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IMPACTO DA DOMINAÇÃO PSICOLÓGICA DAS ORGANIZAÇÕES NA SAÚDE MENTAL DO TRABALHADOR

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF 
FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO E CIÊNCIAS CONTÁBEIS – EST 
DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO – STA 
CURSO DE GRAGUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO 
 
ISABELA DE SOUZA ALVARENGA 
 
 
IMPACTO DA DOMINAÇÃO PSICOLÓGICA 
DAS ORGANIZAÇÕES NA 
SAÚDE MENTAL DO TRABALHADOR 
 
 
Orientadora: Prof.ª Ana Maria Lana Ramos 
NITERÓI 
2022 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF 
FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO E CIÊNCIAS CONTÁBEIS – EST 
DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO - STA 
 
 
ISABELA DE SOUZA ALVARENGA 
 
 
IMPACTO DA DOMINAÇÃO PSICOLÓGICA DAS ORGANIZAÇÕES 
NA SAÚDE MENTAL DO TRABALHADOR 
 
 
 
Monografia submetida ao corpo docente do 
Departamento de Administração da 
Universidade Federal Fluminense como parte 
dos requisitos necessários para a obtenção do 
Grau de Bacharel. Área de concentração: 
Administração. 
 
 
Orientadora: Prof.ª Ana Maria Lana Ramos 
 
 
 
 
 
NITERÓI, 2022 
Ficha catalográfica automática - SDC/BAC
Gerada com informações fornecidas pelo autor
Bibliotecário responsável: Debora do Nascimento - CRB7/6368
A473i Alvarenga, Isabela de Souza
 Impacto da dominação psicológica das organizações na
saúde mental do trabalhador / Isabela de Souza Alvarenga ;
Ana Maria Lana Ramos, orientadora. Niterói, 2022.
 75 f. : il.
 Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em
Administração)-Universidade Federal Fluminense, Faculdade de
Administração e Ciências Contábeis, Niterói, 2022.
 1. Dominação psicológica. 2. Psicodinâmica do trabalho.
3. Satisfação no trabalho. 4. Saúde mental. 5. Produção
intelectual. I. Ramos, Ana Maria Lana, orientadora. II.
Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Administração
e Ciências Contábeis. III. Título.
 CDD -
 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF 
FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO E CIÊNCIAS CONTÁBEIS – EST 
DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO - STA 
 
 
ISABELA DE SOUZA ALVARENGA 
 
IMPACTO DA DOMINAÇÃO PSICOLÓGICA DAS ORGANIZAÇÕES 
 NA SAÚDE MENTAL DO TRABALHADOR 
 
 
Monografia submetida ao corpo docente do 
Departamento de Administração da 
Universidade Federal Fluminense como parte 
dos requisitos necessários para a obtenção do 
Grau de Bacharel. Área de concentração: 
Administração. 
 
Examinada por: 
 _______________________________________ 
Prof.ª: Ana Maria Lana Ramos 
Universidade Federal Fluminense 
 
 _______________________________________ 
Prof.ª: Elza Marinho Lustosa da Costa 
Universidade Federal Fluminense 
 
_______________________________________ 
Prof.º: Fernando de Oliveira Vieira 
Universidade Federal Fluminense 
 
NITERÓI, 2021 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
A Deus, em primeiro lugar, por ter me dado a força necessária para continuar e a 
oportunidade de recomeçar na Administração. Não entendo os seus planos, mas confio que 
são os melhores para a minha vida. 
Aos meus pais, Cláudia e Luiz Felipe, por sempre estarem ao meu lado e me 
incentivarem a estudar e não desistir dos meus sonhos. Tudo o que faço hoje é buscando 
poder retribuir no futuro todo amor e cuidado. 
Aos meus irmãos, Luiz Felipe e Raphaela, a minha avó Nair e minha tia Cátia, por 
terem me dado suporte e apoio nos momentos de dificuldade. E ao meu avô Severino, que 
infelizmente não está mais entre nós, porém, que tanto ensinou a todos da família e por quem, 
o amor ainda se mantém vivo em nossos corações. 
A minha querida professora e orientadora Ana Lana, por ter me inspirado ao 
apresentar o tema durante as suas aulas, de modo a me despertar um interesse em buscar 
estudar sobre o assunto e pelo apoio no desenvolvimento dessa monografia. 
Ao meu grande amigo Victor, por ter sido um grande parceiro nessa jornada, a quem 
tenho imensa gratidão. Não consigo imaginar como seria cursar a sem o seu companheirismo, 
amizade e senso de humor. 
Aos meus colegas de curso e demais professores, a qual compartilhei os últimos anos 
o desafio de cursar Administração na UFF. 
Por fim, gostaria de agradecer a todos os entrevistados pela confiança em aceitar o 
desafio de compartilhar as suas percepções e vivências, algumas até dolorosas, a fim de 
somente contribuir para a construção do conhecimento. Possuo imensa gratidão por terem 
agregado mais valor com os relatos que tornaram possível a validação do tema em campo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“They are playing a game. They are playing at not playing a game. If I show them I see they 
are. I shall break the rules and they will punish me. I must play their game, of not seeing I see 
the game”. 
 
 
“Eles jogam um jogo. Eles brincam de não jogar um jogo. Se eu lhes mostrar que vejo que 
estão jogando, vou transgredir a regra, e eles me punirão. Devo jogar o jogo de não ver que 
estou jogando o jogo.” 
 
 
Ronald D. Laing 
 
 
 
RESUMO 
 
Diante das perenes tentativas das Organizações de exercer controle sobre o 
empregado, tornou-se necessário discutir sobre as consequências dessas práticas que 
permeiam a psicodinâmica do trabalho. O estudo tem por objetivo explorar as formas de 
dominação psicológica promovidas pelas Organizações e identificar o seu impacto na 
satisfação e saúde mental do trabalhador. Realizou-se uma pesquisa de campo, qualitativa, 
com o intuito de confrontar o referencial teórico abordado na presente monografia com a 
perspectiva decorrente dos relatos das vivências dos entrevistados, de modo a vislumbrar se, 
de fato, a dominação psicológica por intermédio das Organizações impacta a percepção das 
experiências, sentidos e sentimentos do trabalhador, ocasionando prejuízo à sua satisfação e 
saúde mental. Identificou-se que, a dominação psicológica, ao apoiar-se na repressão 
inconsciente dos desejos, resulta em frustração e, a médio prazo, consegue impedir a 
satisfação no trabalho e afetar a saúde mental gerando o adoecimento. Logo, perpetua-se a 
postura ilesa da instituição, que se mantém não somente distante e indiferente ao adoecimento 
causado, mas também, impune frente ao dano perpetrado. Este trabalho pretende, enfim, 
despertar uma reflexão crítica acerca da dominação psicológica nas Organizações, que 
estimule ações coletivas voltadas ao enfrentamento do problema e valorização da satisfação e 
da saúde mental no trabalho. 
 
Palavras-chave: dominação psicológica; psicodinâmica do trabalho; satisfação; saúde mental 
no trabalho. 
 
 
ABSTRACT 
 
Considering the constant attempts to assert control over employees over the years, it 
has become compulsory to discuss about the consequences of these practices behind the 
psychodynamics of work. This study aims to explore various psychological domination tactics 
by Organization’s and correlate their impact on, worker satisfaction and mental health. A 
qualitative field research was conducted to confront the theory discussed in this thesis with 
the respondents' experiences revealed through their gathered reports, with the purpose of 
certifying if; psychological dominance through Organizations impacts the perception of 
worker's experiences, senses, and feelings, causing damage to their intrinsic satisfaction and 
mental health. It was identified that psychological dominance, based on the unconscious 
repression of desires, results in employee frustration and in the medium term, can deteriorate 
job satisfaction and affect mental health, in such extent as to generate illnesses. Therefore, the 
unimpaired posture of the institution is perpetuated, which remains not only distant and 
indifferent to the illnesses caused, but also, unpunished for the inflicted damages. As a result, 
this study intends to discuss through the critical reflection of psychological dominance in 
Organizations and to stimulate collective actions aimed at facing the problem firsthand and 
merit employees satisfaction and mental health at work 
 
Keywords: psychologicaldomination; psychodynamic of work; satisfaction; mental health at 
work 
 
 
 
LISTA DE QUADROS 
 
Quadro 1 – Resumo da classificação da pesquisa de campo e justificativa do pesquisador 
quanto a escolha do método......................................................................................................43 
Quadro 2 – Resumo da metodologia escolhida para pesquisa de campo e descrição quanto a 
sua aplicação.............................................................................................................................44 
Quadro 3 – Perfil resumido dos Entrevistados..........................................................................46 
Quadro 4 – Resumo da segmentação dos temas citados pelos entrevistados sobre a resposta do 
“pra que você trabalha?” e o sentido envolvido........................................................................55 
 
 
LISTA DE GRÁFICOS 
 
Gráfico 1 – Vínculo empregatício atual de acordo com a experiência relatada durante pesquisa 
de campo...................................................................................................................................46 
Gráfico 2 – Nº de perspectivas citadas para justificativa do sentido relacionado ao trabalho na 
Pergunta 3.................................................................................................................................55 
Gráfico 3 – Frequência em que os temas foram citados nas respostas sobre o sentido de 
trabalho na Pergunta 3...............................................................................................................56 
Gráfico 4 – Respostas colhidas sobre os métodos identificados de assimilação de culturas e 
valores por parte da Empresa....................................................................................................64 
Gráfico 5 – Nº de sinais e sintomas compartilhados nos relatos ao longo das entrevistas, com 
exceção dos questionados na Pergunta 6..................................................................................69 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 12 
2 A DOMINAÇÃO PSICOLÓGICA NAS ORGANIZAÇÕES ..................................... 16 
3 A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE E O TRABALHO.......................................... 24 
4 SATISFAÇÃO E FELICIDADE NO TRABALHO: (IN)DEFINIÇÕES .................. 29 
5 PRAZER E SOFRIMENTO NO TRABALHO............................................................ 32 
6 PESQUISA DE CAMPO: PERCEPÇÃO DOS ENTREVISTADOS SOBRE A 
ORGANIZAÇÃO E O TRABALHO .................................................................................... 42 
6.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................................... 42 
6.2 PERFIL DOS ENTREVISTADOS ............................................................................ 45 
6.3 ANÁLISE DE RESULTADO .................................................................................... 47 
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 70 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 72 
APÊNDICE 1 – ROTEIRO DE ENTREVISTAS ................................................................ 75 
 
