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ANAIS DA 11ª JORNADA JURÍDICA Os Direitos Sociais e as Reformas Institucionais Imperatriz – MA, v. 3, n.3, Dez. 2019. ISSN 2594-9098 2019 Comissão Organizadora dos Anais do Evento Profa. MSc. Paula Regina Pereira dos Santos Marques Dias Profa. Esp. Leticia de Jesus Pereira Profª MSc. Francine Adília Rodante Ferrari Nabhan Profa. Msc. Adelia Solange Soares Diniz Prof. Esp. Leidiane Sousa Lima Fernandes ANAIS DA 11ª JORNADA JURÍDICA DA UNISULMA Os Direitos Sociais e as Reformas Institucionais IESMA/UNISULMA 23 e 24 de Outubro de 2019 3 Adélia Diniz UNISULMA – Bibliotecária CRB 13/507 11ª Jornada Jurídica da Unisulma : Os direitos Sociais e as reformas institucionais. Anais da 11ª Jornada Jurídica da Unisulma: Os direitos Sociais e as reformas institucionais, realizada nos dias 23 e 24 de Outubro de 2019. Imperatriz, 2019. Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão / Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão, Imperatriz, 2019. ISSN2594-9098 1 Pesquisa científica. 2 Iniciação científica. 3. Reformas Institucionais CDU 001.891 J82 APRESENTAÇÃO A 11ª Jornada Jurídica da Unisulma: Os direitos Sociais e as reformas institucionais é uma modalidade de pesquisa acadêmica desenvolvida por estudantes de graduação do curso de Direito que demonstram interesse pela pesquisa científica. Em geral, os estudantes que se dedicaram a esta atividade possuem pouca ou nenhuma experiência em trabalhos ligados à pesquisa, representando assim, uma oportunidade para os acadêmicos ingressarem na pesquisa científica. A iniciação científica é uma atividade de vital importância para os alunos de graduação, incentivando à formação de novos pesquisadores que, através de projetos de pesquisa com qualidade acadêmica, base científica e orientação adequada, desenvolvam seus conhecimentos, vivências e experiências. A 11ª Jornada Jurídica da Unisulma: Os direitos Sociais e as reformas institucionais foi realizada pelo IESMA / UNISULMA nos dias 23 e 24 de Outubro de 2019 com a finalidade de divulgar trabalhos de pesquisa, proporcionando troca de informações e experiências em ambiente propício a esta atividade. Buscou também incentivar e estimular o desenvolvimento da vocação para os campos da ciência e tecnologia em alunos de graduação, qualificar o corpo discente da graduação para o ingresso em programas de pós-graduação, aprimorar o processo de formação de profissionais da área jurídica para atuação nos diversos setores da sociedade e, ainda estimular professores e pesquisadores a engajar estudantes de graduação no processo de investigação científica. Salienta-se, que este evento, chegou a sua 11ª edição, e, assim, vem contribuindo para o desenvolvimento da pesquisa científica na área jurídica no Município de Imperatriz e região. É difícil relatar aos leitores o clima gratificante das discussões que se desenvolveram durante o evento que manteve a participação dos autores de quase 70 trabalhos e de cerca de 600 alunos inscritos. Assim é importante a divulgação dos resumos para que o leitor possa avaliar a relevância dos assuntos apresentados, como prestação de contas do nosso trabalho e como contribuição à realização de novas pesquisas. Agradecemos a todos aqueles que contribuíram para a realização deste evento, e destacamos particularmente a importância dos alunos que, de diferentes formas nos acompanharam ao longo da organização e realização do mesmo. Comissão Organizadora 11ª Jornada Jurídica da Unisulma:Os Direitos Sociais e as Reformas Institucionais. 5 Diretora Geral do IESMA/UNISULMA Joane Gláucia da Silva de Almeida e Almeida Diretora Acadêmica do IESMA/UNISULMA Raquel de Moraes Azevedo Coordenadora do curso de Direito Paula Regina Pereira dos Santos Marques Dias Coordenação Geral Profª MSc. Paula Regina Pereira dos Santos Marques Dias Coordenação Científica Profª MSc. Paula Regina Pereira dos Santos Marques Dias Profª Esp. Leticia de Jesus Pereira Coordenação Executiva do evento Prof. MSc. Miguel Daladier Barros Profª MSc. Francine Adília Rodante Ferrari Nabhan Prof. Esp. Tiago Vasconcelos Silva Profª Esp. Xermona Milhomem Costa Silva SUMÁRIO 1. ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE À LUZ DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA 2. PARADIGMA DO POSITIVISMO JURÍDICO E OS DESAFIOS DA TRIDIMENSIONALIDADE NO CONTEXTO DO PENSAMENTO COMPLEXO 3. ERA DA PÓS-VERDADE: a contribuição das Fake News na maximização e reprodução de preconceito contra a comunidade LGBTQ+ 4. SISTEMA POLÍTICO BRASILEIRO E OS IMPACTOS NOS DIREITOS SOCIAIS 5. Sistema de Capitalização Previdenciária e Sistema de Repartição Simples: breve comparativo 6. UMA ANÁLISE DA MATERNIDADE CARCERÁRIA COM BASE NA LEI N° 13.769/2018 7. O tributo, o ICMS e a importância do mesmo para o Estado do Maranhão. 8. A IMPLEMENTAÇÃO DA REMIÇÃO DA PENA PELA LEITURA, COMO CRITÉRIO DE HUMANIZAÇÃO DO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO 9. O JULGAMENTO DO TEMA 944 DE REPERCUSSÃO GERAL PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: DESCRIÇÃO E DISCUSSÃO DOS ARGUMENTOS DAS PARTES 10. REFORMA TRIBUTÁRIA: principais mudanças propostas 11. HANNAH ARENDT: O TERROR COMO FORMA DE GOVERNO 12. RELAÇÃO DE EMPREGO: uma análise das características da relação empregatícia. 13. O USO DA MÁQUINA PÚBLICA PARA PROMOÇÃO PESSOAL DE AGENTES E O PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO. 14. COMENTÁRIOS AO “PROJETO FAMÍLIA PLENA” DA 2ª PROMOTORIA CÍVEL DE IMPERATRIZ: os limites da interferência estatal à luz do melhor interesse da criança 15. NEOPROCESSUALISMO: a efetivação das ondas renovatórias de acesso à justiça somada à força normativa dos princípios 16. AS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS NA PERSPECTIVA DO PLURALISMO JURÍDICO 17. AGRONEGÓCIO E AS PRÁTICAS SUSTENTÁVEIS: desafios e perspectivas 18. MÉTODOS ALTERNATIVOS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NA ADVOCACIA PREVENTIVA. 19. APLICAÇÃO DA LEI Nº 11.340 DE 07.08.2006 (LEI MARIA DA PENHA) PARA OS TRANSEXUAIS E TRANSGÊNEROS 20. AS LIMITAÇÕES DO POSITIVISMO JURÍDICO FRENTE À AXIOLOGIA NO DIREITO 21. BANDERSNATCH: UMA CRÍTICA AO CONTROLE MIDIÁTICO DE MASSAS POPULACIONAIS FRENTE A ERA DIGITAL 22. MULHERES NO CÁRCERE E PRISÃO PREVENTIVA: ANÁLISE DO HABEAS CORPUS COLETIVO N° 143.641. 23. POSITIVISMO JURÍDICO, COMPLEXIDADE E O PENSAMENTO CRISTÃO: um olhar de René Girard sobre a violência. 24. FILOSOFIA MEDIEVAL: as formas jurídicas da Era Medieval 25. LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DIREITO À INFORMAÇÃO: O impulsionamento de discurso de ódio nas redes sociais em tempos de pós-verdade. 7 26. A EQUIPE MULTIPROFISSIONAL ENQUANTO INSTRUMENTO PARA O EFETIVO DIREITO À EDUCAÇÃO 27. ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL GARANTIA DE ATENDIMENTO NA ESCOLA MUNICIPAL PROFESSOR JOSÉ QUEIROZ 28. DIREITO EDUCACIONAL: o acesso à cidadania por meio conhecimento 29. A (IN) EFICÁCIA DO SERVIÇO DE REABILITAÇÃO PROFISSIONAL OFERECIDO PELO INSS FRENTE A OMISSÃO DO BENEFICIÁRIO A SUBMETER-SE AO PROCESSO DE REABILITAÇÃO NO MUNICÍPIO DE IMPERATRIZ/MA 30. A VIOLÊNCIA COMO CONTRATEMPO PARA A EFETIVAÇÃO DO DIREITO A EDUCAÇÃO PÚBLICA 31. A REFORMA DA PREVIDÊNCIA E SEUS REFLEXOS NO PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DO RETROCESSO 32. O ENFRENTAMENTO DAS SITUAÇÕES DE DEPENDÊNCIAS E CONSUMO DE DROGAS NO ÂMBITO ESCOLAR 33. O DIREITO DE BRINCAR COMO DIREITO FUNDAMENTAL DE PROTEÇÃO À INFÂNCIA 34. O PORNÔ DE VINGANÇA NO CONTEXTO DA VIOLÊNCIA DE GÊNERO: CRÍTICA CRIMINOLÓGICA AO PATRIARCALISMO. 35. INFLUÊNCIA DA FAMILIA NO ENSINO ESCOLAR 36. O NOVO ENTENDIMENTO DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO SOBRE A PROVA TESTEMUNHAL PARA A CONCESSÃO DA PENSÃO POR MORTE EM UNIÃO ESTÁVEL 37. O PACIENTE PORTADOR DA NEOPLASIA MALIGNA E OS ASPECTOS CONSTITUCIONAIS SOBREO DIREITO À SAÚDE. 38. FILOSOFIA MEDIEVAL: o Cristianismo e a Filosofia 39. DA AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE MÓVEL: da confusão 40. FÉ E RAZÃO EM TOMÁS DE AQUINO 41. CONTINGENCIAMENTO DE VERBAS NA EDUCAÇÃO: UMA OFENSA AO DIREITO SOCIAL À EDUCAÇÃO 42. A ADAPTAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DAS CIÊNCIAS JURÍDICAS FACE A REFORMA TRABALHISTA E O CLAMOR SOCIAL ANTE A “REFORMA POLÍTICA 43. O SISTEMA DE CAPITALIZAÇÃO: uma análise crítica dos possíveis impactos ocasionados pela reforma da previdência 44. A LEI Nº 13.844/2019 E OS IMPACTOS NA GARANTIA DO DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL SOCIAL À ALIMENTAÇÃO 45. A POLÍTICA CRIMINAL DE GUERRA ÀS DROGAS E O RECRUDESCIMENTO DO ENCARCERAMENTO FEMININO NO BRASIL. 46. AS POSSIBILIDADES DO CONHECIMENTO: correntes filosóficas ao tocante âmbito jurídico 47. HANNAH ARENDT: O TERROR COMO FORMA DE GOVERNO 48. A INSTITUCIONALIZAÇÃO DE MENORES E O DIREITO Á CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA 49. A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA OBRIGATORIEDADE DE EXTRAÇÃO DE DNA CONSTANTE DO DENOMINADO PACOTE ANTICRIME. 