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Pesquisa sobre as aspirações nacionais com vistas à reforma da constituição - relatório preliminar

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PESQUISA SOBRE AS ASPIRAÇÕES NACIONAIS COM 
VISTAS À REFORMA DA CONSTITUIÇÃO 
RELATÓRIO PRELIMINAR 
Introdução 
RELATORES: 
AFONSO ARINOS DE MELO FRANCO 
ANA LUCIA DE LYRA TAVARES 
NEI ROBERTO DA SILVA OLIVEIRA 
Introdução; 1. Singularidades desta pesquisa; 2. Objetivos; 
3. Desenvolvimento dos trabalhos; 4. Análise dos dados 
quantitativos; 5. Primeiras conclusões. 
ANA LUCIA DE LYRA TAVARES 
Desde abril de 1980, constitui uma das principais atividades do INDIPO 
a realização de uma ampla sondagem, de âmbito nacional, com o objetivo de 
identificar as aspirações mais profundas dos segmentos representativos da so­
ciedade brasileira, relativas a uma reestruturação constitucional. 
Desejoso de associar, de forma íntima e continuada, esses mesmos segmentos 
à sua iniciativa, através do acompanhamento das diferentes fases desse estudo, 
o Instituto programou o presente relatório preliminar para ser apresentado no 
final de 1982, conforme anunciara à Comissão de Constituição e Justiça do Se­
nado Federal o seu diretor, o Prof. Afonso Arinos de Melo Franco. l 
Visa-se, pois, com este documento - a partir da indicação das finalidades 
da pesquisa e de suas bases teórico-metodológicas - oferecer um primeiro re­
lato dos trabalhos até agora desenvolvidos, bem como uma análise inicial, de 
natureza quantitativa, fundada na codificação das respostas às indagações fe­
chadas dos questionários recebidos até agosto de 1982.2 
Ressalte-se, por fim, a natureza provisória de certas observações para a formu­
lação das quais torna-se necessário o completo cotejo dos dados quantitativos 
e qualitativos fornecidos pela totalidade dos questionários, objeto do relatório 
final. 
1. Singularidades desta pesquisa 
Sem desconhecer que é da conjugação do tema escolhido com o processo 
empregado para examiná-lo que decorrem, em toda a sua extensão, os traços 
1 Cf. Melo Franco, Afonso Arinos de. Poderes constituintes do Congresso. Brasília, Senado 
Federal, 1981. p. 37. 
" Os quadros estatísticos compõem o Anexo deste relatório. 
R. Ci. pol.. Rio de Janeiro, 26(1):83-195, jan./abr. 1983 
peculiares da pesquisa aqui focalizada, optou-se, porém, pela abordagem em 
separado desses dois elementos, pois ela, ao invés de impedir, enriquece aquela 
inter-relação. 
1 . l. Quanto ao tema 
Os critérios que, no Brasil, têm presidido à seleção de temas de pesquisa na 
área jurídica, sobretudo em nível individual, decorrem geralmente de motivações 
pessoais, subjetivas. Nota-se, outrossim, uma tendência recente de privilegiar-se 
estudos de oportunidade e interesses evidentes, sobretudo quando desenvolvidos 
por instituições que, para eles, pleiteiam financiamento oficial.3 
Antes, porém, que ficasse patente a intenção de favorecer-se certas linhas de 
pesquisa, era possível verificar, em alguns campos jurídicos, particularmente no 
penal, a predominância dos critérios de necessidade e utilidade imediatas e a 
adoção de métodos sócio-jurídicos que permitissem identificar as opiniões e ex­
pectativas sobre o assunto.4 
Na área do direito constitucional, os inúmeros estudos atuais sobre a ne­
cessidade de uma reforma constitucional e de suas linhas-mestras,S bem como a 
confecção de anteprojetos de Lei Magna,6 decorrem, sem dúvida, do reconheci­
mento de seu interesse comum imediato e de sua oportunidade, obedecendo, em 
parte, à orientação referida. Dela se afastam, contudo, pelo seu desenvolvimento 
em bases apriorísticas e restritas. As sugestões neles apresentadas provêm, com 
efeito, de diagnósticos calcados em teses pessoais ou de grupos de especialistas. 
Sob este aspecto, deles se distingue, substancialmente, a presente pesquisa, 
cujo título indica que o objetivo principal é a identificação de aspirações, expec­
tativas, opiniões e atitudes sobre o assunto. Não se visa, pois, a formulação de 
propostas, resultantes de teses e observações pessoais da realidade nacional. O 
que aqui se pretende é apontar as principais tendências reveladas pelos dados 
que, sobre a matéria, forem colhidos na consulta às correntes representativas da 
sociedade brasileira. 
3 Ver o trabalho, ainda em versão preliminar, do Prof. Joaquim de Arruda Falcão Neto -
Avaliação e perspectivas 1982: pesquisa e pós-graduação em direito. Recife. Instituto Joa­
quim Nabuco, 1982 - no qual, após amplo levantamento de dados e opiniões, propõe o 
apoio oficial prioritário a "pesquisas jurídico-científicas, de cunho zetético de base ou apli­
cada, voltadas metodologicamente para a realidade social brasileira presente ( ... ) (p. 14). 
~ Lembra Madeleine Grawitz, professora da Universidade de Paris, que "as pesquisas em 
ciências sociais visam detectar o que o homem pensa, sente, crê, teme, espera, aspira; como 
age e reage; suas opiniões, atitudes e motivações". (Ver Méthodes eles sciences sociales. 
Paris, DaIloz, 1976. p. 513). Com esta finalidade, na área jurídica, no Brasil, têm sido 
desenvolvidos estudos sobre delinqüência e criminologia. Ilustra este último tipo o em­
preendido pela Procuradoria Geral da Justiça de São Paulo sobre" A criminalidade violenta", 
através de indagações encaminhadas a 2.300 leitores, de seu órgão de divulgação, a revista 
Justitia, e cujos resultados figuram no v. 111, nl? 42, out.-dez. de 1980. Ver também as 
pesquisas sócio-jurídicas empíricas brasileiras relatadas na obra de Souto, Cláudio & Falcão, 
Joaquim. Sociologia e direito. São Paulo, Pioneira, 1980. p. 255-312. 
S Ver, por exemplo, as comunicações do Congresso de Direito Constitucional de Belo Ho­
rizonte, realizado em maio de 1982. 
6 Como o anteprojeto da OAB, divulgado e debatido no Congresso Pontes de Miranda, em 
setembro de 1981, em Porto Alegre. 
84 R.C.P. 1/83 
Esta finalidade é, ao que se sabe, pioneira nos estudos de direito constitucional 
empreendidos no Brasil. Decorre ela de convicções de ordem vária, sendo a 
primeira delas a da necessidade de uma reedificação constitucional, uma vez 
que o atual texto, além de carecer de uma fundamentação filosófica para a ação 
reguladora e transformadora do Poder,1 parece não corresponder mais aos an­
seios da sociedade brasileira. Esta correspondência - e é a segunda premissa -
é imprescindível para a durabilidade e eficácia da Lei Magna.8 
Sem entrar-se em considerações sobre o problema da legitimidade que esta 
idéia envolve, uma, vez que o assunto foi objeto de indagação no questionário da 
pesquisa,9 serão evocadas apenas algumas observações de Burdeau a esse respeito. 
Lembra o eminente constitucionalista francês que o consentimento é o funda­
mento básico da legitimidade e da eficácia do Poder. Este consentimento de­
corre, contudo, da adequação do Poder à idéia de direito predominante no grupo 
social, o qual resulta, por sua vez, "da coesão das vontades dirigidas para uma 
organização social melhor".lO Assim, "a idéia de direito que se incorpora na 
instituição estatal é uma idéia de direito nacional. Todas as aspirações que vi­
mos se conjugarem para constituir o sentimento nacional encontram-se na origem 
da idéia do direito".u 
Definir, portanto, a Constituição, ainda nas palavras de Burdeau, não é "mon­
tar um mecanismo harmonioso, suscetível de satisfazer a inteligência especulati­
va; é admltir, em primeiro lugar, que a Constituição nunca deixou de ser, no 
decorrer dos séculos, o ponto de convergência de aspirações humanas; e pro­
curar, em seguida, aquelas aspirações a que a Constituição pode satisfazer, para 
finalmente propor a sua imagem definitiva, a fim de que os povos possam dela 
tirar proveito, sem se expor às decepções que lhes causaria a crença numa pa­
nacéia" (o grifo é nosso) .12 
Para reforçar e enriquecer o pensamento do ilustre professor francês, vale 
serem transcritas algumas observações da socióloga Madeleine Grawitz, que se 
ajustam, de forma perfeita, à natureza e aos objetivos desta pesquisa. Assinala 
esta professora da Universidade de Paris I, no seu livro que obteve prêmio da 
Academia de Ciências Morais e Políticas da França: "As forças mais oumenos 
organizadas exprimem as idéias e as aspirações dos governados, isto é, o patri­
mônio intelectual ou espiritual, as tradições, as doutrinas e ideologias de uma 
época determinada. ( ... ) <tA noção de aspiração não se expressa, exaustiva­
mente, na representação política. Há algo de mais profundo e mais complexo 
vinculado à finalidade do poder e de sua legitimidade. O poder mais sólido é o 
que representa, verdadeiramente as aspirações da coletividade." (O grifo é nosso). 
E conclui: "Não se pode estudar, separadamente, os governantes e os gover­
nados, pois que há uma interação entre a forma pela qual o poder atua em re­
lação às necessidades dos governados e a reação dos mesmos."13 
i Ver Melo Franco, Afonso Arinos de. op. cit. p. 8. 
8 Ver Melo Franco, Afonso Arinos de. Relatório sobre reformas políticas. In: --o O Som 
do outro sino. Editora da Universidade de Brasília, 1978. p. 309. 
9 Embora tenha sido ele examinado, nos seus estudos preparatórios, à luz, sobretudo, dos 
importantes trabalhos reunidos por Paul Bastid, em L'ldée de légitimité, e da obra de Elias 
Díaz, Legalidad y legitimidad en el socialismo-democrático. (Madrid, Civitas, 1978). 
10 Burdeau, Georges. Traité de science politique. Paris, LGDJ, 1949. v. 2: L'Etat, p. 116. 
11 Id. ibid. p. 108. 
12 Id. ibid. p. 11. 
)j Grawitz, Madeleine. op. cito p. 272. 
