artigos analisando importantes inovações legislativas e seus impactos na atuação jurídica, a tecnologia é trazida como importante aliada da estratégia jurídica, juntamente às soft skills e metodologias de gestão, demonstrando-se como o seu aprimoramento impacta diretamente em uma advocacia eficaz que agrega valor ao cliente. De big data, blockchain, compliance digital e data mapping até soft skills, legal analytics, ADR e metodologias ágeis, o presente e-book brinda a advocacia com importantes contribuições para o constante aprimoramento dos serviços jurídicos, com o objetivo de estimular a inovação com criatividade, legitimidade e protagonismo. Desejando uma excelente leitura, fico à disposição para futuras interações. Camile Costa Advogada e Fundadora do Grupo de Estudos Direito e Inovação ESA-OAB/RS Contatos em camile.costa@gmail.com e @camilecostaconsultoria. 2 APRESENTAÇÃO Apresentar o e-book “Direito e Inovação: uma combinação necessária” reveste-se, para nós, de um significado especial. A coletânea de artigos, organizada pelas advogadas e moderadoras do Grupo de Estudos Direito e Inovação, Camile Costa e Alyane Dornelles, será lançada no momento histórico em que, na Escola Superior da Advocacia do Rio Grande do Sul, reconhecemos que professores e professoras, moderadores e moderadoras devem ter suas competências digitais bem desenvolvidas, estando preparados para serem pesquisadores reflexivos de sua prática pedagógica, criadores de experiências de aprendizagem, protagonistas de sua formação profissional ao longo da vida, além de terem capacidade de inovar na resolução de problemas complexos, de liderar a mudança necessária nos espaços educacionais eatuar como cidadãos digitais. Em tempos de pandemia, a tecnologia se mostra uma aliada para o desenvolvimento destas novas competências e as discussões travadas no Grupo de Estudos e nos artigos que compõem este e-book revelam a importância de se integrar conhecimentos e práticas sobre o bom uso e o uso seguro da tecnologia. Os artigos trazidos nesse e-book tratam dos mais diversos temas relevantes para a advocacia e sobre eles são lançados múltiplos olhares acerca dos impactos das tecnologias na ciência do Direito, bem como a necessidade dos profissionais de acompanharem essas inovações, desenvolvendo habilidades específicas. A urgência frente às mudanças, somada à necessidade dos profissionais do direito de acompanharem essas inovações, fez com que percebêssemos que existe uma era pós-pandemia com desafios ainda maiores. A coletânea, nesse sentido, retrata as reflexões que a Escola Superior da Advocacia do Rio Grande do Sul (ESA/OAB-RS), braço cultural da Ordem dos Advogados do Brasil, juntamente com o Grupo de Estudos Direito e Inovação, vem promovendo acerca das intersecções da tecnologia no contexto jurídico e educacional, tendo a segurança digital e as prerrogativas da classe como metas. Aos leitores e às leitoras, desejamos uma boa e profícua leitura e que esta obra sirva de inspiração para que a advocacia contribua para o debate acerca do uso da tecnologia da informação com o objetivo de possibilitar a todos o acesso à justiça e ao conhecimento. Porto Alegre, novembro de 2021. Rosângela Maria Herzer dos Santos Diretora Geral da Escola Superior da Advocacia da OAB/RS Fernanda Corrêa Osorio Diretora de Cursos Permanentes da Escola Superior da Advocacia da OAB/RS 3 TECNOLOGIA E SOFT SKILLS PARA INOVAÇÃO NOS SERVIÇOS JURÍDICOS Camile Costa1 “Este é certamente um momento para fazer o futuro. Este é um momento para a ação. ” Peter Drucker A era da informação2, na sociedade do conhecimento3, a partir da quarta revolução industrial4, exige inovação em todos os sentidos e quase constantemente. Neste contexto, o desafio é identificar onde e como inovar, de forma a agregar valor ao que se faz e direcionar as próprias habilidades para a entrega de soluções úteis e efetivas. Certamente não será diferente na advocacia, e já são perceptíveis as constantes inovações percebidas no mundo jurídico5. É neste cenário de desafios vistos como oportunidades que o presente artigo é escrito, com o objetivo de demonstrar a utilidade do domínio das soluções tecnológicas e do desenvolvimento das soft skills para a inovação nos serviços jurídicos. É sabido que a rapidez com que as modificações acontecem, somada ao seus impactos sistêmicos, impossibilitam que o Direito positivado caminhe no mesmo ritmo. Some-se a esta realidade a dinamicidade atual das interações na vida em sociedade e a conclusão percebida refletirá na necessidade de respostas jurídicas personalizadas a cada caso concreto, elaboradas com legitimidade e conforme a ética da situação6. Para tanto, nossa atual lei já está pronta: “[…] a nova Lei Civil se distingue da anterior pela frequente referência de seus dispositivos aos princípios de equidade, de boa-fé, de equilíbrio contratual, de correção (correttezza), de lealdade, de respeito aos usos e costumes do lugar das convenções, de interpretação da vontade tal como é consubstanciada, etc, etc, sempre levando em conta a ética da situação, sob cuja luz a igualdade deixa de 1 Advogada com formação em Negociação em Harvard e LLM em International Commercial Law and Dispute Resolution pela Swiss International Law School. Consultora em Negociação, Soft Skills e Autogestão para Advogados/as. Fundadora do Grupo de Estudos Direito e Inovação ESA-OAB/RS. Co-fundadora do Meeting de Negociação. Mediadora credenciada pelo ADR/ODR International. Contatos em camile.costa@gmail.com e @camilecostaconsultoria. 2 Para mais informações sobre o impacto desta era em nossa realidade, vide: A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura. Manuel Castells. Editora Fundação Calouste Gulbenkian. 2002. 3 Para maior aprofundamento acerca do advento e consequências da sociedade do conhecimento, vide: Sociedade Pós-Capitalista. Peter Drucker. Editora Pioneira.1993. 4 A Quarta Revolução Industrial. Klaus Schwab. Tradução: Daniel Moreira Miranda. Editora Edipro. 2016. 5 https://ab2l.org.br/radar-dinamico-lawtechs-e-legaltechs/ 6 O Novo Código Civil Brasileiro: em Busca da "Ética da Situação". Judith Hofmeister Martins-Costa. 2001. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/ppgdir/article/download/49214/30844. Acesso em 05/09/2021. https://ab2l.org.br/radar-dinamico-lawtechs-e-legaltechs/ https://seer.ufrgs.br/index.php/ppgdir/article/download/49214/30844 4 ser vista in abstrato, para se concretizar em uma relação de proporcionalidade.” 7 (grifos nossos) Miguel Reale, redator do Código Civil de 20028. Ao exigir respostas jurídicas personalizadas, a realidade atual desafia o status quo jurídico e estimula o desenvolvimento constante de novas habilidades em seus operadores9, as quais, somadas ao conhecimento do Direito, possibilitam o desenho de soluções jurídicas mais eficazes, que de fato satisfaçam os interesses dos envolvidos e, não apenas resolvam problemas e impasses, mas os previnam10. “Operar no modo "fast forward" significa antecipar o problema. Ao lidar com seus clientes, o advogado ou advogada deixa de ser o objeto reativo dos eventos e passa a ser o planejador ativo dos cenários".11 Um ponto chave a ser levado em conta neste processo de personalização está no fato de que a efetividade das soluções jurídicas está diretamente relacionada à percepção dos destinatários dessas soluções: os clientes. A partir desta constatação, fica evidente a necessidade, e o atual desenvolvimento, de uma advocacia que cada vez mais entende a sua relevância no cenário atual de mudanças ágeis e exponenciais e, assim, busca maior 7 Prefácio do livro Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. Judith Martins Costa, Gerson Luiz Carlos Branco. São Paulo, Ed. Saraiva, 2002. 8 Nas palavras de Miguel Reale, em seu discurso na cerimônia de sanção do Código Civil de 2002: “Desde o pórtico dos Direitos da personalidade – inexistente no Código de 1916 – até as normas estabelecidas em razão da função social da propriedade e do contrato; desde a maioridade aos dezoito anos até a revisibilidade do regime de bens no casamento; desde a extinção do “pátrio poder”, substituído pelo “poder familiar”, até os dispositivos que salvaguardam o real interesse da prole; desde as novas figuras criadas no campo do Direito das Obrigações até a disciplina da atividade empresarial; desde a preferência dada às “cláusulas abertas”, propiciadoras de ampla compreensão hermenêutica e de maior interferência do juiz na solução dos conflitos, até as novas regras sobre responsabilidade objetiva; desde a constante remissão aos princípios de equidade e de boa-fé até o tratamento da posse de bens imóveis em razão do valor do trabalho que a motiva; desde a eliminação de formalidades absurdas na lavratura dos testamentos até a preservação dos direitos dos herdeiros, do cônjuge inclusive, é toda uma nova atmosfera normativa que surge no mundo do Direito, com paradigmas de renovado humanismo existencial.” disponível em http://miguelreale.com.br/. Acesso em 05/09/2021. 