8 50. POPULISMO PENAL MIDIÁTICO: a exploração comercial e política do crime 51. FILOSOFIA MEDIEVAL: escolástica na idade média 52. A ATUAÇÃO DO CEJUSC E A CONTRIBUIÇÃO NAS DEMANDAS JUDICIAIS DE IMPERATRIZ 53. A IMPORTÂNCIA DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL PARA OS SINDICATOS E SEUS IMPACTOS PÓS REFORMA TRABALHISTA 54. DIREITO POSITIVO E O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA 55. FILOSOFIA MEDIEVAL: a metafísica da relação entre a fé e a razão 56. FILOSOFIA MEDIEVAL: João Duns Escotos e a Teoria da Univocidade do Ser 57. A REGULAMENTAÇÃO DA JORNADA 12x36 SOB A ÉGIDE DA REFORMA TRABALHISTA 58. POLÍTICAS PÚBLICAS E JUSTIÇA SOCIAL NO DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO 59. ASPECTOS HISTÓRICOS E GERAIS DA TEOLOGIA MEDIEVAL 60. O DIREITO AO ESQUECIMENTO E A DICOTOMIA: ABUSO DE INFORMAÇÃO X LIBERDADE DE EXPRESSÃO NO CASO DA CHACINA DA CANDELÁRIA 61. A COBRANÇA DOS IMPOSTOS INDIRETOS EM CONTRAMÃO AO PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA 62. OS FUNDAMENTOS EPISTEMOLÓGICOS DA SOCIOLOGIA E SUAS CORRELAÇÕES COM A NORMA JURÍDICA DE HANS KELSEN 63. A INSTRUMENTALIZAÇÃO POLÍTICA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS CONTEMPORÂNEOS NO BRASIL 64. FEMINISMO JURÍDICO: a luta pela equidade no Poder Judiciário 65. O DIREITO TRIBUTÁRIO COMO GARANTIA DOS DIREITOS SOCIAIS 66. DE CABRAL À LEI COMPLEMENTAR 150: historicidade do trabalhador doméstico e discussão dos efeitos da reforma trabalhista 67. LINCHAMENTOS NO MARANHÃO E A MOVIMENTAÇÃO DE VIOLAÇÕES A DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO BRASILEIRO 9 Direito 10 ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE À LUZ DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA Genilza Sipiao Oliveira1 Katiane da Silva Viana2 Francine A. Rodante Ferrari Nabhan3 Este resumo objetiva analisar o princípio da anterioridade tributária, expresso no art. 150, III, alínea “b”, “c” da Constituição Federal. Para Alexandre Mazza (2018, p. 267) sua finalidade é dar um prazo de respiro a fim de que o contribuinte possa preparar se para pagar novos valores ao fisco. A partir da EC/2003 o princípio passou a funcionar combinando a anterioridade anual e a nonagesimal. Para aplicar-se os mesmos analisa - se caso a caso a fim de tornar o mais distante possível a data da exigência do tributo, deste modo, visa, garantir um intervalo mínimo de 90 dias entre as datas da publicação da lei e da efetiva cobrança do tributo (princípio da carência, aplicando separadamente as duas anterioridades sobre o dia em que foi publicada a lei que majorou ou instituiu o tributo). Alguns impostos que tem a finalidade de regular a economia (impostos extra fiscais) como o Imposto de Importação (II), Imposto de Exportação (IE), Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), além dos Impostos Extraordinário de Guerra e os Empréstimo Compulsório são exceções a esta regra, pois sua cobrança ocorre de maneira imediata. Enquanto, os Impostos sobre produtos Industrializados (IPI), Contribuições Sociais, bem como a CIDE Combustível e ICMS combustível respeitam apenas a anterioridade nonagesimal. Por fim, temos o Imposto de Renda, IPTU e IPVA que somente respeitam a anterioridade anual. Quando existe a redução de desconto no pagamento ou alteração do prazo legal para recolhimento do tributo, não incide o princípio da anterioridade. Ao longo deste trabalho, busca-se analisar todos os impostos previstos na Constituição Federal à luz do principio da legalidade. Como metodologia utilizou-se a pesquisa qualitativa com base de análise bibliográfica. Ao final, verifica-se que o princípio da anterioridade, constitui uma limitação ao poder impositivo do Estado e uma conquista político jurídica dos contribuintes tendo a finalidade de coibir a tributação de surpresa, permitindo o razoável tempo de espera para o evento e gerando uma segurança jurídica entre a Administração e os administrados. Palavras-chave: Sistema Tributário Nacional; Princípio da anterioridade; Princípio da não surpresa 1Acadêmica do 9 período do Curso de Direito da IESMA/UNISULMA. Email:genilza2819@hotmail.com 2Acadêmica do 9 período do Curso de Direito da IESMA/UNISULMA. E-mail: katiane_s.viana@hotmail.com 3 Orientadora, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional – Universidade de Taubaté – (UNITAU), Especialista em Direito e Processo do Trabalho (UNITEC), Especialista em Direito Civil (UNISUL) Pós graduanda em Direito Tributário (Damásio). Pesquisadora do grupo de estudos Direitos Fundamentais e Novos Direitos da IESMA/UNISULMA. Professora do curso de graduação em Direito da UNISULMA/ IESMA. E-mail: francinenabhan@hotmail.com 11 O PARADIGMA DO POSITIVISMO JURÍDICO E OS DESAFIOS DA TRIDIMENSIONALIDADE NO CONTEXTO DO PENSAMENTO COMPLEXO Esdra Salomão Pereira da Silva4 Wanderson Wendel Noronha Lô5 RESUMO: O presente artigo tem como objetivo discutiro paradigma do positivismo jurídico e os desafios da tridimensionalidade no contexto do pensamento complexo. Ademais, buscou-se através deste trabalho evidenciar o processo de decadência do positivismo na esfera das ciências exatas quanto no universo das ciências jurídicas, em detrimento, a ascensão do pensamento complexo de Edgar Morin no meio científico e a elevação da tridimensionalidade jurídica de Miguel Reale.A pesquisaé de natureza qualitativa, com caráter exploratório. A pesquisa mostrou que são grandes os desafios na promoção de um diálogo entre o paradigma positivista jurídico frente os desafios da tridimensionalidade no contexto do pensamento complexo. A pesquisa esclareceu ainda que o positivismo jurídico é uma concepção incapaz de corresponder sozinha as impertinências da justiça social. Pois, se, por um lado, assiste-se uma maior segurança jurídica, por outro lado, ao preconizar o monopólio da lei por intermédio das limitações estatais, mostra-se totalmente indiferente a aqueles que requerem a sua intervenção para alcançar o mínimo de dignidade. Palavras-Chave:Positivismo Jurídico. Fragmentação. PensamentoComplexo. TridimensionalidadeJurídica. ABSTRACT: This article aims to discuss the paradigm of legal positivism and the challenges of three-dimensionality in the context of complex thinking. In addition, this paper sought to highlight the process of decay of positivism in the sphere of exact sciences as in the universe of legal sciences, to the detriment of the rise of Edgar Morin's complex thinking in the scientific environment and the elevation of the legal three-dimensionality of Miguel Reale. . The research is qualitative, exploratory in nature. Research has shown that the challenges in promoting a dialogue between the positivist legal paradigm and the challenges of three-dimensionality in the context of complex thinking are great. The research also clarified that legal positivism is a conception unable to correspond alone to the impertinences of social justice. For if, on the one hand, there is greaterlegal certainty, on the other hand, by advocating the monopoly of the law through state limitations, it is totally indifferent to those who require its intervention to achieve the minimum of dignity. 1Acadêmico do quarto período do curso de Direito da UNISULMA. (esdra_789@hotmail.com) 2Professor de Filosofia do Direito da UNISULMA. Mestre em Educação pela Universidade Católica de Brasília - UCB. Especialista em Didática Universitária e em Gestão Escolar. Licenciado em Filosofia, Pedagogia e Teologia. Contato para consultoria em pesquisa: (wandersonlo@hotmail.com). 12 Keywords:Legal positivism. Fragmentation. Complex thinking. Legal three- dimensionality. INTRODUÇÃO O pensamento complexo ou a complexidade de Edgar Morin apresenta-se como uma nova proposta epistemológica e ontológica, que possui como objetivo norteador a superação da fragmentação e simplificação presentes no bojo do paradigma positivista. Apesar de o termo remeter a algo de difícil compressão, complexo ou complexidade, na verdade refere- se a tecido junto, produzindo um elo entre a unidade e multiplicidade (LÔ, 2012; MORIN, 2006). Nesta linha de raciocínio, Morin explica que a complexidade desempenha a função de um principio regulador do pensamento, o qual concebe a realidade de um modo unificado, em oposição a visão positivista que a concebe de modo fragmentado. Com isso, a complexidade possibilita a reintegração de áreas do conhecimentohumano antagonizadas pelo princípio fragmentador do ideal positivista como, por exemplo, arte e ciência, fé e razão, homem e natureza. Portanto, trata-se de uma rede com interconexões pautada na transdisciplinaridade, que visa romper com paradigma dicotômico, fragmentário e reducionista massificado pelo pensamento positivista através da ciência moderna (MORAES, 2004; NASCIMENTO, 2008). Já a tridimensionalidade jurídica é uma concepção no âmbito jurídico que visa sanar as inúmeras falhas presentes no positivismo jurídico, por meio da inserção do componente valor no momento da análise da norma jurídica produzida por um fato com repercussões nessa esfera. Aliás, vale ressaltar-se que o positivismo jurídico foi o responsável pela legitimidade de inúmeras atrocidades cometidas por regimes totalitários ao longo do século passado.Pois tais regimes, simplesmente desprezavam a existência de direitos fundamentais inerentes a pessoa humana, tendo em vista o total repúdio a conceitos metafísicos presentes no cerne do pensamento positivista. 1. O positivismo jurídico Francesco Carnelutti (1960), no estudo intitulado “Balanço do Positivismo Jurídico”, fala-nos que o positivismo jurídico é espécie jurídica do gênero positivismo, sendo, portanto, a projeção do positivismo filosófico no setor do Direito (NADER, 2002, p.369). 