Pesquisa 85 
A terceira e última convicção que cabe, por ora, registrar, diz respeito ao re­
conhecimento de uma capacidade transformadora do texto constitucional. Ante 
os graves problemas sociais e econômicos com que se defronta o País, acredi­
ta-se que um texto constitucional, resultante de um processo que lhe assegure 
a adesão das forças sociais de sustentação, fornecerá as bases para a elaboração 
de um instrumental jurídico apropriado ao equacionamento daqueles proble­
mas. 14 
A tese da função transformadora, exercida pela Constituição, não é, aqui, 
sustentada sem reservas. IS Na verdade, essa capacidade propulsora, não pode 
ser considerada como inerente ao texto constitucional. Ela tem suas raízes na 
própria realidade social, e é efetiva na medida em que este texto traduza, de 
forma adequada, os interesses político-jurídicos básicos das forças representa­
tivas da sociedade. 
1 .2 Quanto ao método 
A natureza do tema selecionado condicionou os procedimentos adotados para 
o seu exame. Um estudo visando detectar expectativas em relação a normas 
constitucionais requeria um desenvolvimento dentro de uma perspectiva sócio­
jurídica, com a associação de técnicas próprias à sociologia (questionários e 
análise de conteúdo) àquelas peculiares ao direito (formulações teóricas, de­
correntes de um processo lógico-formal de raciocínio, aplicação de princípios 
hermenêuticos, etc.). Esse enquadramento, quase que automático, na área da 
sociologia jurídica, acentuou a singularidade da pesquisa, pois que o emprego 
das técnicas sociológicas aludidas era inédito em se tratando de estudos sobre 
reforma constitucional, tradicionalmente empreendidos, no Brasil, por grupos 
restritos de juristas, com recurso aos métodos jurídicos. 
Inspirou-se a presente pesquisa em iniciativa similar do governo suíço que, 
em 1967, constituiu um grupo de trabalho para, através do levantamento de 
opiniões dos cantões, universidades, partidos e outros meios idôneos e interessa­
dos, indicar os fundamentos e os elementos principais de uma futura Constituição 
federal. Atentou-se, especialmente, para as vantagens que uma consulta popular 
desse gênero traria ·para o fortalecimento dos vínculos entre o indivíduo e o 
Estado.16 
Em condições materiais e humanas muito diversas das que caracterizaram o 
desenvolvimento do estudo suíço - patrocinado pelo próprio Governo - o 
INDIPO, ao ver frustradas suas tentativas de obtenção de apoio financeiro ex­
terno, foi compelido a reduzir as proporções de sua sondagem e a abrir mão 
de técnicas, como a de entrevistas locais, que a tornariam por demais onerosa. 
U Ver Melo Franco, Afonso Arinos de. Aula inaugural na Universidade Federal do Paraná. 
em 24.3.1980. In: Estudos Brasileiros, Curitiba, 8(13):104, 1982. 
IS Um de seus ilustres defensores, o ProL Garcia Cotarelo, assinala que ela se caracteriza 
por conceber a Constituição "como um instrumento dinâmico, quase como um mecanismo, 
um centro motor de um sistema que permite sua utilização com fins de transformação so­
cial e econômica". Apud Contreras, Manuel. Sobre las transformaciones constitucionales. 
Revista de Estudios Políticos, Madrid, (16):170. jul./ago. 1980. 
15 Ver Groupe de travail pour la préparation d'une révision totale de la Constitution fédé­
rale - Rapport final. Berne, Centrale Fédérale des Imprimés et du Matériel, 1973. v. 6. 
86 R.C.P. 1/83 
---~-----------------
Entretanto, como se tem verificado na fase inicial de avaliação, os imperativos 
dessa ordem não diminuíram o grau de receptividade do estudo, nem a quali­
dade das contribuições até agora recebidas. 
Sobre a oportunidade do tema, cabe, desde já, mencionar alguns dados signi­
ficativos: 
a) até agora, 94% dos respondentes manifestaram seu interesse sobre debates 
relativos à reforma constitucional.17 Nas razões alinhadas pelos professores de 
direito constitucional, ciência política e teoria do Estado - o único segmento 
por ora examinado, na parte aberta desta questão - preponderam referên­
cias às condições de cidadão e de professor das mencionadas disciplinas, moti­
vadoras de sua participação dos estudos visando a reconstrução política e jurídica 
do País.18 Os poucos que se confessam, normalmente, descrentes de tais debates 
revelam a possibilidade de uma mudança de atitude perante indagações isentas 
e construtivas, formuladas por uma instituição de reconhecida tradição no exame 
da matéria; 
b) a convicção de que uma reforma constitucional ensejará um aperfeiçoamento 
do regime democrático é partilhada por 82,8% dos interrogados, desde que -
assinalam os professores - ela seja fruto de um amplo debate que permita 
maior participação popular c concorra para a supressão de certos dispositivos 
(tais como: eleição indireta, decurso de prazo, delegação legislativa, fidelidade 
partidária e estado de emergência) que entravam a prática daquele regime; 
c) no quadro de assuntos prioritários a requererem a atenção das autoridades 
figura, ao lado do desemprego e da inflação, o tema da reforma constitucional. 19 
Ressalte-se que esta questão, como grande parte das demais, de cunho fechado, 
comporta\"a a indicação de outros assuntos nela não relacionados, o que toma 
estes índices mais relevantes. 
2. Objetivos 
Traduz o título dessa pesquisa o seu objetivo primeiro, qual seja, o de iden­
tificar as aspirações de segmentos representativos da sociedade brasileira sobre 
a reforma constitucional. 
Detectadas as tendências principais relativas ao processo de reestruturação 
constitucional e a temas suscetíveis de serem objeto da Lei Magna, não se pre­
tende elaborar um anteprojeto de Constituição. Tenciona-se, sim, encaminhar 
as conclusões da consulta ao Poder Legislativo, a título de subsídio para a sua 
missão de reedificação constitucional.20 Associando esta finalidade de cunho uti­
litário àquelas meramente acadêmicas, acredita o Instituto estar imprimindo uma 
direção adequada a este seu esforço para o aperfeiçoamento da vida institucional 
brasileira. No desempenho de sua tarefa reconstitucionalizadora, o Poder Legis-
li Ver Anexo 1, quadro 1. 
18 O que não impede de assinalar que, até agora, o índice de participação desse segmento 
esteja bem aquém das expectativas. 
19 Ver Anexo 1, quadros 7 a 7. 10. 
~o Ver Melo Franco, Afonso Arinos de. Discurso de posse do diretor do INDIPO. Revista 
de Ciência Política, FGV, 23(2):5-6, maio/ago. 1980. 
fcsquisa 87 
lativo, por certo, não poderá prescindir de diagnósticos21 como este que, sem 
qualquer conotação político-partidária, são suscetíveis de revelar as concepções 
jurídico-políticas predominantes no meio social. 
Além desses, fixaram-seos seguintes objetivos específicos - de natureza di­
versa, e por isso mesmo, não escalonáveis - à luz dos quais foram elaboradas 
as indagações: 
a) verificar a existência ou não de aspirações nacionais sobre a matéria e buscar 
as causas da ausência de opinião;22 
b) identificar globalmente, e por segmentos, as tendências majoritárias em re­
lação ao assunto. Note-se que a análise por grupos sociais não contraria, mas 
aprofunda, a avaliação global das expectativas, meta prioritária do estudo;23 
c) suscitar manifestações sobre questões básicas de um texto constitucional e 
sobre problemas notoriamente polêmicos, suscetíveis de serem focalizados na 
Lei Magna, o que explica a extensão dos questionários, os quais, sem serem de­
talhados, são bastante abrangentes. Uma orientação contrária, isto é, a formula­
ção de um número reduzido de perguntas, restringiria o campo da reflexão e 
prejudicaria o seu aprofundamento. É evidente que nem todos os interrogados 
teriam motivação, conhecimento e tempo para responder à totalidade das per­
guntas, razão pela qual foram alertados da conveniência de se limitarem àquelas 
que lhes despertassem maior interesse ou em relação às quais se considerassem 
mais familiarizados. No que se refere à abrangência dos questionários, obser­
va-se, até o momento, que ela tem se revelado satisfatória, uma vez que são 
poucos os respondentes que se valem da questão final para indicar temas ne­
les não focalizados; 
d) conferir um caráter educativo ao trabalho, acentuando-se a importância da 
participação individual e dos diversos grupos sociais no processo de constitucio­
nalização, além de levar os interrogandos à consulta da Constituição em vigor. 
Na verdade, um conhecimento maior de certos aspectos do texto vigente reve­
la-se útil, sobretudo para os leigos na matéria, para evidenciar "a desconexão 
maior ou menor entre os sistemas de valores reconhecidos socialmente e o sis­
tema de valores incorporados ao ordenamento jurídico positivo".24 
21 A esse respeito, assim manifestou-se o ProL Miguel Reale, em entrevista ao Jornal do 
Brasil: "De que adiantaria reunir os deputados e senadores sem que tais matérias houvessem 
sido previamente amadurecidas, através de pesquisas, dados estatísticos e outros? Não creio 
que o Espírito Santo Cívico possa descer numa Assembléia, para iluminá-Ia no sentido de 
- por encanto ou improviso - torná-Ia apta a oferecer um estatuto capaz de ser o 'abre-te 
Sésamo' da felicidade nacional" (reproduzida com o título" A crise constitucional do Brasil". 
in: Digesto Econômico, n.O 283, ago. 1981. 
22 Finalidade expressa, sobretudo, nas duas primeiras perguntas de ambos os questionários 
(Anexo 2). 
23 São de Burdeau estas ponderações: "I! inútil penetrar nos meandros das psicologias 
individuais, pois, por melhor que conseguíssemos classificar os móveis de adesão, que o Poder 
encontra na consciência humana, teríamos apenas recolhido uma poeira de informações 
sobre a qual nada poderia ser edificado" (op. cit. v. 2, p. 115). No mesmo sentido. mani­
festa-se Madeleine Grawitz: "Por um jogo de interações complexas, o que cada um sente, 
teme, espera, resulta num total diferente, algo que não é a soma das vontades individuais" 
(op. cito p. 53). 
24 Díaz, Elias. Sociologia y filosofia deI derecho. Madrid, Taurus Ediciones, 1976. p. 214. 
88 R.C.P. 1/83 
3. Desenvolvimento dos trabalhos 
3.1 Etapas vencidas 
3.1.1 Estudos preparatórios 
o termo estudos está, aqui, empregado num sentido amplo, para indicar não 
só documentos elaborados pela equipe da pesquisa visando a montagem do 
projeto, como também as reuniões de especialistas em que o assunto foi exami­
nado. 