9 Para maior detalhamento acerca das habilidades necessárias para uma advocacia contemporânea, especialmente no tocante ao desenvolvimento das dimensões do advogado e advogada como designer (que cria condições preventivas e atua nos contextos em que os problemas surgem) e resolutor de problemas, veja: Preventive Law and Creative Problem Solving: Multi-dimensional Lawyering,Thomas D. Barton and James M. Cooper. 2001. Disponível em http://restorativejustice.org/rj-library/preventive-law-and-creative-problem- solving-multi-dimensional-lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs. Acesso em 05/09/2021. 10 Para aprofundamentos acerca de ferramentas úteis para a identificação prévia de potenciais problemas e conflitos, que permitem a atuação em sua causa, de forma a prevenir que ocorram, veja o completo e esclarecedor estudo da evolução do Direito e consequentemente da advocacia em: Preventive Law and Problem Solving: Lawyering for the Future. Thomas D. Barton. Editora Vandeplas Pub. 2009. 11 Tradução livre de: "Operating in the Fast Forward mode means that the lawyer anticipates the problem. In dealing with individual clients, the lawyer moves from being the reactive object of events, to becoming the planful shaper of environments".Preventive Law and Creative Problem Solving: Multi-dimensional Lawyering, Thomas D. Barton and James M. Cooper. 2001. Disponível em http://restorativejustice.org/rj- library/preventive-law-and-creative-problem-solving-multi-dimensional- lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs. Acesso em 05/09/2021. http://miguelreale.com.br/ http://restorativejustice.org/rj-library/preventive-law-and-creative-problem-solving-multi-dimensional-lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs http://restorativejustice.org/rj-library/preventive-law-and-creative-problem-solving-multi-dimensional-lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs http://restorativejustice.org/rj-library/preventive-law-and-creative-problem-solving-multi-dimensional-lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs http://restorativejustice.org/rj-library/preventive-law-and-creative-problem-solving-multi-dimensional-lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs http://restorativejustice.org/rj-library/preventive-law-and-creative-problem-solving-multi-dimensional-lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs 5 entendimento e conexão com os reais interesses dos clientes, de forma a elaborar soluções jurídicas personalizadas e eficazes. É neste contexto que percebemos o advento de uma “advocacia multiportas”, que conhece as possíveis formas e métodos de resolução de disputas (judiciário, arbitragem, mediação, conciliação, negociação, dispute boards, expert assessor, desenho de sistemas de disputas, minitrials…) e auxilia seu cliente a optar pela forma ou método mais adequado para a solução da disputa em questão12. É também neste cenário que vemos o advento de startups com soluções tecnológicas em análise de dados jurídicos (legal analytics, jurimetria, volumetria), que permitem o aprimoramento do diagnóstico da situação e da análise das possibilidades de solução (levando-se em conta o investimento de tempo, custo, riscos, chances de êxito), consequentemente aumentando a assertividade na elaboração das opções e caminhos que comporão a estratégia jurídica a ser apresentada ao cliente. Como consequência do advento da consciência acerca das opções existentes em métodos de resolução de disputas, juntamente às soluções tecnológicas em legal analytics, torna-se necessário o aprimoramento de habilidades para além da lei, isto é, para além das chamadas hard skills jurídicas (conhecer o Direito). Tais habilidades consistirão justamente naquelas que permitirão maior entendimento dos reais interesses do cliente e maior assertividade na elaboração, comunicação e condução das soluções jurídicas personalizadas ao caso concreto, podendo ser chamadas de habilidades humanas ou soft skills. Assim, as soft skills entram mais do que nunca como uma necessidade latente para a advocacia, pois, uma vez constituídas pelas habilidades de comunicação efetiva, pensamento estratégico, análise e visão sistêmicas, flexibilidade mental, equilíbrio emocional, colaboração, negociação, criatividade e disposição para o aprendizado contínuo (life long learning), mais do que "buscar direitos", elas auxiliarão os advogados e advogadas a buscar soluções realmente efetivas, a partir da ótica dos próprios envolvidos. Assim, somadas ao conhecimento jurídico e às tecnologias disponíveis, as habilidades humanas permitem à advocacia o desenho de soluções jurídicas legítimas, seguras e eficazes, pois possibilitam unir a segurança jurídica às reais necessidades e interesses dos destinatários de seus serviços. Em vista do exposto, percebe-se a alta relevância de cada vez mais proporcionar aos operadores do Direito ambientes que estimulem o entendimento do cenário atual de estímulo 12 Para maior aprofundamento em sistemáticas e ferramentas de análise de cenários para definição do método de resolução de conflitos mais adequado ao caso concreto, veja: Frank E.A. Sander & Stephen B. Goldberg, Fitting the Forum to the Fuss: a User-Friendly Guide to Selecting an ADR Procedure. Negotiation Journal vol.10. Program on Negotiation - Harvard Law School. 1994. 6 à inovação e fomentem a utilização da tecnologia disponível e o aprimoramento das referidas soft skills. Neste sentido, a abertura ao aprendizado e à identificação de sua utilidade passa a ser algo evidente, importando saber o que buscar e por onde começar. A este respeito, destaca-se a importância da habilidade de “aprender a aprender” e, neste ponto, o autor Peter Drucker ressalta que o aprendizado contínuo que consentirá à realização será aquele que estimular a se “fazer excepcionalmente bem aquilo em que já se é bom”13, focando, portanto, em potencializar os pontos fortes, isto é, as habilidades e virtudes que já se possui. Esta é a boa notícia para a finalização do presente artigo, na medida em que as habilidades humanas, pelo seu próprio nome, já estão em cada um de nós. Assim, seguindo a orientação do aprender a aprender, estimula-se focar na potencialização das habilidades que já se possui, seja em termos de aprimoramento pessoal, seja quando na liderança e orientação de equipes em escritórios e departamentos jurídicos. Desta forma, as potencialidades de cada um poderão ser consideradas na organização das atividades entre os membros de uma mesma equipe jurídica, tal como realizado cada vez mais em empresas geridas pelo paradigma das novas economias, orientadas pela abundância e pelas metodologias ágeis, onde o colaborador é visto, antes de tudo, como ser humano capaz e as equipes são organizadas combinando-se as necessidades de cada projeto com as habilidades de cada membro14. Desta maneira, o aprimoramento constante das próprias soft skills, o aumento da familiaridade e utilização das soluções tecnológicas disponíveis, e a organização de equipes com base nas potencialidades de cada indivíduo, permitirá que a inovação nos serviços jurídicos aconteça de forma consistente, aumentando a efetividade e a personalização das soluções jurídicas para cada caso. 13 Sociedade Pós-Capitalista. Peter Drucker. Editora Pioneira. 1993. pg. 157. 14 Para maior aprofundamento acerca das práticas de gestão centradas em reconhecer e potencializar as habilidades dos membros da organização, veja: Reinventando as organizações. Frederic Laloux. Editora Voo. 2019. 7 REFERÊNCIAS CASTELLS, Manuel. A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura. Lisboa: Editora Fundação Calouste Gulbenkian. 2002. SCHWAB, Klaus. A Quarta Revolução Industrial. Tradução: Daniel Moreira Miranda. Editora Edipro. 2016. Fitting the Forum to the Fuss: a User-Friendly Guide to Selecting an ADR Procedure. Frank E.A. Sander & Stephen B. Goldberg, Negotiation Journal vol.10. Program on Negotiation - Harvard Law School. 1994. MARTINS-COSTA, Judith Hofmeister; BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2002. MARTINS-COSTA, Judith Hofmeister. O Novo Código Civil Brasileiro: em Busca da "Éticada Situação". 