 
 
 
 
 
12 
1 INTRODUÇÃO 
 
A dominação psicológica pode ser conceituada como a manipulação do inconsciente 
através de ferramentas implícitas e que aplicadas no contexto das dinâmicas do trabalho 
promovem o controle da Organização sobre o trabalhador (AGUIAR, 2005; GAULEJAC, 
2007; PIOLLI, 2011, PAGÈS, 1987). Tal situação torna-se possível em virtude da simbologia 
da atividade profissional como fator de identidade social do indivíduo, através das 
perspectivas, relações interpessoais, reconhecimento social e projeções futuras que se tornam 
vinculadas a esse cenário. Nesse sentido, as Organizações conseguem influenciar e tentam 
moldar as estruturas psicológicas do indivíduo, pois promovem uma alienação através do 
trabalho, com uso de ferramentas de motivação, punição, metas e recompensas. Isto é, a 
alienação explorada provoca a substituição da vontade própria e singular do sujeito pela da 
Instituição, com a perda velada do livre-arbítrio, portanto, a introjeção da ideologia 
organizacional (PIOLLI, 2011; GAULEJAC, 2007; PAGÈS, 1987). 
O homem como um ser social precisa do outro, através das relações interpessoais, 
para se reconhecer e validar na sociedade (MARX, 1988, apud DUARTE, 2018), nesse 
sentido, o trabalho na ótica de referencial também é discutido por Freud na construção e 
delimitação das instâncias psíquicas e na instauração do princípio da realidade (FREUD, 
2011) com o desenvolvimento da consciência do sujeito. Tal aspecto aplicado no ambiente 
profissional demonstra como a dominação psicológica pode ser prejudicial para o indivíduo, 
visto que o trabalho adquire cada vez mais uma posição de centralização na vida da pessoa. 
Ou seja, “na sociedade capitalista atual, é muito comum, logo em seguida à indagação do 
nome, a importância que se dá à ocupação profissional para descrever a identidade de uma 
pessoa” (PERICO & JUSTO, 2011, p. 139.). Segundo Borsoi (2007, p. 106) “[...] quando o 
trabalho começa a fazer parte efetiva da vida das pessoas, ele se torna tão significativo (ou 
quase) quanto as relações amorosas que elas constroem e – a meu ver, não seria exagero dizer 
– tão necessário quanto o sono [...].” Dessa maneira, percebe-se a magnitude do papel do 
trabalho nas construções identitárias e da saúde mental do indivíduo que justifica o 
surgimento do sofrimento que pode levar ao adoecimento. 
Define-se “satisfação” como “Ação ou efeito de satisfazer” ou “Contentamento; 
prazer resultante da realização daquilo que se espera ou do que se deseja” (DICIO, 2020). Na 
literatura, tal conceito quando aplicado no ambiente de trabalho encontra diversas concepções, 
que geralmente englobam um entendimento comum. Locke (1960, apud MARQUEZE & 
MORENO, 2005, p. 70) “define a satisfação no trabalho como o resultado da avaliação que o 
13 
 
 
 
trabalhador tem sobre o seu trabalho ou a realização de seus valores por meio dessa atividade, 
sendo uma emoção positiva de bem-estar”. Isto é, a satisfação parte da percepção do 
trabalhador sobre a realidade observada do ambiente profissional a qual se insere. Dessa 
maneira, quando não ocorre a satisfação, o resultado é o sofrimento pelo não alcance da 
realização do que se esperava, resultando na insatisfação. Nesse sentido, a Psicologia e a 
Administração discursam sobre os fatores que determinam a satisfação no ambiente 
profissional e as empresas utilizam desses conceitos, de modo a oferecer subsídios que tornem 
viável a aquisição da satisfação, entendendo no sentido de uma realização das necessidades, a 
fim de exercer controle de maneira sutil sobre o indivíduo. Contudo, quando tal realização 
não é alcançada ou não se perpetua, instala-se a insatisfação (HELOANI & CAPITAO, 2003), 
que pode evoluir para um prejuízo à saúde mental, portanto, um adoecimento do trabalhador, 
visto que, para Freud, o resultado do “sofrimento suportado em silêncio como ‘adoecimento’” 
(FREUD, 2014, p. 60). 
Percebe-se, portanto, que o trabalho pode ser tanto fonte de prazer quanto de 
desprazer (AGUIAR, 2005). Será fonte de prazer quando as pulsões internas de cada sujeito 
serem satisfeitas, por meio do trabalho, caso contrário, no cenário em que a atividade laboral 
torna-se fonte do desprazer, o indivíduo assume algumas estratégias comportamentais e 
subjetivas para tentar de alguma maneira preservar a saúde mental e/ou aliviar o sofrimento 
(AGUIAR, 2005; GAULEJAC, 2007, FERREIRA, 2009; PAGÈS, 1987). Ademais, com a 
dominação psicológica há uma constante tentativa de modificar as estruturas mentaisdos 
trabalhadores para os objetivos sociais (HELOANI, 2003), em decorrência da introjeção do 
agente de coação no próprio indivíduo, e com isso, o trabalhador assume uma posição de auto 
explorador em uma Sociedade do Cansaço, logo, “o sujeito de desempenho encontra-se em 
guerra consigo mesmo” (HAN, 2017a, p. 29). Sendo assim, nota-se a posição crucial a qual a 
atividade profissional exerce no processo de saúde-adoecimento (FERREIRA, 2009). 
Nesse sentido, o presente estudo buscou responder à seguinte questão: Como a 
dominação psicológica das Organizações influencia a satisfação e saúde mental do 
trabalhador? Partiu-se da hipótese de que a dominação psicológica consegue moldar a 
satisfação e afetar a saúde mental gerando o adoecimento. Assim, o objetivo geral deste 
estudo foi explorar as formas de dominação psicológica promovidas pelas Organizações e 
identificar o seu impacto na satisfação e na saúde mental do trabalhador. 
Para alcançar tal objetivo, a pesquisa procurou: a) Refletir sobre a influência do 
trabalho na saúde mental e as relações de adoecimento; b) Contextualizar o cenário de 
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dominação organizacional de modo a identificar como se dão as formas de dominação 
psicológica do trabalhador; c) Levantar, por meio da pesquisa de campo, as técnicas aplicadas 
pelas organizações para realizar a dominação e as percepções sobre o processo e suas 
consequências em diferentes grupos de hierarquia organizacional; e d) Exemplificar as 
principais práticas utilizadas de manipulação psicológica e seus impactos na satisfação e na 
saúde mental do trabalhador. 
O tema discutido por esse trabalho mostra-se necessário para evidenciar as práticas de 
dominação organizacional que permeiam a narrativa profissional dos indivíduos, de modo a 
destacar a importância do trabalho como fator essencial de identidade, reconhecimento e 
contribuição social dentro da sociedade. Nesse aspecto, entende-se que é essencial que o 
indivíduo tenha conhecimento para saber identificar situações de vigência de tal prática, de 
modo a tentar resguardar a sua saúde mental e evitar o seu adoecimento. Ao analisar os 
fatores da vida social que impactam a vida psíquica do indivíduo e geram o adoecimento, o 
aspecto profissional normalmente tende a ser desconsiderado pelo senso comum, de maneira 
negligente. O presente estudo tem por intuito promover conhecimento e debater sobre essas 
questões que permeiam a vida das pessoas desde o surgimento do capitalismo, visto que 
independentemente da época e mesmo com a evolução dos modelos de produção, técnicas de 
gestão e prática de negócios, as relações entre homem e trabalho devem ser objeto de 
discussão e análise contínuas. Percebe-se que, por um lado, o “explorador” objetiva 
potencializar o seu controle e dominação sobre o processo produtivo, de modo a reduzir o 
homem a mão de obra necessária; por outro lado, observa-se a ótica do ser vivo que é 
reduzido a “recurso” e que sofre as interferências em virtude da tentativa de modelar as suas 
necessidades e objetivos. Sendo assim, a discussão buscou entender quais as consequências da 
dominação psicológica para o trabalhador, como tal prática pode promover a satisfação ou 
insatisfação com o trabalho, de que maneira essa ação pode prejudicar a saúde mental, 
entender como e explorar quais as principais manifestações de adoecimento. 
Em concordância com o referencial teórico explorado e desenvolvido ao longo da 
monografia nota-se a necessidade de complementar o estudo com uma pesquisa de campo, a 
fim de não somente contextualizar o leitor, mas também de apresentar o impacto real de tal 
prática na satisfação e saúde mental do trabalhador para comprovar, portanto, a hipótese 
desenvolvida. Para isso, partiu-se da abordagem qualitativa através de entrevistas com roteiro 
semiestruturados a fim de explorar os relatos de experiências compartilhados da amostra 
15 
 
 
 
selecionada de 8 sujeitos, que vivenciaram no ambiente corporativo o cenário de dominação 
psicológica. 
Por último, destaca-se a relevância do estudo apresentado que tem por intuito não 
somente explorar as formas de dominação psicológica promovidas pelas Organizações, mas 
também debater e promover reflexões acerca da psicodinâmica do trabalho. Tal fato é 
imprescindível, visto que tal prática, por ser velada, mantém-se no “desconhecido” para a 
população em geral, e essa ausência de percepção e conhecimento, somente facilita a 
aplicação de métodos que visam exercer o controle e dominação sobre o empregado. Sendo 
assim, a presente monografia não se limitou a somente analisar a bibliografia conceituada 
sobre tal tema e o cenário que permeia, mas foi além, em buscar comprovação científica 
factível com a realidade atual através da pesquisa de campo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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2 A DOMINAÇÃO PSICOLÓGICA NAS ORGANIZAÇÕES 
 