3. 1.1.1 Doutrinários 
A natureza essencialmente interdisciplinar do tema levou a que se fizesse 
confluir para o seu exame elementos teóricos básicos, provenientes, sobretudo, 
do direito constitucional, da sociologia jurídica, da ciência política e da socio­
logia política, embora alguns autores não façam distinção entre essas duas úl­
timas áreas do conhecimento.25 Serviram de fonte de consulta trabalhos clássicos 
e recentes, nacionais e estrangeiros, desses campos do saber.26 
Constituiu, porém, o ponto de partida, a análise de conteúdo de uma obra 
nacional básica e atual de direito constitucional,27 que permitiu a seleção de 
conceitos-chave e orientou a delimitação dos campos de indagação. 
À indicação completa de elementos clássicos e modernos que concorrem para 
o arcabouço conceitual desta pesquisa, preferiu-se destacar os seguintes pessu­
postos teóricos que podem ser inferidos do seu próprio título, assim como do 
enunciado de certas questões: 
a) a concepção de Constituição como o elemento condicionante de todo o ins­
trumental jurídico,28 integrante de uma estrutura mais ampla e, por isso mesmo, 
só tendo sentido quando articulada com os componentes sociais, ideológicos, 
culturais, econômicos e políticos dessa estrutura;29 
b) o reconhecimento de que um texto constitucional não desempenha apenas 
um papel de tradutor dos valores normativos predominantes, mas também o de 
propulsor de transformações sociais;30 
25 Entre eles, Roger-Gérard Schwartzenberg. professor da cadeira na Universidade de 
Paris. que considera as duas expressões "quase sinônimas". (Ver Sociologie po/itique. Paris. 
Montchrestien, 1977. p. v.) 
26 Os principais trabalhos consultados deverão ser listados no relatório final. 
27 Melo Franco, Afonso Arinos de. Direito constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense. 
1981. Esta análise baseou-se no trabalho do Prof. Maurice Duverger - Ciência política: 
teoria e método. Rio de Janeiro, Zahar, 1962 - e figura no documento em que foi apre­
sentado o Projeto da pesquisa. 
28 Ver Melo Franco, Afonso Arinos de. Aula inauguraL .. op. cit. p. 104; e Tamayo y 
Salmorán, Ricardo. Cambios constitucionales. p. 161. 
29 García-Pelayo, Manuel. Organizaciones de interesses y teoria constitucional. In: Cons­
tItllción y grupos de presión en América Latina. México, UNAM, 1977. p. 29-30. 
30 Ver a coletânea de trabalhos de Resta, Eligio, org. Diritto e transformazione sociale. 
Roma, Laterza, 1978. 
Pesquisa 89 
c) a associação dos atributos de eficácia e estabilidade da Lei Magna ao de­
senvolvimento de um processo constituinte em que o recurso aos mecanismos de 
debate31 permita levar em conta os anseios dos "atores político-constitucionais";32 
d) a verificação da necessidade de o ordenamento jurídico fundamental obter 
o apoio das forças políticas, sociais, econômicas e culturais que atuam sobre a 
\'ida institucional para superar-se a tradicional defasagem entre o formal e o 
real;33 
e) o juízo de que o desenvolvimento de um processo de reconstitucionalização 
em bases nacionais não é incompatível com o recurso à experiência constitucional 
estrangeira contemporânea. Com efeito, nela podem ser colhidos subsídios válidos 
para o aperfeiçoamento do texto fundamental, à luz dos conhecimentos forne­
cidos pelos estudiosos de transplantes jurídicos, evitando-se, assim, os riscos 
de uma recepção inadequada ou conduzida. como nos textos anteriores, de forma 
irrealista ;34 
Dentro dessa orientação, foram analisados pronunciamentos recentes de par­
lamentares e juristas sobre a matéria, assim como os processos suíço, espanhol e 
português de reforma constitucionaJ.35 
Em relação ao modus faciendi da reforma, procurou-se aprofundar o exame 
de atos legislativos suscetíveis de viabilizar a outorga de poderes constituintes a 
um novo Congresso. Foram, então, elaboradas notas sobre as resoluções legis­
lativas - nelas incluída a resolução concorrente do sistema norte-americano -
e os decretos legislativos. 
A esse respeito, vale mencionar que até o momento o número de entrevista­
dos que preferiram tal alternativa equivale ao dos defensores de uma Assembléia 
Constituinte,36 segunda opção proposta. 
Entre os méritos apontados pelos que indicaram a primeira fórmula estão a 
rapidez, a tranqüilidade e a autenticidade de um processo conduzido pelos legí­timos representantes da vontade popular. Um dos entrevistados evocou o pre­
cedente da lei de 12 de outubro de 1832, do período em que Francisco de Lima 
e Silva era Secretário dos Negócios do Império. O parágrafo inicial do seu ar­
tigo único dispunha: "Os eleitores dos deputados para a seguinte legislatura 
lhes conferirão nas procurações especial faculdade para reformarem os artigos 
da Constituição ... " Os que apóiam a segunda fórmula, embora reconheçam 
'I Sobre a importância de multiplicação desses mecanismos, ver, entre outros, Lafer, Celso. 
O Sistema político brasileiro, São Paulo, Perspectiva, 1978. p. 122. 
32 Denominação dada por García-Pelayo às entidades extraconstitucionais (elites políticas. 
partidos, grupos de pressão e de interesse) "através das quais se atualiza a Constituição e 
que representam a mediação entre o sistema constitucional como mera ordem normativa 
e o sistema constitucional como ordem jurídico-política de um povo". García-Pelayo, M. 
op. cito p. 10. 
33 Ver, por exemplo, as sugestões de José Guillermo Acuíia, para vencer-se este descom 
passo, entre elas a análise das causas que impedem a participação mais ampla dos diversos 
grupos nos benefícios sociais (Los Cambias constitucionales. México, UNAM, 1977. p. 6 
e 10. Por outro lado, como lembra Afonso Arinos de Melo Franco, "quando os instrumen­
tos constitucionais coincidem com as conveniências históricas predominantes, eles são 
eficazes e duradouros" (Relatório sobre reformas. " op. cit. p. 309). 
34 Ver as obras clássicas de direito constitucional comparado de García-Pelayo, Biscaretti 
di Ruffia, Luis Sanchez Agesta, além dos estudos recentes sobre importações jurídicas. 
desenvolvidos não só naquela área como também na da sociologia do direito. 
35 Estes e os demais estudos preliminares deverão figurar, em anexo, no relatório final 
da pesquisa. 
36 Ver Anexo 1, quadro 13. 
90 R.C.P. 1/83 
os riscos de tumultos e de abalos institucionais que ela envolve, consideram-na 
como o único meio realmente eficaz para tal fim, dada a especificidade do man­
dato conferido pelo povo aos integrantes de uma Assembléia Constituinte. 
Os defensores, numericamente inferiores, de uma terceira opção, ou seja, da 
revisão global da Constituição por meio de emendas, realçam a facilidade de 
sua concretização, a inexistência de perigo de traumatismos institucionais e sua 
eficácia na atualização dos dispositivos relativos à ordem econômico-social da 
Lei Magna, uma vez que as estruturas básicas tendem a subsistir. 
Além dos estudos desenvolvidos com base na análise de fontes documentais, 
registrem-se as contribuições de relevo fornecidas pelos participantes das mesas­
redondas organizadas tradicionalmente pelo INDIPO, e que, nessa fase prepa­
ratória da pesquisa, versaram não só sobre a reforma constitucionaP7 como tam­
bém sobre temas de interesse sócio-político imediato.38 
3.1.1.2 Metodológicos 
A peculiaridade dos objetivos desta pesquisa e os limitados recursos para 
desenvolvê-la levaram a encará-la como um estudo exploratório, do qual re­
sultasse a indicação das principais expectativas em matéria de reforma consti­
tucionaJ.39 
Assim, a exemplo do que costuma ocorrer em trabalhos dessa natureza,4O não 
houve o propósito de formular hipóteses a serem testadas, finalidade que pode­
ria, certamente, ser a de um estudo posterior, realizado a partir dos dados for­
necidos pela presente pesquisa.41 
Acresce que tal propósito não se coadunaria com um dos fins da investigação 
- o oferecimento de subsídios ao Poder Legislativo - uma vez que os ele­
mentos informativos seriam coletados em função da confirmação ou da rejeição 
de certas hipóteses, tomando mais complexa a sua utilização em outro contexto. 
A delimitação do campo da pesquisa requereu, por sua vez, uma série de aná­
lises, não só quanto ao tema e ao universo a ser examinado, como também em 
relação ao instrumental disponível para sua realização. 
Examinaram-se, então, as exigências do processo de coleta de dados numa 
pesquisa sobre reforma constitucional relativas ao fundo, à forma e aos desti­
natários das indagações. Sem pretender-se reproduzir tais análises,42 convém re­
gistrar que foram consideradas, neste estudo prévio: a natureza das normas cons­
titucionais; o conteúdo mínimo de um texto básico; a diversidade de tipos de 
Constituição; as cautelas no emprego da terminologia jurídica numa investiga-
37 Ver Revista de Ciência Política, FGV, 24(3):94-117, set./dez. 1981. 
38 Tais como: a criminalidade (RCP, 23(3):163-223, set. 1980), o relacionamento jurídico 
Estado-Igreja no Brasil contemporâneo (RCP, 24(1):128-69, abro 1981), a condição política 
e social da mulher (RCP, 25(1):77-106, abro 1982) e problemas da terra (RCP, 25(2):64-87. 
ago. 1982). 
3', Ver Selltiz, JahoJa & Deutsch. Métodos de pesquisa das relações sociais. São Paulo. 
Herder, 1965. p. 62. 
40 Ensina Madeleine Grawitz que "as pesquisas exploratórias ( ... ) não são suscitadas por 
uma hipótese precisa, sendo, sobretudo, descritivas" (op. cit. p. 840). 
41 O exame prévio, exploratório, permite, muitas vezes, a formulação e o teste de hipóte­
ses em trabalhos subseqüentes. (Selltiz, Jahoda & Deutsch. op. cito p. 62). 
4Z Elas deverão figurar no relatório final. 
Pesquisa 9\ 
ção jurissociológica; os imperativos da formulação das questões, tendo-se em 
vista a população consultada e o objetivo de obter-se uma contribuição válida 
para o assunto. 
Ao demarcar-se o universo da consulta, com o emprego da técnica de amos· 
tragem aleatória simples, teve-se em mente, sobretudo, a expressão nacional dos 
segmentos, o grau de representatividade dos interesses de várias ordens e a sua 
diversidade. A opção recaiu, então, sobre os seguintes grupos: prefeitos (I), 
professores (II), dirigentes sindicais (IH) e personalidades (IV). 
A escolha do Grupo I (prefeitos) decorreu do reconhecimento da importância 
de identificarem-se as expectativas daqueles que atuam no nível fundamental -
e tradicionalmente relegado - da organização administrativa do País. 