1.1 O positivismo filosófico 13 O positivismo filosófico teve início no século XIX, na ascensão da metodologia experimental, no âmbito científico-natural.O positivismo pretendeu transportar o método para o campo das ciências sociais. De acordo com essa metodologia, o trabalho científico deveria basear-se na observação dos fatos que poderiam ser comprovados pela via experimental. A mera abstração, dedução ou especulação, não possuíam compatibilidade com discurso científico, e, com isso, deveriam ser totalmente desqualificadas (NADER, 2002). A metodologia experimental, adotada pelo positivismo, constitui-se fundamentalmente de três fases: A primeira é a observação, o ponto de partida. A segunda é a formulação de hipótese, fase essa que é caracterizada pela formulação de hipótese através da observação de fatos sucessivos. Já a terceira é a experimentação, fase na qual a hipótese formulada é colocada à prova. Caso obtenha êxito, ou seja, caso seja comprovada, adquire o status de conhecimento científico. Augusto Comte (1798- 1857) é considerado o fundador dessa corrente filosófica, através da sua obra Curso de Filosofia Positiva, composta de seis volumes. Ao longo de sua obra, há dois aspectos que se destacam. Primeiramente, a lei dos três estados, segunda a qual o pensamento humano, ao longo da história, passou por três etapas. A primeira é mitológica ou teológica, etapa na qual os fatos eram explicados por meio das "atividades divinas". A segunda é a metafísica, etapa na qual as explicações provinham de princípios abstratos. Contudo, o que a diferencia da etapa teológica, é o fato de suas explicações pautarem-se no plano especulativo filosófico. E, em virtude disso, a natureza seria explicada pelas suas causas e finalidades. A terceira e última é a positiva, etapa essa que representa uma reação às duas primeiras. Caracteriza-se pelo exame empírico dos fatos. Ironicamente, apesar de ser um dos pensamentos permeadores do discurso positivista, alguns autores qualificam a "lei dos três estados" de metafísica, pois, não pode fazer uso da metodologia científica para ser comprovada. Em segundo plano, a classificação das ciências, aonde Comte formulou uma classificação das ciências, fazendo uso do seguinte critério: caminhar das mais gerais às mais específicas, concomitantemente, das mais simples às mais complexas. A ordem foi a seguinte: Matemática, Astronomia, Física, Química, Biologia, Sociologia. Entretanto, essa classificação é incompleta, pois contempla apenas as ciências da matéria, deixando de lado as ciências do espírito. Ademais, para Comte o Direito era uma mera seção da Sociologia e a Psicologia, devido a isso, denominou-a de "biologia transcendental" (NADER, 2002). 1.2 O positivismo jurídico O positivismo jurídico mantendo-se fiel aos princípios filosóficos positivos repudia todos os elementos abstratos do Direito, primordialmente, a ideia de Direito Natural, pois a julga metafísica e anticientífica. “Em seu afã de focalizar apenas os dados fornecidos pela 14 experiência, o positivismo despreza os juízos de valor, para se apegar apenas aos fenômenos observáveis” (NADER, 2002, p.370). De acordo com essa corrente jurídica o objeto da Ciência do Direito deve abster-se ao estudo das normas que compõe o ordenamento jurídico vigente. Nessa tarefa o investigador deverá fazer uso apenas dos juízos de contestação ou juízos de realidade, rejeitando os juízos de valor. No que se refere à justiça, a corrente positivista mantêm-se absolutamente cética. Pois, considera-a um ideal irracional, pelo fato de ser acessível apenas pela via emocional. Para o positivismo jurídico existe somente uma ordem jurídica: a emanada do Estado e que é soberana. Eis, na opinião de Eisenmann, um dos críticos do Direito Natural, a proposição que melhor caracteriza o positivismo jurídico: “Não há mais Direito que o Direito Positivo” (EISENMANN, 1966, p.276). Além disso, o jus positivismo satisfaz-se plenamente com o plano ontológico do Direito Positivo, sem cogitar-se sobre o plano deontológico jurídico, a forma ideal do Direito. Assim, para o adepto dessa corrente a lei assume o papel de valor único. Admite-se apenas o método indutivo como válido, pois este se baseia nos fatos experimentais. Já o método dedutivo é recusado cientificamente, pelo fato do meio científico considerá-lo dogmático. Porém, o uso do método dedutivo é aceito no âmbito científico quando atendidas determinadas condições, todavia, as conclusões obtidas por esse método nada serão além de meras hipóteses. A chamada Escola da Exegese, já vencida pelo tempo, desenvolveu programa típico do positivismo. Essa Escola defendeu o fetichismo legal. A sua doutrina era o codicismo. Segundo essa doutrina, o código tinha a solução para todos os problemas. O Direito encontra-se exclusivamente na lei. 1.3 A decadência do discurso positivista jurídico O positivismo jurídico encontra-se em decadência, após viver o seu auge no início do século XX. “Surgiu em um período crítico da história do Direito Natural, durou enquanto foi novidade e entrou em declínio quando ficou conhecido em toda asua extensão e consequências” (NADER, 2002, p.371). Tendo por base a metodologia científica-natural, na observação e análise dos fatos concretos, a corrente filosófica positivista reduziu o significado humano. O ser complexo, que é o homem, passou a ser visto como um mero prodígio da Física a ser explicado pelo princípio "linear" da causalidade. No que diz respeito à justiça, o positivismo a considera um ideal irracional, pois se faz necessário o uso da via emocional para alcançá-la, o que abrange o âmbito axiológico, algo que é completamente repudiado pelo positivismo. A sua atenção encontra-se voltada exclusivamente para o plano do ser jurídico, desconsiderando por completo o que há em seu conteúdo. Identificando o Direito com a lei, o positivismo jurídico é uma porta aberta para a ascensão de regimes totalitários, fato esse que se assistiu ao longo do século passado (GALVÃO DE SOUSA, 1977). O positivismo jurídico é uma doutrina incapaz de satisfazer as exigências da justiça social. Se, de um lado, assiste-se ao favorecimento do valor segurança, pelo outro lado, ao 15 defender o monopólio da lei atravésdas limitações estatais, mostra-se totalmente inerte a aqueles que necessitam de sua intervenção para alcançar o ideal de vida digna. O Direito não compõe-se exclusivamente de normas. As regras jurídicas possuem sempre um valor. O jus positivismo apegou-se somente ao concreto. Os limites impostos ao Direito foram muitos estritos ante a grandiosidade e importância que o Direito possui. A lei por si só é incapaz de abarca todo o ideal de justiça. A lei, sem condicionantes, é uma arma que pode ser usada tanto para bem quanto para o mal.O mérito que Carnelutti vê no positivismo é conduzir a atenção do analista para a descoberta do Direito Natural: “A observação daquilo que se vê é o ponto de partida para chegar àquilo que se não vê” (CARNELLUTI, 1960, p.289). 2 A tridimensionalidade jurídica O simples fato de existirem várias acepções da palavra Direito deve suscitar a seguinte pergunta: esses significados que, através do tempo, têm sido atribuídos a uma mesma palavra, já não revelam a existência de diferentes aspectos complementares na experiência jurídica? Apesar de o tridimensionalismo estar implícito na obra de vários autores, como a de Emil Lask, Gustav Radbruch, Roscoe Pound e em todas as concepções culturalistas do Direito, é justamente com Miguel Reale que encontra a sua formulação ideal e que o credencia como rigorosa teoria (NADER, 2002, p.377). O fenômeno jurídico, independentemente da forma que venha expressar-se requer a participação dialética implicação-polaridade do fato, valor e norma. A originalidade do jus filósofo brasileiro encontra-se na maneira como descreve o relacionamento entre esses três componentes. Enquanto que para as fórmulas genéricas ou abstratas, os três elementos vinculam-se através de uma adição, aonde geralmente um tende a sobrepor-se aos outros, na concepção de Reale (1975), denominada específica ou concreta, a realidade fático- axiológico-normativa apresenta-se como uma unidade, havendo uma implicação dinâmica. Cada qual faz referência aos demais e por isso só alcança sentido no conjunto. Além disso, onde quer que haja um fenômeno jurídico, há, sempre e necessariamente, um fato um valor, que confere determinada significação a esse fato, inclinando ou determinando a ação dos homens no sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou objetivo; e, finalmente, uma regra ou norma, que representa a relação ou medida que integra um daqueles elementos ao outro, o fato ao valor (REALE, 1976). O Direito não possui uma estrutura simplesmente factual, como querem os sociólogos.valorativa, como proclamam os idealistas.normativa, como defendem os normativistas (SICHES, 1970). Essas visões são parciais e não abrangem toda complexidade envolvendo um fenômeno jurídico. Juntos formaram uma síntese integradora, na qual cada elemento é explicado pelos demais e pela totalidade do processo. 