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Comportamento e Mentalidades

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O QUE SÃO MENTALIDADES?
A vida em sociedade é marcada pelo choque entre diferentes ideias, aspirações, noções morais e opiniões a respeito de acontecimentos (ou melhor, de interpretações sobre acontecimentos!). Tudo isso pode nos fazer acreditar que seres humanos convivendo socialmente, compartilhando uma língua, costumes e território, pautam seu comportamento exclusivamente por noções superficiais e específicas a respeito de seu ambiente social.
Imagine, entretanto, que observamos uma formação política a partir de um conjunto de lentes de aumento e estejamos ampliando a imagem para ver bem de perto. Nesse percentual de zoom, a imagem mostra agentes políticos adversários, com ideias completamente antagônicas, disputando no curto prazo a legitimidade de suas narrativas. Nesse nível de aproximação, portanto, esses agentes podem parecer completamente diferentes e inconciliáveis. Lembre-se, contudo, de que estamos investigando as formações políticas utilizando lentes de aumento e esse é apenas o nível de maior aproximação possível.
Se olharmos com nossas lentes para essas formações políticas a partir de uma distância cada vez maior, as particularidades dos agentes se perdem, e passamos a enxergar padrões de comportamento comuns entre eles, padrões esses que não seriam visíveis ao olharmos “de perto”. É claro que sempre haverá, em qualquer formação política, elementos que discordem desses padrões comuns, mas que só serão relevantes ou identificáveis a partir de um nível de zoom mais aproximado.
É nesse nível de visualização mais distante, coarse-grained, em oposição a um olhar mais aproximado, fine-grained, que somos capazes de identificar as chamadas mentalidades. Elas são fenômenos:
Clique nas informações a seguir.
macrodimensionais
macrotemporais
Relembrando
Apesar de toda fúria transformadora da Revolução Russa de 1917, e das profundas mudanças políticas e econômicas empreendidas pelos bolcheviques, persistiu na sociedade russa uma mentalidade política personalista direcionada ao líder, construída lentamente ao longo de centenas de anos, desde o século XVII. Isso tornou Lênin e Stalin, em certa medida, “continuadores” do Imperador Nicolau II, apesar das radicais diferenças específicas entre suas aspirações e visões de mundo.
Podemos entender as mentalidades em nível mais geral como padrões cognitivos inconscientes e coletivos.
Esses padrões produzem um viés na maneira pela qual os agentes entendem o mundo ao seu redor, as questões éticas, as relações políticas, as práticas culturais, enfim, todo o ambiente social circundante.
As mentalidades “rodam em segundo plano”, para usar aqui uma metáfora da informática. Se você não tem familiaridade com essa ideia, seria o mesmo que dizer que as mentalidades estão presentes na sua forma de pensar, mas quase nunca você se dá conta disso.
A transformação das mentalidades é um processo muito lento e que tem frustrado gente com a melhor das intenções ao longo dos séculos. Entretanto, tudo na história é mutável, e não devemos nos impressionar pelo fato de que certas coisas mudem a ponto de percebermos e outras não. Nada é eterno, embora alguns fenômenos sejam resistentes e muito longevos.
Mentalidades são sistemas de valores, de expectativas a respeito de como o ambiente social e cultural funciona e deve funcionar. Preconceitos estão fortemente enraizados nas mentalidades e, como são fenômenos macrodimensionais e macrotemporais, afetam o comportamento de todos os agentes socializados em uma sociedade.
É por isso, por exemplo, que falamos de “racismo estrutural”, algo que provoca a fúria de muita gente que não se vê como racista. Quer você queira, quer não, a experiência escravocrata deixou fortíssima marca no campo das mentalidades na sociedade brasileira e por mais que um agente lute individualmente para “desarmar” a mentalidade racista em seu próprio comportamento, o entorno social o pressionará sutilmente para que desista.
É muito difícil “nadar contra a corrente” das mentalidades, porque há todo um entorno social que se impõe sobre um agente individual a ponto de tentar conformar seu comportamento.
Não é necessário qualquer governo, polícia, igreja ou partido para punir os desviantes, embora essas instituições sejam fundamentais na reprodução ou na destruição de complexos de mentalidades: as próprias interações sociais, no dia a dia, funcionam como um sistema de assédio e coerção contra agentes desviantes. Discrepar da norma tem custos sociais, o que leva agentes menos radicais a buscarem alguma acomodação com as mentalidades reinantes.
Passemos então aos principais temas ou complexos no campo das mentalidades que são visíveis ao longo de cerca de 200 anos de história do Brasil independente.
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