Além do mais, a proximidade de sua ação para a comunidade e os múltiplos 
aspectos que ela recobre, tornava-os particularmente habilitados para a con­
secução dos objetivos deste estudo. Dentro do grupo, selecionaram-se os prefeitos 
que representassem centros regionais e sub-regionais de população superior a 
50 mil habitantes, totalizando 404 municípios.43 Excluíram-se, deste segmento, 
as capitais dos estados pela sua condição de centros metropolitanos, representa­
dos, largamente, em outros grupos da pesquisa. 
Como integrantes do Grupo H (professores) foram selecionados docentes de 
direito constitucional, de teoria do Estado e de ciência política das 17 principais 
instituições universitárias, privadas e públicas do País. A inclusão deste grupo 
fala por si, mas não é ocioso assinalar o entusiasmo de alguns mestres por esta 
oportunidade de transmitirem, com uma intenção prática precípua, o fruto de 
seus estudos e de sua experiência sobre o assunto. 
A consulta ao Grupo IH (dirigentes sindicais) é um dos traços que distin­
guem esta sondagem do estudo suíço já referido, e no qual foram entrevistados 
representantes de 25 cantões, 9 partidos e 9 universidades.44 O concurso de re­
presentantes das classes profissionais foi solicitado tendo-se em vista a riqueza 
de sua vivência dos problemas sociais e a importância de sua atuação junto à 
comunidade e às instituições. Foram interrogados 831 sindicatos de projeção 
regional, sediados em locais de maior densidade demográfica. 
A constituição de um Grupo IV (personalidades) resultou do objetivo de 
identificar os anseios e propostas daqueles que têm desempenhado funções re­
levantes nos quadros políticos, jurídicos, culturais e empresariais. Considerou-se 
que seria imprescindível a consulta aos que, por sua atuação, no presente e no 
passado, têm uma visão definida de inúmeros problemas institucionais. Foram 
incluídos, nesta categoria, políticos, profissionais liberais de renome(sobretudo 
advogados), magistrados, empresários e presidentes de entidades culturais e so­
ciais de expressão nacional. 
Convém realçar que, se, por um lado, os resultados negativos na busca de 
financiamento externo não afetaram as dimensões desse universo da consulta:5 
por outro, eles restringiram o campo de escolha das técnicas desta pesquisa. 
43 Anuário Estatístico do Brasil. Rio de Janeiro, IBGE, 1981. 
44 Ver nota de rodapé 16. 
45 Uma vez que foi mantido o objetivo de realização de cerca de 2 mil entrevistas, indi­
cado no projeto da pesquisa. Saliente-se que não se teve em vista a realização de um 
número excessivamente elevado de consultas, dando-se prioridade ao exame do grau de 
representatividade e de credenciamento intelectual e profissional dos informantes para o 
trato de questões constitucionais gerais e especializadas. 
92 R.C.P. 1/83 
Com efeito, previra-se, inicialmente, o emprego de três instrumentos princi­
pais: as entrevistas, os questionários e a análise de fontes documentais (artigos 
de periódicos jurídicos, entrevistas e estudos divulgados por órgãos representa­
tivos da imprensa escrita). 
Entretanto, ante os limitados recursos financeiros disponíveis e as tentativas 
infrutíferas de ampliá-los por via de auxílio externo, viu-se a direção do projeto 
obrigado a abrir mão da técnica de entrevistas, mais dispendiosa que as demais. 
Ela implicaria deslocamentos pelo País de um número elevado de pesquisadores 
e a conseqüente realização de despesas que estariam além das possibilidades do 
Instituto. 
Passou-se, pois, por força dessas circunstâncias, a privilegiar a técnica de 
questionários, apesar de suas conhecidas deficiências quantitativas - com índi­
ces de respostas não superiores a 30% - e qualitativas, dadas as possibilidades 
de imprecisões decorrentes de uma compreensão errônea das questões formu­
ladas. 
3.1.2. Montagem e apresentação do projeto 
Definidos o referencial teórico e os instrumentos da pesquisa, passou-se para 
a fase de praxe de montagem do projeto. No documento que o formalizou fo­
ram expostos seus objetivos, suas técnicas de coleta e de tratamento de dados, 
os critérios que nortearam a seleção dos segmentos, a análise de conteúdo já 
mencionada, o roteiro inicial das entrevistas, o cronograma de trabalho e a re­
lação das fontes a serem consultadas. 
3.1.3 Elaboração e primeira remessa dos questionários 
Os aspectos técnicos do tema e a diversidade de formação intelectual dos in­
terrogados tornaram aconselhável a elaboração de dois tipos de questionário: o 
nÇl 1, destinado à maioria dos consultados, vazado em linguagem comum e não 
comportando questões de técnica constitucional; o nÇl 2, de cunho mais jurídico, 
encaminhado ao segmento dos professores e às personalidades dos círculos do 
direito e da política.46 Em ambos os tipos, foram incluídas perguntas abertas 
(comportando respostas indeterminadas) e fechadas (com alternativas fixas). 
À luz das premissas teóricas e dos objetivos específicos da sondagem, após 
algumas indagações gerais sobre a conveniência de uma reforma constitucional 
e os meios de promovê-la, centraram-se as perguntas em torno de temas tradi­
cionalmente focalizados na Lei Magna47 e de problemas notórios da vida insti­
tucional brasileira (inflação, desemprego, terra, controle de estatais, etc.). Inse­
riram-se, também, perguntas sobre questões geradoras de crises institucionais 
(prerrogativas parlamentares, vice-presidência, etc.), visando-se a colher mani­
festações sobre normas constitucionais suscetíveis de preveni-las. 
Dado o caráter mais técnico do questionário 2, nele foram solicitadas opi­
niões sobre a viabilidade de certos transplantes jurídicos (como um Tribunal 
46 Os questionários 1 e 2 estão reproduzidos no Anexo 2. 
47 Ver o item 4 (Análise dos dados quantitativos), em que se reproduz a ordenação da­
queles temas. 
Pesquisa 93 
Constitucional, juizados distritais, o ombudsman escandinavo). Por outro lado, 
no quadro das finalidades educativas já aludidas, foram freqüentes as referências 
ao texto vigente. 
A partir de dezembro de 1981, iniciou-se a primeira remessa dos questioná­
rios, que foram anexados a uma carta, na qual se indicavam os objetivos do 
estudo, seu ineditismo, bem como as razões da importância da contribuição do 
destinatário. Com base nos 151 questionários recebidos até agosto de 1982, 
empreendeu-se uma avaliação quantitativa inicial das questões fechadas, objeto 
do item 4 deste relatório. 
3.2 Etapas a vencer 
3.2.1 Segunda remessa dos questionários 
A segunda remessa, em curso, dos dois tipos de questionários - anexados à 
carta na qual se reitera a importância da participação do informante numa con­
sulta dessa natureza - deverá estar concluída até dezembro de 1982. 
3.2.2 Análises quantitativa e qualitativa 
A avaliação preliminar que se segue baseou-se, conforme foi salientado, nos 
dados extraídos da codificação das perguntas fechadas dos questionários rece­
bidos até agosto de 1982. Nela serão injetadas outras informações coligidas, 
nào só através das questões de mesma espécie dos questionários recebidos pos­
teriormente, como também por meio da análise das perguntas abertas de todos 
os questionários. Se se tiver em conta, além disso, a necessidade de integração 
desses dados com aqueles provenientes das análises documentais, não será difícil 
perceber a natureza provisória de certas observações do presente relatório, so­
bretudo aquelas de cunho justificativo. 
3.2.3 Relatório final 
Esse documento constará, sobretudo, do exame conjugado das informações 
obtidas através das análises qualitativa e quantitativa dos questionários, com 
aquelas provenientes dos estudos documentais, chegando-se, então, à indicação 
das conclusões gerais da pesquisa. 
4. A nálise dos dados quantitativos 
NEI ROBERTO DA SILVA OLIVEIRA 
Cabe aqui lembrar que nossa análise restringe-se aos questionários recebidos 
pejo Instituto do Direito Público e Ciência Política (JNDIPO) da Fundação 
Getulio Vargas no período de janeiro a agosto de 1982, abrangendo o exame 
94 R.C.P. 1/83 
de 151 questionários, provenientes dos questionários I e 11,48 e, neste relatório 
preliminar, especificamente das perguntas fechadas. Acredita-se que os resul­
tados a serem apresentados são expressivos e já delineiam as expectativas ime­
diatas dos segmentos consultados. 
4.1 Reforma constitucional 
o conjunto de perguntas sobre reforma constitucional49 re\ela que os debates 
sobre o tema em questão suscitam interesse; que uma reforma constitucional 
permitirá o aperfeiçoamento democrático; excetuando-se os dirigentes sindicais, 
há uma concordância com que um regime constitucional estável depende de 
fatores estranhos ao texto da Constituição. 
Consultando-se os especialistas sobre os processos propostos para a reforma 
do atual texto constitucional, sobressai o interesse tanto para a outorga de plr 
'deres constituintes a um novo Congresso quanto pela eleição de uma Assem­
bléia Constituinte. 
No que se refere ao acompanhamento da dinâmica das relações sociais, veri­
ficou-se que o texto constitucional deve limitar-se a um conteúdo mínimo, ex­
presso por normas sintéticas, básicas e abrangentes, deixando-se à legislação 
ordinária a sua atualização. 
De uma forma genérica, quando se questionou acerca da necessidade de uma 
nova Constituição para o Brasil, obteve-se um resultado bastante significativo, 
uma vez que 79,8% das respostas foram positivas. 
4.2 Princípios fundamentais do Estado e do Governoso 
Entre os princípios e objetivos básicos que deveriam figurar no texto cons­
titucional destacam-se, em ordem de preferência: 
% 
1. Promoção do bem social 89,4 
2. Proteção dos direitos humanos 88,7 
3. Liberdade e justiça 86,8 
Igualdade perante a lei 86,8 
4. Regime representativo 80,8 
5. Supremacia da lei 80,1 
6. Pluralismo político expresso pelos partidos políticos 78,1 
7. Forma federativa de Estado 77,5 
Por outro lado, a opção pela 'ação política dos sindicatos'obteve o percen­
tual médio de 42,4%, embora 62,3% dos dirigentes sindicais a tenham assina­
lado. Por último, indicado apenas por 33,1 % dos consultados, está a questão 
do relacionamento Estado-Igreja. 
48 Ver modelo dos questionários - Anexo 2. 
4~ Ver, em anexo, quadros 1 a 1.7. 