16 As Lebenverhaltnis - relações da vida - são a fonte material do Direito. Ao disciplinar uma conduta, a ordem jurídica estabelece um modelo aos fatos da vida social, uma fórmula de vivência coletiva. O fato é o acontecimento social ao qual o Direito objetivo faz referência. É o fato interindividual que envolve interesses básicos humanos e com isso enquadra-se nos assuntos regulados pelo ordenamento jurídico. O valor é o elemento moral do Direito, é a perspectiva sobre o ideal de justiça. Toda ação humana possui um valor. A norma jurídica é um padrão de comportamento social, imposto pelo Estado aos indivíduos que o constituem, que devem fazer sua observância em determinadas circunstâncias. Fato, valor e norma encontram-se intimamente vinculados. Há uma interdependência entre os três componentes. A referência de um deles implica, necessariamente, a referência dos demais (GUSMÃO, 1955). Para Reale (1976), o Direito é fruto da experiência e localiza-se no âmbito cultural. Constituído por três fatores, o Direito é formado da seguinte maneira: Um valor - podendo ser mais de um - incide sobre um prisma e refrata-se em um grupo de normas possíveis, cabendo ao Estado a escolha. O jus filósofo ressalta o fato de toda lei possuir vários caminhos. Contesta, entretanto, o decisionismo, que erra ao exagerar o poder de escolha. No que tangencia ao fato, pontua que nunca é um fato isoladamente, e sim um conjunto de circunstâncias, muitas vezes alheias à vontade do indivíduo. Na perspectivatridimensionalista de Miguel Reale, o fenômeno jurídico é uma realidade fático-axiológico-normativa, que se revela como um produto histórico-cultural, direcionado para a realização do bem comum. À medida que rejeita o historicismo absoluto, concomitantemente, não admite que sejam meta-históricos. A ênfase que é dada a experiência não abstrai a concepção jus naturalismo em termos realistas. Apesar de sua natureza dinâmica, o Direito possui um núcleo resistente, uma constate axiológica, que não se encontra sujeito às mudanças históricas (NADER, 2002). Ademais, o jus filósofo brasileiro Miguel Reale definiu o Direito como “realidade histórico-cultural-tridimensional, ordenada de forma bilateral atributiva, segundo valores de convivência”. A bilateralidade-atributiva é específica do fenômeno jurídico, pois apenas ele confere a possibilidade de exigir-se um comportamento. Portanto, a compreensão completa do Direito somente pode ser alcançada através da correlação unitária e dinâmica das três dimensões da experiência jurídica, que se confunde com a história da humanidade na sua busca incessante pela harmonizaçãodo ser com o deve ser. 3 O pensamento complexo O pensamento complexo ou a complexidade apresenta-se como uma nova proposta epistemológica e ontológica, na superação da fragmentação do conhecimento valorizadopeloparadigmacartesiano. Para Morin (2006), complexidade funciona como um princípio regulador do pensamento, para conceber a realidade dando-lhe um tratamento sem fragmentá-la (LÔ, 2012). “O paradigma clássico, que circunscreve os parâmetros de atuação da ciência moderna, vem perdendo, gradualmente, a sua capacidade explicativa” (ESTRADA, 2009, 17 p.86). De acordo com Edgar Morin (2001), a perda da capacidade explicativa científica não se deve, exclusivamente, a sua metodologia, mas também a disparidade entre a maneira como a ciência moderna concebe o mundo e como realmente ele é. Ou seja, enquanto a ciência moderna acredita que o mundo seja regido pelo determinismo, na verdade ele compõe-se por um conjunto de relações complexas que transcendem a análise simplificadora e reducionista do saber científico.Jáque,os fatos científicos são meros recortes da realidade que buscam explicá-la por completo. A ciência moderna tem como partida o pressuposto de que o mundo é estável, por ser constituído por um conjunto de sistemas estáveis e que tais sistemas são regidospor um regramento natural que se caracteriza pela estabilidade e pela ordem. Contudo, a mesma ciência admite a existência de sistemas instáveis dentro desse mundo, mas somente como meras exceções. Entretanto, ao longo do seu processo histórico, a ciência vem chegando à constatação de que tal raciocínio é ilusório, pois a mesma por intermédio de várias de suas constituintes, em especial a física, chegou ao parecer de que a desordem e instabilidade não são exceções desse mundo, e sim regras (PRIGOGINE, 1999). E tal afirmação torna-se mais evidente, quando nos deparamos com várias teorias da física quântica que inserem a figura da desordem e da incerteza, vide a teoria do caos e o princípio da incerteza de Heisenberg. Além disso, com o predomínio da desordem e instabilidade, houve a introdução das múltiplas possibilidades, e com isso, a limitação da previsibilidade, que até pouco tempo caracterizava o paradigma cientifico (WALLERSTEIN, 2002). E com isso assiste-se a decadência da corrente determinista no âmbito cientifico, pois tal corrente prega a ideia de que tendo-se conhecimento das condições iniciais de um dado processo, podemos prever o seu final ou até mesmo retrocedê-lo. Porém, o cientista na sua visão fragmentadora, simplificadora e reducionista rejeita uma série de elementos fundamentais na análise de um dado processo, o que acaba por impossibilita não apenas a exatidão do resultado, mas também uma maior proximidade da exatidão desse resultado. Sob o mesmo ponto de vista, para Bachelard, não existe teorias e conceitos simples e sim conceitos e teorias simplificados pela ciência. Como exemplo da inexatidão da simplificadora e reducionista metodologia cientifica pode citar-se a Economia, uma vez que foi incapaz de prever as diversas crises econômicas que assolaram o mundo nas últimas décadas, apesar de fazer uso e “abuso” do método científico (PRIGOGINE, 1996). Aliás, os especialistas econômicos detêm o monopólio da decisão (vide o Ministério da Fazenda), e com isso inibe exposição de ideias dos “leigos”. Porém, tais especialistas são incapazes de solucionarem novos problemas, apenas os já existentes. Ademais, pode dar-se como exemplo da decadência do discurso determinista a criação e ascensão da lógica difusa. Essa lógica visa opor-se a dicotomia encontrada na lógica formal, inserido a multiplicidade de possibilidades, visando enquadra o conteúdo lógico ao mundo real e não o mundo real ao conteúdo lógico. Nas palavras de Albert Einstein: “Na medida em que as leis da matemática se referem à realidade, não são certas, e na medida em que são certas, não se referem à realidade” (DEMO, 2000, p.93). 18 Nesse sentido, há o neo-obscurantismo, que se refere à fragmentação do objeto de estudo científico, o que impede a comunicação das várias disciplinas científicas e resulta não reflexão sobre os dados obtidos, o que origina as ideias gerais e infundadas. Por outro lado, há uma contradição, visto que, simultaneamente, fragmenta-se através da criação de disciplina (especializações) e une-se através da elaboração de teoria. A ciência é complexa, pois se apoia no empirismo e racionalismo como também na imaginação e verificação. Haja vista, os vários conceitos e ideias metafísicas que a compõe, por exemplo, a themata (uma ampla concepção da realidade que impulsiona a elaboração científica, porém não sujeita à verificação, tem-se como exemplo a themata platônica através do mundo inteligível) e paradigma (uma concepção universal a qual partir um conjunto de teorias que estão sujeitos à refutação, pode citar-se como exemplo o paradigma quântico). Em síntese, a ciência lida com questões que vão além do mundo empírico e da fragmentação, sendo assim faz-se necessário uso do pensamento complexo para melhor compreendermos o mundo estamos inseridos. 4 A complexidade e a tridimensionalidade jurídica Ao longo deste artigo, abordou-se a decadência do discurso positivista, não apenas no âmbitofilosófico, mas também na esferajurídica. Ao passo que assistiu-se a ascensão do tridimensionalismo, especialmente de Miguel Reale, no mundo jurídico, assiste-se a elevação do pensamento complexo de Edgar Morin no universo filosófico. Tanto o pensamento complexo quanto a tridimensionalidade jurídica originaram-se das inúmeras deficiências presentes no paradigma positivista. Primeiramente, ambos buscam não apenas inserir a subjetividade em suas respectivas realidades, e sim, explicitá-las em tais realidades, pois, como bem destaca Edgar Morin por meio de sua obra Ciência com consciência(1982), toda obra humana encontra-se impregnada de subjetividade. Além disso, tanto Edgar Morin quanto Miguel Reale compartilham de ideias convergentes naquilo diz respeito ao papel que o homem desempenha na obtenção do conhecimento. Para os dois pensadores, o ser humanonão é um mero “espectador” em tal processo, como prega a ideologia positivista, e sim, parte integrante do processo estudado. Este pensamento encontra-se presente na tridimensionalidade jurídica quando afirma-se que o Direito é fruto do processo histórico e cultural, o que justificaria o seu dinamismo, em oposição a estaticidade enraizada no viés positivista. Já na complexidade de Morin (1982), tal aspecto verifica-se quando o pensador francês afirma que a total objetividade nos estudos científicos é impossível, pois, como já abordado, toda obra humana encontra-se impregnada de subjetividade. Contudo, segundo o mesmo pensador, essa subjetividade desempenha papel fundamental em uma melhor compreensão das ciências sociais, por possuir como objeto de estudo o próprio homem em sociedade. Por último, vale a pena ressaltar-se, a teoria do agir comunicativo do filósofo alemão Jürgen Habermas, aonde se propõem que em vez de o intérprete da norma jurídica colocar- 19 se de um modo neutro, em relação ao objeto, o mesmo deveria projetar a sua experiência pessoal no modo de ver a lei, e tal experiência adquiria-se na medida de sua participação no meio social. Em suma, à medida que o positivismo filosófico e jurídico surgiu com intuito de suprir as lacunas presentes no discurso filosófico e no Direito Natural, o pensamento complexo e a tridimensionalidade jurídica ascendem visando sanar as diversas inconsistências encontradas no paradigma positivista. CONCLUSÃO Reconhecemos que não são poucos os desafios na promoção de um diálogo entre o paradigma positivista jurídico frenteos desafios da tridimensionalidade no contexto do pensamento complexo. Dito