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Violência e Segurança Pública no Brasil Contemporâneo Violência e Segurança Pública no Brasil Contemporâneo: Um Desafio Multifacetado A violência e a segurança pública no Brasil contemporâneo representam um desafio complexo e multifacetado, que permeia todos os estratos da sociedade brasileira. A violência se manifesta em diversas formas, desde os crimes hediondos que ganham destaque nos noticiários até as formas mais sutis e invisíveis que afetam as relações interpessoais e as estruturas sociais. É essencial compreender e reconhecer as diferentes modalidades de violência presentes na sociedade brasileira. A violência de gênero, por exemplo, é um fenômeno alarmante que ceifa a vida de inúmeras mulheres e membros da comunidade LGBTQIA+, refletindo desigualdades de poder e estruturas patriarcais arraigadas na sociedade. A violência racial, por sua vez, marginaliza e oprime comunidades inteiras, perpetuando ciclos de exclusão e desigualdade. Além disso, a violência contra crianças e adolescentes é uma triste realidade que compromete o desenvolvimento saudável e o futuro desses indivíduos. Em julho de 2023, foi divulgado o 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, baseado nos dados de 2022, e a Politize! separou alguns dados presentes neste relatório. Neste documento são apresentadas informações e análises sobre homicídios, latrocínios, estupros e demais crimes sexuais, abuso infantil, dentre outros tipos de violência. O Anuário se baseia em informações fornecidas pelas secretarias de segurança pública estaduais e também pelas polícias civil, militar e federal. Mortes Violentas Intencionais (MVI) Essa categoria corresponde à soma das vítimas de mortes violentas com intencionalidade, ou seja, crimes como: homicídio doloso (incluindo feminicídio e policiais assassinados), latrocínio (roubo seguido de morte), lesão corporal seguida de morte e mortes decorrentes de intervenções policiais (tanto em serviço, como fora de serviço). Em 2022, o Brasil registrou 47.508 mortes violentas intencionais,a taxa de mortalidade ficou em 23,4 a cada 100 mil habitantes, o que representa uma redução de 2,4% em relação a 2021. As causas relativas a explosão de violência verificada a partir de 2016 tem relação a alguns fatores: ● Racha entre as duas maiores organizações criminosas do país: PCC e Comando Vermelho; ● Disputa entre as facções do crime organizado pelas rotas nacionais e transnacionais de drogas pela região da Amazônia Legal; ● Avanço do desmatamento, garimpos ilegais e a intensificação de conflitos fundiários. O crime da “moda” O relatório observou uma nova configuração de crimes patrimoniais no Brasil. A mudança se deu, sobretudo, a partir da pandemia de Covid-19, nos quais se destacaram crimes como: furtos, estelionatos e golpes virtuais. Só em 2022 foram registrados 208 golpes virtuais por hora e, quanto ao crime de estelionato, foram 1.819.409 registros, um crescimento de 326,3% desde 2018. Quanto aos registros de roubo e furto de celular, ao menos 2.737 aparelhos foram subtraídos diariamente no Brasil, o que representa um crescimento de 16,6% em relação a 2021. Vitimização e letalidade policial As mortes causadas pelas polícias ocupam espaço muito significativo entre as causas de mortes violentas intencionais. Exemplo disso é que, no Amapá, mais de 1 em cada 3 mortes violentas intencionais foi causada pelas polícias. Os registros mostram ainda que as 14 das 20 cidades com maiores taxas de mortes violentas intencionais do país integram os estados com as polícias mais violentas do país: Amapá, Bahia e Rio de Janeiro. Violência contra negros e LGBTQIA+ A legislação vigente em 2023, tipifica crimes de racismo e injúria racial como equivalentes e, além disso, crimes contra LGBTQIA+ são enquadrados na lei do racismo. Nesse sentido, o relatório registrou aumento de 68% de crimes de racismo e crescimento de 54% de crimes contra pessoas LGBTQIA+. O perfil das vítimas de mortes violentas intencionais segue sendo 76,5% de negros. Aliás, negros são o principal grupo vitimado pela violência independente da ocorrência registrada. Entretanto, no caso da violência policial, este grupo é 83,1% das vítimas. Entre latrocínios, a porcentagem de vítimas negras é de 58,5%, https://www.politize.com.br/pcc-e-faccoes-criminosas/ https://www.politize.com.br/garimpo-ilegal/ https://www.politize.com.br/lei-14-532/ https://www.politize.com.br/lei-14-532/ superando, inclusive, a porcentagem de pessoas negras na composição demográfica da população brasileira (55,8%). O perfil das vítimas da letalidade policial é 83% de negros, 76% com idade entre 12 a 29 anos. Nesse sentido, nota-se que jovens negros, majoritariamente pobres e residentes de periferias, são o principal alvo da letalidade policial. Em 2022, também notou-se aumento das taxas de injúria racial (aumento de 32,3%) e de racismo (crescimento de 67%). Foram, em média, 6,7 casos de racismo por dia em 2022. O Rio de Janeiro foi o estado com maior número de ocorrências e é importante lembrar que, na cidade, existe a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), o que auxilia no registro de ocorrências. Quanto aos dados referentes a população LGBTQIA+, os crimes recorrentes são os de lesão corporal, homicídio e estupro. Entretanto, existe o quadro de alta subnotificação, o que indica certa dificuldade em informar sobre a realidade da violência contra pessoas LGBTQIA+ no país.A ANTRA contabilizou 131 vítimas trans e travestis de homicídio, enquanto o GGB registrou 256 vítimas LGBTQIA+ de homicídio no Brasil. O Estado brasileiro contabilizou 163 crimes de homicídio apenas, ou seja, somente 63% do que registrou a organização da sociedade civil. A dificuldade de registro de ocorrências de racismo/injúria racial e LGBTQIA+fobia nas delegacias também contribuem para a subnotificação desses casos. O Anuário, informa que crimes de homofobia e transfobia tiveram crescimento de 53,6%, porém traz esse dado relatando a subnotificação e informando que os dados tendem a estar incompletos. Além disso, muitos estados não disponibilizaram dados sobre estes tipos de violências. Violência de gênero A violência de gênero se refere a situações diversas, como: violência física, assassinatos, violência sexual e psicológica cometida por parceiros, estupro, abuso sexual de criança e adolescentes, assédio sexual e mortal, violência cometida pelo Estado (mutilação genital, por exemplo), dentre outros. Dados do Anuário indicam que 2022 foi o ano com mais casos de estupros registrados desde o início da produção do documento, em 2011. Foram, em média, 205 estupros por dia, totalizando 74.930 vítimas. Estes números consideram também estupros de vulneráveis. https://www.politize.com.br/lgbtfobia-brasil-fatos-numeros-polemicas/ https://www.politize.com.br/violencia-de-genero-2/ https://www.politize.com.br/estupro-de-vulneravel/ Dentro disso, 6 em cada 10 vítimas têm até 13 anos. De acordo com os dados, o maior crescimento ocorreu entre estupros de vulneráveis, sendo registrados 56.829 em 2022, 8,6% a mais do que em 2021, quando foram registrados 52.057 casos. O estupro de vulnerável é considerado qualquer ato libidinoso contra uma vítima menor de 14 anos. O relatório mostra que os registros de estupros são mais frequentes no Norte do país, especialmente os estados de Roraima e Acre. Enquanto os de exploração infantil são maiores no Centro-Oeste, sobretudo Mato Grosso do Sul. O Centro-Oeste tem a maior taxa de feminicídio do país. No caso de estupro de não vulneráveis, de 2021 para 2022 o aumento foi de 7% dos casos. Em 2022 foram registrados 18.110 casos e o estado com maior variação foi o Acre, com crescimento de 31,1% de registros nos casos. O levantamento também analisou tentativas de estupros. De 2021 para 2022, o número cresceu 3%, chegando a 4.639. Além disso, casos de assédio sexual aumentaram em 48,7%. Como o levantamento considera apenas casos de ocorrências registradas nas delegacias, assim como os crimes de racismo/injúrias racial e LGBTQIA+fobia,crimes de violência de gênero também podem sofrer com a subnotificação. Os feminicídios também tiveram aumento de registros entre 2021 e 2022, sendo de 6,1%, ao passo que as tentativas de feminicídios aumentaram em 16,9%. Entre os casos de violência doméstica, o número cresceu de 237.659 em 2021, para 245.713 em 2022. Além disso, o crime de “stalking” (perseguição, em inglês), definido pela lei como o ato de seguir alguém por qualquer meio, ameaçando a integridade física ou psicológica da vítima ou invadindo a sua privacidade/liberdade, também registrou aumento de 75%. Em 2021, o número era de 30.783, em 2022 passou a ser de 53.783. Violência