50 Ver, em anexo, quadros 2, 2.1 e 2.2. 
Pesquisa 95 
Quanto ao sistema democrático de governo, observou-se o fato de que 68,2 % 
dos interrogados assinalaram o presidencialismo, e somente 18,6% o parlamen­
tarismo. Vale notar que 13,2% não responderam à questão. Não menos signi­
ficativos são os dados específicos relativos aos professores, quando, então, esta 
divergência de opiniões decresce: presidencialismo, 48,5 %; e parlamentaris­
mo, 36,4%. 
Sabe-se que, geralmente, os textos constitucionais brasileiros se iniciam com 
dispositivos sobre a organização do Estado, sucedidos por normas relativas aos 
direitos e garantias individuais, para se encerrarem com a enumeração dos prin­
cípios atinentes à ordem econômica e social. No que se refere a esse aspecto, o 
mais imediato a destacar ·é que 68,1% dos professores e personalidades afirma­
ram que a disposição usual deveria ser mantida, pois uma alteração na ordem de 
apresentação dos assuntos não traria maior repercussão na aplicabilidade do 
texto. Divergiram desta opinião 25,5 % dos respondentes que acreditam dever 
esta ordem ser invertida para que sejam ressaltados novos anseios sociais e po­
líticos. Alguns destes consideraram também que, além de uma inversão, outras 
modificações na disposição das matérias deveriam ser previstas. Observe-se, ain­
da, que 6,4% dos entrevistados apontaram uma alternativa diversa das apre­
sentadas. 
4.3 Organização do Estado FederaISl 
No que concerne à possível existência de partidos políticos estaduais, pre­
\alece a idéia de que eles não devem existir, desde os 80% dos prefeitos con­
trários a tal medida, até os 66,6% dos professores. 
É oportuno mencionar que 74,9 % dos respondentes consideraram a partici­
pação no processo político dos partidos atuais como não-eficaz. 
Às respostas sobre os meios de fortalecimento da organização municipal indi­
cam que 72,2 % dos entrevistados pleiteiam o aumento e a especificação de suas 
fontes de receita, assim como a ampliação de sua jurisdição administrativa e 
política. 
Além disso, verifica-se que 73,5% dos respondentes pensam que as leis de 
organização municipal devem atender às peculiaridades regionais e locais. Isto 
se aplica, sobretudo na percepção dos professores (84,9 % ) e dos prefeitos (80 % ) . 
Em relação a indagação - exclusiva aos peritos - sobre a conveniência ou 
não da elevação dos organismos regionais e das regiões metropolitanas à condi­
ção de unidades federadas, não houve consenso, com 46,8 % de respostas nega· 
tivas e 42,5 % de positivas. 
Por outro lado, para 61,7 % dos informantes, a criação de novos estados, o 
desmembramento ou a fusão de alguns deles deve ser matéria de referendo po­
pular; para 21,3 %, objeto de lei complementar (como prescreve o texto atual) 
e, para apenas 10,6%, o assunto é da alçada das Assembléias estaduais. Os 6,4% 
restantes deram uma outra informação. 
Diante da questão "Como compatibilizar o planejamento federal, método in­
dispensável de governo, com o federalismo?", a maioria optou pelo "estabele­
cimento da participação dos Estados no planejamento" (78,7%), sendo que 
51 Ver, em anexo, quadros 3 a 3.9. 
96 R.C.P. 1/83 
- ----------------------
apenas 8,5 % consideram necessária a eliminação do caráter político do planeja­
mento; além disso, 12,8% apresentaram outras sugestões. 
Não há uma concordância na questão, formulada apenas aos peritos, em re­
lação à intervenção federal nos Estados: para 46,8% dos interrogados o instituto 
deve ser mantido na forma atual; 36,2% afirmam que novos elementos devem 
ser incluídos na sua regulamentação constitucional; 10,6% preferiram não opinar 
sobre o assunto e ainda 6,4% apresentaram outras sugestões. 
No que se refere à criação de senados estaduais, questão formulada, apenas 
no questionário 2, 89,4% manifestaram-se negativamente. 
De forma geral, os especialistas consultados consideram que o aperfeiçoamento 
do sistema federal exigiria: 
a criação de novos estados por divisão territorial dos existentes (34,1 % ) ; 
- a transformação do maior número de territórios em estados (14,9 % ) ; 
- a facilitação do estabelecimento de municípios (10,6%). Outras alterna-
tivas foram indicadas por 29,8%, sendo que 10,6% não opinaram. 
4.4 Estrutura e articulação dos poderes 
4.4.1 Legislativ052 
Duas opções mereceram a preferência dos interrogados no que diz respeito à 
composição da Câmara dos Deputados: o aumento do número de representantes, 
proporcionalmente à população, sem fixação de limites (34,4%) e a manutenção 
do número atual de cadeiras (31,8%). 
Quanto à composição do Senado Federal, a maioria pensa que deve ser man­
tido o limite de 35 anos, enquanto apenas 13,9% acreditam que o limite deve 
ser o mesmo fixado para a Câmara dos Deputados. 
Sobre a questão relativa à manutenção ou não da enumeração das matérias 
de competência exclusiva do Congresso Nacional (art. 44 do texto vigente) divi­
diram-se as opiniões entre as alternativas "não deve sofrer alteração' e "deve 
ser alterada para a inclusão de outras matérias" (36,2 % cada). 
Sobre o sistema eleitoral, tem-se como fator determinante para o aperfeiçoa­
mento do regime democrático a eleição direta em todos os níveis (67,5 % ). Tal 
expectativa eleva-se para 83,6% entre os dirigentes sindicais. 
No que se refere à introdução do voto do analfabeto, aproximadamente um em 
cada dois dos respondentes aceitam esta inovação. Por outro lado, o voto majo­
ritário distrital é aceito por 27,8% dos respondentes, sendo que este percentual 
atinge 39,4% dos professores. 
Em seguida, examinando-se as opções sobre o tema das prerrogativas parla­
mentares, a visão dos respondentes,53 em ordem de prioridades, é a seguinte: 
- as imunidades não excluiriam ação do Ministério Público aos crimes co­
muns, ação esta sustável pelo Congresso, se provada sua conotação política 
(65,6% ); 
- a imunidade durante o estado de sítio somente poderia ser suspensa com 
a aprovação de 2/3 dos votos da Casa à qual pertencesse o parlamentar (33,8%); 
52 Ver, em anexo, quadros 4 a 4.9. 
53 Respostas múltiplas, conseqüentemente n diferente de 100%. 
Pesquisa 97 
dever-se-ia restabelecer integralmente a imunidade parlamentar (25 .2l7c ) ; 
outras opções (12,6%). 
A controvérsia acerca da aprovação de projetos do Executivo por decurso 
de prazo se manifesta nos resultados obtidos. Segundo as personalidades entre­
vistadas, ela deve ser mantida (57,1 %); por outro lado, os professores (a maio­
ria de direito constitucional) a rejeitam (60,6%). 
Em relação aos atos enumerados no texto atual como compreendidos no pro­
cesso legislativo - emendas constitucionais, leis complementares, leis ordinárias, 
leis delegadas, decretos-leis, decretos legislativos, resoluções - de acordo com 
38,3% dos especialistas, deveriam ser todos mantidos; para 44.7%, alguns de­
veriam ser eliminados. 
Ressalte-se a concordância, entre os professores entrevistados, de que deveriam 
constar do texto constitucional formas de consulta por referendo ou plebiscito 
(84,9%), atitude não partilhada pelas personalidades (35,7%). 
A pesquisa revelou ainda que é aceitável o controle do povo em relação aos 
seus representantes, no desempenho de seus respectivos mandatos (70,20(): tal 
índice eleva-se para 85,7% entre as personalidades ouvidas. 
4.4.2 ExecutivoS<! 
o primeiro fato a ser levado em consideração diz respeito ao sistema de go­
verno: 41 % consideram que deve ser mantido o sistema presidencial, rea1izando­
se as eleições por via direta, para um mandato de quatro anos; para 14,6% 
deve ser introduzida a forma parlamentar, com eleição direta para presidente da 
República. Verifica-se, pois, que, explicitamente, 55,6% de todos os segmentos 
consultadosoptam por eleições diretas para a escolha do presidente da Repú­
blica. Porém, 17,9% discordam desta opinião, afirmando que deve ser mantido 
o sistema presidencial, com eleição indireta, de seis em seis anos, para a presi­
dência da República, e 24,5 % apresentaram outras alternativas. Somente 2 % 
não se manifestaram sobre o assunto. 
O segundo fato a ser destacado é a opção da maioria dos peritos de que o 
texto constitucional reúna, num só capítulo, normas gerais sobre a Administração 
direta e indireta, remetendo-se para a legislação ordinária dispositivos mais espe­
cíficos sobre as Forças Armadas, os funcionários públicos e o Ministério PÚ­
blico (55,3%). 
Outros dados revelam que o texto constitucional deveria fixar certos princípios 
visando limitar a ação e controlar os órgãos da Administração indireta (empresas 
públicas, autarquias, sociedades de economia mista) e as fundações instituídas 
pelo poder público (70,2 % ). 
Diante da questão "Nas modernas democracias aumentaram muito as atribui­
ções do Poder Executivo (Governo) quanto à iniciativa e à feitura das leis. O 
Poder Legislativo (Congresso) passou a exercer predominantemente funções de 
fiscalização administrativa e orientação política. É aceitável essa mudança?, cabe 
assinalar o posicionamento favorável dos prefeitos entrevistados (72 % ), contra-
õ-I Ver. em anexo, quadros 4.10 a 4.18. 
98 R.C.P. 1/83 
riam ente aos 50% das personalidades e 49,2 % dos dirigentes sindicais que não 
a aceitam. 
Não se pode deixar de encarar como significativa a visão dos prefeitos e dos 
dirigentes sindicais, em relação à questão - bastante objetiva - sobre qual seria 
a melhor forma de voto para presidente da República: 
Segmentos consultados 
Prefeitos 
Dirigentes sindicais 
Eleição direta 
64,0% 
85,2% 
Eleição indireta 
32,0% 
11,5% 
S/I 
4,0% 
3,3% 
Em relação à questão da legalidade e da legitimidade dos Poderes Executivo e 
Legislativo, assim manifestaram-se os respondentes: 
No Brasil, o Poder Executivo tem legalidade (Sim = 77,9%); 
No Brasil, o Poder Legislativo tem legalidade (Sim = 79,8%); 
No Brasil, o Poder Executivo tem legitimidade (Sim = 33,6%); 
No Brasil, o Poder Legislativo tem legitimidade (Sim = 56,7%); 
No Brasil, o Poder Executivo tem legalidade (Não = 9,6%; s/i = 12,5%); 
No Brasil, o Poder Legislativo tem legalidade (Não = 2,9 %; s/i = 17,3 % ) ; 
No Brasil, o Poder Executivo tem legitimidade (Não = 51 %; s/i = 15,4%); 
No Brasil, o Poder Legislativo tem legitimidade (Não = 26,9%; s/i = 
16.4%). 
