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ORGANIZAÇÃO Alexandre Torres Petry Carolina Cyrillo Rosane Beatriz J. Danilevicz EDUCAÇÃO JURÍDICA: orientação acadêmica e construção do conhecimento Porto Alegre, 2023 Copyright © 2023 by Ordem dos Advogados do Brasil Todos os direitos reservados Recebimento dos textos, diagramação, ficha catalográfica Jovita Cristina Garcia dos Santos Projeto Gráfico e capa Victor Baldez Silva Revisora Dieniffer de Souza Silva Lemes Bibliotecária Jovita Cristina Garcia dos Santos – CRB 10º 1.5717 A revisão de Língua Portuguesa e a digitação, bem como os conceitos emitidos em trabalhos assinados, serão de inteira responsabilidade do(s) autor(es). Escola Superior de Advocacia da OAB/RS Rua Manoelito de Ornellas, 55 – Praia de Belas CEP 91110-230 – Porto Alegre/RS E26 Educação Jurídica: orientação acadêmica e construção do conhecimento//, Alexandre Torres Petry, Carolina Cyrillo, Rosane Beatriz J. Danilevicz. (Organizadores). – Porto Alegre: OAB/RS, 498p. ISBN: 978-65-88371-24-4 1. Educação Jurídica. 2. Direito. I Petry, Alexandre Torres (org.). II. Cyrillo, Carolina (org.). III. Danilevicz, Rosane Beatriz J. (org.) III. Título CDU 34:378 ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - CONSELHO FEDERAL DIRETORIA/GESTÃO 2022/2025 Presidente: Beto Simonetti Vice-Presidente: Rafael Horn Secretária-Geral: Sayury Otoni Secretária-Geral Adjunta: Milena Gama Diretor Tesoureiro: Leonardo Campos ESCOLA NACIONAL DE ADVOCACIA – ENA Diretor-Geral: Ronnie Preuss Duarte ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL Presidente: Leonardo Lamachia Vice-Presidente: Neusa Maria Rolim Bastos Secretário-Geral: Gustavo Juchem Secretária-Geral Adjunta: Karina Contiero Silveira Tesoureiro: Jorge Luiz Dias Fara ESCOLA SUPERIOR DE ADVOCACIA Diretor-Geral: Rolf Hanssen Madaleno Vice-Diretor: Eduardo Lemos Barbosa Diretora Administrativa-Financeira: Graziela Cardoso Vanin Diretoras de Cursos Permanentes: Fernanda Corrêa Osório, Michelle da Silva G. Vieira Diretor de Cursos Especiais: Roger Eridson Dorneles Diretor de Cursos Não Presenciais: Jair Pereira Coitinho Diretoras de Atividades Culturais: Ana Lúcia Kaercher Piccoli, Eliane Chalmes Magalhões Diretor de E-books e da Revista Eletrônica da ESA/RS: Alexandre Torres Petry CONSELHO PEDAGÓGICO Bruno Nubens Barbosa Miragem Simone Tassinari Cardoso Fleischmann Gerson Fischmann Cristina da Costa Nery Raimar Rodrigues Machado CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS ADVOGADOS Presidente: Pedro Zanette Alfonsin Vice-Presidente: Paula Grill Silva Pereira Secretária-Geral: Morgana Bordignon Secretária-Geral Adjunta: Alessandra Glufke Tesoureiro: Matheus Portella Ayres Torres TRIBUNAL DE ÉTICA E DISCIPLINA Presidente: Airton Ruschel Vice-Presidente: Gabriel Lopes Moreira CORREGEDORIA Corregedora: Maria Helena Camargo Dornelles Corregedores Adjuntos Maria Ercília Hostyn Gralha Josana Rosolen Rivoli Regina Pereira Soares OABPrev Presidente: Jorge Luiz Dias Fara Diretor Administrativo: Otto Junior Barreto Diretora Financeira: Claudia Regina de Souza Bueno Diretor de Benefícios: Luiz Augusto Gonçalves de Gonçalves COOABCred-RS Presidente: Jorge Fernando Estevão Maciel Vice-Presidente: Márcia Isabel Heinen SUMÁRIO APRESENTAÇÃO – Carolina Cyrillo .................................................................................... 9 PREFÁCIO – Rosane Beatriz J. Danilevicz .......................................................................... 11 A EXTENSÃO DA IMUNIDADE CONSTITUCIONAL DOS LIVROS, JORNAIS, PERIÓDICOS E PAPÉIS PARA A SUA IMPRESSÃO CONFERIDA AOS LIVROS ELETRÔNICOS – Aline Matzenauer e Rosane Beatriz Danilevicz ................................... 12 CONSIDERAÇÕES CRÍTICAS AO PACOTE ANTICRIME – Ana Martina Wolmer e Daniel Pulcherio Fensterseifer .............................................................................................. 29 A REPARAÇÃO CIVIL POR DANOS EXTRAPATRIMONIAIS AMBIENTAIS CAUSADOS POR VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DIFUSOS – Anderson Lino da Silva e Luiz Fernando Castilhos Silveira .................................................................................................. 42 EFEITOS DO DESCUMPRIMENTO DO PROGRAMA DE COMPLIANCE NAS DEMISSÕES POR JUSTA CAUSA: UMA ABORDAGEM JURÍDICA E ORGANIZACIONAL – André Lourenço Artmann e Maira Angelica Dal Conte Tonial .................................................................................................................................... 64 OS IMPACTOS DA LGPD NAS RELAÇÕES LABORAIS – Andressa Vitali e Valkiria Briancini .................................................................................................................................. 82 ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA: A LITERATURA COMO POSSIBILIDADE DE OBSERVAÇÃO AO RACIONALISMO JURÍDICO – Bárbara Candida Giovanini e Luiz Fernando Castilhos Silveira ................................................................................................. 102 PENSÃO POR MORTE PÓS EC Nº 103/2019: ANÁLISE DOS REFLEXOS DECORRENTES DA ALTERAÇÃO NA BASE DE CÁLCULO DO BENEFÍCIO COMO RETROCESSO SOCIAL E AFRONTA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS – Kamyla Rita Garcia de Oliveira e Bárbara De Cezaro .................................................................. 120 A EDUCAÇÃO JURÍDICA NO ÂMBITO DO ENSINO BÁSICO COMO PRESSUPOSTO DO DEVER ESTATAL EDUCACIONAL DE PREPARAR PARA O EXERCÍCIO DA CIDADANIA - Camila Siqueira Prado, Vitória Silveira da Silva e Carlos André Souza Birnfeld .................................................................................................................................. 140 A CRISE PERMANENTE DO ENSINO JURÍDICO BRASILEIRO: UMA BREVE HISTÓRIA DO PERFIL DE EGRESSO DOS CURSOS DE DIREITO – Pablo Buogo, Raul Rodrigues Kühl e Diego Nunes ............................................................................................ 153 A TIPIFICAÇÃO DA VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA CONTRA A MULHER E SUA RELAÇÃO COM A FUNÇÃO SIMBÓLICA DO DIREITO PENAL – Échele da Silva Candido, Claudio Daniel de Souza, Luan Christ Rodrigues ........................................... 173 FANFICTION E DIREITO AUTORAL: POSSIBILIDADE DE A LITERATURA DE Fà SER CONSIDERADA COMO UM LIMITE AO DIREITO AUTORAL – Gabriela Schiefferdecker e Fernanda Borghetti Cantali .................................................................. 194 NFT – NON-FUNGIBLE TOKENS E OBRAS AUTORAIS: REGISTRO VOLUNTÁRIO BENÉFICO PARA AS RELAÇÕES NEGOCIAIS? Thiago Severgnini de Sousa e Fernanda Borghetti Cantali .................................................................................................................. 215 SOBRE A NECESSÁRIA INCLUSÃO DAS PRÁTICAS COLABORATIVAS NO CURRÍCULO DE GRADUAÇÃO DO CURSO DE DIREITO – Grasiela de Souza Thomsen Giorgi e Roberta Drehmer de Miranda .............................................................................. 239 SUBORDINAÇÃO ALGORITIMICA : UM ESTUDO SOBRE A UBERIZAÇÃO –Juliana da Silva Franceschi dos Santos e Maira Angelica Dal Conte Tonial .............................. 259 REFUGIADOS AMBIENTAIS: REFLEXÕES SOBRE O RECONHECIMENTO DESSES STATUS PELO DIREITO INTERNACIONAL – Larissa Ribeiro Cardoso e Caroline Dimuro Bender D’Avila ....................................................................................................... 275 STARE DECISIS: OS PRECEDENTES NA PERSPECTIVA DA COMMON LAW NA INGLATERRA E NOS ESTADOS UNIDOS –Laura Maurina e Luiz Fernando Castilhos Silveira ................................................................................................................................... 292 A CONTRATAÇÃO FRAUDULENTA DE ATLETAS ENVOLVENDO O DIREITO DE IMAGEM DIREITO DE IMAGEM: A POLÊMICA EM TORNO DO CONTRATO DO ATLETA PROFISSIONAL – Lucas De Marco Stefanello e Maira Angelica Dal Conte Tonial ..................................................................................................................................... 310 ALIENAÇÃO PARENTAL: A CONTRIBUIÇÃO DA ESCOLA NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO INTEGRAL E A SUA INFLUÊNCIA NOS DIREITOS DAS CRIANÇAS E DOS ADOLESCENTES –Luiz Cristiano Souza dos Santos e Luiz Fernando Castilhos Silveira .................................................................................................................. 327 ACOLHIDA A REFUGIADOS NO BRASIL: DESAFIOS E PROPOSTAS PARA UMA ABORDAGEM EFETIVA –Luiza Belardinucci e Luiz Fernando Castilhos Silveira .... 346 A LEGITIMIDADE SINDICAL PERANTE A LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS – Marciéli Oliveira dos Santos e Maira Angelica Dal Conte Tonial ................................... 368 AS MUDANÇAS DA JORNADA DE TRABALHO DURANTE A PANDEMIA DE COVID- 19 –Mariana Kuhn Ferreira e Endrigo Durgante Oliveira Biscaino Nunes ................... 380 OS DESAFIOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO FRENTE ÀS NOVAS TECNOLOGIAS Náthaly Fernanda Weber Lima e Maira Angelica Dal Conte Tonial .............................. 393 DO DIREITO REGRESSIVO DO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) EM FACE DO EMPREGADOR –Náthaly Fernanda Weber Lima e Maira Angelica Dal Conte Tonial .......................................................................................................................... 