contra crianças e adolescentes Todos os tipos de violência contra crianças e adolescentes cresceram no país em 2022. Neste ano, mais de 102 mil menores de idade foram vítimas de algum tipo de violência. Aqui também há a preocupação com a subnotificação dos crimes. https://www.politize.com.br/equidade/blogpost/abuso-infantil-e-exploracao-de-criancas/ https://www.politize.com.br/equidade/blogpost/abuso-infantil-e-exploracao-de-criancas/ https://www.politize.com.br/feminicidio/ https://www.politize.com.br/lei-stalking/ A violência policial contra jovens de 12 a 17 anos aumentou em 17% em relação a 2021. Em 2022, a polícia matou um adolescente por dia no Brasil. Além disso, cresceu em números, casos de abandono, maus-tratos, lesão corporal, pornografia infanto-juvenil e crimes sexuais. Este último foi o que teve maior aumento proporcional em 2022, foram 51.971, 15,3% a mais que em 2021. Denúncias de exploração sexual cresceram 16,4% e registros de pornografia infanto-juvenil foi de 1.523 para 1.630. Outros crimes, como maus tratos, teve crescimento de 13,8%, além desse, abandono de incapaz foi de 8.197 para 9.348 registros. Especialistas acreditam que o aumento significativo pode ter sido em função da volta às aulas presenciais. Acredita-se que nos dois anos anteriores, 2020 e 2021, os casos ficaram sem registros, pois foram os anos que as crianças e adolescentes ficaram sem ir às escolas. Esse fato destaca o papel da escola no combate aos crimes sexuais contra crianças e adolescentes. Além disso, a publicização de casos de abuso envolvendo famosos, pode ter ajudado vítimas a entenderem o que passou e também denunciarem a situação. Violência nas escolas O Anuário também analisou dados de 2021 que mostram um aumento na percepção de violência nas escolas. Neste ano, foram relatados tiroteios ou balas perdidas em pelo menos 1,7% das escolas brasileiras, além de casos de assédio sexual em 2,3% das escolas. Devido aos quadros de violência, o calendário escolar de 2021 foi interrompido por dias em pelo menos 6,2% das escolas do Rio de Janeiro e 2,5% das escolas do Amazonas. A média nacional foi de 0,9%. As ocorrências de tiroteios ou bala perdida nas escolas têm destaque no Rio de Janeiro, com 13,5% dos casos, enquanto a média nacional é de 1,7%. Em números absolutos, ao menos 1.295 diretores escolares relataram ter vivenciado essas situações em 2021. Nesse contexto, a segurança pública emerge como uma necessidade urgente para proteger a vida e a integridade das pessoas. No entanto, o enfrentamento da violência vai além das abordagens tradicionais de repressão e punição. A relação https://www.politize.com.br/violencia-escolar/ https://www.politize.com.br/violencia-escolar/ entre violência e sistema punitivo penal é complexa e marcada por dilemas éticos e pragmáticos. O sistema punitivo penal, muitas vezes, é questionado quanto à sua eficácia em lidar com as raízes profundas da violência e promover a justiça social. O encarceramento em massa, a seletividade penal e a falta de políticas de ressocialização podem, na verdade, contribuir para a perpetuação do ciclo de violência e exclusão social. O enrijecimento do sistema punitivo penal não pode ser considerado a alternativa mais adequada para o enfrentamento da violência. Em vez disso, é fundamental investir em abordagens mais abrangentes e integradas, que considerem não apenas a punição, mas também a prevenção, a ressocialização e a promoção de políticas públicas voltadas para a redução das desigualdades sociais. A rede de educação desempenha um papel crucial na diminuição dos índices de violência. Investir em educação de qualidade, inclusiva e voltada para a promoção de valores como respeito, tolerância e igualdade pode contribuir significativamente para a formação de uma sociedade mais justa e pacífica. Diversos atores sociais devem estar envolvidos nessa missão. Além do Estado e das instituições governamentais, a sociedade civil, as organizações não governamentais, as comunidades locais, as escolas, as universidades e outros atores têm um papel fundamental a desempenhar no enfrentamento da violência e na promoção da segurança pública. É necessário um esforço conjunto e coordenado de todos os setores da sociedade para construir um país mais seguro e justo para todos os seus cidadãos.
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