2001. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/ppgdir/article/download/49214/30844. Acesso em 05/09/2021. BARTON, Thomas D.; COOPER, James M.. Preventive Law and Creative Problem Solving: Multi-dimensional Lawyering.. 2001. Disponível em <http://restorativejustice.org/rj-library/preventive-law-and-creative-problem-solving-multi- dimensional-lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs> Acesso em 05/09/2021. BARTON, Thomas D. Preventive Law and Problem Solving: Lawyering for the Future. Editora Vandeplas Pub. 2009. LALOUX, Frederic. Reinventando as organizações. Belo Horizonte: Voo. 2019. DRUCKER, Peter. Sociedade Pós-Capitalista. São Paulo: Pioneira. 1993. https://seer.ufrgs.br/index.php/ppgdir/article/download/49214/30844.%20Acesso%20em%2005/09/2021 https://seer.ufrgs.br/index.php/ppgdir/article/download/49214/30844.%20Acesso%20em%2005/09/2021 http://restorativejustice.org/rj-library/preventive-law-and-creative-problem-solving-multi-dimensional-lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs http://restorativejustice.org/rj-library/preventive-law-and-creative-problem-solving-multi-dimensional-lawyering/1796/#sthash.ov8K4SLA.dpbs 8 METODOLOGIAS ÁGEIS EM ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA Vitória Tavares Della Valentina15 RESUMO: O desenvolvimento tecnológico e a constante inovação nas mais diversas áreas, inclusive na jurídica, culminaram em uma mudança no mercado de trabalho. Dessa forma, foram elaboradas metodologias, denominadas ágeis, caracterizadas pela entrega incremental de resultados com valor agregado, equipes auto-organizáveis e flexibilidade para mudanças. Nesse sentido, o objetivo da presente pesquisa é avaliar a aplicabilidade dessas metodologias ágeis, nomeadamente, o Scrum e o kanban, nos escritórios de advocacia, a fim de averiguar se elas são adaptáveis e adequadas para melhores resultados e efetividade no cumprimento das tarefas inerentes à rotina dos advogados e das equipes jurídicas. Assim sendo, a partir do método de abordagem hipotético-dedutivo, por meio da técnica qualitativa, com objetivo exploratório e procedimento bibliográfico, com base na doutrina nacional e estrangeira, conclui-se que há aplicabilidade dos métodos ágeis nos escritórios de advocacia e sua implementação, em razão das características ágeis, se mostra adequada à melhora da produtividade. Palavras-chave: Metodologias Ágeis; Scrum; Kanban; Gestão de Escritórios de Advocacia. ABSTRACT Technological development and constant innovation in the most diverse areas, including legal, culminated in a change in the labor market. In this way, methodologies called agile were developed, characterized by the incremental delivery of results with added value, self-organizing teams and flexibility for changes. In this sense, the objective of this research is to evaluate the applicability of these agile methodologies, namely Scrum and kanban, in law firms, in order to ascertain whether they are adaptable and adequate for better results and effectiveness in fulfilling the tasks inherent to the routine of lawyers and legal teams. Therefore, from the hypothetical-deductive approach method, through qualitative technique, with an exploratory objective and bibliographic procedure, based on national and foreign doctrine, it is concluded that there is applicability of agile methods in law firms and their implementation, due to its agile characteristics, it is adequate to improve productivity. Keywords: Agile Methodology; Scrum; Kanban; Law Firm Management. 1. INTRODUÇÃO A execução de projetos e de tarefas é atividade essencial em toda sociedade, empresarial ou de pessoas, para seu crescimento e desenvolvimento. Usualmente, utiliza-se a metodologia tradicional, baseada no modelo cascata, que tem como linha-guia a hierarquia entre os participantes do projeto e a linearidade de entrega, de modo que, somente quando o produto passar por todas as fases da produção, ele será entregue. 15 Advogada. Mestranda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 9 Todavia, com o desenvolvimento da tecnologia e da chamada Indústria 4.0, observou-se a necessidade de implementação de novos métodos, a fim de aumentar a entregabilidade dos produtos em menor tempo e ainda possibilitar a correção de erros de maneira mais dinâmica e assertiva. Nesse cenário, foram desenvolvidas novas metodologias, denominadas ágeis, que se baseiam na flexibilidade do projeto e sua execução, bem como na autonomia das equipes e priorização de tarefas. Tais avanços tecnológicos também atingiram a área do Direito, com destaque para a atuação digital dos profissionais dessa área, como em caso de audiências telepresenciais, consultorias virtuais e mesmo trabalho integralmente remoto, mudanças essas que alteram a dinâmica na atuação dos advogados, tanto em relação aos seus clientes, quanto em relação ao Poder Judiciário. Nesse sentido, se faz essencial avaliar a atuação dos advogados e das equipes jurídicas para lidarem com as novas demandas nesse cenário inovador e implementarem novas habilidades essenciais à sobrevivência do empreendimento na mudança do mercado de trabalho. Em razão disso, verifica-se que o método tradicional de gerenciamento de projetos pode estar defasado frente às mudanças ocorridas nos últimos anos, motivo pelo qual a presente pesquisa se propõe a estudar as metodologias ágeis, nomeadamente o Scrum e o Kanban, e sua aplicabilidade nos escritórios de advocacia, a fim de averiguar se as essas metodologias são adequadas para melhorar os resultados e trazer efetividade no cumprimento das tarefas inerentes à rotina dos advogados e das equipes jurídicas. Para tanto, a presente pesquisa parte da hipótese de que os métodos ágeis são adaptáveis aos escritórios, em razão de sua ampla flexibilidade para implementação, sendo aptos a trazer maior celeridade na resolução das demandas internas do empreendimento. Dessa forma, a presente pesquisa possui natureza qualitativa e tem como base o método hipotético-dedutivo, com objetivo exploratório e procedimento bibliográfico, por meio de revisão de bibliografia nacional e internacional sobre o tema, e apresenta os métodos ágeis, suas diferenças em relação ao método tradicional, e então sua aplicabilidade nos escritórios de advocacia, para, por fim, tecer considerações finais sobre o tema. 10 2. OS MÉTODOS ÁGEIS: SCRUM E KANBAN Os métodos ágeis propõem o desenvolvimento incremental do produto, em que há novas versões disponibilizadas para testes e evoluções16 a cada fase. Esses passaram a ser desenvolvidos em razão da insatisfação com os modelos de projetos de desenvolvimento de softwares da década de 90, de modo que um grupo de desenvolvedores, no ano de 2001, se reuniu e publicou o “Manifesto Ágil”17. O Manifesto Ágil apresenta quatro objetivos - indivíduos e interações, software em funcionamento, colaboração com o cliente e responder a mudanças - e doze princípios dos métodos ágeis18. A partir de então, as metodologias ágeis foram disseminadas, tanto para projetos de desenvolvimento de softwares, quanto para outras áreas, pois “suas ferramentas, seus métodos e, principalmente, seus valores e princípios auxiliam em uma gama muito maior de projetos”19. Nesse cenário, esses métodos têm sido cada vez mais adotados para o gerenciamento de projetos que exigem flexibilidade e velocidade20. As metodologias ágeis inserem flexibilidade no desenvolvimento dos projetos e, por consequência, possibilitam que as equipes trabalhem com maior eficiência21, visto que estabelecem um processo incremental, além de funcionar como forma de monitorar o andamento dos projetos, suas atividades e melhor definição dos responsáveis e prazos22. Há diversas abordagens ágeis, como o Extreme Programming(XP), o Desenvolvimento Adaptativo de Software (DAS), o Método Dinâmico de Sistemas (Dynamic System Development Method - DDSDM), Crystal, Modelagem Ágil (Agile 16 SOMMERVILLE, Ian. Engenharia de Software. 9. ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2011, p. 39 17 FONTES, Marcelo Henrique Ferreira. Implantação de metodologia ágil de projetos com uso de Scrum e Kanban na produção de conteúdos educacionais. 2020. 71 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Administração do Desenvolvimento de Negócios) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2020, p. 36. 18 BECK, K. et al. Manifesto para Desenvolvimento Ágil de Software. 