407 O ENSINO JURÍDICO E UM NOVO ETHOS ECOJURÍDICO: PERSPECTIVAS A PARTIR DA INTERDISCIPLINARIDADE SISTÊMICA – Nathiele Brito da Silva e Karinne Emanoela Goettems dos Santos ........................................................................................... 423 A MEDIAÇÃO E A ARBITRAGEM NO ÂMBITO DAS RELAÇÕES LABORAIS – Renan Augusto Soccol e Daniel Pulcherio Fensterseifer............................................................... 439 A JUDICIALIZAÇÃO AUTÔNOMA DO DIREITO À SAÚDE E O SEU DUPLO CARÁTER PRESTACIONAL: A EFETIVIDADE DAS DECISÕES DA CORTE IDH – Rosana Helena Maas e Anderson Carlos Bosa ............................................................................................. 456 A CONSTITUCIONALIDADE DO ENSINO DOMICILIAR (HOMESCHOOLING) – Thamyres Barreto Santos e Luiz Fernando Castilhos Silveira ........................................ 480 9 APRESENTAÇÃO A Comissão de Educação Jurídica e a Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Rio Grande do Sul apresentam um livro inédito na construção do conhecimento jurídico: um livro sobre o papel da orientação acadêmica na construção da advocacia e dos profissionais do direito. Todos os capítulos que aqui estão foram fruto de um processo complexo que compõe o trabalho do professor e da professora de direito que é a orientação de discentes. Orientação que é fundamental na formação dos profissionais jurídicos que tenham condições técnicas e éticas de ingressarem no mercado da ciência jurídica, habilitados aos mais profundos debates de ideias. Em tempos de pseudo ciência, fakenews e ataques ao Estado Democrático de Direito, a proposta desse e-book foi demonstrar que o professor, a professora e a universidade são os espaços apropriados para resistência e construção do direito afinados com a democracia, valorizando o processo de formação nos futuros profissionais jurídicos que estão ingressando no mercado de trabalho, seja em suas graduações em direito e ciências jurídicas, seja nos estudos mais aprofundados de pós-graduação. Portanto, os capítulos que aqui estão pretendem mostrar que a orientação jurídica é a chave da construção do conhecimento jurídico crítico, analítico e responsável. E isso significa dizer que a Comissão de Educação Jurídica e a Escola Superior da Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Rio Grande do Sul apoiam a atividade acadêmica, valorizam a atividade do professor universitário na construção de um profissional do direito que seja comprometido com os valores da advocacia que são o de exercê- la com dignidade e independência, observando a ética, os deveres e as prerrogativas profissionais, defendendo a Constituição, a ordem jurídica, o Estado Democrático de direito, os Direitos Humanos, a Justiça social, a boa aplicação das leis, a rápida administração da Justiça e o aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas. Os autores e autoras dos capítulos são os professores e professoras de direito e seus respectivos discentes em sinergia de um trabalho conjunto. Assim, Aline Matzenauer, Rosane Beatriz Danilevicz, Ana Martina Wolmer, Daniel Pulcherio Fensterseifer, Anderson Lino da Silva, Luiz Fernando Castilhos Silveira, André Lourenço Artmann, Maira Angelica Dal Conte Tonial, Andressa Vitali, Valkiria Briancini, Bárbara Candida Giovanini, Luiz Fernando Castilhos Silveira, Bárbara De Cezaro, Kamyla Rita Garcia de Oliveira, Carlos André Sousa Birnfeld, Camila Siqueira Prado, Vitória Silveira da Silva, Diego Nunes, Pablo Buogo, Raul Rodrigues Kühl, Échele da Silva Candido, Claudio Daniel de Souza, Luan Christ Rodrigues, Fernanda Borghetti Cantali, Gabriela Schiefferdecker, Thiago Severgnini de Sousa, Grasiela de Souza Thomsen Giorgi, Roberta Drehmer de Miranda, Juliana da Silva Franceschi dos Santos, Larissa Ribeiro Cardoso, Caroline Dimuro Bender D’Avila, Laura Maurina, Lucas De Marco Stefanello, Luiz Cristiano Souza dos Santos, Luiza Belardinucci, Marciéli Oliveira dos Santos, Mariana Kuhn Ferreira, Endrigo Durgante Oliveira 10 Biscaino Nunes, Náthaly Fernanda Weber Lima, Nathiele Brito da Silva, Karinne Emanoela Goettems dos Santos, Renan Augusto Soccol, Rosana Helena Maas, Anderson Carlos Bosa, Thamyres Barreto Santos são protagonistas desse e-book e da proposta de comprovar que boas orientações geram bons profissionais. Convidamos a comunidade da advocacia a desvelar os mais variados temas que compõem os trabalhos científicos aqui apresentados. Seguramente estaremos diante de trabalhos instigantes para o cotidiano de nossas atuações profissionais, pensados a partir da experiência acadêmica. Esperamos que a inovação produzida no processo de educação jurídica transforme as visões sobre os assuntos e problemas enfrentados nos capítulos, que são os mais diversos e refletem a constante necessidade de atualização de nossa ciência. Agradecemos imensamente o engajamento da comunidade acadêmica em geral na produção e disseminação do edital de convocação para participação ampla e democrática na presente obra. Agradecemos à todas e todos envolvidos na produção desse livro, em especial aos autores e autoras que, como já dissemos, são protagonistas desse projeto coletivo de valorização de nossa atividade acadêmica como instrumento de transformação de uma advocacia comprometida com os valores de respeito aos máximos standards da ciência jurídica, da boa administração da justiça, respeito aos direitos das pessoas e do Estado Democrático de Direito. Porto Alegre, inverno de 2023. Carolina Cyrillo Advogada. Vice-Presidente da Comissão de Educação Jurídica da OAB/RS. Professora da UFRJ 11 PREFÁCIO A obra “EDUCAÇÃO JURÍDICA: orientação acadêmica e construção do conhecimento” representa um marco para a educação jurídica brasileira, pois reúne produções intelectuais desenvolvidas por estudantes de cursos de Direito sob a orientação de um docente. Considerando que a Educação Jurídica tem como pilares o ensino, a pesquisa e a extensão e, que a pesquisa é a parte da formação que materializa o conhecimento adquirido, este E-book consiste em um espaço de publicação de artigos científicos resultantes da pesquisa desenvolvida nos trabalhos de conclusão de curso dos mais variados temas jurídicos. De um modo geral, os trabalhos de conclusão de curso consubstanciam o esforço intelectual de seus autores. Nos cursos de Direito, frequentemente materializam o exame de questões teóricas e práticas que, sob a orientação de professoras e professores, traduzem-se em temas atuais e de interesse profissional. Nesse tipo de atividade os estudantes têm a possibilidade de trabalhar às suas potencialidades e de explorar a suas habilidades e competências de pesquisa, escrita e manifestação argumentativa, dentre outras. A obra que tenho a honra de prefaciar visa a prestigiar a produção intelectual manifestada na academia de modo a estar estreitamente vinculada à realidade profissional. Essa obra não seria possível sem a contribuição de discentes e docentes envolvidos na experiência intelectual. Naturalmente que os protagonistas são os discentes que com o seu esforço e trabalho permitiram a existência da presente obra. Todavia, reconhecemos que chegaram ao êxito pelos seus próprios méritos e pela mão segura das orientações ofertadas pelos seus professores orientadores. Agradecemos, enfim, às autoras e aos autores por suas valorosas contribuições e que os leitores possam usufruir e tornar útil os contributos que ora são postos à disposição. Agrademos a Escola Superior de Advocacia – ESA/RS, na pessoa do seu Diretor-Geral, Dr. Rolf Madaleno, e do Diretor de E-books e da Revista Eletrônica da ESA/RS, Dr. Alexandre Torres Petry, pela oportunidade de publicação deste E-book. Por fim, deve ser destacada a Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Estado do Rio Grande do Sul, que na pessoa de seu presidente, Dr. Leonardo Lamachia e de toda a Diretoria, está sempre atenta às necessidades da advocacia e, sobretudo, ao aprimoramento intelectual e profissional da advocacia. Rosane Beatriz J. Danilevicz Presidente da Comissão de Educação Jurídica 12 A EXTENSÃO DA IMUNIDADE CONSTITUCIONAL DOS LIVROS, JORNAIS, PERIÓDICOS E PAPÉIS PARA A SUA IMPRESSÃO CONFERIDA AOS LIVROS ELETRÔNICOS Aline Matzenauer1 Rosane Beatriz Danilevicz2 RESUMO O presente artigo objetiva examinar a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal expandir, alargar a imunidade objetiva, conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para sua impressão aos livros eletrônicos, promovendo dessa forma a manutenção efetiva da imunidade cultural no ordenamento jurídico pátrio. Sem a pretensão de esgotar o tema e utilizando o raciocínio dedutivo baseado na revisão bibliográfica e na jurisprudência de matéria tributária, constata-se a viabilidade de extensão e a consequente manutenção da imunidade conferida pela Constituição Federal aos livros impressos também aos livros eletrônicos para manutenção da tutela do direito de acesso à educação e à cultura frente à rápida evolução tecnológica que modificou o livro impresso, transformando-o em um novo objeto – o livro eletrônico. Palavras-chave: Imunidade cultural; Acesso à