isso, a pesquisa mostrou que o positivismo jurídico é uma concepção incapaz de correspondersozinha as impertinências da justiça social. Pois, se, por um lado, assiste-se uma maior segurança jurídica, por outro lado, ao preconizar o monopólio da lei por intermédio das limitações estatais, mostra-se totalmente indiferente a aqueles que requerem a sua intervenção para alcançar o mínimo de dignidade. Naquilo que faz referência a tridimensionalidade jurídica, a compreensão completa do Direito somente pode alcançar-se por meio da correlação unitária e dinâmica das três dimensões da experiência jurídica, ou seja, fato, valor e norma. Já no que refere-se a complexidade de Morin, ficou claro que a ciência lida com questões que transpõem o mundo empírico e a fragmentação. Devido a isso,torna-se necessário ouso do pensamento complexo para uma melhor compreensãodo mundo no qual estamos inseridos. E por fim, ao passo que o positivismo filosófico e jurídico surgiu objetivando o suprimento de lacunas encontradas no discurso filosófico e no Direito Natural, o pensamento complexo e a tridimensionalidade jurídica ascendem visando o saneamento de diversas inconsistências presentes no paradigma positivista. REFERÊNCIAS CARNELUTTI, Francesco. “Balanço do Positivismo Jurídico”, in Heresias do Nosso Tempo. Porto:Livraria Tavares Martins, 1960. DEMO, Pedro. Certeza da incerteza: ambivalência do conhecimentoe da vida. Brasília: Plano, 2000. EISENMANN, Charles.El Jurista y el Derecho Naural, Critica del Derecho Natural. Madrid: Taurus, 1966. 20 ESTRADA, Adrian Alvarez. Os fundamentos da teoria da complexidade em Edgar Morin. Umuarama:Akrópolis, v. 17, n. 2, p. 85-90, abr./jun. 2009. GALVÃO DE SOUSA, José Pedro. Direito natural, direito positivo e estado de direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977. GUSMÃO, Paulo Dourado de. O Pensamento Jurídico Contemporâneo. 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Nesse prisma, surge um protagonista perigoso que vem ganhando espaço nos debates, que são as fake news. Bakir e McStay definem notícias falsas como “totalmente falsas ou que contêm elementos deliberadamente enganosos incorporados no seu conteúdo ou contexto” (Bakir&McStay, 2018, p.2). Durante o ano de 2018, a presença desse tipo de notícia tornou-se mais evidente durante as eleições. Segundo uma pesquisa feita pela Transparência Internacional, que tem como resultado o número de 82% de brasileiros que afirmam que o uso de fake news influenciou no produto das eleições passadas. Uma das principais e mais divulgadas fake news, foi a do kit gay. Tal notícia, propagada na campanha de Jair Bolsonaro, juntamente com o uso do termo ideologia de gênero – no sentido negativo - ajudam na validação e maximização do preconceito e violência contra a comunidade LGBTQ+. Nesse sentido, o presente artigo tem por objetivo analisar o impacto das fake news envolvendo a comunidade LGBTQ+ na legitimação e perpetuação do preconceito contra esse grupo. Para tanto, partiu-se do método dedutivo, pois o conceito geral do termo fake news foi analisado sociogicamente para então abordar notícias falsas específicas contra a comunidade em comento. Utilizou-se como procedimento metodológico de revisão bibliográfica sobre o tema e, posteriormente, análise documental de algumas notícias e pesquisas específicas que foram abordadas ao longo do trabalho. Falas como “ideologia de gênero é uma forma de ensinar meninos a brincarem de boneca” ou mostrar o livro errado de maneira proposital, durante entrevista, ainda na campanha eleitoral para validar uma segunda fake news, a do kit gay, ajudam a disseminar o ódio compartilhado por parcelada da sociedade. O elo que liga tais inverdades e a vitória presidencial é uso de forma profissional de sistemática para propagação de inverdades, fazendo com que atinja uma maior massa. Com a repetição de inverdades como estas ocasiona uma demonização do grupo LGBTQ+, fazendo com que direitos fundamentais sejam impugnados e que haja uma disseminação de preconceito. Isso pode ser observado, em mudanças práticas já implementadas como por fim no uso da grafia “genitores” nos passaportes infantis como vinha sendo usado, trazendo o direito de reconhecimento legal de 6Mestra em Direito e Instituições do Sistema de Justiça da Universidade Federal do Maranhão (PPGDIR/UFMA). Advogada pela OAB/MA. Contato: fernandaarrudaledal@gmail.com 7Acadêmico do 6° período matutino do Curso de Direito do Instituto de Ensino Superior do Superior do Sul do Maranhão (IESMA). Contato: sampaiom.jv16@gmail.com 8 Acadêmica do 6° período matutino do Curso de Direito do Instituto de Ensino Superior do Superior do Sul do Maranhão (IESMA). Contato: paulozz16@hotmail.com 23 famílias homoafetivas, nesse caso, e a volta do termo “pai e mãe”. Outro ponto preocupante é a retirada, com a publicação da Medida Provisória n° 870/19, da comunidade LGBTQ+ das diretrizes do Ministério dos Direitos Humanos. As fake news são o ponto de conexão entre tais práticas excludentes e preconceituosas, pois legitimaram e dando força e espaço para implementação dessas políticas. Por fim, o que precisa ser feito, de forma urgente, é um projeto de desestruturação dessas mentiras, baseada em educação, respeito, alfabetização virtual. Esta última será importante para interpretação em relação a notícias espalhadas nos meios virtuais, bem como a efetiva inserção da educação consciente sobre temas sexuais e de gênero. Palavras-chave: Fake News, preconceito, LGBTQ+, Direito. 24 SISTEMA POLÍTICO BRASILEIRO E OS IMPACTOS NOS DIREITOS SOCIAIS Kethelly Rubi Lima9 Lidianne Kelly N. Rodrigues de Aguiar Lopes10 Tendo em vista o que dispõe a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, notadamente sobre a separação de poderes e a urgência em se estabelecer, cada vez mais o equilíbrio do funcionamento das Instituições é que o presente resumo tem como objetivo geral, analisar o sistema político desde a CRFB/88 e como objetivos específicos os impactos da atuação desequilibrada dos Poderes no exercício de suas funções. Assim é que, a CRFB/88 estabelece que o Brasil tem como forma de governo, o modelo Republicano e sistema de governo o Presidencialismo. Desta forma, o Chefe do Poder Executivo em âmbito federal concentra as funções de chefe de Estado e chefe de Governo. Na CRFB/88, artigo 2º há previsão da separação dos Poderes, quais sejam, Executivo, Legislativo e Judiciário, que são independentes e harmônicos entre si. Porém, nem sempre essa harmonia se efetiva e, a partir dessa atuação é que se problematiza: o sistema político no Brasil é eficiente do ponto de vista da garantia dos direitos sociais? Cicco e Gonzaga afirmam que “embora combatidos pelos pensadores da época, é no séc. XIX que os partidos políticos foram se impondo e ganhando relevo como realidade social e política” (2015 p. 116). Ocorre que essa proliferação de partidos políticos, atualmente denominados partidos de esquerda, de direita ou de centro, mesmo tendo amparo no ordenamento jurídico brasileiro, já que adotamos o modelo pluripartidarista, que é o mais democrático, muitas vezes não desempenham seu papel de representatividade, o que nos faz repensar sobre a possibilidade dessas múltiplas agremiações para a garantia dos direitos sociais.Palavras-chave: Direito eleitoral, Direitos Sociais, Sistemas eleitorais 9Acadêmico do Curso de Direito do Instituto de Ensino Superior do Superior do Sul do Maranhão (IESMA). 10Doutoranda pela faculdade Estácio. Docente do Curso de Direito do Instituto de Ensino Superior do Superior do Sul do Maranhão (IESMA). lidiannelopesadv@outlook.com 25 SISTEMA DE CAPITALIZAÇÃO PREVIDENCIÁRIA E SISTEMA DE REPARTIÇÃO SIMPLES: breve comparativo Arisson Carneiro Franco11 Francine Adilia Rodante Ferrari Nabhan12 O advento da crise previdenciária no Brasil trouxe consigo propostas de reformas. Ainda em campanha pelo cargo de Presidente da República, o atual eleito expôs uma proposta de um modelo garantista conhecido como “Sistema de Capitalização da Previdência”, que por sua vez, sofreu severas críticas. Por outro lado, o proponente governo apresentara reais motivos de que o sistema praticado atualmente encontra-se em déficit ou, simplesmente, falido. O Sistema de Capitalização consiste na contribuição individual de cada trabalhador para uma conta pessoal que, via de regra, seria administrada por entidades privadas e funcionaria como uma espécie de poupança individual a qual o trabalhador poderia gozar ao alcançar os requisitos. Em contrapartida, o Sistema de Repartição Simples, praticado no Brasil atualmente, atua de forma coletiva de modo que os trabalhadores ativos contribuem para os pagamentos dos inativos, fazendo jus ao princípio da solidariedade social. Vale destacar que este último modelo é de filiação compulsória e dispões de um teto, enquanto àquele, ainda em proposta, pode ser compulsória ou voluntária existindo a possibilidade de apostes. Ambos os modelos de previdência detêm adeptos e críticos. O modelo de capitalização visa que cata trabalhador ganhe, enquanto gozo de um benefício, sobre somente do que conseguiu dispor em sua conta privada de capitalização, o que na maioria das vezes tornaria o valor dos benefícios inferiores ao salário mínimo e comprometimento do bem-estar durante a velhice. Por outro lado, esse sistema fomentaria a criação de empregos e regularização de empregados, uma vez que não haveria a contribuição patronal sobre a folha de pagamento, realizada pelo empregador, desonerando substancialmente as empresas. Em tempos que a