Consolida-se a impressão, a partir desses segmentos consultados, que há uma 
expectativa de que se amplie o grau de legitimidade do Poder Executivo. Quanto 
8.0 Legislativo, a confiança na legitimidade é majoritária. 
4.4.3 Judiciári055 
Com referência às alternativas propostas para o aperfeiçoamento da estrutura 
e do funcionamento do Poder Judiciário, da seguinte forma posicionaram-se os 
especialistas: 56 
- criação de juizados nos bairros, para julgamento de pequenas causas (68,1 % ) ; 
criação de uma jurisdição agrária (44,7 % ) ; 
criação de juizados de instrução (42,6%); 
predominância do procedimento oral, sobretudo em matéria criminal (42,6%); 
criação de um contencioso administrativo (36,2%); 
criação de Supremos Tribunais estaduais (6,4 % ). A notar que outras su­
gestões foram oferecidas por 55,3% e que apenas 2,1 % não responderam à 
pergunta. 
55 Ver, em anexo, quadro 4.19. 
5& Respostas múltiplas, conseqüentemente n diferente de 100%. 
Pesquisa 99 
4.4.4 Equilíbrio dos poderes57 
Sobre a necessidade de um Tribunal Constitucional, não só para o controle da 
constitucionalidade das leis (atualmente a cargo do Supremo Tribunal Federal), 
mas também para dirimir conflitos entre as unidades da federação e entre os 
poderes, similar aos que existem na República da Alemanha e na Áustria, os 
especialistas não chegaram a um consenso, pois, enquanto a maioria dos profes­
sores é favorável à sua criação (51,5 % ), somente 28,6 % das personalidades têm 
esta opinião. 
4.5 Direitos e garantias individuais58 
Sobre a inclusão de outros direitos individuais, além dos proclamados no texto 
vigente (art. 153) e os relativos ao trabalhador (art. 165), foram os seguintes, 
por ordem de prioridade, os direitos indicados: 
à saúde (72,8%); 
ao amparo à velhice (68,9%); 
à defesa dos consumidores (65,6%); 
ao seguro-desemprego (64,9%); 
à informação (61,6%); 
à privacidade, isto é, à reserva da intimidade da vida privada e familiar 
(61,6%); 
ao lazer (57,6%); 
- à segurança ambiental e ecológica (55,6%); 
- à própria imagem, isto é, à interdição de fotos lesivas à reputação ou daquelas 
tiradas à revelia (50,3 % ) ; 
- outros (29,1 %). 
Destaque-se, ainda, as duas primeiras opções de cada um dos segmentos con­
sultados: 
Prefeitos - primeiro, à saúde (84%); segundo, ao amparo à velhice (80%); 
Personalidades - primeiro, à saúde (62,5 % ); segundo, à informação (46,9%), 
ao amparo à velhice (46,9%); 
Professores - primeiro, à segurança ambiental e ecológica (72,7%); segundo, 
à defesa dos consumidores (60,6 % ), à privacidade (60,6 % ) ; 
Dirigentes sindicais - primeiro, à saúde (81,9 %), ao amparo à velhice 
(81,9 % ); segundo, à defesa dos consumidores (80,3 % ). 
Dentro do mesmo item, formulou-se a indagação da conveniência de o texto 
constitucional limitar-se aos direitos essenciais, fazendo remissão expressa aos 
tratados e declarações internacionais subscritos pelo Brasil na matéria. Nenhuma 
57 Ver. em anexo. quadro 4.20. 
58 Ver. em anexo. quadros 5 a 5.5. 
100 
BIBLIOTECA 
fVND::';;AO GETULIO VAR5~ .. 
R.C.P. 1/83 
tendência majoritária pôde ser apontada, pois que 39,1 % dos respondentes dis­
seram "sim"; 33,1 %, "não"; 24,5 %, preferiram não se manifestar e, ainda, 3,3% 
apresentaram outras opiniões. 
Em seguida, perguntou-se aos peritos: "Seria aconselhável a distinção, exis­
tente em outras Constituições, de direitos reivindicáveis perante os tribunais (di­
reito à vida, à honra, à liberdade, etc.) e de direitos não reivindicáveis judicial­
mente, apresentados mais como princípios diretores da política legislativa e da 
administração (direito à saúde, ao pleno emprego, à habitação, à cultura, etc.)?" 
Constatou-se que a grande maioria não concordou com a distinção proposta 
(65,9%) e pouco mais de 25% reconheceram-na viável. 
Outro indicador, particularmente sugestivo, refere-se à questão da criação de 
órgão equivalente ao ombusdman escandinavo ou ao "defensor do povo" da 
Constituição espanhola de 1978, para defender os direitos e liberdades funda­
mentais, com poderes de supervisionar as atividades da Administração e de pres­
tar contas perante o Congresso Nacional, na qual predomina a recusa, por parte 
dos especialistas, de considerá-la exeqüível (51,1 %). Além disso, 19,1 % desses 
peritos indicaram outras alternativas; 2,1 % não se manifestaram, e 27,7%, ape­
nas, admitiram aceitar a criação do referido órgão. 
Sabendo-se que, além da sua importância intrínseca, os meios de comunicação 
servem para construir uma consciência coletiva, a problemática da censura não 
poderia deixar de ser investigada. Além do mais, é do conhecimento público que 
entidades representativas da comunicação têm clamado a sua inconformidade 
no que se refere à aplicação da Lei de Segurança Nacional, principalmente contra 
jornalistas. Por conseguinte, acreditando-se que o questionamento da censura 
traria alguns subsídios à reflexão, formulou-se a seguinte indagação no questio­
nário 2: "A censura aos meios de comunicação, à propaganda política e aos 
costumes deve ser: abolida?; limitada?" Constatou-se que tanto os professores 
quanto as personalidades afirmaram que ela deve ser limitada (70,2%); por 
outro lado, 19,2% indicaram que ela deve ser abolida; 8,5% apresentaram outra 
resposta e somente 2,1 % não se manifestaram. 
Na questão seguinte, tentou-se dimensionar a aceitabilidade ou não da censura, 
em relação a determinados meios de comunicação, por parte dos segmentos con­
sultados.Verificou-se, então: 
a) segundo os prefeitos: primeiro, são admissíveis tipos de censura no rádio, na 
televisão (80%); segundo, na imprensa (76%); terceiro, nos cinemas e teatros 
(60%); quarto, na propaganda política (56%); 
b) segundo os dirigentes sindicais: são admissíveis tipos de censura no rádio, na 
televisão (60,7); primeiro, não são admissíveis tipos de censura nos cinemas e 
teatros (60,7 % ); segundo, não são admissíveis tipos de censura na propaganda 
política (54,1 % ); terceiro, não são admissíveis tipos de censura na imprensa 
(52,5% ); 
c) segundo as personalidades: não são admissíveis tipos de censura na propa­
ganda política (55,6%); nos cinemas e teatros (55,6%); na imprensa (sim -
50%, não = 50%); no rádio, na televisão (sim = 50%, não = 50%). 
Pesquisa 101 
slçao, 31,9 % revelaram que eles devem constar de capítulo à parte, englobando 
os princípios diretores da política social, econômica e cultural do Estado, e so­
mente 4,2 % deixaram de responder à questão. 
No que se refere à matéria a ser objeto de um texto constitucional, apresenta­
ram-se três alternativas, a seguir indicadas, com os respectivos resultados, por 
ordem de prioridade: 61 
1. Um texto constitucional deve limitar-se a regular os mecanismos de governo, 
sem focalizar temas de natureza conjuntural que exigiriam a sua permanente atua­
lização: 70,2 %. 
2. Um texto constitucional deve concentrar-se nos problemas magnos do país, 
de natureza social, política, econômica e cultural, fornecendo diretrizes para o 
seu equacionamento: 55,3%. 
3. Um texto constitucional deve conciliar a regulamentação de certos mecanismos 
básicos de governo com o estabelecimento de princípios diretores, de natureza 
política, nas diversas áreas da ação governamental: 55,3 %. 
Sublinhe-se a tendência majoritária para a confecção de um texto orgânico, 
sintético, sem preocupações programáticas. 
Visando-se conhecer a reação dos entrevistados sobre certas questões de inte­
resse político-social mais geral, apresentaram-se as seguintes afirmativas que são 
aqui reproduzidas, com a indicação dos respectivos índices de concordância e de 
discordância: 
Afirmativas = % de concordância 
I. O Brasil é uma sociedade racialmente tolerante: 76,9%. 
2. Afirma-se que a maior potencialidade do Brasil é o seu espaço territorial. No 
entanto, ele não tem sido utilizado como fator de bem-estar da população: 71,2 % . 
3. Todos os partidos legalmente existentes podem governar: 69,2%. 
4. A política econômica posta em prática nos últimos anos acentuou as históricas 
desigualdades regionais, setoriais e de classe: 68,3 % . 
Afirmativas = % de discordância 
1. O Brasil é uma sociedade socialmente justa: 78,9 %. 
2. O regime parlamentarista daria maior estabilidade às instituições políticas: 
73,1%. 
3. O Brasil é uma sociedade politicamente aberta: 58,7%. 
Vale notar que na afirmativa: "O Brasil é uma sociedade economicamente 
pluralista" houve um equilíbrio entre o grau de concordância (40,4%) e o de 
discordância (41,3%), sendo que 18,3% deixaram de opinar. 
Conhecendo-se o papel de relevo, tradicionalmente, desempenhado pelas elites 
brasileiras na evolução institucional do país, desejou-se verificar as opiniões dos 
fi Respostas múltiplas. conseqüentemente 11 diferente de 100%. 
JO~ R.C.P. 1/83 
interrogados sobre a subsistência dessa tradição nos dias atuais. Formulou-se, 
assim, uma questão sobre o grau de responsabilidade dessas elites, obtendo-se, 
por ora, os seguintes resultados: 
1. As elites políticas brasileiras têm um reduzido senso de responsabilidade: 
42,3%. 
2. As elites políticas brasileiras têm um médio senso de responsabilidade: 41,4%. 
3. As elites políticas brasileiras têm um alto senso de responsabilidade: 6,7%. 
4. Não emitiram opinião: 9,6%. 
Parece não haver dúvidas, entre os segmentos consultados, quanto às questões 
que devem ser resolvidas, prioritariamente, pelos poderes constituídos, de acordo 
com as reações ao conjunto de oito problemas concretos que lhes foi proposto. 