A dominação psicológica pode ser conceituada como a manipulação do inconsciente 
através de ferramentas implícitas e que aplicadas no contexto das dinâmicas do trabalho 
promovem o controle da Organização sobre o trabalhador. Isto é, um sistema socio psíquico 
de dominação exercido pelas Empresas para promover a mobilização das energias psíquicas 
em um recurso explorado, por meio do trabalho (AGUIAR, 2005; GAULEJAC, 2007; 
PIOLLI, 2011, PAGÈS, 1987). Tal situação torna-se possível em virtude da simbologia da 
atividade profissional como fator de identidade social do indivíduo, através das perspectivas, 
relações interpessoais, reconhecimento social e projeções futuras que se tornam vinculadas a 
esse cenário. Nesse sentido, as Organizações conseguem influenciar e promover a 
manipulação do inconsciente já que “a dominação como meio de exercício do poder está mais 
baseada na introjeção dessas normas ou regras das organizações do que numa repressão mais 
explícita” (HELOANI, 2003, p. 102). Como resultado, a alienação explorada provoca a 
substituição da vontade própria e singular do sujeito pela da Instituição por meio da tentativa 
de submissão inconsciente, em que o desejo do indivíduo se rende à imposição mascarada da 
autoridade patronal (AGUIAR, 2005), com a perda velada do livre-arbítrio, portanto, a 
introjeção da ideologia organizacional. 
De modo sutil, percebe-se que as organizações se apresentam como “prisões 
psíquicas”, visto que as pessoas pertencentes são aprisionadas em modos de agir, formas de 
pensar e comportamentos semelhantes, por meio de percepções distorcidas que constroem 
uma falsa realidade aparente que é, a princípio, imperceptível para os indivíduos internos a 
esse cenário (MORGAN, 2002). Veja-se, por exemplo, o fenômeno da “identidade de 
empréstimo”, em que o indivíduo passar a introjetar as mesmas referências simbólicas 
pertencentes ao grupo organizacional como sua, de modo a legitimar o seu sentimento de 
pertencimento e vínculo à empresa (GAULEJAC, 2007). Dessa maneira, o trabalhador 
desenvolve a falsa consciência que ocorre em virtude da percepção equivocada das relações 
do sujeito com o meio exterior – a empresa (AGUIAR, 2005). 
Em primeira análise, pode-se perceber que a manipulação da subjetividade não é um 
fenômeno iniciado nos dias atuais, visto que tal prática foi, ao longo do tempo, refinada e 
potencializada, conforme os avanços dos modos de organização do trabalho. Veja-se, por 
exemplo, os princípios da Administração Científica defendidos pelo taylorismo, modo de 
organização mundialmente reconhecido, que discursa principalmente sobre a teoria da 
17 
 
 
 
racionalização do trabalho de modo a exercer um controle minucioso sobre toda a produção e 
que se estendia para uma tentativa de domínio sobre o trabalhador. Nesse sentido, “Taylor 
esboça um ensaio de ‘modelização do inconsciente’, ou seja, penetrar na esfera da 
subjetividade do trabalhador para reconstruir a sua percepção segundo os interesses do 
capital” (HELOANI, 1991, p.119).Dessa maneira, a empresa taylorista se concentra em 
docilizar os operários em corpos úteis e produtivos em prol do interesse do capital 
(GAULEJAC, 2007). Tal cenário pode ser exemplificado quando Taylor almeja ensinar o 
trabalhador a pensar de acordo com os interesses da corporação para buscar o melhor método 
de exercer determinada função – One best way – e com isso, potencializar o acúmulo de 
capital (HELOANI, 2003; PIOLLI, 2011). 
Com o surgimento do capitalismo e por conseguinte, do homo economicus, o 
trabalho perdeu, aos poucos, a sua característica ética e ideológica e foi substituído por um 
comportamento que incentiva o acúmulo de capital, portanto, o consumismo. “O trabalho, ao 
deixar de ser um fim em si mesmo, torna-se um meio para a aquisição de mercadorias. 
Trabalha-se para consumir, nem que seja a própria identidade” (GAULEJAC, 2007, p.16), 
sendo assim, nessa perspectiva a atividade laboral passa a ser vista como parte pertencente e 
natural das coisas e não como um produto do empenho ligado à ação humana (PIOLLI, 2011). 
Portanto, quando o trabalho deixa de ter um valor para servir somente como ferramenta de 
produção de valor, a simbolização que cria um sentido pessoal para o exercer profissional se 
perde, e o indivíduo tem uma descaracterização velada de sua identidade. Segundo Freud, em 
sua obra O mal-estar da civilização, de 1939, a instauração do princípio da realidade se dá 
quando é possível “distinguir entre o que é interior – pertencente ao Eu – e o que é exterior – 
oriundo de um mundo externo” (FREUD, 2011, p.11), contudo, quando perde-se a valoração 
pessoal dada ao trabalho por meio de uma sinergia com os interesses do capitalismo 
representados pela figura das Organizações, o princípio da realidade torna-se deturpado por 
um viés ideológico que foi assumido como verdadeiro. Isto é, os desejos do profissional 
tornam-se os mesmos desejos defendidos e estimulados pela companhia e tal fato só se torna 
possível visto que há um poder gerencialista que promove essa doutrinação e que tenta 
transformar a energia libidinal em força de trabalho (GAULEJAC, 2007). As Organizações, 
portanto, observadas pela ótica da metáfora das prisões psíquicas se contextualizam como 
essa tentativa de doutrinação do inconsciente e através do “reprocessamento da percepção do 
espaço produtivo” (HELOANI, 2003, p.13) determinam os modelos de comportamento 
replicados em um ambiente controlador, que tenta determinar modos e condutas comuns entre 
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os indivíduos para gerar benefícios à própria Organização (MORGAN, 2002). Para isso, 
“podemos exercer a liberdade de pensamento e de palavra, com a condição de que essa 
liberdade sirva para melhorar os desempenhos” (GAULEJAC, 2007, p. 78), logo, as 
capacidades e habilidades dos indivíduos são bem-vindas quando essas possam servir como 
recurso para gerar benefícios à Empresa, porém, nunca para criticar a estrutura, formas de 
domínio ou normas de condutas comuns, exercidos por um poder gerencialista. Em suma, 
contrariar premissas (sombras) defendidas como verdades absolutas não é um comportamento 
utilitário para as Organizações (MORGAN, 2002) visto que “tudo aquilo que não for útil é 
considerado como não tendo sentido” (GAULEJAC, 2007, p. 78), portanto, um funcionário 
que não se adequa no perfil desejado deverá ser descartado. 
Nas empresas pós-fordistas - capitalismo moderno - prevalece nas companhias a 
perspectiva de olhar para o funcionário como um possível agente de resolução das situações-
problema, em que o funcionário é estimulado a ser proativo, dinâmico, ter pensamento 
analítico, ser inovador etc. Entretanto, para exercer essas capacidades o indivíduo precisa 
deter de certo nível de autonomia, ao mesmo tempo em que se mantém sob controle pela 
Organização. Nesse sentido, a estratégia adotada pela Empresa é fazer com que os 
funcionários absorvam a cultura organizacional, de modo a introjetar o “modo de pensar”, as 
regras e normas de conduta da corporação, ou seja, domesticar o seu objeto de controle, o 
“homem organizacional” (AGUIAR, 2005) e tal fato só se torna possível quando há um 
reordenamento subjetivo da mentalidade do trabalhador, pois “crendo que a subjetividade foi 
reconhecida ponham a serviço do capitalismo seu potencial físico, intelectual e afetivo” 
(HELOANI, 2003, p.106). Logo, as empresas modernas enxergam a psiquê como mais um 
recurso a ser explorado. 
Dessa maneira, pode-se perceber que, “o trabalho subordina-se ao capital em três 
dimensões: afetiva, subjetiva e psicológica” (HELOANI, 2003, p. 109), e para manter o 
controle da ordem capitalista que visa o acúmulo de capital pelas organizações é preciso 
legitimar essa forma de poder e, nos dias de hoje, isso ocorre através dos modelos de gestão 
em que “o poder gerencialista mobiliza a psique sobre os objetivos da produção” 
(GAULEJAC, 2007, p.41). Na organização hipermoderna há uma perda da figura 
representativa de dominação que se despersonaliza da figura tradicional do “chefe” para o 
controle exercido pela Instituição, que mantém com os funcionários formas de relações 
infantis de submissão-revolta do tipo maternal (PAGÈS, 1987). Logo, as práticas 
gerencialistas atuam de modo a manter o controle subjetivo dos subordinados em favor dos 
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interesses do capital personificados pela Empresa moderna, isto é, a empresa assume um 
papel ambíguo de controle e opressão de acordo com Heloani (2003), e faz isso através da 
oferta e retirada de amor, por meio de mecanismos de gestão da percepção do trabalhador e 
docilização da sua subjetividade. Tal aspecto é facilitado pela troca de um sistema 
inconsciente de submissão do tipo paternal, mais centralizado na figura representativa de um 
“chefe” controlador e rígido, para um sistema tipo maternal, de prazer e angústia, com o poder 
despersonificado e a dominação psíquica (AGUIAR, 2005; GAULEJAC, 2007; PIOLLI, 
2011; PAGÈS, 1987; HELOANI, 2003). Entretanto, ainda que se almeje exercer tal controle e 
poder sobre o indivíduo, a dimensão do inconsciente humano não pode ser ignorada, muito 
menos dominada. “Os desejos individuais e indestrutíveis estão no nível do inconsciente. 
Tentar substituir os desejos dos indivíduos e satisfazê-los de acordo com as necessidades das 
organizações são uma tentativa impraticável” (AGUIAR, 2005, p.163). Diante disso, quando 
ocorre uma tentativa de reduzir o indivíduo a mero recurso financeiro, de modo a racionalizar 
as suas habilidades, técnicas e condutas e ao mesmo tempo, reprimir os aspectos irracionais 
da sua natureza, o resultado, portanto, será um desequilíbrio, visto que “racionalidade e 
irracionalidade são lados de uma mesma moeda e, quando um é muito enfatizado, 
invariavelmente ocorrem distorções e disfunções” (MORGAN, 2002, p. 246), por conseguinte 
que irá se caracterizar pelo surgimento de doenças e distúrbios psicológicos, já que a todo 
momento a empresa gerencialista preocupa-se em “transformar a energia libidinal em força de 
trabalho” (GAULEJAC, 2007, p.42). Entretanto, o fato é que jamais será possível efetuar com 
sucesso a tentativa de padronizar os desejos visto que esses pertencem as instâncias 
individuais e inconscientes (AGUIAR, 2005). 
É importante ressaltar que esse controle exercido pela dominação psíquica é 
extremamente sutil, de modo que se torna difícil a identificação por parte de quem pertence a 
esse contexto e mais facilmente observado pela ótica do indivíduo alheio ou externo a esse 
cenário. Por essa razão, a Caverna de Platão utilizada como metáfora desse universo das 
Organizações como prisões psíquicas, conforme abordado por Morgan (2002) em sua obra 
Imagens da Organização, corrobora para facilitar o entendimento desse cenário complexo. E 
tal prática é favorecida em virtude do sentimento de instabilidade e insegurança gerado no 
trabalhador, na tentativa de substituir o seu sistema de valores pelo introjetadoda Instituição 
(PIOLLI, 2011). Nesse sentido, a Organização como uma estrutura de interação comunicativa 
que propaga o seu discurso com base em uma razão instrumental, que é distorcida, atua de 
maneira tênue para moldar a vida de seus empregados a fim de uniformizá-los a partir da 
20 
 