2001. Disponível em <http://agilemanifesto.org/iso/ptbr/manifesto.html>. Acesso em 20 fev. 2021. 19 FONTES, Marcelo Henrique Ferreira. Implantação de metodologia ágil de projetos com uso de Scrum e Kanban na produção de conteúdos educacionais. 2020. 71 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Administração do Desenvolvimento de Negócios) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2020, p. 37. 20 Ibidem, p. 31. 21 MARUPING, Likoebe M; VENKATESH, Viswanath; AGARWAL, Ritu. A Control Theory Perspective on Agile Methodology Use and Changing User Requirements. Information Systems Research, v. 20, n. 3, p. 377-399, 2009, p. 378. 22 FELIPE, Danilo Almeida; PINHEIRO, Tânia Saraiva de Melo. Seleção de tecnologias digitais para a gerência de projetos em disciplinas de projeto integrado. #Tear: Revista de Educação, Ciência e Tecnologia , v. 7, n. 1, 2018, p. 7. 11 Modeling), Scrum e Kanban. A presente pesquisa delimitar-se-á à análise das metodologias Scrum e Kanban, por se tratarem das metodologias mais utilizadas23. O Scrum é um framework que possibilita a entrega dos produtos de forma produtiva e criativa por meio de processos adaptativos complexos24. Enquanto o Kanban possibilita a visualização do fluxo de trabalho de um projeto, sua limitação e o acompanhamento durante o processo25. Podem, inclusive, trabalhar em conjunto, o que se denomina scrumban. O Scrum surgiu no ano de 1995 e é conceituado por seus criadores como “um framework dentro do qual pessoas podem tratar e resolver problemas complexos e adaptativos, enquanto produtiva e criativamente entregam produtos com o mais alto valor possível”26. É um processo empírico, baseado em três pilares - transparência, inspeção e adaptação - com abordagem iterativa e incremental que visa a melhoria no controle de riscos do processo de produção27. Esse método tem como base o Time Scrum, que é composto pelo Scrum Master, responsável por ajudar os participantes a entenderem os valores da metodologia e garantir a adoção das práticas e regras; o Product Owner, pessoa responsável pelo gerenciamento das tarefas e pela priorização das entregas para alcançar melhores resultados; e, por fim, a equipe, composta pelos desenvolvedores das atividades28. A metodologia inclui uma série de etapas curtas, chamadas de sprints. Nessas etapas, o product owner define os itens que compõem o produto, gerando uma lista dos requisitos já identificados29- o backlog do produto - e o time de desenvolvimento fica responsável por executar da melhor forma possível o trabalho e entregar os itens de cada sprint, adicionando valor ao produto. 23 DIGITAL. AI. 14th Annual State of Agile Report. 2020. Disponível em < https://stateofagile.com/>. Acesso em 20 fev. 2021. 24 SCHWABER, Ken; SUTHERLAND, Jeff. Guia do Scrum. 2017. Disponível em <https://www.scrumguides.org/docs/scrumguide/v2017/2017-Scrum-Guide-Portuguese-Brazilian.pdf>. Acesso em 20 fev. 2021. 25 FONTES, Marcelo Henrique Ferreira. Implantação de metodologia ágil de projetos com uso de Scrum e Kanban na produção de conteúdos educacionais. 2020. 71 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Administração do Desenvolvimento de Negócios) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2020, p. 13. 26 SCHWABER, Ken; SUTHERLAND, Jeff. Guia do Scrum. 2017, p. 3. Disponível em <https://www.scrumguides.org/docs/scrumguide/v2017/2017-Scrum-Guide-Portuguese-Brazilian.pdf>. Acesso em 20 fev. 2021. 27 Ibidem, p. 4. 28 Ibidem, p. 6. 29 FELIPE, Danilo Almeida; PINHEIRO, Tânia Saraiva de Melo. Seleção de tecnologias digitais para a gerência de projetos em disciplinas de projeto integrado. #Tear: Revista de Educação, Ciência e Tecnologia, v. 7, n. 1, 2018, p. 7. 12 No início de cada sprint há uma reunião de planejamento (Sprint Planning Meeting), momento no qual se dá início ao projeto. Nessa reunião, com toda a equipe, há análise dos objetivos de produção, volume de trabalho e ferramentas necessárias para alcançar o resultado30, que norteará o desenvolvimento do produto. Há reuniões diárias de quinze minutos, o daily scrum, para definição de prioridades, de acordo com a execução das tarefas, garantindo um processo mais eficiente e focado na finalização do trabalho31. Essas reuniões permitem a identificação de possíveis desvios na produção, bem como eliminar e/ou minimizar retrabalhos causados pelo método tradicional de produção32. No final do sprint, há a reunião de revisão, na qual se avalia o produto final, sendo apresentado o valor agregado, e a reunião de retrospectiva, na qual são observados os pontos fortes e sugeridas melhorias para os próximos sprints33. Nesse sentido, essa metodologia propõe a otimização do tempo utilizado no planejamento e na produção do produto por meio da criação de regularidade no processo, e minimizando a necessidade e o tempo gasto em reuniões fora da estrutura do método, possibilitando, também, maior transparência34. Em revisão sistemática acerca da metodologia Scrum, Pedron e Oliveira (2021), averiguaram que o método “em ambientes de projetos foi apontado como um facilitador do sucesso no gerenciamento de projetos, com sua ênfase na comunicação, aumento de produtividade, eficiência e eficácia”35. O método Kanban tem origem japonesa, decorrente do Sistema Toyota de Produção de automóveis, sendo implementado para a gestão de estoque e produção visando maior 30 FONTES, Marcelo Henrique Ferreira. Implantação de metodologia ágil de projetos com uso de Scrum e Kanban na produção de conteúdos educacionais. 2020. 71 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Administração do Desenvolvimento de Negócios) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2020, p. 44. 31 SCHWABER, Ken; SUTHERLAND, Jeff. Guia do Scrum. 2017, p. 12. Disponível em <https://www.scrumguides.org/docs/scrumguide/v2017/2017-Scrum-Guide-Portuguese-Brazilian.pdf>. Acesso em 20 fev. 2021. 32 FONTES, Marcelo Henrique Ferreira. Implantação de metodologia ágil de projetos com uso de Scrum e Kanban na produção de conteúdos educacionais. 2020. 71 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Administração do Desenvolvimento de Negócios) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2020, p. 45. 33 SCHWABER, Ken; SUTHERLAND, Jeff. Guia do Scrum. 2017, p. 13. Disponível em <https://www.scrumguides.org/docs/scrumguide/v2017/2017-Scrum-Guide-Portuguese-Brazilian.pdf>. Acesso em 20 fev. 2021. 34 Ibidem, p. 7. 35 OLIVEIRA, Ricardo Lair Franco; PEDRON, Cristiane Drebes. Métodos Ágeis: Uma Revisão Sistemática sobre Benefícios e Limitações. Brazilian Journal of Development. v. 7. n. 1, p. 4520 - 4535, 2021, p. 4527. 13 assertividade no chamado pull system, no qual o ritmo da produção é ditado pela demanda, sem a acumulação de estoque36. O kanban é uma ferramenta bastante visual e adaptável, sendo composta de um cartão com as informações necessárias de produção e entrega, de modo que, quando a demanda é concluída, os cartões são realocados no quadro, conforme seu estado, entre “a fazer”, “fazendo” e “feito”. Assim, o método é adaptadopara situações de gerenciamento de projetos, em que os cartões remetem a cada atividade que deve ser realizada visando o cumprimento da data e qualidade de entrega, sendo cada atividade adicionada em uma coluna de acordo com seu andamento37. Dessa forma, essa metodologia permite o acompanhamento do fluxo de trabalho e facilita a visualização de possíveis obstáculos na produção38, cabendo à equipe estar atenta ao processo de atualização do fluxo de trabalho para a condução dos processos. Assim, está assentada sobre três pilares essenciais, quais sejam, a visualização do fluxo do trabalho, a limitação desse fluxo e seu acompanhamento e gerenciamento durante o processo39. A visualização do fluxo de trabalho deve se limitar ao fluxo que ocorre na realidade, não ao que é virtualmente definido pela organização, pois diversas equipes definem seus próprios processos internos, divergindo do modelo determinado pela organização. Já a limitação do fluxo de trabalho torna necessário que estejam explícitos os itens de trabalho que compõem cada fase do processo, sendo um dos pontos-chave do método, pois é o responsável por tornar o kanban um sistema puxado (pull system), no qual a capacidade de produção é definida pela demanda40. Por fim, o acompanhamento e gerenciamento do fluxo de trabalho tem o objetivo de tornar evidentes os problemas, indicando adaptações e propondo formas de evitá-los ou resolvê-los. Para sua efetividade, é necessário uma política sólida de garantia de qualidade e acompanhamento contínuo da cadência de produção - ou elaboração das atividades - associada com um fluxo otimizado visando a produtividade41. 