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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES Breno Aranha Gillopes - 8576306 Catarina Amaral Zancheta - 10722540 Júlia Mota Silva - 10722407 Lucas César Garcia - 11369520 Tayna Suemy Vitor - 11366274 Mulheres no mercado de trabalho: a maternidade como penalidade Trabalho apresentado à disciplina de Indicadores de Políticas Públicas (ACH 3535) da Escola de Artes Ciências e Humanidades (EACH-USP). Orientadora: Profª. Drª Cristiane Kerches da Silva Leite São Paulo 2021 1. INTRODUÇÃO Nos últimos anos, a participação e as métricas salariais femininas no mercado de trabalho têm aumentado, como apontam os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), que mostram que a participação feminina entre mulheres de 30 a 34 anos passou de 61% em 1997 até 71% em 2012 (Barbosa, 2014). Entretanto, se por um lado há um aumento da participação feminina, por outro ele ocorre lentamente e acompanhado de estigmas sociais e culturais relacionados à divisão sexual do trabalho e à maternidade, gerando consequências na remuneração de mulheres. Ou seja, a dinâmica de trabalho colocada pelo capitalismo articula posições da vida doméstica e do trabalho não remunerado à vida pública para justificar a manutenção da precarização da mão de obra feminina (Biroli, 2016) Nota-se, portanto, que a excessiva responsabilidade colocada sobre as mulheres e a disparidade de atribuições no âmbito doméstico acarretam penalidades a elas. Entre os conceitos que explicam essa penalidade está a penalidade pela maternidade, que Guiginski e Wajnman (2019) definem como: " [...] diferenciais observados entre os níveis salariais de mulheres que compartilham características pessoais e de inserção no mercado de trabalho semelhantes, que se diferem apenas pela presença ou ausência de filho. Quando são comparadas mulheres com e sem filhos, aquelas que contam com a presença de filhos, geralmente, auferem salários inferiores aos das mulheres sem filhos”. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é discorrer sobre a penalidade pela maternidade a partir de duas hipóteses: se é possível mensurar essa penalidade a partir dos dados disponíveis e quais são os determinantes para a penalidade. Este artigo é composto por duas partes além desta introdução, um capítulo principal onde será descrito a penalidade a partir de três fatores: Ocupação e Informalidade no mercado de trabalho, Escolaridade feminina e Falta de vagas em creches, seguidos por uma conclusão com os aprendizados gerados. 2. A PENALIDADE DA MATERNIDADE A partir da dados primários e secundários, buscaremos evidenciar nas próximas seções como se dá a penalização da maternidade no mercado de trabalho e como esse fator intersecciona diferentes problemáticas como a informalidade no mercado de trabalho, a disparidade entre escolaridade e ocupação e a defasagem de vagas em creches. 2.1 Ocupação e informalidade Muito já se evoluiu no que diz respeito à desigualdades de gênero no mercado de trabalho brasileiro (Guiginski; Wajnman, 2019), no entanto proporcionalmente há ainda muito o que se fazer para alcançarmos níveis básicos de equidade entre mulheres e homens no ambiente laboral, ainda mais quando observamos este contexto de forma interseccional. Evidenciaremos nesse tópico como o mercado de trabalho penaliza a maternidade, criando mais uma barreira para mulheres, sob a ótica da informalidade, partindo do pressuposto de que a informalidade enquadra trabalhadores que não se beneficiam da proteção concedida pela legislação trabalhista e que, portanto, estão mais propensos à precarização (ULYSSEA, 2006) Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) expõem o comportamento de homens e mulheres no mercado de trabalho e como isso se altera com a presença de crianças de até três anos no lar. Ilustramos esses dados no gráfico abaixo: Gráfico 1: Nível de ocupação de pessoas de 25 a 49 anos de idade, com recorte de gênero e presença de crianças com até três anos (%) Fonte: elaboração própria com base nos dados do IBGE É notório, portanto, como a presença de crianças de até três anos prejudica ainda mais o nível de ocupação de mulheres no mercado de trabalho, quando o contexto observado para homens é claramente o oposto: a presença de crianças de até três anos melhora o nível de ocupação de homens no mercado de trabalho. Quando feito um recorte racial, este cenário fica ainda mais discrepante, mulheres negras apresentam os menores níveis de ocupação no mercado, principalmente quando há a presença de crianças de até três anos: Tabela 1: Nível de ocupação de pessoas de 25 a 49 anos de idade, com recorte de raça, gênero e presença de