 
 
exploração das suas angústias reprimidas, desejos não realizados, sonhos, aspirações, 
frustações, etc. (FREDDO, 1994). Ou seja, das vulnerabilidades do sujeito. Ademais, 
“Marshall McLuhan salientou que a última coisa que um peixe provavelmente nota é a água 
na qual ele nada” (MORGAN, 2002, p 218) e “que vive a alienação e não se dá conta dela, 
porque não examina a relação entre ele mesmo, seu trabalho e seus atos, nem percebe a 
distância que separa seu próprio ser de seu que fazer” (FREDDO,1994, p. 33). Dessa maneira, 
percebe-se que, dificilmente o profissional que vive diariamente essa doutrinação subjetiva 
irá, sem estímulo externo, questionar a forma que a companhia utiliza para exercer controle e 
dominação sobre seus subordinados, visto que as sombras dessa caverna constituem as suas 
percepções de “realidade”. Assim, tal cenário poderia caracterizar o delírio de massa, segundo 
pensamento de Freud (2011), para conceituar o ato delirante de um grupo coletivo em 
modificar a percepção da realidade como mecanismo de proteção ao sofrimento. 
Para Freud (2011) nas teorias das instâncias psíquicas, a consciência faz parte de 
uma das funções do “Super-eu” com ação de censurar, vigiar e julgar os atos e intenções do 
“Eu” e ao exercer essa ação coercitiva surge o sentimento de culpa que garante a doutrinação, 
seja por um comportamento que segue de acordo com as normas ou por um sentimento de 
castigo e punição na ocorrência das transgressões. Sendo assim, a cultura e/ou a sociedade 
exercem poder por meio do “Super-eu da cultura”. Essa analogia pode se estender para o 
ambiente corporativo em que as lideranças gerencialistas se disfarçam como forma de 
consciência coletiva que exerce coerção sobre os funcionários através do controle psíquico, 
em que “o corpo só se torna força útil se é ao mesmo tempo corpo produtivo e corpo 
submisso” (FOUCAULT, 1987). Essa consciência coletiva, que prega um discurso orientado 
para a execução de seus objetivos voltada para a dominação psíquica, atua por meio de 
repressão através de uma lógica da racionalidade (FREDDO, 1994), isto é, ocorre uma 
substituição de um sistema paternal de ordens pela dominação psicológica exercida por um 
sistema psíquico de controle das estruturas mentais do empregado, que se torna eficiente por 
ser interiorizado (PIOLLI, 2011). Em contrapartida, essa tentativa excessiva de controle que 
tenta a todo momento usurpar as energias libidinais do indivíduo irá gerar profundas 
consequências, visto que “exigindo mais, produzimos no indivíduo rebelião ou neurose, ou o 
tornamos infelizes” (FREUD, 2011, p. 91) e “o homem se torna neurótico porque não pode 
suportar a medida de privação que a sociedade lhe impõe” (FREUD, 2011, p. 32). 
 Nota-se que, o poder gerencialista não funciona somente como um modelo de 
dominação, mas também como uma tentativa constante de docilizar a subjetividade dos 
21 
 
 
 
funcionários já que “o objetivo do controle tende a se deslocar da atividade física para a 
atividade mental” (GAULEJAC, 2007, p.117), de modo a perpetuar uma modelação de 
comportamento a partir de uma introjeção de valores que estão de acordo com os ideais 
corporativos. E que se torna mais eficiente quando há na Empresa um programa bem 
direcionado da área de Recrutamento, Seleção e Treinamento, já que “as práticas de seleção e 
treinamento reafirmam explicitamente esse espaço pedagógico de adestramento dos corpos no 
interior da empresa” (HELOANI, 2003, p.37). Dessa maneira, esses agentes atuam para 
identificar, por exemplo, possíveis candidatos que apresentem um perfil com ambições e 
ideais, para propor, portanto, a esse indivíduo, satisfazer as suas necessidades e metas, como 
também, de estimular o desenvolvimento das ambições pessoais – desde que – alinhadas com 
os objetivos que agreguem valor para a empresa. Segundo Gaulejac: 
 
[...] a empresa oferece uma imagem de expansão e de poder ilimitado, na qual o 
indivíduo projeta seu próprio narcisismo. Tomado pela ilusão do próprio desejo, ele é 
animado pelo medo de fracassar, de perder o amor do objeto amado (aqui, a 
organização), o temor de não estar à altura, a humilhação de não ser reconhecido 
como um bom elemento (GAULEJAC, 2007, p.124). 
 
Quando a empresa consegue enlaçar o funcionário nesse cenário persuasivo ocorre o 
processo transferencial (HELOANI, 2003) em que toda a lógica individual é substituída por 
uma mesma ótica coletiva em comum, de maneira sutil e quase imperceptível. Nesse cenário 
observa-se o determinismo sociológico em que os indivíduos se submetem aos interesses da 
organização, que são movidos pelo interesse do capital e são condicionados através da 
perspectiva de “vestir a camisa da companhia” (AGUIAR, 2005). Tal aspecto deve-se ao 
processo de mediação, em que a Organização consegue atuar como um agente mediador entre 
as vantagens que oferece ao profissional e as restrições a qual o mesmo deve se submeter, de 
modo a conseguir encantar o sujeito com possíveis benefícios ao mesmo tempo que impede a 
consciência e percepção coletiva, a fim de integrar e manter o indivíduo vinculado à 
corporação (PAGÈS, 1987). Isto é, com a mediação a corporação consegue potencializar a 
dependência psíquica dos trabalhadores. Sendo assim, para persuadir o funcionário são 
ofertados promoções, benefícios, políticas de remuneração, bônus, elevação salarial, plano de 
carreira, incentivos emocionais, ou seja, o termo mediador – as vantagens que atraem os 
profissionais para uma maior adesão e inserção naquele ambiente, em contrapartida, para as 
desvantagens são adotadas estratégias não tão explícitas, como constante disponibilidade, 
subordinação e dependência psíquica. Desse modo, os trabalhadores perdem a sua identidade 
para se moldar à organização, e são, portanto, massificados (AGUIAR, 2005). 
22 
 
 
 
A “Organização-droga” é amada e odiada ao mesmo tempo, e essa ambiguidade ocorre 
visto que trata-se a Empresa tanto como objeto de identificação – amor, quanto como fonte de 
angústia, pelo medo constante da perda. Portanto, a empresa retoma o sentimento de 
dependência presente na relação entre a criança e os pais (PAGÈS, 1987), o que torna esses 
indivíduos emocionalmente infantis (CROCHIK, 2007). Nessas organizações a empresa se 
coloca como “protetora”, essencial por garantir a vida dos indivíduos e indispensável para a 
sua existência, e tal prática é efetivada por meio da internalização dos valores, manipulação 
de angústias reprimidas, exploração das carências emocionais, padronização dos sentimentos, 
desejos e condutas (AGUIAR, 2005). Ou seja, o funcionário se desindividualiza para se tornar 
parte pertencente do grupo coletivo. Logo, “o indivíduo tende a depender cada vez mais da 
organização, num processo de fusão afetiva, que passa a reproduzir o paradigma maternal: 
como ‘protetora’, a empresa deve receber ‘fidelidade e competência’ do trabalhador” 
(HELOANI, 2003, p. 108). Ademais, a administração participativa é outra estratégia 
mascarada adotada pelas empresas modernas de exercer esse controle, que ocorre através de 
grupos coletivos, Círculos de Controle de Qualidade (CCQ), etc. (AGUIAR, 2005). Assim, as 
estratégias utilizadas para dominação subjetiva do homem organizacional apresentam severas 
consequências, a saber, padronização dos valores com perda de individualidade, limitação da 
capacidade criativa, inovadora e crítica do sujeito, e principalmente, insatisfação e frustação. 
Nesse momento se instaura o perigo, já que muitas vezes sem perceber, o indivíduo 
entra em uma espiral da qual não consegue mais de desconectar,de controle, submissão e 
dependência (GAULEJAC, 2007). Tal aspecto deve-se ao fato de que para não entrar em um 
conflito interno em que os seus desejos e metas pessoais se confrontem com os objetivos da 
organização, o indivíduo cria mecanismos de defesa que o levam a uma fuga psíquica, 
portanto, uma falsificação da consciência (AGUIAR, 2005). Tal aspecto deve-se ao 
aniquilamento psíquico, em que o Eu torna-se totalmente suprimido e dominado pelo trabalho 
(FREDDO, 1994). Assim, negando as suas necessidades e pulsões internas o sujeito adota e 
“permite” - entende-se como tornar-se passivo - a introjeção da ideologia organizacional 
como meio de autoproteção psíquica. Com isso, o Ego deixa de exercer o papel de instância 
psíquica reguladora de integração entre o Superego e o ID para exercer um papel autoritário e 
rígido sob o próprio sujeito, de modo a alinhar a sua autoridade em prol dos objetivos, crenças 
e ética organizacional (AGUIAR, 2005). Desse modo, o medo de perder o objeto amado 
provoca o sofrimento, visto que a Instituição representava o meio pelo qual suas necessidades 
de realização narcisistas iriam ser supridas. Logo, “do mesmo modo que a satisfação de 
23 
 