36 MONDEN, Yasuhiro. Sistema Toyota de Produção. Porto Alegre: Grupo A, 2015, p. 9. 37 MONDEN, Yasuhiro. Sistema Toyota de Produção. Porto Alegre: Grupo A, 2015, p. 274. 38 FONTES, Marcelo Henrique Ferreira. Implantação de metodologia ágil de projetos com uso de Scrum e Kanban na produção de conteúdos educacionais. 2020. 71 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Administração do Desenvolvimento de Negócios) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2020, p. 47. 39BOEG, Jesper. Kanban em 10 passos. C4Media, 2010, p. 5. Disponível em: http://www.gianfratti.com/WP/wp-content/uploads/2018/04/InfoQBrasil-Kanban10Passos.pdf. Acesso em: 06 Mar 2021. 40 Ibidem. 41 Ibidem. http://www.gianfratti.com/WP/wp-content/uploads/2018/04/InfoQBrasil-Kanban10Passos.pdf 14 Diferentemente da metodologia Scrum, que possui reuniões constantes de acompanhamento, o kanban se baseia na disseminação da metodologia, onde todos os que participam do processo de produção conhecem a utilização da ferramenta e suas proposições42. Nessa metodologia não há a diferenciação entre papéis a serem desempenhados na equipe, como no método Scrum, tendo em vista que não há nenhum papel obrigatório entre os membros, e sim uma igualdade de importância, onde todos podem colaborar para uma melhoria do desenvolvimento do projeto43. Ambas metodologias aqui apresentadas possuem evidências de impactos positivos nas equipes ágeis, seja pela redução significativa no tempo despendido nas atividades em conjunto com a redução das despesas44, quanto em relação ao melhor alinhamento com prioridades e objetivos organizacionais45. 3. DIFERENÇAS ENTRE AS ABORDAGENS TRADICIONAL E ÁGIL O modelo de Gestão Tradicional de Projetos (GTP) se trata de processo linear e prescritivo, baseado em um modelo hierárquico. Nesse cenário, a metodologia mais comum é o modelo de cascata46, no qual cada fase se inicia após o término da anterior47. As fases do modelo de cascata são apresentadas por Franco e envolvem a avaliação dos requisitos do projeto, a análise e a estruturação do cronograma para execução, com base no fluxo de dados e no orçamento48. A partir dessa estrutura, pensa-se no projeto mais detalhadamente, para então ter início sua execução, que, quando encerrada, o projeto será testado e entregue49. 42 MONDEN, Yasuhiro. Sistema Toyota de Produção. Porto Alegre: Grupo A, 2015. 43 Ibidem. 44 AZANHA, Adrialdo, Argoud, Ana Rita Tiradentes Terra; CAMARGO JÚNIOR, João Batista de; ANTONIOLLI, Pedro Domingos (2017). Agile project management with Scrum: A case study of a Brazilian pharmaceutical company IT project. International Journal of Managing Projects in Business, v. 10. n. 1, p. 121–142, 2017, p. 138. 45 IAMANDI, Oana; POPESCU, Sorin; DRAGOMIR, Mihai; MORARIU, Cristina. A critical analysis of project management models and its potential risks in software development. Quality Management. v. 16. n. 149, p. 55-61, 2015, p. 60. 46OLIVEIRA, Alex Miranda. Desenvolvimento de uma Metodologia de Gestão de Projetos Baseada num Modelo Híbrido. 2020. 111f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) - Instituto Superior de Engenharia do Porto, Porto, 2020, p. 33. 47 Ibidem, p. 34. 48FRANCO, Eduardo Ferreira. Um modelo de gerenciamento de projetos baseado nas metodologias ágeis de desenvolvimento de software e nos princípios da produção enxuta. 2007. fl. 113. Dissertação (Mestrado em Sistemas Digitais) - Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007, p. 12. 49 Ibidem p. 13 15 Nesse sentido, a partir de uma revisão bibliográfica sobre os métodos tradicionais e ágeis, Eder et al.50 apontam seis principais diferenças entre a abordagem tradicional e a ágil, quais sejam, a forma de elaboração do plano do projeto, a forma como se descreve o escopo do projeto, o nível de detalhe e padronização com que cada atividade do projeto é definida, o horizonte de planejamento das atividades da equipe de projeto, a estratégia utilizada para o controle do tempo do projeto e, por fim, a estratégia utilizada para a garantia do atingimento do escopo do projeto. A forma de elaboração do plano do projeto no gerenciamento tradicional se dá por meio do planejamento integral do projeto, com grande nível de detalhamento, o que ocasiona, por vezes, a necessidade de ser refeito em caso de erro. Por outro lado, nos métodos ágeis, os projetos são idealizados com menor grau de detalhe, sendo entregues aos clientes durante o processo, de maneira sucessiva, o que permite a flexibilidade e reformulação do processo de maneira dinâmica51. Assim, a diferença na elaboração do projeto impacta diretamente na forma como se descreve o escopo do projeto, sendo apresentada uma visão mais abrangente nos projetos gerenciados pelas metodologias ágeis, orientada para a resolução de problemas e usualmente com recursos visuais, enquanto nos projetos executados por meio de gerenciamento em cascata, o escopo do projeto é definido de maneira quase definitiva, em que há descrição minuciosa do produto final52. Diante disso, Oliveira apresenta que “o modelo cascata é indicado para projetos em que o modelo de negócios está bem definido, os requisitos são claros e o tempo de duração do projeto é curto”53, isso porque, no gerenciamento tradicional, a fase de testes é separada da construção do produto, enquanto no modelo ágil, o teste é concluído durante a construção do produto54. A terceira diferença entre as metodologias ágeis e a tradicional é a forma como são definidas as atividades, isso porque, no gerenciamento ágil as equipes se organizam por meio 50 EDER, Samuel et al. Diferenciando as Abordagens Tradicional e Ágil de Gerenciamento de Projetos. Production, São Paulo , v. 25, n. 3, p. 482-497, jul./set. 2015, p. 490. 51 EDER, Samuel et al. Diferenciando as Abordagens Tradicional e Ágil de Gerenciamento de Projetos. Production, São Paulo, v. 25, n. 3, p. 482-497, jul./set. 2015, p. 493. 52 Ibidem. 53 OLIVEIRA, Alex Miranda. Desenvolvimento de uma Metodologia de Gestão de Projetos Baseada num ModeloHíbrido. 2020. 111f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) - Instituto Superior de Engenharia do Porto, Porto, 2020, p. 36. 54 Ibidem, p. 38. 16 de uma lista de atividades e tarefas, sem rigor de planejamento. Por outro lado, no gerenciamento tradicional, as tarefas são organizadas de forma hierárquica e sequencial55. A quarta diferença consiste no tempo de elaboração do cronograma de produção, visto que no gerenciamento tradicional, há a consideração do projeto como um todo, por vezes sem a participação do cliente ou da equipe de desenvolvimento, enquanto nas metodologias ágeis, o plano é estruturado por partes, em pequenos espaços de tempo, a partir da interação entre os membros da equipe e os clientes56. A quinta diferença se refere ao tempo do projeto e as mudanças ocorridas, pois, enquanto no método tradicional o objetivo é seguir o plano do projeto, com atenção aos relatórios de acompanhamento, avaliando seu progresso por meio de indicadores de tempo, custo e percentual de execução do projeto, nos métodos ágeis as mudanças necessárias são identificadas por meio de controle visual e reuniões diárias, sendo o progresso avaliado por meio de resultados tangíveis57. Por fim, as metodologias ágeis e tradicional, se diferenciam em relação ao controle do escopo do processo. Nos métodos ágeis, a verificação do progresso do projeto se dá por meio de prioridades apontadas pelo cliente e é registrada informalmente nas reuniões diárias. Já na gestão tradicional, o cliente não define as prioridades do projeto, ele recebe as informações por meio da empresa de desenvolvimento58. Dessa forma, Oliveira (2020) aponta como uma das desvantagens do modelo de cascata a impossibilidade de mudanças de requisitos, visto que esse é o primeiro passo do modelo, havendo alteração nos requisitos, seria necessária a reestruturação de todo o projeto. O que implica também em apontar que uma das desvantagens é seu processo sequencial, no qual apenas há início de uma fase quando a anterior for finalizada59. Por fim, o autor aponta que um erro simples pode acarretar em elevados custos, visto que só é identificável ao final do processo, quando da entrega do produto ao cliente. Nesse contexto de aversão à mudança e pouca flexibilidade, surgiram os métodos ágeis, focando na entrega ao cliente e no incremento do produto por fases, com base em transparência, alta flexibilidade e equipes auto-organizadas. Assim sendo, investiga-se sua 55 EDER, Samuel et al . Diferenciando as Abordagens Tradicional e Ágil de Gerenciamento de Projetos. Production, São Paulo , v. 25, n. 3, p. 482-497, jul./set. 2015, p. 493. 