Citam-se assim, primeiramente, os resultados gerais - somatório da 1l!- e da 2l!­
elassificação em cada problema concreto - e, em seguida, os resultados reagru­
pados em torno dos segmentos desta pesquisa (as três principais opções) :62 
Questões 1l!- elas. (%) 
1. Inflação 15,2 
2. Desemprego 15,2 
3. Reforma constitucional 20,5 
4. Dívida externa 10,6 
5. Reforma agrária 9,9 
6. Problema habitacional 2,0 
7. Sistema eleitoral 3,3 
8. Controle das multinacionais 1,3 
1. Para os prefeitos: 
Questões 
1. Inflação 
2. Reforma agrária 
3. Desemprego 
4. Reforma constitucional 
1l!- elas. (%) 
8,0 
20,0 
8,0 
8,0 
2. Na visão das personalidades: 
Questões 
1. Inflação 
2. Reforma constitucional 
3. Desemprego 
1l!- elas. (%) 
15,6 
34,3 
15,6 
2l!- elas. (%) 
17,2 
15,2 
6,0 
9,9 
7,3 
8,6 
4,6 
6,0 
2l!- elas. (%) 
20,0 
4,0 
16,0 
8,0 
2l!- elas. (%) 
25,0 
3,2 
9,3 
62 Respostas múltiplas, conseqüentemente n diferente de 100%. 
Pesquisa 
Somatório (% ) 
32,4 
30,4 
26,5 
20,5 
17,2 
10,6 
7,9 
7,3 
Somatório (%) 
28,0 
24,0 
24,0 
16,0 
Somatório (%) 
40,6 
37,5 
24,9 
105 
3. No entender dos professores: 
Questões 1'.1 elas. (o/c ) 2'.1 elas. (Cié) Somatório (% ) 
I. Inflação 36,4 9,1 45,5 
2. Desemprego 18,2 21,2 39,4 
3. Reforma constitucional 27,3 27,3 
4. 1'a opinião dos dirigentes sindicais: 
Questões H clas. (%) 2,.1 clas. (CC) Somatório (% ) 
1. Desemprego 16,4 14,8 31,2 
2. Reforma constitucional 14,8 9,8 24,6 
3. Inflação 6,6 16,4 23,0 
Verifica-se que estas questões assinaladas como prioritárias inflação, de-
semprego e reforma constitucional - são temas presentes na consciência na­
cional, exigindo um exame, em profundidade, por parte das autoridades brasileiras. 
8. Síntese 
Alguns dados sobre os processos propostos para a reforma do atual texto cons­
titucional devem ter suas informações complementadas não só para efeito de 
elucidar idéias, mas sobretudo para efeito do futuro próximo. Por conseguinte, 
cabe registrar também, que, aproximadamente, sete em cada 10 especialistas 
consultados optaram pela outorga de poderes constituintes a um novo Congresso 
e/ou pela eleição de uma Assembléia Constituinte. Isto, em nosso entender, re­
flete, de fato, uma expectativa de reformas mais substanciais do regime. 
Não há dúvida acerca de que uma reforma constitucional permitirá o aperfei­
çoamento do regime democrático. Isto foi explicitado por, aproximadamente, oito 
em cada 10 de todos os entrevistados. Outra observação que pode ser feita sobre 
este aspecto refere-se ao fato de 87,8% dos professores (predominantemente de 
direito constitucional) e 83,6% dos dirigentes sindicais das principais capitais do 
país terem afirmado, como foi dito, que uma reforma constitucional permitirá 
o aperfeiçoamento democrático. Pelo exposto, torna-se evidente que, mesmo entre 
segmentos distintos da população, suas aspirações sobre certas questões nacionais 
são semelhantes. 
Reafirma-se também que, segundo os entrevistados, há necessidade de uma 
nOva Constituição para o Brasil. 
No que se refere aos princípios fundamentais do Estado e do Governo, cabe 
registrar, além do que já foi mencionado, a principal indicação de cada um dos 
segmentos da população que compõe o universo desta pesquisa: 
1. Prefeitos - liberdade e justiça (96 % ); proteção dos direitos humanos 
(96% ). 
2. Personalidades - igualdade perante a lei (90,6%); promoção do bem social 
(90,6% ). 
106 R.C.P. 1/83 
3. Professores - regime representativo (90,9%); proteção dos direitos humanos 
(90,9%). 
4. Presidentes de sindicatos - promoção do bem social (90,2 % ); igualdade 
perante a lei (90,2 % ). 
Basicamente, no que se refere à organização do Estado Federal, cabe assinalar 
(apenas os aspectos com um consenso superior a 50 % ) : 
a) não devem existir partidos políticos estaduais (71,5%); 
b) considera-se a participação dos partidos atuais no processo político como não 
eficaz (74,9%); 
c) a criação de novosestados, o desmembramento ou a fusão de alguns deles 
devem ser matérias, predominantemente, de referendo popular (61,7 % ) ; 
d) a compatibilidade do planejamento federal (método indispensável de governo) 
com o federalismo deve ser feita estabelecendo-se a participação dos Estados no 
planejamento (78,7%); 
e) o fortalecimento da organização municipal requer o aumento e a especificação 
de suas fontes de receita, assim como de sua jurisdição administrativa e política 
(72,2% ); 
f) leis de organização municipal devem atender às peculiaridades regionais e 
locais (73,5%); 
g) não será conveniente a introdução de senados estaduais (89,4%). 
Quanto à estrutura e articulação dos Poderes, determinados aspectos devem 
ser ressaltados: 
a) entre as opções suscetíveis de aperfeiçoar o regime democrático, relativas ao 
sistema eleitoral, destaca-se a expectativa de que haja eleição direta em todos os 
níveis (67,5%); 
b) deveriam constar no texto constitucional formas de consulta por referendo ou 
plebiscito (70,2%); 
c) é aceitável o controle do povo em relação aos seus representantes, no desem­
penho de seus respectivos mandatos (70,2%); 
d) o texto constitucional deveria reunir, num só capítulo, normas gerais sobre a 
Administração direta e indireta, remetendo-se para a legislação ordinária dispo­
sitivos mais específicos sobre as Forças Armadas, os funcionários públicos e o 
Ministério Público (55,3%); 
e) o texto constitucional deveria fixar certos princípios visando limitar a ação 
e controlar os órgãos da Administração indireta (empresas públicas, autarquias, 
sociedades de economia mista) e as fundações instituídas pelo poder público 
(70,2% ). 
Como foi dito anteriormente sobre os direitos e as garantias individuais, entre 
as nove alternativas apresentadas, as cinco primeiras consideradas como priori­
tárias foram: direito à saúde (72,8%), ao amparo à velhice (68,9%), à defesa 
dos consumidores (65,6%), ao seguro-desemprego (64,9%) e à informação 
(61,6% ). 
Pesquisa 107 
A destacar-se, aqui, os principais objetivos, entre as 20 opções sugeridas, que 
deveriam regular a política do Estado: preservação do meio ambiente (86,1 %); 
proteção dos menores carentes (86,1%); amparo à velhice (83,4%); controle 
de exploração dos recursos naturais (82,8 % ); política de fixação do homem no 
campo (82,1 %); assistência aos deficientes físicos e psíquicos (78,8%); controle 
dos investimentos estrangeiros (78,1 %) e controle da exploração da Região 
Amazônica (76,2%). Como se sabe, estas opções indicam que, aproximada­
mente, oito em cada 10 entrevistados - entre prefeitos, personalidades, profes­
sores e dirigentes sindicais - estão de acordo com tais objetivos. 
Ressalte-se, mais uma vez, que na percepção dos peritos, um texto constitu­
cional deve limitar-se a regular os mecanismos de governo, sem focalizar temas 
de natureza conjuntural que exigiriam a sua permanente atualização (70,2 % ). 
Cabe registrar, no que se refere a determinados dados de identificação dos 
respondentes, algumas informações sugestivas. Verificou-se que, correlacionando­
se os segmentos consultados da população e a sua faixa etária, 15,2% de todos 
os entrevistados têm, no máximo, 40 anos, 60,3% estão incluídos na faixa de 
idade de 41 a 60 anos, 17,2 % têm mais de 60 anos e 7,3 não forneceram a 
idade. 
Com referência à escolaridade, como já estava previsto, em função do objeto 
de análise desta pesquisa, há entre os informantes um predomínio de pessoas com 
nível universitário. Aproximadamente, seis em cada 10 desses respondentes. 
5. Primeiras conclusões 
AFONSO ARINOS DE MELO FRANCO 
Ao assumir, em abril de 1980, o Instituto de Direito Público e Ciência Política 
da Fundação Getulio Vargas, proferimos discurso do qual consta o seguinte 
trecho: "Embora sem o propósito de apresentar planos, permito-me, no entanto, 
dar notícia de duas intenções que alimento como tarefas possíveis do Instituto ... 
(Quanto à primeira): Trata-se de proceder a uma pesquisa, abrangente e sinté­
tica, segundo os melhores métodos a nós acessíveis do direito constitucional e 
ciência política, sobre as correntes mais significativas e influentes do pensamento 
e das aspirações nacionais, com referência ao inevitável preparo de uma nova 
Constituição para o Brasil."63 
A intenção manifestada obteve, desde logo, apoio sem restrições do Presidente 
da Fundação, Df. Luiz Simões Lopes, que fez colocar à disposição do trabalho os 
pesquisadores e funcionários administrativos, bem como o material necessário. 
O plano inicial teve de ser acomodado às restrições financeiras que o país atra­
vessa desde 1980, atingindo todas as suas instituições privadas e públicas, nota­
damente àquelas de fim não lucrativo e prestação de serviços, como a Fundação 
Getulio Vargas. Graças, porém, à competência e à aplicação da equipe partici­
pante, começa-se a atingir resultados capazes de contribuir para uma visão -
ainda provisória e sujeita a retificações - do problema institucional do Estado 
brasileiro. A exposição conclusiva dos resultados finais será apresentada, em 
~3 Melo Franco, Afonso Arinos de. Política e direito. Brasília. Ed. Universidade de Bra· 
sília, 1981. 
108 R.C.P. 1/83 
segundo relatório, às autoridades competentes do Executivo e do Legislativo, bem 
como a outros interessados, na época da instalação do futuro Congresso Nacional. 
A equipe principal da pesquisa foi composta pelos seguintes professores: Afon­
so Arinos de Melo Franco, catedrático das Universidades Federal e Estadual do 
Rio de Janeiro, ex-chanceler e ex-parlamentar; Nei Roberto da Silva Oliveira, 
bacharel em sociologia e ciência política, especialista em metodologia da pesquisa, 
pós-graduado pela Universidade Técnica de Lisboa, professor e pesquisador da 
FGV; Ana Lucia de Lyra Tavares, doutora em direito pela Universidade de 
Paris, professora da Universidade Católica do Rio de Janeiro e pesquisadora da 
FGV; Lídice Aparecida Pontes Maduro, bacharel em sociologia e ciência política, 
especialista em metodologia da pesquisa, professora do Estado e pesquisadora 
da FGV. .." 