cultura e educação; Evolução tecnológica; Expansão da imunidade; Livros eletrônicos. INTRODUÇÃO Os avanços tecnológicos dos últimos anos abarcaram o formato dos livros, sendo que, muitos destes, passaram a ser eletrônicos, digitais; enfim, deixaram de ser impressos. Tal mudança criou um hiato em relação à imunidade cultural, vez que esta é conferida pelo nosso ordenamento pátrio somente aos livros impressos, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão. Para evitar a obsolência da imunidade cultural tornou-se de fundamental importância a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal acerca da extensão desta imunidade aos livros eletrônicos e aos meios de suporte para a sua leitura, como uma ferramenta de atualização e manutenção efetiva dessa imunidade cultural tão importante no nosso ordenamento jurídico. Assim, a análise de decisões da Suprema Corte tem por escopo responder ao seguinte problema: É possível o Supremo Tribunal Federal expandir a imunidade objetiva, conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para sua impressão aos livros eletrônicos, 1 Graduada em Ciências Jurídicas pelas Faculdades Integradas São Judas Tadeu. Servidora Pública Federal - Técnica Judiciária do INSS de 25/01/13 a 13/04/14; Técnica Judiciária do TRF da 4ª Região de 14/04/14 até a corrente data. 2 Professora orientadora. Advogada. Conselheira Estadual Titular, Presidente da Comissão de Educação Jurídica, membro da Comissão de Estágio e Exame de Ordem e da Comissão Especial de Direito Tributário da OAB/RS. Mestre em Direito - PUCRS. Professora universitária – UNIRITTER. E-mail: rosane@danilevicz.adv.br 13 promovendo dessa forma a manutenção efetiva da imunidade cultural no ordenamento jurídico pátrio? Desta feita, neste artigo, analisar-se-á a possível concessão de tal imunidade cultural aos livros eletrônicos. Para tanto, utilizar-se-á o método de abordagem dedutivo, analisando-se, primeiro, a imunidade tributária conferida a livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão, compreendendo a sua origem histórica, social e política, que levaram a sua composição objetiva e de eficácia plena no nosso ordenamento. Então, conferir-se-á o desenvolvimento tecnológico ocorrido em um curto espaço de tempo, o qual afetou o objeto alvo principal de tal imunidade, o livro, para, finalmente, chegar ao ponto principal do trabalho em questão: a confirmação da extensão dessa imunidade tributária aos livros eletrônicos para a manutenção dos direitos fundamentais tutelados por ela, que são a proteção à livre expressão do pensamento e o direito à educação e à cultura. Tal confirmação basear-se-á em análises da doutrina e jurisprudência relacionadas a forma de concessão da imunidade cultural. As técnicas de pesquisa utilizadas para o presente trabalho consistirão em revisões bibliográficas em direito tributário, em especial nos temas de imunidade cultural e sua extensão aos livros digitais sendo qualitativa com a análise da doutrina e jurisprudência. 1 A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA A imunidade conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão encontra-se descrita no artigo 150, inc. VI, alínea "d" da Constituição Federal de 1988 é chamada de imunidade cultural, a qual consiste em um tipo de imunidade objetiva, com caráter político, vez que tem por escopo a manutenção da liberdade de transmissão de pensamentos e, ainda, a tutela dos direitos fundamentais de acesso à cultura e educação. Assim, é mandamento constitucional expresso incondicionado de eficácia plena, já que goza de aplicação imediata, não dependendo de nenhuma condição. Já o conceito geral de imunidade tributária constitucional pode ser depreendido das lições de Paulsen (2017, p. 109): As regras constitucionais que proíbem a tributação de determinadas pessoas, operações, objetos ou de outras demonstrações de riqueza, negando, portanto, competência tributária, são chamadas de imunidades tributárias. Isso porque tornam imunes à tributação as pessoas ou bases econômicas nelas referidas relativamente aos tributos que a própria regra constitucional negativa de competência. 14 Tal ensinamento facilita a compreensão da imunidade cultural, a qual é uma espécie de imunidade tributária conferida especificamente aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão, com o intuito de proteção à educação e à cultura. Segundo Amaro (2009, p. 151), em que pese a imunidade estar prevista no capítulo do Sistema Tributário Nacional, importa frisar que ela não é instituto de direito tributário. A imunidade é, antes de tudo, uma garantia de liberdade conferida ao cidadão. Portanto, a imunidade não guarda relação direta com a arrecadação tributária, tornando assim irrelevante a capacidade contributiva das pessoas por ela alcançadas. Para Machado (2010, p. 300), a definição de imunidade é bastante sucinta, consistindo em um obstáculo decorrente da Constituição Federal à incidência da regra jurídica de tributação, ou seja, a imunidade impede que a lei defina como hipótese de incidência tributária aquilo que é imune. Observa-se assim que a imunidade se fundamenta em instituto constitucional que tem por objetivo limitar o poder de tributar do Estado. Tal limitação serve a determinados objetivos perseguidos pela Constituição Federal e é atribuída a determinadas pessoas mediante o preenchimento de determinados requisitos. Trata-se de gênero, o qual engloba diversas espécies, dentre as quais, a imunidade conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão. 1.1 Contexto histórico, social e político da concessão da imunidade cultural A imunidade cultural foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro na Constituição Federal de 1946, no artigo 31, inciso V, alínea "c" e se aplicava exclusivamente ao papel destinado à impressão de jornais, periódicos e livros. Carrazza e Torres (2018, p. 318) compreendem que a expressa alusão ao papel de imprensa ocorreu por razões puramente históricas, pois, o governo, durante o Estado Novo (1937 a 1945), adotava medidas restritivas às importações de papel de imprensa, as quais prejudicavam os jornais que faziam oposição ao regime ditatorial. Para evitar essa prática arbitrária o escritor baiano Jorge Amado, então deputado constituinte pelo Partido Comunista Brasileiro, teve a ideia de propor, à Assembleia Nacional Constituinte, que se inserisse tal imunidade na Carta de 1946. Assim, Jorge Amado ao defender a não tributação do papel destinado exclusivamente à impressão de jornais, periódicos e livros, confirmou o interesse cultural de sua argumentação. Frente a esse cenário, optou pelos valores espirituais que, ao mesmo tempo, coincidiam com a 15 necessidade de preservação da liberdade de crítica e de debate partidário através da imprensa (BALEEIRO, 2010, p. 577-578). Com o golpe militar de 1964, embora advinda a reforma do sistema tributário mediante a Emenda Constitucional nº 18, de 1965, a regra da imunidade do papel destinado exclusivamente à impressão de livros, jornais e periódicos foi mantida (Recurso Extraordinário nº 330.817). A Carta de 1967 estendeu aos livros, jornais e periódicos a imunidade anteriormente restrita ao papel destinado à impressão destes (artigo 20, inciso III, alínea "d") o que foi mantido com o advento da EC nº 1/1969 (artigo 19, inciso III, alínea "d"). Já a Constituição Federal de 1988, no artigo 150, inciso VI, alínea "d", manteve a imunidade dos livros, jornais, periódicos e do papel destinado a sua impressão (CARRAZZA, 2012, p. 52). Percebe-se assim que a Carta Magna de 1988 ao manter a imunidade de forma expressa e destacada ao "papel", não o fez no sentido de estreitar o alcance da norma imunizante. Pelo contrário, teve o objetivo de manter a expansão da norma que havia sido concedida pela Carta de 1967, com o intuito de alcançar o papel além dos livros, periódicos e jornais. Esse breve relato histórico demonstra a "evolução" e, de certa forma, a expansão da regra imunitória, vez que após ser conferida ao papel para impressão, passou a abranger também os próprios livros, periódicos e jornais. Com isso, visível torna-se a preocupação do legislador, no decorrer do tempo, em manter a proteção aos direitos de acesso à cultura e educação, os quais se constituem em direitos fundamentais de segunda dimensão, portanto passíveis de tutela constitucional, a qual lhes é conferida pela imunidade cultural. 