população idosa é inferior a pulação jovem o atual sistema é viável. Segundo o IBGE no ano de 2031 a população idosa irá ultrapassar a população jovem. Tal índice revela que o sistema de solidariedade ou repartição irá encontrar óbice, uma vez que, embora disponha de outras formas de arrecadação o modelo praticado tem como principal contribuinte o trabalhador ativo, aquele que contribui mensalmente, por meio das contribuições sociais. Ocorre ainda que, havendo possibilidade de migração do modelo previdenciário haveria uma evasão fiscal e imensa perda de receitas, visto que os atuais beneficiários careceriam de financiador, que pela legislação vigente, seria o próprio governo, com base no princípio previdenciário do Não-Retrocesso. Portanto, o atual cenário 11Acadêmico do 9º período do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão UNISULMA/IESMA 12Orientadora, Advogada, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional – Universidade de Taubaté – (UNITAU), Especialista em Direito e Processo do Trabalho (UNITEC), Especialista em Direito Civil (UNISUL) Pós graduanda em Direito Tributário (Damásio). Professora do curso de graduação em Direito da UNISULMA/ IESMA E-mail: francinenabhan@hotmail.com 26 de beneficiários e contribuintes é oneroso para todos os que fazem parte do sistema, de modo que o trabalhador não se encontra satisfeito pela prestação de serviços disponibilizada pelo INSS, e os empregadores são onerados com inúmeros tributos. A responsabilidade social previdenciária, em suma não pode ser colada aos ombros do empregado, uma vez que cada lei deve ser aplicada de acordo com os parâmetros sociais para os quais foram criadas e a população brasileira não tem o hábito de prevenção. A metodologia utilizada, neste trabalho, será a pesquisa qualitativa com delineamento bibliográfico e nosso objetivo será apresentar um comparativo entre o Sistema de Capitalização Previdenciária e o Sistema de Repartição Simples. O fato é que, a aplicação de uma política previdenciária tão radical deve ocorrer de modo lento, atuando, primeiramente, no costume da população em poupar e, caso ocorra, é necessário que se busque acentuados impactos aos cofres públicos. Por outro lado, ainda é possível a reestruturação do atual modelo, com investimento em políticas de prevenção, fiscalização de sonegação de contribuições previdenciárias, corte de benefícios indevidos, alteração legislativa para redução de super-aposentadorias e cobranças de dívidas fiscais provenientes de apropriação indébita previdenciária. Palavras-chave: Princípios; Previdência Social; Garantias Constitucionais 27 UMA ANÁLISE DA MATERNIDADE CARCERÁRIA COM BASE NA LEI N° 13.769/2018 Bruna Silva Alencar 13 Hiane Karoline Moura Silva14 Larissa Gomes Pinheiro15 Letícia de Jesus16 Resumo: O presente artigo tem por objetivo analisar a realidade do cárcere feminino no Brasil, a partir de uma análise histórica e sócio jurídica com enfoque na maternidade. Para tanto, utiliza-se a pesquisa bibliográfica e documental, analisando o sistema carcerário brasileiro, partindo de uma premissa geral para uma específica – a maternidade no cárcere, confirmando o método dedutivo. Assim, levantam-se as consequências de ser mãe dentro do presídio, principalmente no que concerne ao direito do menor, o qual acaba sendo submetido a uma privação de liberdade ou sendo furtado do convívio com a genitora mesmo quando esta não tem uma condenação definitiva transitada em julgado. Por essa razão, em decorrência de um número exacerbado de parturientes nessa situação, a Lei n° 13.769/2018 surgiu com a finalidade de alterar o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal e assegurar os direitos da mulher encarcerada, bem como de sua prole. Palavras-chave: Cárcere. Maternidade. Alteração. Privação de Liberdade. Abstract This article aims to analyze the reality of the women's prison in Brazil, based on a historical, sociological and legal analysis focused on motherhood. To this porpuse, it was used the bibliographic and documentary research, analyzing the Brazilian prison system, starting from a general premise to a specific one - maternity in prison, confirming the deductive method. Therefore, the consequences of being a mother within the prison are raised, especially with regard to the right of the child, who ends up being deprived of liberty or stolen from living with the parent even when she does not have a final conviction passed on trial. For that reason, due to an exacerbated number of parturients in this situation, the Law n ° 13.769/2018 arose in order to amend the Code of Criminal Procedure and the Penal Enforcement Act to guarantee the rights of the imprisoned women, well as your offspring. Key Words: Incarceration. Motherhood. Alteration. Deprivation of Liberty. Introdução 13Acadêmico do 6º período do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão UNISULMA/IESMA 14Acadêmico do 6º período do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão UNISULMA/IESMA 15Acadêmico do 6º período do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão UNISULMA/IESMA 16 Docente do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão UNISULMA/IESMA. Especialista em Direito Penal e Processo Penal. 28 Ao longo da história a mulher vem sendo inferiorizada em vários âmbitos sociais, e no sistema carcerário não é diferente, tanto que de acordo com dados do INFOPEN apenas 7% dos presídios brasileiros são exclusivamente femininos, mesmoque seja a 4º maior população carcerária feminina do mundo, ficando atrás somente dos Estados Unidos, Rússia e China (INFOPEN, 2018). Não obstante, além da pouca atenção com presídios femininos, melhor ainda é a preocupação com mulheres mães e gestantes em situação de cárcere. Entretanto, com o intuito de modificar um pouco essa realidade, foi impetrado o Habeas Corpus nº 143641/18 para se discutir um dos aspectos essenciais da mulher: a maternidade. Assim, considerando que a privação de liberdade em uma situação de fragilidade feminina deveria ser apenas depois da condenação definitiva e não em uma prisão provisória, o legislador brasileiro elaborou a Lei 13.769/2018 que modifica o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal com o objetivo de melhorar as circunstâncias da mãe presa e seu filho. Metodologia A pesquisa tem por objetivo geral, portanto, analisar a realidade do cárcere feminino no Brasil, a partir de uma análise histórica e sócio jurídica, com enfoque na maternidade, com o intuito de perquirir se os direitos previstos na Lei de Execução Penal estão sendo cumpridos. Para tanto, utiliza-se a pesquisa bibliográfica e documental, analisando o sistema carcerário brasileiro, partindo de uma premissa geral para uma específica – a maternidade no cárcere, confirmando o método dedutivo. 1 O Sistema Prisional no Brasil Atualmente muito se sabe sobre a precariedade do sistema prisional brasileiro, e de fato, é um tema muito abordado pelos noticiários, sites de informações, pesquisadores ou interessados em geral pelo assunto. A precariedade das políticas de encarceramento ou o encarceramento em massa é uma problemática visível de nossa sociedade, onde prender ou manter sob custódia é a “solução” mais viável para as autoridades que veem isso como 29 uma forma rápida de resolver os problemas vindo das ruas para dentro das delegacias ou penitenciárias, enchendo, assim, o sistema carcerário. De acordo com dados do Cadastro Nacional de Presos, disponível através do Banco Nacional de Monitoramento de Prisões, pesquisa mais recente feita pelo CNJ até o dia 6 de agosto de 2018 o número de pessoas cadastradas no sistema eram de 602.217 (seiscentos e dois mil duzentos e dezessete) – aqui incluídas penas privativas de liberdade, prisões civis e internações como medidas de segurança, distribuídas em todas as unidades da federação. Dentre esses números, um total de 40,03% das pessoas privadas de liberdade estão sem condenação. Segundo afirma Beccaria (1764, p. 10): Por conseguinte, só a necessidade constrange os homens a ceder uma parte de sua liberdade; daí resulta que cada um só consente em pôr no depósito comum a menor porção possível dela, isto é, precisamente o que era preciso para empenhar os outros em mantê-lo na posse do resto. Em outros termos, o atual sistema penitenciário consiste no recolhimento do indivíduo da sociedade – aqui englobando todas as relações sociais dele, como família e amigos - para que, privando-o de sua liberdade, possa refletir sobre seus atos. Assim sendo, a pena adquire não apenas um caráter punitivo fisicamente, mas também com um teor psicológico, na tentativa de evitar que o criminoso não volte a delinquir. Nesse sentido, de acordo com os ensinamentos de Foucault (1987) a finalidade da prisão deixou de ser unicamente algo relacionado com a dor física e passou a assumir um novo papel, o de punição da alma. A evolução histórica das penitenciárias femininas no Brasil. O registro da primeira penitenciária feminina no Brasil é a de Madre Pelletier, de Porto Alegre (RS), criada em 1937 por freiras da Igreja Católica – porque até então esse não era um problema do qual o Estado tinha conhecimento e interesse. Logo após, em São Paulo, surgiu um presídio feminino, em 1942, e no mesmo ano inaugurou-se o presídio feminino de Bangu, no Rio de Janeiro. Até a antecedente criação dessas penitenciárias, as presas eram mantidas – e até hoje são - em presídios mistos, onde evidentemente não representavam a maioria, nesse contexto da época, e dividiam as celas com os homens. De acordo com