56 Ibidem, p. 494. 57 Ibidem, p. 494. 58 Ibidem, p. 494. 59 OLIVEIRA, Alex Miranda. Desenvolvimento de uma Metodologia de Gestão de Projetos Baseada num Modelo Híbrido. 2020. 111f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) - Instituto Superior de Engenharia do Porto, Porto, 2020, p. 36. 17 aplicabilidade aos escritórios de advocacia e possíveis benefícios decorrentes dessa implementação. 4. APLICAÇÃO DOS MÉTODOS ÁGEIS EM ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA Em decorrência do avanço tecnológico e da Indústria 4.0, há uma mudança nos modelos de processos de produção e de negócios, exigindo um novo nível de desenvolvimento e gestão para as sociedades, empresariais ou de pessoas60. A Inteligência Artificial já é realidade em diversos setores e ganha cada vez mais espaço, sendo utilizada na esfera jurídica para pesquisas legais, gerenciamento de documentos, análises preditivas, contratos, entre outras atividades61, que há poucos anos eram exercidas por profissionais jurídicos. Assim, as tarefas e responsabilidades dos advogados estão sendo alteradas e adaptadas de acordo com as necessidades do mercado de trabalho, dos clientes e das ferramentas disponíveis. Desse modo, verifica-se que “é necessário que os profissionais da área jurídica se reinventem, aproveitando o movimento da Revolução 4.0 com vistas a oportunizar para a sociedade um serviço jurídico de alta qualidade”62. Motivo pelo qual, a investigação acerca das metodologias aplicáveis à produção intelectual e da prestação de serviço nos escritórios de advocacia se faz essencial. A partir das características dos métodos ágeis e suas diferenças em face dos métodos tradicionais, verifica-se que os métodos tradicionais de gestão de produção dominam o mercado jurídico, sendo esse o ponto crucial para a mudança na gestão dos escritórios, a fim de desenvolver um trabalho mais eficiente, mais focados no cliente, em prazos menores e com menos custos. Nesse sentido, usualmente, o fluxo de trabalho se dá com a divisão das tarefas e prazos entre as equipes ou setores do escritório, caso existam, ou diretamente entre os advogados. Dessa forma, cada um é responsável por seus prazos e tarefas e não necessariamente há coordenação com os demais membros da equipe ou do escritório, 60 SANTOS, Beatrice Paiva; ALBERTO, Agostinho; , LIMA, Tânia Daniela Felgueiras Miranda; CHARRUA- SANTOS; Fernando Manuel Bigares. INDÚSTRIA 4.0: DESAFIOS E OPORTUNIDADES. Revista Produção e Desenvolvimento, v. 4, n. 1, p. 111-124, 2018, p. 115. 61 DAVIS, Anthony E. The Future of Law Firms (and Lawyers) in the Age of Artificial Intelligence. Revista Direito GV, v. 16, n. 1, Jan./Apr. 2020, p. 3. 62 TREVISANUTO, Tatiene Martins Coelho. A Revolução 4.0 e os Impactos na Área Jurídica. Revista JurisFIB, v. 9, n. 1, Edição Especial 20 anos FIB, p. 183 -193, fev. 2018, p. 191. 18 havendo difusão de prioridades, e por sua vez, as tarefas são desenvolvidas dentro de um prazo maior. Todavia, com o avanço tecnológico e pressão por resultados, a partir da implementação de ferramentas digitais e de outras metodologias, abre-se espaço para uma revolução no mercado jurídico, especialmente dentro dos escritórios de advocacia, a fim de mudar a forma de trabalho dos advogados. Com a adoção dos métodos ágeis, as equipes devem priorizar as metas, desempenho de tempo, custos e funcionalidade para a determinação de quanto de agilidade seria necessário63. Nesse contexto, o Scrum é adaptável de acordo com as necessidades da organização, podendo ser adotado de maneira híbrida64, em conjunto com outras metodologias, especialmente, como propõe a presente pesquisa, com o kanban. Na aplicação da metodologia ágil nos escritórios de advocacia, deve-se indicar o product owner para representar a equipe, o scrum master, como coordenador dos prazos e tarefas, e os desenvolvedores - no caso, os advogados - para executarem as tarefas. Isso porque as equipes jurídicas precisarão ser planas, e não piramidais65, de modo que a equipe será estruturada de forma auto-organizável e dotada de autonomia para priorizar tarefas e definir como elas serão executadas. Igualmente, o uso adequado do método kanban nos escritórios de advocacia colaboram com o Scrum e possibilitam o aumento de agilidade nas produções, visto que há melhora na colaboração dos envolvidos nos processos, pois todos têm acesso ao andamento de todos os prazos, abrindo espaço para discussão de teses e estratégias, bem como traz transparência ao andamento do trabalho no escritório. A transparência no andamento das rotinas dentro do escritório e da execução de tarefas é essencial à produtividade, visto que evita trabalho redobrado, com constante questionamento acerca das tarefas, bem como troca de e-mails e relatórios pormenorizados. Diante desse cenário, com o compartilhamento de todas as informações acerca das tarefas e a autonomia das equipes, desenvolve-se internamente a colaboração, o que potencializa a eficiência da entrega de resultados aos clientes, uma vez que eles podem 63LEE, Gwanhoo; XIA, Weidong. Toward Agile: An Integrated Analysis of Quantitative and Qualitative Field Data on Software Development Agility. MIS Quarterly, v. 34. n. 1, p. 87-114, 2010, p. 105. 64 IAMANDI, Oana; POPESCU, Sorin; DRAGOMIR, Mihai; MORARIU, Cristina. A critical analysis of project management models and its potential risks in software development. Quality Management. v. 16. n. 149, p. 55-61, 2015, p. 60. 65 DAVIS, Anthony E. The Future of Law Firms (and Lawyers) in the Age of Artificial Intelligence. Revista Direito GV, v. 16, n. 1, Jan./Apr. 2020, p. 7. 19 participar ativamente do processo, elencando o que é mais importante e o que de fato possui interesse de receber de forma antecipada. Unindo as metodologias ágeis apresentadas nesta pesquisa, verifica-se que o quadro do kanban será o referencial para as reuniões diárias do Scrum, debatendo-se as prioridades e identificando as interrupções do fluxo de trabalho, em conjunto com toda a equipe. Conforme Gonçalves et al., apontam, as principais competências nas equipes ágeis são “conhecimento técnico especializado, conhecimento de métodos ágeis de projetos, comunicação, saber trabalhar em equipe, capacidade de execução, flexibilidade, liderança, colaboração e proatividade”66. Nesse sentido, os métodos ágeis estão sendo utilizados como inovações de processos, agregando valor ao trabalho executado no cotidiano das equipes67. Inclusive, deve-se destacar que o uso do Trello como instrumento de gerenciamento ágil de processos, aponta evidências na melhora de apresentação de resultados na área educacional68. Desse modo, verifica-se que as características da aplicação das metodologias ágeis são hígidas a melhorar o prazo e escopo dos projetos em decorrência de “fixação de metas compatíveis, auxílio de mudanças necessárias no projeto, comprometimento da equipe e facilitação de fluxo de trabalho”, bem como aumentar o grau de satisfação do cliente e da própria equipe69. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente artigo teve como objetivo principal mostrar a relevância da aplicação dos métodos ágeis nos escritórios de advocacia, em especial os métodos Scrum e kanban, os quais podem ser utilizados para apresentar uma maior efetividade na produção e desenvolvimento de trabalhos internos, inclusive trazendo uma maior satisfação do cliente para com seus advogados e os serviços prestados. 66 GONÇALVES, Laila Cristina Couto; OLIVEIRA, Silvia Alves. Assumpção de; PACHECO, Jéssica Carvalho Amaral; SALUME, Paula Karina. Competências requeridas em equipes de projetos ágeis: um estudo de caso em uma Edtech. Revista de Gestão e Projetos. v. 11, n. 3, p. 72-93, set/dez. 2020, p. 90. 67 ALVES, Eder Junios; BAX, Marcello Peixoto; GONÇALVES, Carlos Alberto. Métodos Ágeis sob a Ótica da Informação. Inf. Inf., Londrina, v. 22, n. 3, p. 178 – 210, set./out. 2017, p. 203. 68 ISABELLA, Anderson de Ramada; SCAFUTO, Isabel Cristina. Implementação do Método Ágil com a Utilização da Plataforma Trello no Gerenciamento de Projetos Educacionais. Revista CESUMAR. v. 25, n. 1, p. 228-239, jan./jun., 2020. 69 OLIVEIRA, Ricardo Lair Franco; PEDRON, Cristiane Drebes. Métodos Ágeis: Uma Revisão Sistemática sobre Benefícios e Limitações. Brazilian Journal of Development. v. 7. n. 1, p. 4520 - 4535, 2021, p. 4531. 