 
 
instintos é felicidade, torna-se causa de muito sofrer se o mundo exterior [leia-se 
Organização] nos deixa à míngua, recusando-se a nos saciar as carências” (FREUD, 2011, p. 
22). Nesse sentido, esse ego deformado impede a autorrealização do sujeito, o 
desenvolvimento da consciência crítica e autonomia para impor que se reproduza o 
comportamento e normas de conduta seguidos pela Empresa, portanto, o trabalhador não 
alcança a maturidade psicológica e se mantém no infantilismo psíquico (AGUIAR, 2005). 
Como também, “ocorre a morte de si mesmo, do sujeito, em nome de uma obediência sem 
limites” (FERREIRA, 2009, p.13) e tal aspecto, no médio-longo prazo trará severas 
consequências. 
O domínio ideológico da Organização é abordado por Pagès (1987) para explicar 
essa preponderância de poder na perspectiva da empresa vista como uma espécie de 
Instituição religiosa, a igreja. Define-se ideologia como “um conjunto lógico, sistemático e 
coerente de representações (ideias e valores) e de normas ou regras (de conduta) que indicam 
e prescrevem aos membros da sociedade o que devem e como devem pensar, valorizar, sentir” 
(CHAUÍ, 1984, apud AGUIAR, 2005, p.120). Diante disso, percebe-se que as empresas 
conseguem criar um sistema de representação por meio de forças abstratas que exercem 
coerção e admiração, ao mesmo tempo que promove a adesão as suas práticas e a projeção do 
narcisismo de cada funcionário por promover um sistema de crença e identificação. Por essa 
razão, a consciência de culpa é tão eficiente e a sua dominação não é reconhecida pelos 
integrantes, de modo a se manter no inconsciente ou como forma de “mal-estar” reconhecida 
nesse cenário como expressão de “pecado” frente a uma transgressão ou medo de punição do 
Super-eu (produzido pela consciência coletiva – Instituição) e a necessidade do amor 
proveniente dela (FREUD, 2011). 
A abstração é o resultado da introjeção dos valores e desejos organizacionais de 
modo a distanciar a perspectiva do homem frente à realidade concreta e vivida através de 
representações falsas ou deturpadas da realidade (PAGÉS, 1987). E essa abstração somente 
torna-se possível em virtude do processo de mediação e falsificação do inconsciente, logo “o 
compromisso do assalariado é sem fim, a partir do momento em que ele projeta seu próprio 
ideal sobre a empresa” (GAULEJAC, 2007, p.122). Percebe-se que, dessa maneira, a fuga da 
realidade em prol de uma percepção distorcida gera a cegueira psíquica (AGUIAR, 2005) 
com a finalidade de manter o indivíduo protegido frente a introjeção da rigidez do Ego e do 
Super-Ego formado à imagem da Organização, portanto, o sujeito torna-se passivo a 
dominação psíquica visto que para se resguardar, o inconsciente buscará fugir do desprazer. 
24 
 
 
 
3 A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE E O TRABALHO 
 
“É o que experimentamos como eu diante da pergunta quem é você?” (FERREIRA, 
2009, p.48). Em tal aspecto, nota-se que a identidade se apresenta como um conceito 
polissêmico com difícil definição, por se tratar de um processo interno de construção, a partir 
da influência externa do meio à qual se pertence, com o desenvolvimento do indivíduo como 
sujeito em que ocorre a caracterização como ser singular. Logo, a identidade está sempre 
relacionada com o conceito de alteridade, pois necessita de um outro referencial para a partir 
de uma comparação estabelecer as semelhanças e divergências, de modo a caracterizar o que 
identifica um indivíduo (MACEDO & HELOANI, 2013). Nesse sentido, a identidade se 
constrói no meio social por meio das relações interpessoais e influências simbólicas (PIOLLI, 
2011). Isto é, parte de um movimento que necessita do coletivo para que a partir dos produtos 
das inter-relações do meio, o indivíduo em formação receba essas influências, e determine a 
partir de um processo introspectivo inconsciente, como irá valorar a sua significação e quais 
símbolos serão agregados na sua formação como sujeito. Logo, a identidade pessoal e a 
identidade social (papel do indivíduo no meio) são conceitos que se fundem na prática e que 
não é possível descrever de maneira isolada, já que trata-se de uma definição que se constrói a 
partir de socialização e aprendizado (MACEDO & HELOANI, 2013), como “o trabalho inclui 
e exclui o sujeito das suas possibilidades de ser” (FERREIRA, 2009, p. 12). Por essa razão, 
entende-se a importância de refletir sobre a psicodinâmica do ambiente profissional na 
construção da identidade do sujeito. 
Freud, na tentativa de discursar sobre os conceitos do “Eu”, diz que “Normalmente nada 
nos é mais seguro do que o sentimento de nós mesmos, de nosso Eu. Este Eu nos aparece 
como autônomo, unitário, bem demarcado de tudo” (FREUD, 2011, p. 9). Isto é, o autor tenta, 
ao explicar as instâncias psíquicas que formam o “Eu”, conceituar o que mais tarde 
entendemos como parte de nossa identidade, visto que ao continuar a sua teoria, Freud relata 
que esse “Eu” se prolonga para dentro de maneira inconsciente e movido pelo princípio do 
prazer, instância denominada ID. Contudo, em geral, o “Eu” que se projeta para fora, possui 
limites mais definidos, exceto nos casos de enamoramento (relações amorosas). Nesse 
cenário, os limites que se projetam para fora tornam-se difusos ou conturbados, portanto, o 
“Eu” e o “Tu” tornam-se únicos, logo compartilham das percepções, anseios, desejos etc. E o 
problema reside no momento que se perde esse limite com o externo, não somente por 
distorcer o princípio da realidade que envolve o desenvolvimento da consciência, mas 
25 
 
 
 
também por desfigurar a constituição de sua identidade. Ademais, “na medida em que o 
indivíduo é convidado a tomar o lugar daquele que avalia, ele é estimulado a se identificar 
com a organização, interiorizando suas restrições e projetando nela a angústia ligada ao medo 
do fracasso” (PAGÈS, 1987, p. 105). Para Gaulejac (2007), portanto, nesse cenário há uma 
dupla perda para o trabalhador, visto que quanto maior a identificação com a empresa maior é 
a perda de autonomia e maior é a tendência psíquica que resultará em uma dependência 
permanente e perda do seu verdadeiro “Eu”. Tal fato deve-se à importância que o trabalho 
exerce na construção da perspectiva individual sobre a própria imagem de si e na 
identificação e validação pelo olhar do outro (PIOLLI, 2011), portanto, um significado 
simbólico de autorrealização da imagem projetada do Eu que necessita ser legitimado e 
reconhecido no ambiente Organizacional. 
Por mais que a atividade profissional se apresente com fins de geração e acúmulo de 
capital, a mesma, ainda está atrelada a um valor simbólico que pode ser representado como 
expectativas e projeção da identidade (PIOLLI,2011). Tal aspecto deve-se ao fato de que, o 
trabalho exerce posição central nos processos de identificação do sujeito e na formação de sua 
personalidade, em virtude da simbologia empregada na prática, que é moldada pela ótica 
subjetiva de desejos inconscientes e forças psíquicas. Ademais, o homem como um ser social 
precisa do outro, através das relações interpessoais, para se reconhecer e validar na sociedade 
(MARX, 1988, apud DUARTE, 2018), ou seja, parte da identidade do sujeito é moldada pelo 
olhar do outro, portanto, tal fato deve-se a necessidade intrínseca do homem de buscar o 
reconhecimento e validação de si, nos processos interativos. 
A identidade é um processo que está em constante construção e modificação, que nunca 
está completo e sempre é inacabado, permissivo a novos aprendizados. A construção da 
identidade está sujeita, portanto, à dinâmica das relações entre sublimação e reconhecimento. 
Entende-se que a sublimação corresponde ao “desvio de energia sexual (libido) de seu 
objetivo sexual para objetivos culturais” (AGUIAR, 2005, p. 182) e “ao investimento afetivo 
em objetos socialmente valorizados” (FERREIRA, 2009, p. 48). Logo, a sublimação, nesse 
aspecto, atua por meio da descarga pulsional como possível fonte de prazer. Ademais, todas 
as experiências passadas permanecem de alguma maneira preservadas nas instâncias psíquicas 
que estão em um processo contínuo de construção, portanto, o que se formou no âmbito 
psicológico pode retornar à luz da consciência em determinadas circunstâncias (FREUD, 
2011), na medida em que ocorre interações sociais. Nesse sentido, a percepção do indivíduo é 
formada por processos transacionais entre o sujeito que percebe e o objeto que é percebido, 
26 
 