crianças com até três anos Fonte: elaboração própria com base nos dados do IBGE Gráfico 2: Nível de ocupação de pessoas de 25 a 49 anos de idade, com recorte de raça, gênero e presença de crianças com até três anos Fonte: elaboração própria com base nos dados do IBGE É evidente como o nível de ocupação de mulheres negras e brancas é afetado pela maternidade. Se olharmos para 2019, o nível de ocupação de mulheres negras diminui em 10 pontos percentuais quando há a presença de crianças de até três anos, e no caso das mulheres brancas, 8 pontos. Neste ponto, é válido ressaltar que melhores condições de renda também significam maiores chances de contar com o suporte de creches e babás, o que significa ter mais oportunidades de conciliar a maternidade com a carreira profissional (CUNHA, 2016). No entanto, no caso dos homens há uma associação positiva entre a presença de crianças de até três anos e o nível de ocupação no mercado de trabalho. Para homens brancos, a presença de crianças de até três anos aumenta em 5 pontos percentuais o nível de ocupação, enquanto aumenta em 4 pontos para homens negros. Estudos prévios sobre este tema demonstram que, do montante de pessoas ocupadas que possuem filhos, "27,1% foram classificados em postos de trabalho precários, o que equivale a 20,0% dos homens e 35,2% das mulheres.” (Guiginski; Wajnman, 2019), ou seja, mesmo ocupadas mulheres são as mais precarizadas quando há a presença de filhos. Além disso, “a presença de dois ou mais filhos em idade pré-escolar está associada a chances 90,6% maiores de jornada parcial para as mulheres. [...] Para os homens, nenhum coeficiente da variável de presença e número de filhos é significativamente associado à chance de trabalho em jornada parcial.”. (idem). Sendo válido ressaltar que jornadas parciais de trabalho estão associadas a menores níveis de remuneração e maior chance de precarização (idem). Por fim, “a presença de um filho em idade pré-escolar aumenta as chances de a mulher ser uma trabalhadora autônoma em 54,3% e ter dois ou mais filhos nesta faixa etária associa-se chances 2,2 vezes maiores de ser autônoma” (idem), o que por um lado aumenta a flexibilidade de horário para que as mulheres lidem com jornadas duplas ou triplas de trabalho, mas por outro significa menor qualidade de emprego, menor proteção social e menor remuneração. 2.2 Escolaridade Outro fator crucial ao discutir a questão da maternidade e mercado de trabalho são os dados de escolaridade e a diferença entre os indicadores entre homens e mulheres em idade adulta e o grau de instrução (ou formação). Há diversos estudos e Notas Técnicas que apresentam alguns indicadores que demonstram os dados do IBGE e da PNAD Contínua de forma clara e prática para se entender as inferências desses dados e pode-se associar a penalidade da maternidade do mundo de trabalho com os resultados. Dado que as mulheres historicamente em números ocupam menos os cargos de liderança e são por diversas vias penalizadas dentro do mercado de trabalho, uma contra hipótese que é facilmente refutada é a justificativa por menor grau de instrução e formação. Quando na realidade podemos verificar que as mulheres geralmente são melhores instruídas, principalmente com formação superior. Os dados do IBGE (censo 2010)e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) Contínua abordam esse levantamento com dados relevantes que remetem à indicadores Gráfico 1. Escolaridade por sexo no Brasil (1992-2012) Fonte: BARBOSA, 2014 a partir da PNAD Contínua/IBGE Nesse gráfico, vemos a evolução em “anos de escolaridade” como a totalidade de anos que a pessoa passou se escolarizando (fundamental e médio) entre 1992 e 2012, e durante esses 10 anos, em todos, as mulheres passaram mais tempo nas escolas que os homens, e ainda a taxa de escolarização delas subiu 2,3% e a dos homens, exatos 2%. A pesquisa ainda indica que a educação não interfere na desigualdade. Sendo assim, as maiores dificuldades que as mulheres enfrentam no mercado de trabalho para serem melhor remuneradas não podem ser atreladas a educação, já que as mesmas são indicadas como sendo mais bem escolarizadas do que os homens. Pode-se inferir justamente o oposto: são as mulheres brasileiras que são, em média, mais instruídas que os homens. Gráfico 2. Brasil: população de 25 anos ou mais com superior completo (2016) Fonte: Elaboração Própria - IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua 2019. As mulheres também se sobressaem em escolaridade, em relação a proporcionalidade de pessoas com o ensino superior completo, principalmente nas faixas etárias mais jovens, onde apresentam uma maior diferença percentual em comparação aos