20 A utilização do Scrum permite melhor organização e realização das tarefas dentro do prazo estabelecido, evitando desperdício de tempo a curto prazo, dentro do sprint, com a diminuição de reuniões não essenciais, havendo maior foco direcional nas prioridades do escritório, e, inclusive, diminuindo problemas diários em relação às inúmeras diligências que necessariamente são organizadas e cumpridas. Por consequência, há economia de tempo a longo prazo e majoração na produção das peças processuais e produção de relatórios, em caso de consultorias, visto haver uma maior organização não somente de tempo, mas também no desenvolvimento do trabalho e de cada etapa até chegar no resultado final. A utilização do kanban permite melhor visualização de pendências e atividades desenvolvidas, garantindo o fluxo de informações para todos os colaboradores envolvidos nos processos, auxiliando na priorização de atividades e alocação de recursos nas etapas adequadas. Ambos os métodos, tanto o Scrum como o kanban são fundamentais para o melhor desenvolvimento do trabalho em equipe em razão de suas características essenciais. Dessa forma, entende-se que isso culmina na economia de tempo, pela organização da elaboração das tarefas e em razão do contínuo compartilhamento de informações - tanto nas reuniões diárias, quanto pela visualização das etapas da produção - isso porque, as tarefas são desenvolvidas de forma clara e objetiva para atender ao resultado final com o melhor desempenho. Portanto, tendo em vista se tratarem de metodologias flexíveis e dinâmicas, sua implementação se mostra adequada para a gestão dos escritórios de advocacia, pois permite melhor integração entre a equipe, em decorrência da visualização integral dos processos por todos, priorização de atividades intelectuais de alta relevância, o que melhora a produtividade e torna mais eficiente a entrega das tarefas, bem como melhora a prestação de serviços aos clientes. REFERÊNCIAS ALVES, Eder Junios; BAX, Marcello Peixoto; GONÇALVES, Carlos Alberto. Métodos Ágeis sob a Ótica da Informação. Inf. Inf., Londrina, v. 22, n. 3, p. 178 – 210, set./out. 2017. AZANHA, Adrialdo, Argoud, Ana Rita Tiradentes Terra; CAMARGO JÚNIOR, João Batista de; ANTONIOLLI, Pedro Domingos (2017). Agile project management with Scrum: A case study of a Brazilian pharmaceutical company IT project. International Journal of Managing Projects in Business, v. 10. n. 1, p. 121–142, 2017. 21 BECK, K. et al. Manifesto para Desenvolvimento Ágil de Software. 2001. Disponível em <http://agilemanifesto.org/iso/ptbr/manifesto.html>. Acesso em 20 fev. 2021. BOEG, Jesper. Kanban em 10 passos. C4Media, 2010. Disponível em: http://www.gianfratti.com/WP/wp-content/uploads/2018/04/InfoQBrasil- Kanban10Passos.pdf. Acesso em: 06 Mar 2021. DAVIS, Anthony E. The Future of Law Firms (and Lawyers) in the Age of Artificial Intelligence. Revista Direito GV, v. 16, n. 1, Jan./Apr. 2020. DIGITAL. AI. 14th Annual State of Agile Report. 2020. Disponível em < https://stateofagile.com/>. Acesso em 20 fev. 2021. EDER, Samuel et al . 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Um modelo de gerenciamento de projetos baseado nas metodologias ágeis de desenvolvimento de software e nos princípios da produção enxuta. 2007. fl. 113. Dissertação (Mestrado em Sistemas Digitais) - Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007 GONÇALVES, Laila Cristina Couto; OLIVEIRA, Silvia Alves. Assumpção de; PACHECO, Jéssica Carvalho Amaral; SALUME, Paula Karina. Competências requeridas em equipes de projetos ágeis: um estudo decaso em uma Edtech. Revista de Gestão e Projetos. v. 11, n. 3, p. 72-93, set/dez. 2020, IAMANDI, Oana; POPESCU, Sorin; DRAGOMIR, Mihai; MORARIU, Cristina. A critical analysis of project management models and its potential risks in software development. Quality Management. v. 16. n. 149, p. 55-61, 2015. ISABELLA, Anderson de Ramada; SCAFUTO, Isabel Cristina. IMPLEMENTAÇÃO DO MÉTODO ÁGIL COM A UTILIZAÇÃO DA PLATAFORMA TRELLO NO GERENCIAMENTO DE PROJETOS EDUCACIONAIS. 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INTRODUÇÃO É indiscutível que o avanço da tecnologia acarretou não só uma forma diferente de interação entre homem e máquina, mas, também, da relação interpessoal humana. Tendo-se esses avanços como norte, as relações interpessoais que, outrora eram apenas físicas, ou seja, no mundo real, passaram a ser, também, por meio eletrônico e em ambiente virtual. Com os avanços tecnológicos e a democratização da Internet, cada vez mais as pessoas têm deixado as tarefas simples e cotidianas, como ir ao mercado ou ao shopping, para fazê-las de forma virtual por sites ou por meio de APP’S71. Nesse ponto cabe a colocação do professor Tarcísio Teixeira72: Dentro deste contexto, vemos os meios eletrônicos, principalmente a internet, tornarem-se um instrumento frequente de negociações e relacionamentos (empresariais, governamentais, pessoais etc.). Logo, as ferramentas eletrônicas acabam servindo como meio de prova, como ocorre, por exemplo, quando se utiliza de sites de “redes sociais” para se provarem determinados aspectos da vida de uma pessoa, como posição financeira, postura ética, entre outras coisas. Os operadores do direito, que tentam fazer com que o direito resguarde direitos e acompanhe as relações humanas, passou a ter uma nova preocupação: como dar segurança e resguardar garantias nas relações em um ambiente intangível? Embora a migração de muitas atividades e ações para o meio virtual já fosse um movimento esperado, como a pandemia de COVID-19, que assola o mundo desde o final de 2019, esta deu um salto gigantesco. Um reflexo dessa migração e o grande número de conflitos – comerciais, pessoais, entre outros – havidos por meio digital. Ambiente este, onde, algumas tecnologias, ainda são desconhecidas não só dos próprios detentores de direitos como por grande parcela dos operadores do direito. A 70 Advogado. Especialista em Direito Digital e Proteção de Dados pela (EBRADI), LLM em Direito e Processo tributário (FMP). 71Abreviação de Aplicação móvel, que é um software desenvolvido para ser instalado em um dispositivo eletrônico móvel – exemplo: celular, tablet, entre outros. 72TEIXEIRA, Tarcísio. Direito digital e processo eletrônico. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020, p. 249. 24 vanguarda do direito já vem discutindo as formas de tronar o direito mais próximo à tecnologia, a fim de que este resguarde também a relação em meio virtual. Contudo, a grande maioria dos juristas estão, apenas agora, se deparando com as novas tecnologias e suas implicações jurídicas. Com essa preocupação, este trabalho, de forma sucinta, tenta apresentar novas formas de se comprovar as ações/omissões ocorridas em um ambiente intangível e eletrônico. Inicializa-se o estudo com a conceitualização de prova, utilizando-se dos princípios constitucionais norteadores do direito como: o contraditório e a ampla defesa, a inafastabilidade da jurisdição, e a obtenção de provas com vedação a provas obtidas por meio ilícito, fazendo assim um abordagem da teoria geral da prova. Em um segundo momento, o autor passará a análise das provas em espécie, para ao final, depois de fazer uma concatenação lógica da prova no sistema constitucional e processual brasileiro, passar a análise da prova em meio eletrônico e as novas tecnologias para a sua validação e comprovação. Ao final da leitura, após o transcurso dessa cadeia lógica, o leitor terá, de forma objetiva, ferramentas para a detecção e aplicação das tecnologias que permeiam o mundo digital e suas aplicações no direito, especificam ante, no direito digital. 2. TEORIA GERAL DA PROVA 2.1 – Conceito de prova Prova é um instrumento jurídico pelo qual se demostra ao julgador, nos mais diversos procedimentos73, a ocorrência ou não de um fato, conforme apresentam Rennan Thamay e Maurício Tamer74: A prova é o instrumento jurídico vocacionado a demonstrar a ocorrência ou não de determinado fato, e, em caso positivo, delimitar todas as suas características e circunstâncias, respondendo não só à pergunta se o fato ocorreu ou não, mas como ocorreu e quais sujeitos estão a ele atrelados, ativa ou passivamente. Alguém, responsável por conferir a leitura jurídica sobre o fato, precisa saber se o fato ocorreu ou não e, se sim, todas as suas circunstâncias. 73Procedimentos estes que podem ser: oficiais - processo judicial, procedimento arbitral, procedimentos oficiais administrativos (como o processo administrativo disciplinar - PAD), entre outros; como não oficiais - tratativas de acordo, investigações internas de empresas, entre outros. 