 
 
ou seja, uma dinâmica contínua de influências mútuas, em que ao conhecer o outro a pessoa 
está, ao mesmo tempo, conhecendo a si mesma (AGUIAR, 2005), logo o “eu é composto por 
inúmeras identificações que ocorrem ao longo da vida” (CROCHIK, 2007, p. 184). Vale 
destacar que esse “outro” pode ser um objeto de desejo, como por exemplo, o da criança que 
deseja o peito materno ou a proteção paterna. Ou também, como ao longo do 
desenvolvimento e amadurecimento, o objeto torna-se o amor proveniente da Organização, e 
as suas experiências passadas como resíduos mnemônicos podem influenciar a dinâmica da 
busca pelo prazer, através do reconhecimento de si na Instituição. Contudo, se esse objeto 
amado recusa ou impossibilita o alcance do Princípio do Prazer, o indivíduo, para evitar o 
sofrimento, nega a sua consciência e torna-se alienado, “com ajuda do ‘afasia-tristeza’ 
podemos nos subtrair à pressão da realidade a qualquer momento e encontrar refúgio num 
mundo próprio que tenha melhores condições de sensibilidade” (FREUD, 2011, p.22). Sendo 
assim, “se o ego enfraquece, a consciência também, e torna-se presa fácil da ideologia carente 
de racionalidade” (CROCHIK, 2007, p. 190), introjeta-se, portanto, uma ideologia por meio 
da falsa consciência como tentativa de evitar o sofrimento. 
Percebe-se, assim, que o trabalho consiste em um elemento-chave não somente na 
formação, como também nas transformações identitárias do sujeito. Tal aspecto nota-se 
principalmente no momento da escolha e formação profissional, em que a atividade laboral 
intervém e influencia nas dinâmicas das relações e nos processos de socialização secundária 
(PIOLLI, 2011). Como também, segundo Perico & Justo (2011, p.139), “na sociedade 
capitalista atual, é muito comum, logo em seguida à indagação do nome, a importância que se 
dá à ocupação profissional para descrever a identidade de uma pessoa”. Tal aspecto 
demonstra, portanto, a proporção da centralidade que a profissão tem na vida das pessoas 
como sendo parte inerente e indissociável do homem, visto que o “o trabalho é fator de 
confirmação da identidade individual e coletiva, indispensável ao sentido que a vida adquire 
em sociedade” (FERREIRA, 2009, p. 37). Nesse sentido, a carreira adquire posição central na 
vida do homem pois torna-se a sua principal forma de significação de sua existência, como se 
o seu valor pessoal estivesse reduzido e centralizado à sua atividade profissional (PAGÈS, 
1987). Diante disso, o sujeito ressignifica todos os desejos e valores subjetivos alinhados com 
o sucesso profissional, como se esse fosse a única forma de definir o sujeito como ser dentro 
da sociedade e de classificá-lo, portanto, a uma dualidade cruel de sucesso e fracasso, que é 
baseada na sua atividade dentro de um cenário dominado pelo acúmulo de capital, status e 
poder. 
27 
 
 
 
De acordo com Piolli (2011, p. 179) “o indivíduo, na condição de trabalhador, constrói 
a imagem de si e sua identidade de forma mediada pela organização do trabalho”. Isto é, o 
trabalho traduz, principalmente, um sentido de essencialidade, de sentido e pertencimento na 
sociedade (PERICO & JUSTO, 2011) e “nenhuma outra técnica para a condução de vida 
prende a pessoa tão firmemente à realidade como a ênfase no trabalho, que no mínimo a 
insere de modo seguro numa porção de realidade” (FREUD, 2011, p.24). Logo, a atividade 
profissional, ao longo dos anos, se tornou não somente substrato para canalização das energias 
psíquicas, desejos inconscientes e autorrealização do Ego, mas também como forma de 
estimar o seu valor em um meio competitivo e de sinalizar a sua inserção no meio. Quando o 
indivíduo consegue se reconhecer no trabalho que executa, ou seja, sentir, pensar e 
principalmente, estimar valor, entende-se a atividade como “trabalho com valor” e nesse 
cenário o profissional imprime a sua marca pessoal na sua função e tal aspecto denota uma 
expressão individual chamada de “escrita da subjetividade” (FERREIRA, 2009). Contudo, 
quando o trabalho deixa de representar essa valoração ou torna-se controlado por um excesso 
de racionalismo imposto por meio de normas, regras de conduta e políticas de desempenho, o 
resultado é a diminuição e até a ausência da expressão da escrita da subjetividade. À medida 
em que o indivíduo deixa de identificar o valor atribuído ao trabalho, que não está mais 
relacionado com os aspectos inerentes da contribuição individual de cada um, como por 
exemplo, de um artesão que produz a sua obra e identifica a finalidade e o propósito da 
mesma, ocorre o fenômeno de perda simbólica em que coloca-se o sentido do trabalho “em 
suspenso” (GAULEJAC, 2007) e com isso, perde-se o elo de conexão com a função do 
sujeito e atividade-fim, visto que a lógica do capitalismo substitui o sentido concreto e 
reconhecido do trabalho por um valor abstrato. Nesse sentido, quando as projeções narcísicas 
são canalizadas para o trabalho, o indivíduo cria no objeto amado as expectativas de 
reconhecimento e proteção, de modo a fantasiar por meio de uma falsa percepção um sentido 
para o trabalho, que é, portanto, um sentido alienado da vida (PIOLLI, 2011). Como também, 
“pela alienação que o trabalho traz implícita, o trabalhador por trabalhar não se pensa e não se 
trabalha; em consequência, se elimina a si mesmo, até desaparecer como protagonista de sua 
própria existência” (FREDDO,1994, p.27), ou seja, por ter sido direcionado por um discurso 
manipulado que objetiva exercer controle e dominação das suas capacidades psíquicas ocorre, 
aos poucos, o distanciamento com a simbologia do papel profissional, que é determinado pela 
conexão exercida na atividade laboral e o resultado, de modo a ceder o lugar de valor para 
indicadores de performance e resultado. Dessa maneira, “o homem é despersonalizado. A 
28 
 
 
 
medida de suas aptidões e seu potencial ‘em si’, sua capacidade em se adaptar às normas, 
planos, quotas, objetivos fixados, tomam para ele o lugar da identidade” (PAGÈS, 1987, p. 
118). Como consequência, “a identidade se esfacela quando o corpo social que a envolve 
torna-se ele próprio incoerente, quando os laços seu diluem e quando osacontecimentos 
perdem seu sentido e não querem dizer mais nada” (CYRULNIK, apud GAULEJAC, 2007, p. 
151). Sendo assim, pode-se perceber que há um dano na identidade que foi construída a partir 
das interações desse meio. 
A identidade de uma criança se forma por influência dos desejos dos pais, de modo 
que o amor dos pais para com os filhos gere no menor um sentimento duplo de medo de perda 
e anseio (PAGÈS, 1987). Isto é, a criança deseja se comportar bem para conquistar e garantir 
o recebimento do amor de seus pais ao mesmo tempo em que tem uma dependência e medo 
constante de perder o seu objeto amado. A identidade será formada por um processo de “corte 
e recorte” em que o sujeito reconhece e identifica o que o atrai e descarta o que não interessa, 
portanto, um processo de construção e interação constante com o objeto, que está sempre 
sujeito a modificações. Segundo Pagès (1987), a identidade se constrói por um processo de 
assimilação, em que o sujeito toma e/ou rejeita uma parte do outro para si, por meio de 
projeções e introjeções que ocorrem na troca com os demais, entretanto, com a dominação 
psicológica há um enfraquecimento do Ego que resulta no empobrecimento da identidade. 
A narrativa da carreira inicia-se desde o período escolar com a escolha vocacional, e 
em um cenário de incertezas e imaturidade, o aluno começa a desenvolver a sua expectativa 
de autorrealização, projeção e metas para o futuro (PIOLLI, 2011). Nesse sentido, o jovem 
que inicia sua trajetória profissional, em geral, não tem “bagagem” nem maturidade psíquica 
para se proteger e tentar blindar tal dominação psicológica (BORSOI, 2007). 
29 
 
 
 
4 SATISFAÇÃO E FELICIDADE NO TRABALHO: (IN)DEFINIÇÕES 
 
A princípio, convém considerar para a presente análise o conceito dicionarizado do 
termo “satisfação” definido como “Ação ou efeito de satisfazer” ou “Contentamento; prazer 
resultante da realização daquilo que se espera ou do que se deseja” (DICIO, 2020). Ademais, 
quando esse conceito é aplicado na atividade laboral, pode-se notar diversas concepções, que, 
em geral, alcançam o mesmo entendimento comum. Veja-se, por exemplo, que Locke (1960, 
apud MARQUEZE & MORENO, 2005, p.70) define a satisfação no trabalho “como o 
resultado da avaliação que o trabalhador tem sobre o seu trabalho ou a realização de seus 
valores por meio dessa atividade, sendo uma emoção positiva de bem-estar”. Tal aspecto 
deve-se ao fato de que, a satisfação parte da percepção do trabalhador sobre a realidade 
observada do ambiente profissional no qual está inserido. Diante disso, quando não há a 
percepção do sentimento de satisfação inerente a cada indivíduo, o resultado gerado está no 
âmbito do sofrimento por não alcançar a realização de um objetivo, meta ou expectativa, da 
qual esperava, e tal fato resulta na insatisfação. Isto é, a satisfação e a insatisfação 
representam um estado emocional e subjetivo do indivíduo, de duas maneiras opostas de 
manifestação do mesmo fenômeno (MARTINEZ & PARAGUAY, 2004). Nesse sentido, se 
desenvolveu o debate sobre os fatores que determinam ou influenciam a satisfação no 
ambiente profissional. As empresas buscam deter o conhecimento de tais fatores, por meio de 
ferramentas, como por exemplo a Pesquisa de Clima Organizacional, para tentar de alguma 
maneira oferecer subsídios que tornem viável a aquisição da satisfação, entendida no sentido 
de uma realização das necessidades, a fim de exercer controle de maneira sutil sobre o 
indivíduo. Contudo, se tal objetivo não é alcançado, por diversas causas a serem discutidas, o 
profissional tende a se sentir insatisfeito. E o grande dano ao trabalhador, portanto, reside no 
fato de a insatisfação promover um prejuízo à saúde mental. Ao mesmo tempo, a insatisfação 
no trabalho compromete o alcance dos objetivos organizacionais. 
Em segunda análise, vale destacar o conceito de felicidade, que, segundo o dicionário 
Michaelis on-line (2021, não paginado), pode ser definida como “1 Estado de espírito de 
quem se encontra alegre ou satisfeito; alegria, contentamento, fortúnio, júbilo”. Contudo, ao 
analisar a definição de felicidade com ênfase, nesse momento, na relação com a satisfação, 
Bendassolli diz que: 
 
[...] como a felicidade é, por sua própria natureza, algo incerto e indefinido, ela não 
pode ser plenamente satisfeita. Há várias explicações para isso, mas todas 
30 
 
 
 
convergem no sentido de uma mesma conclusão: não sendo ou não podendo ser 
satisfeita, a busca pela felicidade moderna alimenta uma ânsia sem fim por objetos e 
sensações (BENDASSOLLI, 2007, p.59). 
 