1.2 Caráter objetivo, político e incondicionado da imunidade cultural A imunidade cultural apresenta características próprias como: ter caráter político (existe para tutelar certos direitos fundamentais, como o acesso à cultura, educação e livre expressão do pensamento), ser incondicionada (possui eficácia plena sendo aplicada de forma imediata para regular situações concretas, sem a necessidade de edição de leis ou outros atos normativos) e de natureza objetiva (alcança somente os impostos que incidiriam sobre os objetos abrangidos por ela, como o livro, o periódico, os jornais e os papéis para a sua impressão). Carvalho (2019, p 221) reforça que tal imunidade é objetiva, pouco importando as qualificações pessoais da entidade que opera com os bens sobre os quais a imunidade atua. Sustenta que a norma imunizante possui eficácia plena e aplicabilidade imediata, ou seja, comprovado que o objeto é livro, haverá a incidência da imunidade, pouco importando suas características individuais e peculiares. Qualquer livro ou periódico e o papel utilizado para a 16 sua impressão, sem restrições, estarão à margem dos anseios tributários do Estado, no que concerne aos impostos. O fato de tal imunidade ser objetiva se explica ainda porque esta não beneficia a editora, o autor, a empresa jornalística ou de publicidade (sujeitos), mas simplesmente afasta a incidência de IPI, do ICMS, do ISS e do Imposto de Importação dos objetos (livros, periódicos, jornais e papel para impressão). Quanto ao caráter político, a imunidade cultural possui um viés finalístico, porque tem por escopo a tutela de direitos e garantias fundamentais constitucionais como a livre manifestação do pensamento (sendo vedado o anonimato) e a livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença, destacados no artigo 5º, incisos IV e IX da Constituição Federal de 1988. Ademais, garante a viabilidade dos direitos expressos nos artigos 206, inciso II e 220, §§ 1º e 6º. Desta forma, o constituinte não pressupôs que quem incorre em operações relacionadas a livros, jornais, periódicos e papel destinado a sua impressão tivesse menor capacidade econômica, merecendo maior atenção. Ao contrário, o referido dispositivo imunizante constitui-se em estímulo à atividade cultural e garantia da liberdade de manifestação do pensamento, do direito de crítica e de posicionamento político, religioso ou ideológico (SCHOEURI, 2018, p. 479). Nesta seara, destaca-se que a imunidade cultural tem nítido sentido político, pois visa assegurar o efetivo exercício da liberdade de manifestação do pensamento e concretizar o compromisso do Estado de amparo à cultura e de proteção à liberdade de ação cultural, científica e artística (MELLO FILHO, 1986, p. 124). Em relação ao caráter incondicionado da imunidade, Martins (2010, p. 301) compreende que a eficácia plena da norma imunizante, foi fundamentada em considerações extrajurídicas, atendendo à orientação do poder constituinte em função das ideias políticas vigentes, preservando valores políticos, religiosos, educacionais, sociais, culturais e econômicos. Portanto, a eficácia plena conferida pela constituição à imunidade cultural retira das mãos do legislador infraconstitucional, a possibilidade de atingir os direitos fundamentais que devem ser protegidos pela imunidade. Portanto, observa-se que a imunidade cultural é objetiva (incide sobre os objetos: livros, periódicos, jornais e papel), de eficácia plena e incondicionada (não podendo sofrer limitações ou restrições pela legislação infraconstitucional), com caráter político de concessão para a manutenção e tutela de direitos fundamentais de segunda dimensão (culturais, com o escopo de promover a igualdade entre os cidadãos). 17 2 A EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA E A CONSEQUENTE ALTERAÇÃO DO LIVRO - OBJETO PRINCIPAL DA IMUNIDADE CULTURAL Historicamente o livro percorreu um longo e variável caminho. De acordo com Fischer (2006, p. 17), a leitura antiga era realizada pelos sumérios e significava "contar, calcular, ponderar e memorizar, declarar, ler em voz alta". As raras edições literárias que existiam nessa época eram feitas em tabuletas de argila, as quais cabiam na palma da mão, mas eram um objeto grande e pesado, desconfortável para a leitura como uma atividade de lazer. Com o passar do tempo, materiais como pedra, couro, cascas de árvores, pergaminho e papiro, por exemplo, foram sendo utilizados para a transmissão da linguagem em "meios físicos" e constituíam os "livros" da época. O surgimento da impressão deveu-se a Johann Genfleisch zum Guttemberg, em Mainz, na Alemanha, no ano de 1450. Nesta época, a Era do Pergaminho simbolicamente se dobrava diante da Era do Papel (FISCHER, 2006, p. 187). Desta feita, na idade média, com o surgimento das primeiras modalidades de impressão, o papel começou a tomar o lugar dos pergaminhos e, rapidamente, a impressão transformou a palavra escrita onipresente, porque a palavra impressa em papel tornou-se barata em comparação à escrita à mão no pergaminho. Com o surgimento da impressão em papel, surge o livro como conhecemos desde a Idade Média até os dias atuais. (FISCHER, 2006, p. 189). Percebe-se, assim, que o livro sofre alterações em seu formato desde o seu surgimento até os dias atuais e isso sugere que o que mais caracteriza o livro não é o seu aspecto físico, mas sim, o aspecto finalístico. Tal objeto carrega em seu bojo dois aspectos diferentes que o determinam, quais sejam: o seu conteúdo físico, material, no qual as palavras estão impressas e, por outro lado, o conteúdo propriamente dito, intrínseco, ou seja, as imagens, ideias e palavras a serem lidas. Nota-se que o segundo aspecto, é o que determina a função do livro, o seu real significado, vez que o suporte físico, apenas existe para carrear o conteúdo que constitui o fim maior deste objeto de expressão de ideias. O livro é um instrumento que veicula, carrega, porta um conteúdo a ser transmitido ao receptor e a imunidade cultural não trata da mera proteção a um objeto corpóreo denominado livro, mas de um bem jurídico maior que é o direito fundamental à educação, à cultura, ao conhecimento ou a informação. O bem corpóreo é protegido para se atingir a proteção de um direito subjetivo público ao conhecimento. Desse modo, o livro carrega em seu corpo um significado muito amplo, além de seu conteúdo físico, ou seja, existe para transmitir 18 ensinamentos, independentemente do veículo no qual é produzido (CANOTILHO, 2018, p. 3141). Por isso, o conceito de livro, no que se refere à questão da imunidade conferida a este, baseia-se na utilização de dois métodos de interpretação constitucional: a teleológica e a evolutiva. Portanto, o conceito de livro deve alcançar o espírito, a finalidade da norma imunizante e os avanços tecnológicos, abarcando conteúdos que não foram imaginados pelo legislador constituinte, mas que constituem a finalidade da norma constitucional. Destarte, necessária a tutela da mídia escrita, materializada em qualquer tipo de veículo (papel, CD, etc.), o que engloba o livro eletrônico, o qual deverá ser abrangido pela norma imunizante (COSTA, 2018, p.131). Seguindo esta linha de raciocínio, pode-se afirmar que o legislador, ao conferir a imunidade cultural aos "livros" o fez com o intuito de imunizar qualquer veículo de pensamento, não importando o seu meio físico, mas sim a sua função de difundir ideias, pensamentos, enfim, espalhar a cultura. Pode-se ir além, concluindo que quaisquer veículos de pensamentos deverão ser tutelados pela imunidade cultural, inclusive os livros eletrônicos. Cabe aqui destacar uma definição e o possível caráter controverso do conceito de livro eletrônico, pois, pode ser compreendido restritivamente apenas como o conteúdo do livro transformado em bits e bytes e vendido, por exemplo, pela internet. Contudo pode ainda abranger igualmente o instrumento físico ou objeto continente do conteúdo, que podem ser tanto os microcomputadores como os e-book readers (YAMASHITA, 2018, p.114). Em que pese a controvérsia em relação ao real significado da expressão "livro eletrônico", a questão relacionada ao meio-ambiente, não gera qualquer dúvida e, conforme Velloso (2018. p. 282), a substituição do livro impresso pelo digital é extremamente salutar ao meio ambiente, por dispensar o meio físico papel. Em relação à questão ambiental, cada vez mais se incentiva a diminuição na impressão de papéis (os quais são extraídos de árvores, causando a devastação de florestas), o que representa mais um argumento de defesa da ampliação da imunidade cultural aos livros digitais. Ainda, pode-se citar a questão de economia de espaço, pois arquivos digitais, CD-ROMs, etc. possuem pequenas dimensões e espaços de memória enormes, garantindo assim que vários livros possam ser armazenados em muito pouco espaço. Portanto, devido a evolução tecnológica na qual estamos inseridos, tornou-se necessária a extensão da imunidade conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para a impressão aos livros eletrônicos, vez que representam uma parcela cada vez maior de difusão de conhecimento e cultura. Por isso, torna-se imprescindível a análise mais aprofundada sobre as decisões do 19 Supremo Tribunal Federal no sentido da confirmação de tal extensão do mandamento imunizante à categoria dos livros digitais, os quais não estão expressamente definidos na Constituição Federal de 1988. 