O diretor do Instituto participou dos trabalhos em suas diferentes fases, além 
de coordená-los e orientá-los, inclusive na elaboração das três partes em que se 
divide o presente relatório. 
A primeira delas, "Introdução", é de autoria da ProP Ana Lucia; a segunda, 
"Análise quantitativa", foi feita pelo Prof. Nei Roberto, e a terceira, "Análise de 
conteúdo", foi preparada pela Prof~ Lídice Aparecida.64 
O diretor da pesquisa considerou útil apresentar algumas reflexões aos dados 
contidos neste relatório preliminar. Elas são de sua responsabilidade e, portanto, 
não obedecem ao método científico adotado na pesquisa, ou seja, o factualismo 
imparcial. Um dos especialistas brasileiros em metodologia de pesquisa recomenda 
a técnica segundo a qual "o autor da conclusão deve distanciar-se do seu tra­
balho e fazer uma apreciação desprendida".6S 
Na verdade, a pesquisa feita pelo Instituto, é, na sua execução, factual e im­
parcial, seja na coleta de dados, seja na análise quantitativa deles. Mas a motiva­
ção da pesquisa decorreu de uma opção política, ou seja, a urgência de uma nova 
Constituição para o Brasil. Se a motivação é política, sua finalidade também o é, 
o que não implica em se supor qualquer parcialidade na sua execução e nos re­
sultados apresentados. Só assim se estará contribuindo para uma meditação -
esta sim, desprevenida - dos meios decisórios do país sobre a ultimação da res­
tauração democrática. 
Convém acentuar que 79,8% das respostas às consultas reconhecem a neces­
sidade de uma nova Constituição para o Brasil. O processo para se chegar a ela 
recolheu 72,4% em favor de poderes constituintes (36,2% ao futuro Congresso, 
como vimos preconizando) e os mesmos 36,2 % a uma Assembléia especial. So­
mente 23,4% opinaram em favor do poder de emenda. 
Consigne-se que 68,2 % optaram pelo sistema presidencial, e somente 18,6% 
em favor do sistema parlamentar, 13,2% abstendo-sede responder. Em relação 
à segunda forma de governo, deve-se, porém, levar em conta as dificuldades para 
chegar-se a apreciações conclusivas, uma vez que, para avaliação das diversas 
modalidades sob as quais ela se apresenta (das quais é exemplo o sistema híbrido 
francês), são necessários conhecimentos especiais. 
64 A "Análise de conteúdo", que contém o estudo de noticiário publicado na imprensa 
sobre o problema da Constituição, será incluída no relatório final. 
65 Castro, Claudio de Moura. Estrutura e apresentação de publicações científicas. 1978. 
Pesquisa 109 
Registrem-se, também, as reações pOSItIvas dos professores à introdução de 
novos órgãos (como o Tribunal Constitucional) e sistemas (como o voto majo­
ritário distrital) para cuja apreciação encontravam-se, particularmente, habilitados. 
Na questão da legitimidade e legalidade dos poderes, 79,8% dos respondentes 
opinaram pela legalidade do Legislativo, 77,9% pela legalidade do Executivo; 
56,7% pela legitimidade do Legislativo e somente 33,6% pela legitimidade do 
Executivo. 
Outros pontos de relevo: 72,8% incluem, entre os direitos individuais, a pro­
teção à saúde; 68,9% o amparo à velhice; 65,6% a defesa do consumidor e 
64,9% o seguro-desemprego. 
A ideologização política da questão racial é recusada: 76,9% dos consultados 
opinaram que o Brasil é uma sociedade racialmente tolerante. 
As elites políticas não são prestigiadas pelas opiniões expressas: só 6,7% en­
contram nelas alto senso de responsabilidade; 41,4% concedem-lhes um senso 
médio; e 42,3%, um senso reduzido. 
Quanto às questões nacionais prioritárias, a inflação vem em primeiro lugar, 
com 32,4%; o desemprego em segundo, com 30,4%; e a reforma constitucional 
em terceiro, com 26,5 %. Só em seguida entram a dívida externa, a reforma agrá­
ria e o problema habitacional. 
No que se refere à receptividade do questionário, podemos declará-la satisfa­
tória, considerando que, por medida de economia, o contacto entre pesquisadores 
e respondentes foi postal. A via postal diminui o número de respostas a níveis 
modestos, em todos os países. A média de respostas a inquéritos feitos por via 
postal é de 30%, no máximo, nos países desenvolvidos. 
Como já foi dito na introdução, a equipe de pesquisa do Instituto tomou por 
inspiração do seu trabalho (não propriamente por modelo) o estudo procedido 
na Suíça, publicado em seis volumes pela Imprensa Oficial daquele país, sob o 
título Révision totale de la Constitution Fédérale. 
A decisão do estudo da revisão total da velha e gloriosa Constituição suíça -
que data de 1848, mas, depois da grande revisão de 1874, já foi emendada mais 
de 50 vezes - partiu do Senado da Confederação (Conselho dos Estados) em 
1965, decisão apoiada pela Câmara dos Deputados (Assembléia Nacional), no 
mesmo ano, e, finalmente, pelo Conselho Federal (Poder Executivo Colegiado), 
em 1966. O propósito era, expressamente, "conhecer as condições nas quais uma 
revisão total da Constituição poderia ser empreendida, na opinião de um grupo 
de personalidades qualificadas". 66 
O trabalho suíço, pela sua origem oficial, pelas condições da execução e pelos 
recursos e ambiente em que se desenvolveu, nunca poderia ser aproximado por 
outro, brasileiro, dadas as diversidades inseparáveis das nossas condições básicas. 
Na Suíça, a exigüidade territorial e populacional, o avançadíssimo índice educa­
tivo do povo, a estabilidade política excepcional, que resistiu, sem abalos, às duas 
maiores guerras mundiais que cercavam completamente a Confederação, permi­
tiram uma análise aprofundada e longa do problema. O âmbito da consulta suíça 
obedeceu às peculiaridades do país. Foram consultados, em primeiro plano, os 
25 cantões que formam a Confederação. Em seguida, as seguintes Universidades 
foram ouvidas: Zurique, Berna, Friburgo, Basiléia, Sr.-Gall, Lausanne e Neuchâ-
66 Os trabalhos da pesquisa suíça foram publicados em seis volumes, entre 1969 e 1973, 
sendo quatro volumes de respostas, um de índices e um do Relatório Final. 
110 R.C.P. 1/83 
tel, portanto quatro de língua alemã, três de língua francesa e nenhuma do Tes­
sino, cantão italiano. Foram igualmente ouvidos todos os partidos políticos. A 
esses dois grupos foram ajuntadas outras entidades várias, como as Igrejas Pro­
testantes, Católica e Israelita, a União Comercial e Industrial, a Federação dos 
Sindicatos de Trabalhadores e dos Sindicatos Cristãos; a Aliança das Sociedades 
Femininas, além de poucas outras de menor relevo. 
Decidimos organizar a pesquisa brasileira obedecendo a outros critérios, mais 
condizentes com o conjunto de características especificamente nacionais, e com 
as possibilidades da Fundação Getulio Vargas. 
Considerando a importância do município na formação política do país e seu 
papel (erradamente diminuído hoje em dia) na estrutura federativa, formamos 
o primeiro grupo de respondentes com a seleção dos prefeitos das cidades de 
mais de 50 mil habitantes. O prefeito é a autoridade municipal mais informada 
da comunidade, tanto no terreno político, quanto no administrativo. Os que cons­
tam deste relatório preliminar foram os que responderam até fins de agosto. Em­
bora pouco numerosos, até agora, são extremamente representativos, pois se 
manifestam em nome de municípios da Amazônia, do Nordeste, do Centro-Sul, 
do Sudeste, do Extremo Sul e do Brasil Central. 
Ao lado dos prefeitos, é de pôr em relevo a colaboração dos sindicatos, das 
principais capitais brasileiras, especialmente os de trabalhadores. Deve-se decla­
rar. em louvor deles, que os sindicatos formam o grupo de entidades que em 
maior número acorreu ao nosso apelo. Além de representarem, territorialmente, 
todo o Brasil, das regiões costeiras às interioranas, falam em nome dos mais va­
riados gêneros de trabalho: rodoviários, portuários, comerciários, vendedores am­
bulantes, indústrias energéticas, viajantes comerciais, indústrias extrativas mine­
rais, jornalistas e jornaleiros, foguistas, enfermeiros, taifeiros e panificadores na­
vais, marceneiros, casas de diversões, indústrias rurais, cargas e descargas e outros. 
Foram ouvidos professores de direito constitucional, ciência política e teoria 
do Estado de numerosas universidades brasileiras, especialmente as federais e es­
taduais, desde o extremo Norte ao extremo Sul, bem como os de outros institutos 
de ensino. O elenco de respostas é extremamente valioso para as observações do 
leitor. 
Foram igualmente consultados, em âmbito nacional, empresários, individual­
mente, e empresas, como entidades. 
Nossa gama de opções parece, assim, mais larga que a do próprio inquérito 
suíço. que nos serviu de inspiração. 
O preenchimento dos questionários pelos respondentes foi, quase sempre, feito 
com cuidado, aplicação e responsabilidade, por todos os segmentos consultados. 
Como exemplo de questionário respondido em profundidade, a Revista de Ciência 
Política da Fundação Getulio Vargas, devidamente autorizada, publicou a res­
posta, enviada de São Paulo, pelo empresário Dr. Olavo Setubal.67 Outras res­
postas cuidadosamente redigidas existem. 
Somos os primeiros a reconhecer as insuficiências do nosso trabalho, sobretudo 
neste estágio, insuficiências que procuraremos sanar no relatório final. 
A omissão de alguns segmentos no conjunto das investigações procedidas não 
traduz desconhecimento da sua representatividade, mas necessidade de limitação 
6
7 Revista de Ciência Política, 25:87·131, ago. 1982. 
Pesl.iuisa 111 
do universo consultado aos elementos mais acessíveis e habilitados a responder. 
Seguimos, neste ponto, o exemplo suíço, que, com muito mais recursos e tempo, 
cingiu-se a um número equivalente de destinatários. 
Não nos escapa, por outro lado, que as posições apresentadas podem variar, 
do primeiro para o segundo relatório, sobretudo em relação à programática dos 
textos constitucionais. 
A caracterização da análise quantitativa não deixa de ser um processo também 
qualitativo, no sentido de que ela não apresenta

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