Diante do exposto, ao entender que a felicidade é efêmera e que estabelece conexões com o 
sentimento de satisfação, e esse parte da perspectiva subjetiva de cada um, compreende-se que 
só é possível estabelecer um modelo para alcançar tal objetivo, a partir de uma tentativa de 
materializar e desindividualizar algo pertinente ao sujeito. Logo, não somente objetivar, mas 
também padronizar a ideia de felicidade geral, de modo a promover a introjeção de uma 
expectativa comum e com isso, uma dependência de ser ou exercer posse sobre algo, como 
por exemplo, prestígio, poder, bens etc. 
Segundo a obra “Se você é tão esperto, porque não é feliz”, Raghunathan discursa 
sobre o tema felicidade aplicado às práticas do cotidiano, como, por exemplo, a vivência do 
ambiente corporativo, e relata que, mesmo a felicidade sendo a principal meta de vida, 
percebe-se que, ainda assim, as pessoas tendem a desviar seu foco para outros objetivos 
menos importantes, teoria intitulada de “Paradoxo Fundamental da Felicidade” 
(RAGHUNATHAN, 2017). Dessa maneira, percebe-se que algumas das técnicas de 
dominação psicológica utilizam ou modelam esses “outros desejos” do indivíduo para atrair e 
exercer um controle sobre o trabalhador e, a partir disso promovem o que o autor 
Raghunathan conceitua como a “Maximização do meio”, que se refere à propensão que temos 
de esquecer o objetivo final que desejamos alcançar e perseguir o meio para esse objetivo, a 
saber, determinado salário, cargo, bonificações, status etc. Logo, nota-se que o paradoxo da 
felicidade se perpetua porque o indivíduo “se perde ou distrai” nas ferramentas de 
maximização dos meios. Isto é, de maneira implícita e, às vezes, imperceptível ao olhar 
desatento, o sujeito passa a substituir o seu entendimento sobre a felicidade pelo ideal comum 
disseminado daquele ambiente corporativo, através da ideia representativa do “ser ou ter” e tal 
aspecto ao longo do tempo pode vir a gerar um prejuízo à sua saúde mental, visto que ocorreu 
uma desapropriação da identidade pela cultura organizacional. Em concordância com o fato 
de não ser possível ocorrer esse tipo de generalização, Freud discursa em sua obra O Mal-
estar na civilização sobre tal cenário: “não há uma regra infalível que se possa aplicar a 
todos” [para se alcançar a felicidade]. Cada homem deve encontrar por si mesmo de que 
modo específico pode ser salvo” (apud BENDASSOLLI, 2007, p.61). Desse modo, percebe-
se como o trabalho influencia e contribui para a construção da identidade pessoal, visto que 
“No processo de desenvolvimento do indivíduo, conserva-se a principal meta do programa do 
princípio do prazer, achar a satisfação da felicidade” (FREUD, 2011, p.87). 
31 
 
 
 
Pagès (1987) discorre em sua obra O Poder das Organizações sobre o conceito de 
consolidação ideológica que julga ser essencial no processo de mediação como forma de 
gerar satisfação, a fim de atribuir uma lógica ou valor à experiência profissional, que ocorre 
por meio dos reforços e ideologias propagadas nas Instituições. Dessa maneira, a mediação 
através do processo de privilégio-coerção atua como o mecanismo ambíguo de prazer versus 
angústia. Tal fato é ainda potencializado quando os desejos subjetivos, divergentes à 
Instituição, e inerentes a cada indivíduo são recalcados porum processo de coerção em 
decorrência da sensação de peso e ameaça. Sendo assim, a “saída” para se livrar desse 
sentimento opressivo está na identificação com a Instituição protetora. Logo, a contradição 
psicológica está na mentalidade do sujeito que introjetou uma ideologia como forma de 
autoproteção e insegurança, portanto, vivencia sentimentos contraditórios acerca da 
Organização, a saber, prazer e angústia, felicidade e infelicidade, segurança e insegurança e 
por fim, proteção e ameaça. Ademais, vale destacar que “o recalcamento produz-se nos casos 
em que a satisfação de uma pulsão – suscetível de proporcionar a si mesmo satisfação – 
ameaçaria provocar desprazer relativamente a outras exigências” (AGUIAR, 2005, p. 160), 
como também o “o sofrimento suportado em silêncio como ‘adoecimento’” (FREUD, 2014, 
p. 60), logo, percebe-se que nos casos em que há uma reação que é reprimida, a sua lembrança 
permanece na subjetividade do sujeito e tal fato gera, portanto, sequelas psíquicas e corporais. 
 
32 
 
 
 
5 PRAZER E SOFRIMENTO NO TRABALHO 
 
O trabalho pode ser tanto fonte de prazer quanto de desprazer. Diante disso, vale 
destacar a priori, em que cenário a atividade profissional consegue se tornar um meio de 
promover prazer, em decorrência das pulsões internas de cada sujeito serem satisfeitas, por 
meio do trabalho. Nesse sentido, a ressonância simbólica conceitua-se por ser uma “condição 
de reconciliação entre o inconsciente e os objetos da produção” (AGUIAR, 2005), ou seja, o 
indivíduo encontra no trabalho uma forma de satisfazer as suas necessidades psíquicas. Logo, 
nesse caso, o trabalho configura-se como um local de sublimação por ser um canal de 
expressão dos desejos do sujeito (BORSOI, 2007). Veja-se, por exemplo, o caso da escolha de 
profissão, que está relacionada com aspectos e elementos subjetivos. Nesse cenário, em que a 
escolha individual está alinhada e se materializa na execução da atividade laboral, o indivíduo 
consegue, de modo inconsciente, mobilizar as forças pulsionais naquele objeto – leia-se a 
organização. Contudo, quando o alinhamento entre necessidades psíquicas e organizacionais 
não ocorre, a prática da Organização para tentar mover essas forças pulsionais em prol dos 
objetivos organizacionais é a dominação psicológica. Logo, a manipulação subjetiva é uma 
tentativa das empresas para moldar e promover uma falsa ressonância simbólica nos 
trabalhadores. Entretanto, é notável que tal estratégia tende ao fracasso, e o resultado em 
médio ou longo prazo é o sofrimento, visto que os desejos são parte do inconsciente e, 
portanto, são incontroláveis e indomináveis. Dessa maneira, a dissonância simbólica ocorre 
quando o sujeito não encontra no trabalho uma forma de mobilizar suas necessidades 
psíquicas (AGUIAR, 2005) e precisa, portanto, reprimir os seus desejos gerando mais 
sofrimento psíquico (BORSOI, 2007). Ademais, vale destacar que, nos casos de ocorrência de 
ressonância simbólica o trabalhador pode passar pelo sofrimento criativo (PERICO e JUSTO, 
2011), que ocorre quando o sujeito consegue se defender de maneira criativa a carga psíquica 
do trabalho pois consegue se “enxergar” na atividade que exerce, portanto, mantém a sua 
integridade e saúde mental. 
A princípio, destaca-se que nesse cenário de dominação psicológica nas 
Organizações, o sujeito assume algumas estratégias comportamentais e subjetivas para tentar 
de alguma maneira preservar a saúde mental e/ou aliviar o sofrimento. Segundo Aguiar 
(2005), as defesas coletivas correspondem à adoção de comportamentos estereotipados ou 
alienados para tentar pertencer à cultura organizacional, e as defesas individuais, 
correspondem aos sintomas causados como consequência do adoecimento psíquico – as 
33 
 
 
 
doenças psicossomáticas. Mendes (2007) conceitua essas estratégias de mobilização coletiva 
como formas de personificar o conflito por meio de modos de agir em comum entre os 
trabalhadores, o que Han (2017b) irá discutir em sua obra Agonia do Eros, como o “inferno 
do igual” e que se contextualiza no ambiente corporativo para indicar a despersonificação da 
individualidade do trabalhador em um nivelamento por igual, através da introjeção dos 
desejos da Organização. Nesse sentido, a ausência de um ambiente em que coexistam 
perspectivas diferentes gera a ressignificação silenciosa, que corresponde ao fenômeno de 
passividade coletiva e a servidão consentida (FERREIRA, 2009). As estratégias defensivas, 
por sua vez, são descritas por Mendes (2007) como a naturalização desse cenário 
psicologicamente opressivo e principalmente, do sofrimento do ser humano em virtude do 
mecanismo de negação e racionalização da atividade, logo, com o desfecho de surgimento de 
condições patológicas. Gaulejac (2007) destaca os modos de defesa do funcionário frente a 
esse contexto, a permissividade, a instrumentalização e a resistência. Isto é, ao tolerar ser 
instrumentalizado, o sujeito ajusta o seu comportamento e tenta alinhar a sua conduta 
conforme a cultura organizacional, portanto, permite a tentativa de docilização da sua 
subjetividade, que corrobora com a ideia de defesa coletiva citada por Aguiar (2005) e 
Mendes (2007). Em contrapartida, a resistência consiste no ato de resistir a essa tentativa de 
indução comportamental e de introjeção de normas, valores e desejos padronizados. É um ato 
de proteção da individualidade, um meio de preservar as características da própria identidade 
e não permitir se tornar recurso a ser psicologicamente explorado e que em concordância com 
Gaulejac (2007), consiste em uma clivagem entre o “Eu organizacional” e o “Eu verdadeiro” 
a partir de um rompimento com essa tentativa de massificação. Contudo, vale destacar que, 
em geral, tais “posturas” não são praticadas de maneira isolada e excludente pelo indivíduo, 
ou seja, o sujeito combina essas diferentes atitudes no dia a dia profissional, de modo a tentar 
ao mesmo tempo se resguardar e pertencer àquele ambiente profissional como forma de se 
manter empregado. Logo: 
 
é preciso igualmente que ele preserve a autoestima, resista à alienação não se 
deixe submeter totalmente. A parte do Eu que resiste à instrumentalização 
permite ao indivíduo salvaguardar sua integridade, proteger suas capacidades 
reflexivas, principalmente em relação ao sentido a dar a suas ações 
(GAULEJAC, 2007, p 109). 
 