Queiroz (2015, p. 73), a criação específica da Penitenciária Madre Pelletier, não era o de ressocialização da presa, mas manter em cárcere mulheres que não estavam em sintonia com o modo de agir ou a maneira de ser mulher naquela época: Era uma casa destinada a criminosas, mas também a prostitutas, moradoras de rua e mulheres “desajustadas”. E “desajustadas”, naquela época, podia significar uma série de coisas muito distantes do desajuste. Eram mandadas para lá, por exemplo, mulheres “metidas a ter opinião”, moças que se recusavam a casar com os pretendentes escolhidos pelos pais ou até “encalhadas” 30 que, por falta de destreza nas tarefas do lar, tinham dificuldades em arrumar marido. (QUEIROZ, 2015, p. 73) Contudo, quando as mulheres já não mais estavam totalmente sobre o controle religioso e começaram a cometer crimes de verdade, as freiras passaram a responsabilidade da penitenciária para a Secretaria de Justiça do Rio Grande do Sul, só que continuaram na direção por muitos anos, com resquícios sombrios. Sobre o tema: Durante a ditadura militar, em um pavilhão com quatro celas ao fundo da penitenciária, oculto por um matagal e uma gruta de Nossa Senhora de Fátima, esconderam presas políticas, que eram continuamente torturadas. Ninguém lembrava que havia mulheres presas e torturadas. Eram invisíveis. O fato só foi descoberto em 2012, pelo Comitê de Memória e Verdade do Rio Grande do Sul, que coletou uma série de depoimentos e documentos. (QUEIROZ, 2015, p. 74) Atualmente o encarceramento feminino vem se tornando um dos mais caóticos pontos da crise de superlotação do sistema prisional, com cerca de 42.355 mil mulheres presas, se apresentando como a quarta maior população carcerária feminina do mundo, representando um aumento de 656% em relação ao início dos anos 2000, quando menos de 6 mil mulheres se encontram presas (INFOPEN, 2018). O estado de São Paulo é o que detém os maiores números, com cerca de 34,26% do total de mulheres privadas de liberdade. É evidente a distinção existente no sistema prisional para homens e mulheres, já que ele foi universalmente pensando apenas para classe masculina, deixando, assim, de atender as necessidades básicas delas, se tornando um ponto negativo. Dentro desse contexto, de acordo com o INFOPEN Mulheres 2018, cerca de 7% dos estabelecimentos prisionais são exclusivos para o público feminino e outros 16% são definidos como misto, ou seja, contam com celas ou alas determinadas para o encarceramento de mulheres dento de prisões destinadas ao sexo masculina. Mais o que leva a mulher ao caminho da prisão? Alguns dos fatores são a baixa escolaridade e o desemprego, a falta de oportunidades, de novos caminhos que as levem para longe da prática de atividades ilegais. Estes fatores influenciam diretamente, não só para o aumento de números, mas também para a criação de um padrão – que normalmente se formam por mulheres negras ou pardas, pobres, mãe solo ou que são obrigadas por seus parceiros que estão presos à enveredar para o caminho do crime, seja o de tráfico de drogas, roubo, furto, entre outros. 2 A maternidade nos presídios: uma mulher, uma mãe, uma detenta. O cerceamento da liberdade feminina vai muito além da própria limitação de ir e vir, a começar por uma questão que historicamente e socialmente está ligada a ela que é a 31 maternidade, a qual ganha novos contornos a partir do momento em que a mãe está encarcerada. Primeiro, uma mãe que passa a adentar o sistema penitenciário, que já teve que passar a responsabilidade da criação de seu filho para outrem, acaba passando por uma situação de desestruturação familiar, que pesa ainda mais quando ela é o único pilar de sustentação da família. Nesse sentido, cite-se relato de uma detenta à pesquisadora Queiroz (2015, p. 12): Eu não conheçomeus filhos. Eu sou assim: eles sabem que eu sou a mãe deles, mas praticamente sou uma desconhecida. Além de eu ter que me adaptar às coisas que eu perdi todo esse período que estive presa, eu tenho que aprender a conhecer os MEUS filhos. A segunda situação a ser destacada é a mulher que ao ser presa está grávida ou engravida dentro do cárcere. Tem-se, assim, duas vidas encarceradas, pois ainda que esteja em período gestacional, o nascituro vai deixar de ter todos os cuidados imprescindíveis para o pré e pós- natal, considerando a realidade carcerária no Brasil. Em um dos relatos de uma detenta, explicita-se: Foi um nascimento prematuro, um parto rápido, e uma saída- relâmpago da sala — quase como se fosse um apêndice retirado. Não se deu ao luxo de descansar do esforço de nascer no colo da mãe. Não deixaram nem que Gardênia segurasse a filha. Só conseguiu, de relance, conferir que era menina, como havia anunciado a médica. “Até nisso é diferente a gente presa do que a gente solta. Solta, você pega seu filho, vê. E eu nem consegui olhar os dedos da mão e do pé, pra ver se não tava faltando nenhum”, ficou se repetindo. (QUEIROZ, 2015, p. 42) Dados do INFOPEN Mulheres 2018 revelam que cerca de 74% das mulheres no sistema prisional têm filhos. Entre essas 313 crianças estão entre a faixa etária de 0 meses a 1 ano de vida e 798 crianças têm entre 1 ano e mais de 3 anos de vida. Em igual período dos dados do INFOPEN Mulheres (março de 2018), o número de gestantes privadas de liberdade era de 317 e as lactantes 215, todas à mercê da sensibilidade do Estado, com a ajuda da família da mulher encarcerada e do pai dos seus filhos - se este se fizer presente, prestar o devido cuidado com sua vida e integridade física e mental. E a partir desses fatos mencionados, casos e números verdadeiros da rotina de nosso país, que se propõe a indagação sobre as condições na qual uma gestante/mãe é tratada dentro do cárcere brasileiro, sobre como as políticas públicas versam sobre tal assunto, sobre como a sociedade se porta diante de tais relatos. 3 Alterações nas Leis especiais e suas contradições A história das mulheres nas prisões brasileiras ressalta a desigualdade material entre gênero que já se via exposta em outros âmbitos sociais, destacando assim a falta de interesse, até recentemente, do legislador brasileiro em criar medidas que reconhecessem 32 as necessidades femininas dentro da prisão e que evitassem o encarceramento desnecessário. Nesse sentido, importante citar o texto do Ministro Ricardo Lewandowski na edição traduzida das Regras de Bangkok: As mulheres em situação de prisão têm demandas e necessidades muito específicas, o que não raro é agravado por históricos de violência familiar e condições como a maternidade, a nacionalidade estrangeira, a perda financeira ou o uso de drogas. Não é possível desprezar, nesse cenário, a distinção dos vínculos e relações familiares estabelecidos pelas mulheres, bem como sua forma de envolvimento com ocrime, quando comparados com a população masculina, o que repercute de forma direta as condições de encarceramento a que estão submetidas. Historicamente, a ótica masculina tem sido tomada como regra para o contexto prisional, com prevalência de serviços e políticas penais direcionados para homens, deixando em segundo plano as diversidades que compreendem a realidade prisional feminina, que se relacionam com sua raça e etnia, idade, deficiência, orientação sexual, identidade de gênero, nacionalidade, situação de gestação e maternidade, entre tantas outras nuanças. Há grande deficiência de dados e indicadores sobre o perfil de mulheres em privação de liberdade nos bancos de dados oficiais governamentais, o que contribui para a invisibilidade das necessidades dessas pessoas. (LAWANDOWSKI, 2016) (deu-se destaque) Na tentativa de modificar essa realidade que priva as mulheres de sua dignidade e não apenas de sua liberdade, o legislador cria no ordenamento jurídico nacional duas leis (Lei nº 11.942/2009 e 13.769/2018) que modificam o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal somando-se aos tratados internacionais já ratificados no Brasil, como as Regras de Bangkok – “Regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras”, entre outros. A Lei nº 11.942/2009 acrescenta a possibilidade do acompanhamento médico à mulher e seu filho no pré-natal e pós-parto no art. 14, § 3º da LEP, levando a crer que apesar de ser assegurada assistência à saúde, tanto na Constituição Federal quanto no caput do artigo supracitado, fez-se necessário especificar a necessidade hospitalar materna, pois todo o sistema prisional (até as leis) foi criada pensando apenas nos homens, por causa do descaso do poder executivo nas condições básicas de saúde e vivencia de mães e filhos na prisão. E neste mesmo raciocínio temos os artigos 83, § 2° da LEP que impõe às penitenciárias femininas terem berçários para as condenadas (e presas temporárias) cuidarem de seus filhos, inclusive amamentá-los, por no mínimo 6 meses de idade. 