3 A IMUNIDADE CULTURAL PELA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA A imunidade cultural é referida na nossa constituição de uma forma explícita e estreita, ou seja, é direcionada de forma objetiva diretamente aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão. Portanto, para que ocorra a manutenção da eficácia de tal imunidade no nosso ordenamento, faz-se necessária a aplicação de métodos de interpretação constitucional que levem a uma atualização da norma. Neste sentido é necessário entender que a finalidade da imunidade não se restringe à proteção dos objetos referidos (livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão), mas também à tutela dos direitos que devem ser protegidos pela referida norma imunizante. Caso contrário, correr-se-ia o perigo de ver feridos os direitos fundamentais de acesso à cultura, à educação e à livre manifestação do pensamento. Sobre a rigidez das normas, Maximiliano (2011, p. 37) ensina que: É um mal necessário a rigidez da forma; ao invés de o abrandarem com a interpretação evolutiva, agravam-no com a estreiteza da exegese presa à vontade criadora, primitiva, imutável. Se há proveito por um lado, avulta o prejuízo maior por outro: o que a lei ganha em segurança, perde em utilidade; menos viável se torna o sofisma, porém fica excessivamente restrito o campo de aplicação. Com isso, confirma-se a demanda por atualização na interpretação da norma imunizante para que esta não perca o seu objetivo principal de manutenção aos direitos fundamentais de segunda dimensão a que se propõe tutelar. Segundo Schoueri (2018. p. 483) que tal imunidade objetiva tem recebido, pela jurisprudência, amplo espectro no que se refere ao conteúdo, bastando para a sua concessão que se esteja diante de um livro, jornal ou periódico. Ainda, quando ocorre a análise do conceito de livro, não mais parece relevante a sua forma física, aceitando-se uma extensão da imunidade a seu suporte físico. Por outro lado, segundo o autor, existe, na jurisprudência, uma tendência à restrição da imunidade, que não se estende a insumos diversos do "papel destinado a sua impressão". Neste contexto, percebe-se o surgimento de duas correntes doutrinárias interpretativas. Para a primeira, a imunidade conferida no artigo 150, inciso VI, alínea "d" da Constituição Federal de 1988 alcança somente o papel e o que puder ser compreendido dentro da expressão "papel destinado à sua impressão", vez que esta teria sido a vontade do constituinte originário 20 ao redigi-la. Entretanto, para a outra corrente, a ampliativa, a imunidade deverá ser conferida para dar efetividade aos princípios da livre manifestação do pensamento e da livre expressão da atividade intelectual, artística, científica ou de comunicação, difundindo o acesso à cultura e à informação, devendo o benefício ser amplo e interpretado teleologicamente, de modo a abranger o produto, maquinário e insumos (ÁVILA, 2017, p. 122). Essa dualidade interpretativa pode ser observada também através de várias decisões prolatadas pelo Supremo Tribunal Federal, ora impedindo a extensão da imunidade a outros insumos que não o papel, ora estendendo o benefício a insumos como filmes, papéis fotográficos, papel para artes gráficas, dentre outros. Ainda pode-se referir outro viés interpretativo quando o Supremo Tribunal Federal determina que a imunidade cultural se dirige tão somente aos impostos cobrados sobre os livros, jornais e periódicos, não alcançando as outras espécies tributárias, tais como as contribuições, taxas ou empréstimos compulsórios, ou seja, tal imunidade seguiria, nesse sentido, uma linha restritiva (CANOTILHO, 2018, p. 3143). Em que pese as divergências interpretativas, Coelho (2018, p. 217-218) destaca que, de forma paulatina, a Suprema Corte tem expandido a abrangência de referida imunidade. Afirma que fatores como a expansão da internet, dos computadores pessoais, dos smarthphones, dos tablets; do Kindle; intensificação do comércio de produtos digitais; o alvorecer da preocupação ambiental e com a sustentabilidade, todos relacionados com a evolução tecnológica, confluíram para a mutação constitucional que observamos. Esta mutação abraça o fim último do benefício imunitório, qual seja: prestigiar a liberdade de expressão e o desenvolvimento da cultura, da educação e da informação, caracterizando-se como uma interpretação teleológica da Lei Fundamental. Nota-se assim que a tendência da concessão da imunidade vai ao encontro da teoria que propõe o alargamento do preceito imunitório, com a aplicação de uma interpretação constitucional evolutiva e teleológica, com o intuito de manutenção finalística de tutela dos direitos fundamentais de acesso à cultura, educação e liberdade de expressão do pensamento. 3.1 Análise das decisões do Supremo Tribunal Federal relacionadas à imunidade tributária Retroagindo um pouco no tempo, através da análise de decisões do Supremo Tribunal Federal, percebe-se que a Corte vem oscilando na forma de decidir a respeito da abrangência 21 da imunidade conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão, ora alargando, ora restringindo o seu alcance. No RE 101.441, a imunidade cultural foi estendida às listas telefônicas: IMUNIDADE TRIBUTARIA (ART. 19, III, 'D', DA C.F.). I.S.S. - LISTAS TELEFONICAS. A EDIÇÃO DE LISTAS TELEFONICAS (CATALOGOS OU GUIAS) E IMUNE AO I.S.S., (ART. 19, III, 'D', DA C.F.), MESMO QUE NELAS HAJA PUBLICIDADE PAGA. SE A NORMA CONSTITUCIONAL VISOU FACILITAR A CONFECÇÃO, EDIÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DO LIVRO, DO JORNAL E DOS 'PERIODICOS', IMUNIZANDO-SE AO TRIBUTO, ASSIM COMO O PRÓPRIO PAPEL DESTINADO A SUA IMPRESSAO, E DE SE ENTENDER QUE NÃO ESTAO EXCLUIDOS DA IMUNIDADE OS 'PERIODICOS' QUE CUIDAM APENAS E TÃO-SOMENTE DE INFORMAÇÕES GENERICAS OU ESPECIFICAS, SEM CARÁTER NOTICIOSO, DISCURSIVO, LITERARIO, POETICO OU FILOSOFICO, MAS DE 'INEGAVEL UTILIDADE PÚBLICA', COMO E O CASO DAS LISTAS TELEFONICAS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO, POR UNANIMIDADE DE VOTOS, PELA LETRA 'D' DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL, E PROVIDO, POR MAIORIA, PARA DEFERIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA. (RE 101441, Relator(a): SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 04/11/1987, DJ 19-08-1988 PP-20262 EMENT VOL-01511-03 PP-00466 RTJ VOL- 00126-01 PP-00216). [Grifo nosso]. Nesta decisão, o ministro relator, Sydney Sanches, defendeu que as listas telefônicas eram publicações técnicas periódicas, com conteúdo técnico informativo extremamente útil, como estava descrito na lei. Afirmou que tais listas precisavam ser republicadas a certos períodos, sob pena de perderem sua própria finalidade, dificultando sobremaneira as telecomunicações. Quanto a circunstância de que as listas continham material publicitário pago, concluiu ser este necessário para que tais periódicos pudessem ser distribuídos gratuitamente e pudessem alcançar a maior parte da população. Segundo ele, jornais e revistas técnicas que gozavam da imunidade cultural também se utilizavam desse expediente para poderem ser vendidos a preço menor. Reforçou que a jurisprudência da casa entendia que jornais e revistas mesmo com a publicidade comercial eram imunes à tributação por óbvio interesse na divulgação de ideias e pensamentos. Assim, o Recurso Extraordinário foi provido e dando caráter finalístico à interpretação da imunidade, na medida em que levou em consideração os fins aos quais ela se propunha e não a observação e aplicação pura da lei escrita. Seguindo o viés ampliativo, no RE 174.476, a Corte entendeu pela extensão da imunidade aos filmes e papéis fotográficos: 22 IMUNIDADE - IMPOSTOS - LIVROS - JORNAIS E PERIÓDICOS - ARTIGO 150, INCISO VI, ALÍNEA "D", DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A razão de ser da imunidade prevista no texto constitucional, e nada surge sem uma causa, uma razão suficiente, uma necessidade, está no interesse da sociedade em ver afastados procedimentos, ainda que normatizados, capazes de inibir a produção material e intelectual de livros, jornais e periódicos. O benefício constitucional alcança não só o papel utilizado diretamente na confecção dos bens referidos, como também insumos nela consumidos com são os filmes e papéis fotográficos. (RE 174476, Relator(a): MAURÍCIO CORRÊA, Relator(a) p/ Acórdão: MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 26/09/1996, DJ 12-12-1997 PP-65580 EMENT VOL-01895-04 PP-00616). [Grifo nosso]. Neste Recurso Extraordinário, a imunidade cultural foi estendida a qualquer material que pudesse ser assimilado ao papel utilizado no processo de impressão, como filmes e papéis fotográficos. Tal decisão, apesar de ampliativa, não desvirtuou o tipo de imunidade tributária conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão, vez que esta continuou sendo objetiva. Em consonância com a decisão do RE 174.476 foi aprovada a Súmula 657 que determina que "A imunidade prevista no art. 150, VI, "d", da Constituição Federal abrange os filmes e papéis fotográficos necessários à publicação de jornais e periódicos." Outra decisão emblemática em relação à imunidade cultural ocorreu no RE 221.239: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. ART. 150, VI, "D" DA CF/88. "ÁLBUM DE FIGURINHAS". ADMISSIBILIDADE. 1. A imunidade tributária sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão tem por escopo evitar embaraços ao exercício da liberdade de expressão intelectual, artística, científica e de comunicação, bem como facilitar o acesso da população à cultura, à informação e à educação. 2. O Constituinte, ao instituir esta benesse, não fez ressalvas quanto ao valor artístico ou didático, à relevância das informações divulgadas ou à qualidade cultural de uma publicação. 3. Não cabe ao aplicador da norma constitucional em tela afastar este benefício fiscal instituído para proteger direito tão importante ao exercício da democracia, por força de um juízo subjetivo acerca da qualidade cultural ou do valor pedagógico de uma publicação destinada ao público infanto-juvenil. 4. Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE 221239, Relator(a): ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 25/05/2004, DJ 06-08-2004 PP-00028 EMENT VOL-02158-03 PP-00597 RTJ VOL-00193-01 PP-00406). [Grifo nosso] Em seu voto, a ministra relatora, Ellen Gracie, defendeu que a intenção da imunidade cultural é facilitar o acesso à cultura e à informação e é realizada pelo álbum de figurinhas, vez que este se caracteriza como um meio para estimular o público infantil a se familiarizar com os meios de comunicação impressos. Ressaltou que não cabe ao aplicador da norma constitucional em debate afastar esse benefício fiscal, instituído para proteger direito tão importante ao exercício da democracia, por força de um juízo subjetivo acerca da qualidade cultural ou do valor pedagógico de uma publicação destinada ao público infanto-juvenil. 23 Ainda, o fato de figuras, fotos ou gravuras de uma determinada publicação serem vendidas separadamente em envelopes lacrados não descaracteriza a benesse consagrada no artigo 150, inciso VI, alínea "d" da Constituição Federal. Destarte, nota-se que a Corte não analisou a qualidade do conteúdo do álbum de figurinhas, seguindo o mandamento constitucional de conferir a imunidade tributária a qualquer espécie de livro, sem adentrar na análise de seu valor artístico ou didático. Portanto, aqui exemplificada mais uma interpretação não restritiva em relação à imunidade tributária em tela. Em 2011, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal negou provimento ao RE 202.149/RS, no qual a União aduziu que a imunidade cultural não seria aplicável às peças sobressalentes para equipamentos de preparo e acabamento de chapas de impressão offset para jornais. Com isso, foi emanada uma decisão de cunho ampliativo, fazendo com que a imunidade alcançasse também insumos indiretos. Todavia, houve interposição de Embargos de Divergência, os quais foram acolhidos e providos, alterando assim a decisão a respeito da abrangência da imunidade. Posteriormente, houve interposição de Agravo Regimental sobre os Embargos divergentes, os quais foram improvidos, conforme ementa abaixo: E M E N T A: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – PRESSUPOSTOS FORMAIS DE SUA UTILIZAÇÃO – JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL QUE SE CONSOLIDOU, POSTERIORMENTE, EM SENTIDO OPOSTO AO DO ACÓRDÃO EMBARGADO – DIVERGÊNCIA DE TESES CONFIGURADA – CONSIDERAÇÕES EM TORNO DO SIGNIFICADO E ALCANCE DO INSTITUTO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA (CF, ART. 150, VI, “d”) – LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL AO PODER DE TRIBUTAR – INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO PRECEITO EM REFERÊNCIA (PRECEDENTES) – ADMISSIBILIDADE DOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – SUCUMBÊNCIA RECURSAL (CPC, ART. 85, § 11) – NÃO DECRETAÇÃO, NO CASO, ANTE A INADMISSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO EM VERBA HONORÁRIA, POR TRATAR-SE DE PROCESSO DE MANDADO DE SEGURANÇA (SÚMULA 512/STF E LEI Nº 12.016/2009, ART. 25) – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. (RE 202149 EDv-AgR, Relator(a): CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 04/06/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-123 DIVULG 20-06-2018 PUBLIC 21-06-2018). [Grifo nosso]. Com essa decisão denegatória ao Agravo Regimental, restou confirmado um viés restritivo à decisão relacionada a abrangência da imunidade cultural, vez que não permitiu a sua extensão a insumos indiretos relacionados à produção e comercialização de livros, jornais e periódicos. Notável, portanto, a oscilação da jurisprudência em relação à aplicação da imunidade conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão. Por fim, pode-se citar a decisão proferida no RE 330.817/RJ que estendeu a imunidade tributária aos livros eletrônicos nos seguintes termos: 24 EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão geral. Tributário. Imunidade objetiva constante do art. 150, VI, d, da CF/88. Teleologia multifacetada. Aplicabilidade. Livro eletrônico ou digital. Suportes. Interpretação evolutiva. Avanços tecnológicos, sociais e culturais. Projeção. Aparelhos leitores de livros eletrônicos (ou e-readers). 1. A teleologia da imunidade contida no art. 150, VI, d, da Constituição, aponta para a proteção de valores, princípios e ideias de elevada importância, tais como a liberdade de expressão, voltada à democratização e à difusão da cultura; a formação cultural do povo indene de manipulações; a neutralidade, de modo a não fazer distinção entre grupos economicamente fortes e fracos, entre grupos políticos etc; a liberdade de informar e de ser informado; o barateamento do custo de produção dos livros, jornais e periódicos, de modo a facilitar e estimular a divulgação de ideias, conhecimentos e informações etc. Ao se invocar a interpretação finalística, se o livro não constituir veículo de ideias, de transmissão de pensamentos, ainda que formalmente possa ser considerado como tal, será descabida a aplicação da imunidade. (...) 3. A interpretação das imunidades tributárias deve se projetar no futuro e levar em conta os novos fenômenos sociais, culturais e tecnológicos. (...) 4. O art. 150, VI, d, da Constituição não se refere apenas ao método gutenberguiano de produção de livros, jornais e periódicos. O vocábulo “papel” não é, do mesmo modo, essencial ao conceito desses bens finais. O suporte das publicações é apenas o continente (corpus mechanicum) que abrange o conteúdo (corpus misticum) das obras. O corpo mecânico não é o essencial ou o condicionante para o gozo da imunidade, pois a variedade de tipos de suporte (tangível ou intangível) que um livro pode ter aponta para a direção de que ele só pode ser considerado como elemento acidental no conceito de livro. (...) 6. A teleologia da regra de imunidade igualmente alcança os aparelhos leitores de livros eletrônicos (ou e-readers) confeccionados exclusivamente para esse fim, ainda que, eventualmente, estejam equipados com funcionalidades acessórias ou rudimentares que auxiliam a leitura digital, tais como dicionário de sinônimos, marcadores, escolha do tipo e do tamanho da fonte etc. Esse entendimento não é aplicável aos aparelhos multifuncionais, como tablets, smartphone e laptops, os quais vão muito além de meros equipamentos utilizados para a leitura de livros digitais. (...)Tanto o suporte (o CD-Rom) quanto o livro (conteúdo) estão abarcados pela imunidade da alínea d do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal. (...) 9. Em relação ao tema nº 593 da Gestão por Temas da Repercussão Geral do portal do STF na internet, foi aprovada a seguinte tese: “A imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se ao livro eletrônico (e- book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo.” (RE 330817, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 08/03/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-195 DIVULG 30-08-2017 PUBLIC 31-08-2017). [Grifo nosso]. Em tal Recurso Extraordinário com repercussão geral, com acórdão publicado em 2017, foi, finalmente, determinado que a imunidade conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão deverá ser estendida aos livros eletrônicos. Ainda, decidiu-se na Suprema Corte, no mesmo dia, em outro recurso extraordinário com repercussão geral, que os suportes criados exclusivamente para a leitura dos livros digitais também serão abarcados por referida imunidade. Tais decisões deram origem ao Tema 259 do STF (A imunidade da alínea d, do inciso VI, do artigo 150, da Constituição Federal alcança componentes eletrônicos destinados, exclusivamente, a integrar unidade didática com fascículos) e ao Tema 593 do STF (A 25 imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se ao livro eletrônico (e- book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo). Na esteira de tal entendimento, o Supremo Tribunal Federal aprovou a Súmula Vinculante 57 com a seguinte redação: A imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se à importação e comercialização, no mercado interno, do livro eletrônico (e-book) e dos suportes exclusivamente utilizados para fixá-los, como leitores de livros eletrônicos (e- readers), ainda que possuam funcionalidades acessórias. Com tal aprovação foi ratificada a extensão da imunidade cultural aos livros eletrônicos e confirmada a preocupação da Corte em realizar uma interpretação teleológica, finalística e evolutiva do preceito imunizante existente no ordenamento pátrio. CONSIDERAÇÕES FINAIS A imunidade cultural possui um viés de proteção a direitos humanos de segunda dimensão, vez que foi conferida pelo legislador de forma expressa aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão, com o intuito de proteger a liberdade de expressão do pensamento e o livre acesso à cultura e à educação. A referida imunidade apresenta características próprias como: ser objetiva (atinge apenas os objetos: livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão, sem se "importar" com os sujeitos envolvidos na produção destes objetos, como livreiros, gráficas, etc.), possuir caráter político (de proteção aos direitos fundamentais de segunda dimensão como proteção à educação, à cultura e a livre expressão do pensamento) e ser incondicionada e de eficácia plena (não necessita de legislação infraconstitucional para ser regulada, ou seja, no momento da concessão, passa a vigorar imediatamente). Pode-se ainda observar que a expressa alusão aos livros e papéis, não teve por escopo restringir a concessão da imunidade cultural. Tal concessão, apenas ocorreu em um período no qual ainda não se imaginava a rápida evolução tecnológica que viria a atingir o principal objeto alcançado pela imunidade, qual seja, o livro. Ademais, nota-se que a doutrina e a jurisprudência se debruçaram sobre tal assunto desenvolvendo duas correntes interpretativas a respeito da aplicação da imunidade cultural, uma mais restritiva e outra mais expansiva. Em que pese, tal dicotomia, o que realmente importa é a confirmação do posicionamento do Supremo Tribunal Federal frente a expansão de tal norma imunitória, ou seja, observa-se que a Corte Suprema expandiu a imunidade cultural aos livros digitais. 