Quando (e se) o indivíduo adquire consciência da psicodinâmica do ambiente no qual 
está inserido torna-se um ser inteligente e livre (AGUIAR, 2005) visto que percebe que está 
34 
 
 
 
submetido a um jogo de submissão e liberdade. A alternativa encontrada para de alguma 
maneira se blindar frente a esse cenário é a postura cínica frente às práticas inerentes ao 
contexto das Instituições, “Em uma sociedade capitalista é preciso ser capitalista” (PAGÈS, 
1987, p. 59). Todavia, tal percepção gera um sentimento de medo pelo reconhecimento de 
vulnerabilidade e possibilidade de se perder. 
É importante ressaltar que o adoecimento e o mal-estar não se limitam somente a 
vida profissional, mas também se prolongam para a vida pessoal do sujeito, logo, “o 
sofrimento no trabalho não se restringe ao interior da fábrica, ele atravessa as paredes e 
acompanha o homem, interferindo e influenciando a vida doméstica e social” (AGUIAR, 
2005, p.167). Isto é, esse empregado ao retornar para o seu lar permanece com a sua 
consciência direcionada para o trabalho, como se mesmo presente em ambiente físico 
estivesse parcialmente ou totalmente ausente com pensamentos que retomem a temática da 
Empresa, como se não fosse possível “se desligar”. Sendo assim, percebe-se o tamanho da 
dimensão do alcance do aniquilamento psíquico na vida do trabalhador (FREDDO, 1994). 
Ademais, esse esforço de adaptação constante e de tentativa de suprir expectativas externas 
gera o sofrimento do trabalhador e como consequência afeta todasas demais dimensões da 
vida do indivíduo (PIOLLI, 2011). Tal aspecto nota-se na dimensão das consequências que o 
adoecimento causado pelo trabalho pode ocasionar na vida do indivíduo e que deve, portanto, 
ser combatido. Ademais, “a alienação é a habitação do corpo do outro” (AGUIAR, 2005, 
p.171), entendido como figura representativa da organização, em que o trabalhador por meio 
de um mecanismo de proteção permite ter a sua natureza de liberdade suprimida pela 
ideologia organizacional; contudo isso é um processo maçante, que gera fadiga, exaustão e 
esgotamento. Desse modo, em decorrência da alienação, o trabalhador não reconhece mais a 
si próprio em seu ambiente profissional (HAN, 2017a) e o resultado poderá ser um sentimento 
de vazio. Tal aspecto deve-se ao fato de que esse empregado vivencia um ambiente em que há 
o predomínio da razão instrumental (FREDDO, 1994), que nessa lógica é apropriada para 
potencializar a dominação por meio de normas e regras, a fim de manter implícito o controle 
exercício, que tenta submeter o ritmo da produção do trabalho-vivo (homem) pelo trabalho-
morto (máquina-tecnologia) segundo Heloani (2003), logo, o sujeito é reduzido e nivelado 
como recurso a ser explorado. 
A consequência da projeção do narcisismo do indivíduo nas possibilidades de 
crescimento e ascensão sem limites que a empresa propõe está no âmbito da sua fragilidade 
psíquica (GAULEJAC, 2007) que foi amparada em um falso suporte. Esse indivíduo desloca 
35 
 
 
 
todo a sua energia para satisfazer os ideais do objeto amado – a organização – e tal feito 
jamais poderá ser alcançado em plenitude, visto que são conjecturas, portanto, são ideias 
efêmeras e voláteis. Tal prática resulta, portanto, no sentimento de mal-estar por parte do 
funcionário, ou seja, além da exploração psicológica a vítima ainda é culpabilizada, como se 
essa fosse a própria responsável por não alcançar os padrões ou não se adequar ao modelo 
solicitado das Instituições (PERICO & JUSTO, 2011). Para exemplificar esse cenário, o 
trabalhador nunca estará totalmente à altura dos desempenhos esperados por se tratar de um 
referencial que é um limiar inalcançado, contudo, ao invés de visualizar com clareza essa 
incerteza proposital, o indivíduo sente-se insuficiente, incapaz, incompetente, e desloca para 
si o problema sistêmico do modelo da organização (GAULEJAC, 2007). E assim, “a 
consciência da culpa produzida pela cultura [a Organização], não seja reconhecida como tal, 
permaneça inconsciente ou venha à luz como um mal-estar, uma insatisfação para a qual se 
busca outras motivações” (FREUD, 2011). 
Segundo Gaulejac (2007), a mobilização psíquica ocorre através de dois principais 
processos, a identificação por introjeção da organização como figura de excelência e 
competência, portanto, deslocando essas características que admira para seu próprio Ego. E a 
idealização, por interiorização, desse ideal de perfeição, plenitude da organização e expansão, 
que pode ser um meio para o seu crescimento conjunto. Isso significa que o indivíduo busca 
na organização um meio para suprir todos os seus ideais e anseios narcisistas, entretanto a um 
alto preço de dependência psíquica ao objeto amado – leia-se, a empresa. Isto é, “elas [as 
instituições] modelam a fundo as estruturas de personalidade, pois se tornam máquinas de 
prazer e de angústias, oferta e retirada de amor” (PIOLLI, 2011, p.174). 
Outro aspecto inerente à psicodinâmica do trabalho é o conflito, que segundo a 
abordagem da psicanálise conceitua-se “quando, no indivíduo, se opõem exigências internas 
contrárias” (AGUIAR, 2005, p. 161), ou seja, quando há forças contraditórias que geram uma 
perturbação ou externalização dessa dualidade existente que faz parte do sujeito. Desse modo, 
a causa desse conflito está no contexto das empresas, no cenário de desempenho e 
performance projetada para o indivíduo versus os anseios narcisistas do sujeito, que podem 
porventura, não estarem alinhados com a estratégia corporativa. Para Mendes (2007), o 
conflito pode ser construtivo quando esse “choque” de perspectivas ainda permite uma 
margem de autonomia e escolha por parte do trabalhador, contudo, quando esse conflito gera 
sofrimento torna-se destrutivo, não somente para o indivíduo, mas também para a própria 
Organização. Logo, faz-se necessário ressaltar também as consequências para as Empresas, 
36 
 
 
 
visto que quando tal aspecto de prejuízo se limita somente ao âmbito do ser humano, a 
discussão torna-se desvalorizada na ótica capitalista. Assim, enfatizar que tal prática trará 
malefícios e também impactará o poder do capital demonstra como a tática de manipulação 
psicológica pode se tornar o próprio “calcanhar de Aquiles” das Organizações 
Hipermodernas. 
Segundo Jung os impulsos ou as vontades indesejáveis, as qualidades irracionais, 
constituem as “sombras” dos indivíduos e que normalmente são reprimidas pelas 
Organizações na tentativa de racionalizar as atividades. Contudo, essa “sombra” não se 
permite ser reprimida pelas Organizações e age de modo a externalizar a sua força, “isto pode 
ser observado em grande parte das políticas que moldam a vida organizacional e também no 
stress, na mentira, fraudes, na depressão e nos atos de sabotagem” (MORGAN, 2002, p.241). 
Han (2017a) descreve, em sua obra Sociedade do Cansaço, como no século XXI a sociedade 
do desempenho adoece por um excesso de positividade ao indicar que a fonte de patologia 
atual é neuronal, observada pelo excesso de doenças neurológicas, como depressão, 
transtornos, ansiedade, estresse etc.; e que a violência implícita é representada pela 
superprodução, superdesempenho e supercomunicação. Tal aspecto deve-se à manipulação da 
subjetividade por meio do discurso “do poder”, no sentido de o indivíduo estar apto a 
conquistar o que almeja. Ferreira (2009) conceitua um cenário similar como “o admirável 
mundo novo do trabalho” para exemplificar essa ideologia organizacional que modela a 
subjetividade do trabalhador, e que atua por meio dos conceitos de racionalização 
instrumental e negação, para tentar indicar justificativas que amenizem o sofrimento a fim de 
alterar a dinâmica psíquica e transmutar o sentimento de peso – leia-se sofrimento - em leveza 
– leia-se satisfação. Percebe-se, portanto, que “a sociedade do desempenho, ao contrário, 
produz depressivos e fracassados” (HAN, 2017a, p. 25). Dessa maneira, conclui-se que tal 
prática é insustentável e resulta no surgimento de patologias sociais, a saber, violência, 
sobrecarga e servidão voluntária. 
Nota-se que, a sociedade pós-moderna, por meio da ideologia gerencialista reduz o 
indivíduo a mero instrumento a ser utilizado e explorado pela empresa (GAULEJAC, 2007), 
sendo assim, o profissional perde a sua noção do que é, antes de mais nada, “ser sujeito”, que 
consiste na consciência de si próprio e do meio ao qual pertence, além da capacidade crítica e 
reflexiva (AGUIAR, 2005). Logo, o indivíduo fica à mercê da Organização que permeia o seu 
entorno e se apresenta como a principal estrutura estável, forte e que acima de tudo, é o seu 
objeto amado. Nesse sentido, “o sujeito de desempenho encontra-se em guerra consigo 
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mesmo” (HAN, 2017a, p. 29), visto que há uma distorção comunicacional, segundo 
FERREIRA (2009), que é caracterizada quando o indivíduo não atribui a causa dos problemas 
às políticas opressivas e manipuladoras da organização, ao contrário, supervaloriza as práticas 
gerencialistas, e atribui as falhas e fracasso, somente, à sua performance pessoal como forma 
de incapacidade, falta de habilidade, comprometimento ou disposição. Isso remete à cultura 
da ansiedade discursada por Gaulejac (2007) como a tendência do medo de nunca ser 
suficiente, de não estar à altura da Organização, de não ser bom, de não alcançar as metas ou 
pior, de perder o seu emprego e ser descartado. Portanto, o resultado

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