homens, indicando que, ao longo do tempo ficou mais comum as mulheres se dedicarem à formação superior, que anteriormente as era um direito negado. Assim, a maior diferença percentual por sexo encontra-se no nível “superior completo”, especialmente entre as pessoas da faixa etária mais jovem, de 25 a 44 anos de idade, em que o percentual de homens que completou a graduação foi de 15,6%, enquanto o de mulheres atingiu 21,5%, indicador 37,9% superior ao dos homens. Um outro indicador que demonstra a participação feminina no mercado de trabalho e a relação maternidade é um cálculo de probabilidade dessa participação e como ela se comporta frente a diferentes situações e realidades, cálculo que Barbosa publicou em uma Nota Técnica, usando como base a PNAD, afirmando que “entre os principais determinantes tratados pela literatura empírica (nacional e internacional) está a presença de filhos, a renda domiciliar per capita e o nível educacional da mulher.” A tabela a seguir apresenta dois desses determinantes que escolhemos para demonstrar seu impacto na probabilidade da mulher fazer parte da População Economicamente Ativa (PEA) no Brasil, com recorte de anos entre 1992 à 2012, com faixa de 5 em 5 anos: Tabela . Brasil: efeitos marginais na participação feminina no mercado de trabalho. Fonte: BARBOSA, 2014 a partir da PNAD Contínua/IBGE A educação tem um impacto positivo na probabilidade da mulher participar no mercado de trabalho brasileiro, que com mais de 11 anos de estudo, essa taxa em 2012 ficou em 23,7%. Em contrapartida, a probabilidade de uma mulher participar do mercado de trabalho (formal e informal) com filhos de 0 a 2 anos, cai 17,2%, justamente na idade em que a criança precisa frequentar a creche, pois não está em idade escolar. Mostrando um impacto negativo dessa variante (a maternidade) para a presença da mulher no trabalho. E conforme a criança vai avançando na idade esse impacto diminui, mas ainda é presente e se mantém significante, ainda que menor. 2.3 Vagas em creches Uma terceira dimensão possível para se analisar de que maneira a função maternidade pesa desproporcionalmente sobre as mulheres — em relação à paternidade — é a disponibilização de creches com um número capaz de absorver a demanda das famílias. Isto é, apesar de a geração e a criação dos filhos não serem apenas da responsabilidade feminina, condicionantes sociais, sejam eles abertos ou implícitos, fazem com que a situação fique claramente desfavorável para as mulheres na esfera do trabalho, e os números revelam bem esse cenário. Hoje, após a inauguração do Estado Social implementado após a Constituição Federal de 1988, a educação infantil ganhou um status de direito de toda e qualquer criança brasileira, o que certamente é uma conquista a ser comemorada para a celebração do pacto democrático do país. Essa é, no entanto, a segunda geração das reivindicações pelo direito à creche, pauta esta que esteve vinculada à pressão sobre o poder público por parte de movimentos sociais das mulheres pelo menos desde as décadas de 1970 e 1980. Já era percebida, então, a relevância dessa demanda uma vez que a inserção feminina no mercado de trabalho não foi acompanhada por uma mudança mais profunda no que diz respeito aos cuidados com o ambiente doméstico, o que inclui o cuidado com os filhos. Ou seja, a profissionalização da mulher não significou o abandono das tarefas domésticas, pelo contrário, criando assim a jornada dupla — e às vezes tripla — de trabalho para elas. Este aspecto deve também ser considerado dentro da discussão da maternidade como penalidade na medida em que altera formalmente a condição de um determinado grupo, mas não substancialmente, de modo a puni-lo indiretamente pelas escolhas tomadas. Como destacado por Sorj, Fontes e Machado (2007): “[...] a ausência de uma prática que atribua uma dimensão coletiva aos cuidados da família reforça um forte viés de gênero na divisão do trabalho, na medida em que essas atividades permanecem, em grande parte, como tarefas realizadas apenas pelas mulheres.”