33 Entretanto, as pesquisas mostram que somente pouco mais da metade dos presídios brasileiros possuem seção própria para lactantes e gestantes. Com esses dados vêm outros questionamentos como, por exemplo, quais outras situações carcerárias agridem a dignidade da mulher-mãe encarcerada? Ao sair do presidio para cuidados médicos pré-natal ou pós-parto, ou até mesmo para o parto, a lei dita não ser necessário o uso de algemas, porém, os dados fornecidos pelo CNJ mostram que “20,6% dos estabelecimentos visitados não asseguram o cumprimento da Lei 13.434/2017 (que veda o uso de algemas em mulheres grávidas durante o parto e em mulheres durante a fase de puerpério imediato).” Quando falamos em crianças acima dos 6 meses aumenta o descaso do poder público que não assegura o que determina o artigo 89 da LEP: Art. 89. Além dos requisitos referidos no art. 88, a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete) anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa Parágrafo único. São requisitos básicos da seção e da creche referidas neste artigo I – atendimento por pessoal qualificado, de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação educacional e em unidades autônomas; e II – horário de funcionamento que garanta a melhor assistência à criança e à sua responsável. Segundo a pesquisa já mencionada do CNJ “Nenhum estabelecimento visitado é dotado de creche para abrigar crianças maiores de 6 meses e menores de 7 anos desassistidas e desamparadas cuja responsável esteja presa.” Em outros termos, no caso concreto, as crianças são encaminhas a um parente próximo ou colocadas em abrigos, longe da mãe. Assim sendo, vale afirmar que esses foram os motivos que levaram a criação da Lei 13.769/2018 que visa diminuir o encarceramento em massa, principalmente prisões provisórias, de mulheres grávidas ou que sejam mãe ou ainda as únicas responsáveis por crianças ou pessoa portadora de deficiência. Ressalta-se que antes dessa Lei o legislador já trouxe a possibilidade de o juiz modificar a prisão preventiva pela domiciliar, com o marco legal da primeira infância, se a mulher for gestante ou mãe com filho menor de 12 anos. Todavia, ainda havia muita divergência entre as decisões judiciais no país, sendo necessário determinar a obrigatoriedade de critérios objetivos para a aplicação de prisão domiciliar nesses casos. Nesse contexto, o Habeas Corpus Coletivo nº 143.641/18 corroborou na criação de uma lei que alterou a Lei de Execução Penal nos casos de situações específicas para presas que são mães em condições de encarceramento, o que se verifica em tópico próprio para melhor compreensão do assunto. Habeas Corpus Coletivo 143.641/18e Lei 13.769/2018 34 Os estudos mostram que a primeira infância é um marco na formação da personalidade de uma criança, dessa forma, é vital um desenvolvimento pleno de todas as suas faculdades e convívio com a mãe sem “estresse tóxico” como é falado no livro Pela liberdade lançado pelo Programa do Instituto Alana e Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADhu): A permanência da gestante ou da criança com a mãe no cárcere, bem como a separação destas, prejudica severamente o desenvolvimento infantil e viola uma infinidade de direitos. Um dos principais fatores responsáveis por esse dano ao desenvolvimento infantil é o estresse tóxico, fruto de situações que envolvem um sofrimento grave, frequente, ou prolongado, no qual a crianças não têm o apoio adequado da mãe, pai ou cuidadores. No caso de crianças com mães encarceradas, o estresse tóxico decorre do ambiente prisional que não permite condições adequadas e dignas à criança, tanto pelas condições e funcionamento estruturais de um presídio, como em decorrência da situação precária que a mulher encarcerada vivência. Também nos casos de separação da mãe e consequente institucionalização infantil, o rompimento do vínculo gera estresse à criança e a falta de um laço emocional constante nas instituições de acolhimento também pode gerar significativos riscos para o seu desenvolvimento sadio. Estudos indicam que o estresse tóxico pode impactar negativamente a arquitetura cerebral e aumentar o risco de doenças físicas e mentais relacionadas ao estresse, levando ainda a efeitos danosos no aprendizado, no comportamento, e na saúde durante toda a vida. Para assegurar, portanto, o convívio e mesmo a dignidade humana da criança que tenha a mãe como única responsável pela criação do menor, impetrou-se um Habeas Corpus Coletivo de nº 143.641/18 perante o Supremo Tribunal Federal (STF) em favor dessas. Em sua decisão, o Ministro Lewandwski, então relator, decidiu determinar a substituição das mulheres que estavam presas preventivamente pela prisão domiciliar, desde que estivessem gestantes, puérperas ou fossem mães de crianças e/ou deficientes sob a sua guarda, com exceção daquelas que tivessem praticado o crime com violência ou grave ameada contra os próprios filhos. Além disso, a decisão foi estendida a adolescentes mães em cumprimento de medidas socioeducativas, concretizando garantias previstas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). É inegável, assim, a importância do Habeas Corpus nº 143.641 de 2018 para o sistema penitenciário feminino, pois trouxe grande inovação, dentre elas a ideia de que o cárcere não é lugar adequado a uma mulher grávida ou a crianças e que não pode submeter uma pessoa que juridicamente é considerada inocente, até uma sentença condenatória, a uma vivência indigna e perigosa à sua saúde e de seu filho dentro da prisão. 35 Diante disso, o Habeas Corpus Coletivo se tornou a única solução viável de acesso à justiça desses grupos mais vulneráveis na sociedade do ponto de vista social e econômico, como aponta o Ministro Ricardo Lewandowski (relator dessa ação) em seu voto, tendo repercussão na vida de mais de 15 mil mulheres presas provisoriamente no Brasil segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (DPN). Em dados de 2018 o DPN informou que 426 mulheres tiveram a prisão domiciliar concedida. Após tal decisão histórica, coube determinar quais mulheres se encaixavam nos critérios. Nesse compasso, foi elaborada a Lei nº 13.769/2018 para determinar critérios objetivos com o intuito de assegurar tais direitos a mais mulheres. Assim sendo, o art. 2º da Lei supradita modificou o Código de Processo Penal, acrescentando o art. 318-A e B em sua estrutura, que passa a vigorar da seguinte forma: Art. 318-A. A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que: I - não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa; II - não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente. Art. 318-B. A substituição de que tratam os arts. 318 e 318-A poderá ser efetuada sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art. 319 deste Código. Desse modo, não se tem atualmente apenas uma decisão, um precedente da Corte Suprema do país para a concessão da prisão domiciliar nos casos acima expostos, tem-se um comando normativo, um texto de lei, portanto, de aplicação obrigatória, posto que é direito subjetivo da presa, quando preenchidos todos os requisitos legais, ter a sua pena preventiva substituída pela prisão domiciliar. A Lei nº 13.769/2018 também alterou a Lei de Execução Penal, acrescentando ao art. 112 os seguintes parágrafos: § 3º No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência, os requisitos para progressão de regime são, cumulativamente: I - não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa; II - não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente; III - ter cumprido ao menos 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior; IV - ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento; V - não ter integrado organização criminosa. § 4º O cometimento de novo crime doloso ou falta grave implicará a revogação do benefício previsto no § 3º deste artigo.” (NR) Importante esclarecer, no entanto, que as condições estabelecidas em lei devem ser atendidas de forma cumulativa. Alguns doutrinadores ressaltam ainda pontos negativos na 36 alteração, como a obrigatoriedade de ser primária (exigência que não existe nem na progressão de regime de crimes hediondos), a subjetividade do bom comportamento carcerário (a maternidade já é tratada como um meio de inferiorizar e julgar negativamente a mulher dentro do cárcere) e a exigência de prova de não participação em organização criminosa, condição preocupante já que atualmente 62% das mulheres são presas por tráfico de drogas. Entretanto, há pontos a serem comemorados, como, por exemplo, a progressão de regime em fração diferenciada. Explique-se. Como regra geral haverá a progressão de regime quando o réu cumprir alguns requisitos subjetivos, tais como o comportamento carcerário, bem como deverá cumprir 1/6 (um sexto da pena). Para os casos de mulheres, nas condições mencionadas no §3º, do art. 112, basta que cumpra 1/8 (um oitavo). Nos casos de crime hediondos ou equiparados, além do comportamento carcerário, o réu deve cumprir 2/5 (dois quintos) da pena quando for primário e 3/5 (três quintos) quando for reincidente. Entretanto, para mulheres, nas condições previstas na lei, aplica- se também o mesmo percentual de 1/8 (um oitavo), já que a Lei nº 13.769/2018 alterou a redação do art. 2º, §2º da Lei de Crimes Hediondos: § 2º A progressão de regime, no caso dos condenados pelos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 112 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal). Portanto, apesar do avanço legislativo com o objetivo de proteger os direitos da mãe e da criança, ainda há muito que se discutir, pois a realidade dos presídios ainda não comporta em sua estrutura um acolhimento adequado. Por outro lado, cria-se uma “solução” paliativa, já que a regra seria o encarceramento nos termos do que preconiza a Lei de Execução Penal. Em outros termos, a possibilidade de prisão domiciliar, bem como a progressão de regime em patamar diferenciado, só atesta a ineficiência do Poder Público no encarceramento da mulher-mãe. 4 As consequências jurídicas e sociais de ser uma mãe presidiária O cárcere brasileiro por si só já coloca presidiárias femininas em situações precárias, visto que ao longo da nossa evolução histórica não se pensou
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