26 A partir das decisões referidas neste artigo, percebe-se que o Supremo Tribunal Federal acatou a tese de expansão, alargamento da imunidade para os livros eletrônicos, através de uma interpretação teleológica e evolutiva. Tais decisões corroboram a afirmação de que nossa Suprema Corte vem adotando formas de decisão voltadas à "modernização" de preceitos constitucionais escritos sob uma realidade distante e diversa da atual. Embora, a evolução tecnológica tenha levado a imunidade tributária conferida aos livros, jornais, periódicos e papéis para a sua impressão a uma desatualização, o Supremo Tribunal Federal agindo de maneira a expandir tal imunidade aos livros eletrônicos conseguiu atingir e manter o espírito da norma em nosso ordenamento jurídico que é o da manutenção e defesa dos direitos humanos e de tudo que seja reflexo destes. REFERÊNCIAS ÁVILA, A. R. S. Curso de Direito Tributário. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2017. AMARO, L. Direito tributário brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. BALEEIRO, A. Limitações ao poder de tributar. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental em EDv no RE 202149. Tribunal Pleno, Brasília, DF, 04 jun. 2018, Relator: Celso de Mello. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search?base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&p age=1&pageSize=10&queryString=202.149%20&sort=_score&sortBy=desc>. 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Fundamentos e alcance da imunidade tributária do livro digital. YAMASHITA, D. Imunidade do livro eletrônico: hardware, software e conteúdo. In: SARAIVA FILHO, O. O. P. (coord.). A imunidade do livro digital e do seu suporte de fixação - Homenagem ao jurista Hugo de Brito Machado. Belo Horizonte: Fórum, 2018. YAMASHITA, D. Imunidade do livro eletrônico: hardware, software e conteúdo. In: SARAIVA FILHO, O. O. P. (coord.). A imunidade do livro digital e do seu suporte de fixação - Homenagem ao jurista Hugo de Brito Machado. Belo Horizonte: Fórum, 2018. 29 CONSIDERAÇÕES CRÍTICAS AO PACOTE ANTICRIME Ana Martina Wolmer1 Daniel Pulcherio Fensterseifer2 RESUMO O atual estudo busca demonstrar as dificuldades geradas pelas alterações advindas da Lei n. 13.964 de 2019, popularmente conhecida como “Pacote Anticrime”, com foco nas mudanças de requisitos para progressão de regime, no limite máximo para o cumprimento de pena e no regime disciplinar diferenciado, trazendo ao centro do debate uma crítica humanística, social e jurídica acerca do tema. Com objetivo de enfatizar os prejuízos causados pela inovação e explorar suas consequências, a análise do endurecimento das penas, e do recebimento de progressão punitiva com uma ótica prática e evoluída como forma de verificar os requisitos pelos quais houve aprovação do Pacote, convidando para um debate contemporâneo e expansivo sobre o que se propôs a pesquisar, por meio de verificações doutrinárias e legais acerca do tema proposto para enfim, como resultado elaborar uma conjuntura própria acerca do assunto estudado. Palavras-chave: Pacote Anticrime; Limite Máximo de Cumprimento de Pena; Progressão de Regimes; Regime Disciplinar Diferenciado. ABSTRACT The current study seeks to demonstrate the difficulties generated by the changes arising from Law n. 13,964 of 2019, popularly known as the “Anti-Crime Package”, focusing on changes in requirements for regime progression, on the maximum limit for serving a sentence and on the differentiated disciplinary regime, bringing to the center of the debate a humanistic, social and legal critique about of the theme. With the aim of emphasizing the damage caused by innovation and exploring its consequences, the analysis of the hardening of penalties, and the receipt of punitive progression with a practical and evolved perspective as a way of verifying the requirements for which the Package was approved, inviting a debate contemporary and expansive about what it proposed to research, through doctrinal and legal verifications about the proposed theme to finally, as a result, elaborate its own juncture about the subject studied. Keywords: Anti-Crime Pack. Maximum Limit of Sentencing. Regime Progression. Differentiated Disciplinary Regime. 1 Acadêmica do 5º semestre do curso de Direito na Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões - Câmpus Frederico Westphalen, RS. E-mail: a099104@uri.edu.br. 2 Doutor e Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS. Professor do curso de Direito e do Programa de Pós- Graduação em Educação (mestrado e doutorado) da URI. Membro da Comissão de Educação Jurídica da OAB/RS. Vice-Presidente da Rede Internacional de Investigação em Direito Educativo-RIIDE/Brasil. Membro da Junta Diretiva da Associação Iberoamericana de Therapeutic Jurisprudence. Membro do Conselho Consultivo Internacional da International Society for Thrapeutic Jurisprudence. Advogado criminalista. E-mail: danielpulcherio@uri.edu.br. 30 INTRODUÇÃO O famoso “Pacote Anticrime” provindo da Lei nº 13.964/2019 entrou em vigor em 23 de janeiro de 2020, modificando algumas questões diretamente relacionadas à forma de aplicação das sanções penais brasileiras, e exigindo uma maior atenção dos aplicadores do Direito, pois as mudanças foram consideráveis. Contudo, é sempre válido ressaltar que ela atinge somente os crimes acontecidos posteriormente a sua vigência, em respeito aos princípios da anterioridade penal (artigo 1º do Código Penal) e da legalidade. É necessária a menção da possibilidade da retroatividade da Lei Penal mais benéfica ao acusado, aludido no artigo 2º do Código Penal, parágrafo único, porém, ao decorrer da presente análise, nota-se que a recente mudança não acarretou, praticamente, em nenhum benefício aos apenados. Pelo contrário, trouxe consigo aplicações mais severas e longas da condenação, tornando esse princípio penal quase inaplicável aos agentes puníveis. Nesses casos o apenado se aproveita de outra previsão fixada pelo caput do artigo 2º, o da irretroatividade da lei mais gravosa. Diversos penalistas buscam atribuir uma finalidade à pena, e de acordo com as lições de Bitencourt (2022) existem três para o entendimento do porquê punir: a) para a teoria retributiva, a punição como uma forma de fazer mal ao criminoso para amenizar o mal que ele causou à sociedade e ao Estado, retribuir da mesma forma as atitudes consideradas reprováveis pelo Direito, uma espécie de castigo; b) da teoria preventiva, espera-se que quanto pior forem as consequências de um delito, menos ele seja cometido, como uma forma de fazer o agente refletir e temer a sanção que será aplicada a ele se caso atue em desacordo, e para aqueles que observam a penalidade recaindo sobre o outro desistam de tomar a mesma atitude, uma forma de prevenir que o crime sequer aconteça, nesse cenário imagina-se que o dispositivo escrito baste para impedir futuros delitos; c) ressocializativa, diz respeito àqueles que já cometerem o crime e precisam ser ressocializados, ou seja, voltarem a produzir condutas de seres que vivem em uma sociedade harmônica e sem violência, para serem reinseridos na vida cotidiana e não reincidiram mais, e isso é feito, ou melhor, deveria ser feito, por meio da ressocialização dentro das penitenciárias. Outra teoria utilizada para justificar o porquê punir é a corrente agnóstica, tese defendida, principalmente, pelo estudioso Eugenio Zaffaroni (2003), para ele a pena é uma manifestação política e não jurídica do Poder do Estado controlar o cidadão, e que aplicar finalidades a uma ação não passaria apenas de uma forma de minimizar as consequências negativas da mesma. O Brasil adotou ambos os objetivos da pena, enquadrando-se na teoria mista de acordo com o doutrinador Rogério Greco (2016), isso fica evidenciado no artigo 59 do Código Penal, e o Pacote Anticrime entende ser possível a concretização das metas da 31 punição, afinal, foi uma inovação penal, subentendendo-se que traria melhorias como a diminuição efetiva dos crimes no país. Dentre todas as modificações trazidas no pacote, neste artigo serão abordadas a modificação no