74THAMAY, Rennan Faria Krüger, TAMER, Maurício Antonio. Provas no direito digital: conceito de prova digital, procedimentos e provas digitais em espécie. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 28. 25 A expressão “prova”, para Daniel Willian Granado, pode ser definida em dois significados: “[…] um objetivo, abrangente dos meios destinados a convencer o juiz dos fatos relativos ao processo; outro subjetivo, relativo à '‘convicção que as provas produzidas geram no espírito do juiz quanto à existência ou inexistência dos fatos’"75. A prova não apenas é um meio destinado a convencer alguém – entenda-se aqui não somente o Juiz/Estado, nos meios oficiais, como os mais diversosjulgadores nas diversas aplicações da prova, meios não oficiais – como também traz uma característica tríplice de meio, resultado e atividade, conforme ensina Arruda Alvim76: Há diversos conceitos jurídicos de prova, visto que a prova é, ao mesmo tempo, meio, resultado e atividade. Os meios de prova são os instrumentos pelos quais se busca demonstrar a verdade de determinados fatos. Assim, por exemplo, a prova testemunhal, a prova pericial e a prova documental. A prova como resultado destes meios, i.e., conduz à conclusão relativa à ocorrência ou não dos fatos objeto de prova. E a atividade probatória consiste na realização da prova em si, principalmente pelas partes e pelo juiz. Dentro do âmbito processual, tem-se que a natureza da prova é a de convencimento, nesse sentido nos ensinam Luis Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart77: Nessa perspectiva, se retorna à definição que já lançamos, e que parece refletir, razoavelmente, a natureza da prova como se pretende denotá-la: a prova, direito processual, é todo meio retórico, regulado pela lei, e dirigido dentro dos parâmetros fixados pelo direito e de critérios racionais, a convencer o Estado-juiz da validade das proposições, objeto de impugnação, feitas no processo. Assim, diante das mais diversas formas de definição e classificação apresentadas, podemos concluir, de forma breve e sucinta, com base nos ensinamentos de Rennan Faria Krüger Thamay e Maurício Antonio Tamer78, que a prova é a comprovação de um fato, que 75ALVIM, Eduardo Arruda. GRANADO, Daniel Willian. FERREIRA, Eduardo Aranha. Direito processual civil. 6.ed. São Paulo: Saraiva, 2019, p. 599. 76ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil: teoria geral do processo e do processo de conhecimento. 17. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: ed. RT, 2017, p. 830. 77MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Prova e convicção, 5. ed., rev., atual, e ampl. São Paulo: Ed. RT, 2019. p. 68. 78Nesse ponto, os autores trazem de forma mais eloquente e extensa o conceito depreendido nesse paragrafo, como se observa: “Os fatos ocorrem no respectivo plano, no plano fático. A eles cumpre dar a leitura jurídica devida a partir da construção normativa que deles se extrai. Os meios probatórios são os instrumentos por meio dos quais os fatos saem do plano puramente fático e adentram aos processos ou procedimentos. Deixam de ser puramente fatos para representar um acontecimento, dentro do processo ou procedimento, juridicamente apto a levar o destinatário ao convencimento sobre o interesse jurídico respectivo. Meios probatórios, são, assim, esses meios de transferência ou trans porte dos fatos de fora dos processos ou procedimentos para dentro. O que os diferencia e permite, por assim dizer, a categorização na expressão provas em espécie, é onde e como os fatos foram registrados e, por consequência, como se dará essa transferência para dentro dos processos e procedimentos. Assim, por exemplo, se o fato foi registrado na memória de alguém, a prova testemunhal será 26 aconteceu no plano fático, e que é, por intermédio de um registro – meios de prova, transportado ou transferido para dentro de um procedimento ou processo. 2.2 – Princípios constitucionais norteadores da prova Após analisarmos o conceito de prova, passaremos a sua análise legal, começando pela sua estruturação constitucional. A Constituição da República Federativa do Brasil, que é a lei máxima do país, que é também a base fundante de todo ordenamento jurídico brasileiro, apresenta, em sua concepção, uma nítida proteção ao direito de prova79 como um dos elementos fundamentais para o efetivo gozo e proteção dos direitos individuais fundamentais. Antes do aprofundamento nos princípios em espécie, cabe trazer ao leitor a definição de princípio, a fim de que este tenha a real dimensão do tema a ser abordado neste ponto e a sua importância para o ordenamento jurídico. A definição trazida por Miguel Reale80 é: o meio probatório habilitado a levar tal fato para dentro do processo ou procedimento. Se o fato estiver registrado em determinado documento (compra e venda de imóvel, recibo de pagamento, certidão de nascimento ou óbito, postagem em mídia social, envio de e-mail etc.), a prova documental seria o meio apto. Se a transferência do fato para dentro do processo ou procedimento depender de sua tradução técnica especializada (digital, médica, de engenharia etc.), a prova pericial será o meio próprio.” (THAMAY, Rennan Faria Krüger, TAMER, Mauricio Antonio. Provas no direito digital: conceito de prova digital, procedimentos e provas digitais em espécie. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 30 -31). 79 Nesse ponto, sobre o direito constitucional à prova, interessante verificar o aprofundamento feito por José Roberto dos Santos Bedaque, que define: “Natureza constitucional do direito à prova. A premissa estabelecida no item anterior, além de compatível como escopo do processo, confere efetividade à garantia da ampla produção probatória, cuja natureza constitucional é incontroversa. O acesso efetivo à prova é direito fundamental, compreendido nas ideias de acesso à justiça, devido processo legal, contraditório e ampla defesa (art. 5.°, XXXV, LIV e LV da CF/1988). Assegurar o direito de ação, no plano constitucional, é garantir o acesso ao devido processo legal, ou seja, ao instrumento tal como concebido pela própria Constituição Federal. Entre os princípios inerentes ao processo, destacam-se o contraditório e a ampla defesa. Expressões diferentes para identificar o mesmo fenômeno: a necessidade de o sistema processual infraconstitucional assegurar às partes a possibilidade da mais ampla participação na formação do convencimento do juiz. Isso implica, evidentemente, a produção das provas destinadas à demonstração dos fatos controvertidos. Contraditório efetivo e defesa ampla compreendem o poder conferido à parte de se valer de todos os meios de prova possíveis e adequados à reconstrução dos fatos constitutivos, impeditivos, modificativos ou extintivos do direito afirmado. O direito à prova é componente inafastável do princípio do contraditório e do direito de defesa [...]. Necessário examiná-lo do ponto de vista da garantia constitucional ao instrumento adequado à solução das controvérsias, dotado de efetividade suficiente para assegurar ao titular de um interesse juridicamente protegido em sede material a tutela jurisdicional. Em última análise, o amplo acesso aos meios de prova constitui corolário natural dos direitos de ação e de defesa. Para que o processo possibilite real acesso à ordem jurídica juta, necessária a garantia da produção da prova, cujo titular é, em princípio, a parte, mas não exclusivamente ela, pois ao juiz, como sujeito interessado no contraditório efetivo e equilibrado e na justiça das decisões, também assiste o poder de determinar as provas necessárias à formação de seu convencimento.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz, 7. ed., rev., atual. e ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 25-27). 80REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1986. p 60. 27 Princípios são, pois verdades ou juízos fundamentais, que servem de alicerce ou de garantia de certeza a um conjunto de juízos, ordenados em um sistema de conceitos relativos à dada porção da realidade. Às vezes também se denominam princípios certas proposições, que apesar de não serem evidentes ou resultantes de evidências, são assumidas como fundantes da validez de um sistema particular de conhecimentos, como seus pressupostos necessários. Complementando esse conceito, define Luís Roberto Barroso81: São o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição,
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