. Essa punição, naturalmente, é traduzida em número quando se olha para a realidade. Uma nota técnica realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), intitulada “Oferta de Creche e Participação das Mulheres no Mercado de Trabalho no Brasil”, publicada em 2017, procurou realizar essa tarefa. Valendo-se de microdados da PNAD Contínua e do IBGE, as autoras ressaltam o comportamento das linhas de ocupação por gênero com a condição de se ter filhos em pequenas idades ou não. O recorte temporal que Ana Luiza Neves de Holanda Barbosa e Joana Simões de Melo Costa fazem vai de 2001 a 2015, enquanto o gráfico 1 (de nossa autoria) retrata o cenário de 2012 a 2019. A despeito de mudanças significativas na gestão política do país, acompanhadas por marcos como a Reforma Trabalhista, fica evidente como a introdução de um filho na dinâmica familiar exerce um papel muito específico nesta: a depender do gênero, essa realidade acaba por reforçar velhas estruturas de divisão do trabalho doméstico. Enquanto a linha de homens com participação no mercado de trabalho aumenta tendo filhos entre 0 e 3 anos, a linha feminina segue um comportamento inverso, de retirar as mulheres do mercado por isso. Embora se note um relativo aumento no patamar da ocupação das mulheres com filhos na primeira infância, esse comportamento espelhado entre os sexos muito provavelmente apresenta uma correlação, na medida em que se tornar pai/mãe significa assumir rotinas completamente diferentes dentro da estrutura familiar histórica da sociedade brasileira (arrimo/cuidadora). Uma vez partindo do pressuposto de que a geração de filhos significa um importante marcador de gênero, as autoras seguem no exame do impacto de esse processo ser acompanhado por uma rede de suporte, seja ela pública, privada ou sem fins lucrativos, para garantir a atenuação desse cenário. O gráfico a seguir mostra como a ausência ou presença de creches apresenta uma relação direta com a inserção feminina no mercado de trabalho, apontando na direção de uma punição da ordem de 15 a 20 pontos percentuais ao longo da série histórica recortada entre as mulheres com crianças na primeira infância: (Fonte: Pnad/IBGE, elaboração de Ana Luiza Neves de Holanda Barbosa e Joana Simões de Melo Costa) Verificada, portanto, a causalidade entre a existência filhos de 0 a 5 anos e a ocupação feminina fica evidente que as falhas na implementação de políticas públicas que garantam o acesso a creches manifestam-se não apenascomo um incongruência com os direitos constitucionais das crianças à infância e das mulheres à igualdade profissional, mas também à própria capacidade produtiva do país na medida em que sabotam uma fatia significativa da sua população economicamente ativa. Fatia essa que, vale dizer, é subutilizada em várias camadas, pois, como já vimos, possui também mais instrução formal do que o grupo dos homens. Essa conjuntura ganha contornos mais dramáticos quando começamos a qualificar esses grupos sob a ótica de raça e de classe. A Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal elaborou um interessante relatório chamado “Desafio do Acesso à Creche no Brasil: Subsídios para o debate”, com dados cruzando elementos regionais, raciais e de ordem socioeconômica: A organização social, preocupada prioritariamente com a primeira infância, fez importantes levantamentos no que diz respeito ao tema. Através dos indicadores Índice de Necessidade de Creche (INC) e da Taxa de atendimento em creche para população de 0-3 anos, elaborados pela própria instituição, a FMCSV consegue trazer um relevante diagnóstico da situação do país. Estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Amazonas e Amapá são os que apresentam situações mais drásticas, com mais da metade da sua população de crianças entre 0 e 3 anos fora de qualquer tipo de creche, pública ou privada. Os dois principais motivos para a ausência nestes espaços, segundo a organização, são a pobreza e justamente o fato de a única pessoa responsável pela criança ter de trabalhar. E esse perfil é feminino. Assim sendo, fica evidente que o problema é nacional, mas ele tem dimensões muito claras que precisam ser olhadas de perto para que se entenda a sua natureza por completo. No infográfico a seguir, são trazidos dados que mostram que uma parte significativa da ausência em creches ainda está em famílias de baixa renda e/ou famílias negras ou pardas. Ou seja, o problema da falta de creches e da subutilização da mão de obra, acompanhada de uma menor remuneração, é uma questão feminina, mas é também sobretudo negra e de classe social mais baixa. Fonte: FMCSV, 2020 Esse panorama, portanto, encontra-se ainda longe de uma solução ideal. A falta de aporte por parte do Estado, acompanhada da insuficiência financeira das famílias para pagar uma creche privada, se revela como um terreno fértil para a construção de laços informais de cuidado, a exemplo da reconfiguração do perfil dos cristãos no Brasil — que paulatinamente deixam de ser católicos para se converterem em neopentecostais. Embora essa relação seja indireta e ainda careça de comprovação, o fato é que o problema das creches pesa exageradamente sobre a carreira e independência financeira das mulheres, sobretudo sobre as que pertencem a grupos historicamente marginalizados no país. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir da combinação dos indicadores de ocupação e informalidade no mercado de trabalho, escolaridade e vagas em creche, o presente trabalho teve como objetivo demonstrar e mensurar a penalidade da maternidade. Os resultados demonstram que, apesar da maior escolaridade entre as mulheres em comparação aos homens, a baixa ocupação e a informalidade no mercado de trabalho ainda atinge mais as mulheres, principalmente aquelas com crianças de até 3 anos. Além disso, com a tradicional divisão sexual do trabalho que delega as funções de cuidado às mulheres, a falta de vagas em creches pesa mais na carreira e independência financeira das mães do que dos pais. Dessa forma, as mulheres estão mais suscetíveis ao desemprego, aos trabalhos precarizados, à escassez de recursos financeiros, à falta de direitos e da proteção social envolvidas à carteira de trabalho, ao aumento da dependência em terceiros e ao acúmulo de tarefas pela necessidade de jornadas duplas ou triplas de trabalho. Os resultados também revelam que além de uma perspectiva de gênero, a raça e a classe social também influenciam significativamente na penalidade da maternidade. A interseccionalidade dessas identidades sociais, portanto, produzem um cruzamento de múltiplas formas de opressão, em que as mulheres negras de classes mais baixas e com filhos são as mais afetadas nesse sistema discriminatório. Neste trabalho, abordamos somente as penalidades da maternidade envolvidas diretamente com o mercado de trabalho, no entanto, são inúmeras as penalidades que as mulheres enfrentam adjacentes a isso, como a redução do tempo de qualidade, a falta de amparo, responsabilidade integral do desenvolvimento dos filhos, prejuízos à saúde mental e física, perpetuação do ciclo de pobreza em famílias de baixa renda etc. Tais condições também acarretam problemas intergeracionais, uma vez que diminui o amparo infantil e boas condições de convivência com as crianças. Nesse sentido, além dos resultados desse trabalho proporcionarem uma crítica a discriminação em relação a maternidade e da tradicional divisão sexual do trabalho, eles também evidenciam a urgência da Economia do Cuidado no Brasil. Em linhas gerais, a Economia do Cuidado visa colocar o cuidado como objeto primordial do estudo econômico, uma vez que os trabalhos de cuidado são a base do desenvolvimento humano e, portanto, fundamentais para que a economia aconteça. De acordo com as estimativas da Organização Internacional do Trabalho (OIT), as mulheres realizam globalmente 76,2% do trabalho de cuidado não pago - como a criação dos filhos e organização do ambiente doméstico - que representa 16,4 bilhões de horas trabalhadas todos os dias de forma não paga. Nesse sentido, a Economia do Cuidado propõe valorizar os trabalhos (pagos e não pagos) associados ao cuidado por meio do: “(i) reconhecimento social e econômico desses trabalhos; (ii) da redução da carga de trabalho desnecessária, por meio de tecnologia, bens e serviços públicos; (iii) de estratégias para a redistribuição mais equitativa da prática de cuidados entre os gêneros, incluindo a universalização das flexibilizações trabalhistas que visam possibilitar o cuidado dos dependentes, e a diminuição geral de horas de trabalho no mercado para maior tempo para cuidados domésticos; (iv) da recompensa justa e com trabalhos dignos na área dos cuidados; e (v) da representação dessas trabalhadoras e trabalhadores na esfera política” (Callegari, 2021) Dessa forma, com a adoção dessas medidas, seriam gerados inúmeros benefícios relacionados à redução das penalidades da maternidade e das desigualdades de gênero, raça e classe como um todo. 4. Referências bibliográficas BARBOSA, A. L. Nota Técnica: Participação Feminina no Mercado de Trabalho Brasileiro. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), ago. 2014. BARBOSA, A. L. e COSTA, J. S. M. Nota Técnica: Oferta de Creche e Participação das Mulheres no Mercado de Trabalho no Brasil. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), abril, 2017. BIROLI, F. Divisão Sexual do Trabalho e Democracia. Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, vol. 59, nº 3, pp. 719 a 681, 2016. CALLEGARI, Isabela. Para entender a urgência da economia do cuidado. Outras Palavras, 2021. Disponível em <Para entender a urgência da Economia do Cuidado - Outras Palavras>. Acesso em: 23 de dezembro de 2021. CUNHA, M; VASCONSELOS, M. Fecundidade e participação no mercado de trabalho brasileiro. Nova Economia. v.26, n.1, p. 179-206, 2016. Estudo prevê que 46,7% das crianças até 3 anos necessitam de creche. Agência Brasil, 2020. 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