limite de cumprimento de pena e os novos marcos para progressão de regime. Alteração no Limite Máximo de Cumprimento de Pena Uma das mudanças advindas da Lei nº 13.964/2019, artigo 2º, foi o tempo máximo que um indivíduo pode cumprir pena privativa de liberdade. Antes da aprovação do Pacote o máximo de duração punitiva era de 30 anos, segundo o que dispunha a redação antiga do artigo 75 do Código Penal. Agora esse tempo aumentou em 10 anos, ou seja, a pena fica no total em 40 anos, imaginou o legislador que quanto maior o período de aplicação da sanção, menor seria a criminalidade, talvez em uma crença sobre a incapacitação física do indivíduo ou no sentido de que as medidas preventivas possam surtir efeitos, contudo, antes de aumentar a dosagem penal, há necessidade de um amplo debate sobre a efetividade das penas no Brasil, uma vez que o índice de reincidência é gigantesco, o que corrobora o entendimento que a forma de punir não é eficaz. Não há garantia que a possibilidade de cumprimento de dez anos a mais de condenação proporciona o verdadeiro sucesso da garantia da segurança pública e, da redução da criminalidade, no entanto, é uma tentativa para gerar aprovação social em massa, e uma possibilidade de aplicação das propaladas finalidades da pena, haja vista que gerou um aumento considerável do limite da sanção, e do castigo imposto aos condenados. Um questionamento possível é: se aumentando de forma progressiva e brusca o prazo de cumprimento da pena não acabaram gerando a caracterização do apenado como "resíduo" da sociedade, como muitos doutrinadores tratam do chamado direito penal do inimigo, apontada por Nucci (2021), pois, quando o criminoso é visto dessa forma, além de violar os princípios da pena, não garante a recuperação do agente, o que apenas gera mais crimes e insegurança ao país, deixando todos insatisfeitos, o apenado e a sociedade por perceber a decadência do Direito Penal. Com relação a vacatio legis, deve ser salientado que o Pacote entrou em vigor no dia 23 de janeiro de 2020, por se tratar de reformatio in pejus, ou seja, reforma legislativa que prejudica o réu, a mesma não retroage em desfavor do condenado, todos os crimes cometidos antes da vacância das alterações devem ser julgados e condenados com base nas leis vigentes à época do crime, o momento consumativo do delito explicado no artigo 4º do Código Penal.Quanto a garantia de irretroatividade de lei penal mais gravosa, trata é tratado no artigo 2º, do CP, o qual 32 dispõe que “Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória”, e é elencada como garantia pelo artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal de 1988. A transformação foi aprovada sob dois aspectos que o legislador considerou de suma importância, o primeiro, foi o de dar uma esperada resposta à sociedade diante do aumento considerável de delitos cometidos nos últimos anos, e o segundo, com base no aumento da expectativa de vida dos brasileiros, buscando compreender melhor esse aspecto da visão do legislador, gostaria de fazer algumas observações, inicialmente a de que a base de cálculo de prosperidade vital utilizada esqueceu de levar em consideração as condições precárias de habitação que as penitenciárias brasileiras apresentam, que consequentemente diminuem a qualidade e expectativa de vida daqueles submetidos a prisão em regime fechado, o que fica evidente é de que dez anos a mais de encarceramento causaram uma redução na perspectiva e na condição de existência do apenado, e o pior de tudo, sem garantia real da melhora do condenado, uma vez que este é vítima de um Estado incapaz de cumprir as finalidades da pena. Visto isso, especula-se que a base para calcular esse aumento exacerbado da pena, equiparando- se a expectativa de vida foi baseada em seres humanos que possuem meios adequados de habitação, saneamento básico, alimentação, educação, trabalho e lazer, todavia, perfil dos criminosos brasileiro não se enquadra nesses aspectos levados em consideração sob a ótica elitista do legislador, há enorme divergência entre a quantidade de tempo que um indivíduo que tem acesso a serviços básicos de qualidade como a saúde e os que não chegam nem perto de a possuírem, que evidencia a despreocupação do Estado em resolver efetivamente seus problemas estruturais pelas raízes, e não ficar apenas estancando a ferida inflamada. Passando a analisar a mudança na prática, há respaldo na aplicação dessa medida e na forma com que deve ser feita no artigo alterado do Código Penal: Art. 75. O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos. § 1º Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 40 (quarenta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo. § 2º - Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena, far-se-á nova unificação, desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido. E na súmula 715 do STF, que dispõe: A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução. 33 Leia-se 40 (quarenta) anos onde o documento menciona 30 (trinta) anos, pois fora elaborado anteriormente à reforma legal, e seguindo o princípio da continuidade legal (art. 2.º da LINDB) lei posterior que altera dispositivo legal, revoga anterior que estiver em desacordo. Entendia-se que para fins de progressão de regime e benefícios da execução penal não se leva em consideração a pena máxima possível de pena privativa de liberdade, mas sim o cômputo total da sanção recebida pelo condenado, observe um exemplo prático: um sujeito é condenado por uma homícidio qualificado a 40 anos de pena total, o cálculo para descobrir quando terá direito ao recebimento de abonamentos penais é feito a partir dos quarenta anos, agora se um agente comete crimes que extrapolam (em sua somatória união) 40 anos, e cheguem a, por exemplo, 120 anos, a base para análise de concessão de favorecimento são os cento e vinte anos totais e não o máximo limítrofe de pena privativa de liberdade de quarenta anos. Isso seria possível pela interpretação do Ministro Luis Fux da Suprema Corte de que: Outra interpretação conduziria a um tratamento igual para situações desiguais, colocando no mesmo patamar pessoas condenadas a 30 anos e a cem ou mais anos de reclusão, por exemplo. Não haveria a distribuição de justiça, expressada em dar a cada um o que merece. (RHC 103.551, rel. min. Luiz Fux, 1ª T, j. 21-6-2011, DJE 163 de 25-8-2011.) Sobreveio o entendimento presente pela enorme pretensão das defesas recorrerem com base no disposto no artigo 75 do Código Penal, visto que, se torna praticamente impossível um condenado em penas altas e superiores ao teto majorante de prisão conseguir acesso a qualquer benefício, pois irá ter que ficar o limite máximo de cumprimento no regime fechado, diante de inúmeras discussões o atual entendimento não é mais o mencionado acima, pois tornaria a pena, praticamente perpétua. Outra discussão pertinente trazida à tona por Bittencourt é sobre a forma de unificação das penas nos crimes que foram cometidos em período anterior (crimes praticados até 23 de dezembro de 2020) e posterior a vigência da reforma legal, o mesmo autor, em obra específica chamada de Reforma Penal sob a ótica da Lei Anticrime, uma possível solução foi encontrada: a de para obter o valor da pena que deve ser cumprida para o sujeito gozar dos benefícios penais é a produção de um cálculo, que este possua como parâmetros a proporcionalidade relativa a cada período, veja: Certamente, não será limitada nem aos trinta anos, nem aos quarenta, ainda que, hipoteticamente, possa ter recebido a mesma condenação, para crime praticado antes do dia 23 de dezembro, e para crime praticado depois dessa data, digamos, de 25 anos de pena, para cada período diferente. Acreditamos que será recomendável fazer-se um cálculo aritmético, adotando-se, como parâmetro, a proporcionalidade relativamente aos dois períodos, crime praticado antes do dia 23 e outro praticado depois, devendo- se somar as penas unificando-as para efeitos de execução. Ah, dir-se-ia, mas então será fácil, principalmente, na hipótese de receberem a mesma pena de 30 ou 25 anos, por exemplo, nos dois períodos, como exemplificado acima. Dividir-se-ia por dois, e, http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=626606 34 consequentemente, ficaria a média em trinta ou cinco anos! (BITENCOURT, 2022, p. 39) Finaliza ressaltando que o deve ser observado pelo Juiz não é a soma das duas penas como aspecto mais relevante, mas sim a quantia de pena que o réu poderá cumprir em relação ao período anterior, afirma em suas próprias convicções expostas: “Portanto, essa proporcionalidade de tempo de pena cumprido relativamente à lei revogada será o fundamental para esse cálculo da proporcionalidade.” (BITTENCOURT, 2022, p. 39) Ainda afirma que os problemas advindos dessa obrigatória unificação de penas ainda estão por vir, afinal a mudança é recente e os crimes praticados depois de sua vigência começarão a ter sentenças condenatórias a partir do momento atual. Mudanças nos Requisitos para Progressão de Regimes Inicialmente se faz necessário compreender o que o legislador entende por progressão. Para ele seria a evolução de um regime mais rigoroso para outro de menor rigor,
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