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HISTÓRIA DO DIREITO MEDIEVAL Prof. Bruno Fraga Pistinizi DIREITO DIREITO ROMANO E HISTÓRIA DO DIREITO PUC Minas Virtual • 2 Para uma adequada compreensão sobre as bases fundantes e cognitivas do di- reito medieval, torna-se recomendável uma breve reflexão histórica envolvendo os personagens desta trama histórica. A memória que se tem da primeira idade média denota a existência de impor- tantes fatores de ordem social, econômica, política e eclesiástica cuja referência ao direito ou uma ordem jurídica criada para o atendimento da sociedade da época, en- trelaça todos estes aspectos. Na formação social que eclodiu na primeira idade média, as relações sociais descritas apontam para uma ampliação da ação e função do Esta- do, acompanhadas de restrições para a livre ação individual. Desde a época do Impé- rio Romano, com os imperadores Diocleciano (284-305) e Constantino (306-337) a ideia de aristocracia se projeta com muita força, seja pela classe dos senadores roma- nos ou pela classe composta por uma elite tradicional com rendimentos maiores do que a classe camponesa. Sob a bandeira da escravidão e do imperialismo, a conquista de riquezas estruturou-se a partir da cobrança de tributos e a prática de saques, so- mado a um processo de ruralização da sociedade. Trilhada pelas determinações do Império Romano, foi possível apreender tam- bém a execução de medidas como adoção da vitaliciedade e hereditariedade das fun- ções dos trabalhadores da cidade. Esta iniciativa garantia ao Estado a manutenção da mão-de-obra e um controle de produtividade em conjunto com a ocupação da terra pelo trabalhador rural, agora chamado de colono e fixado à terra sob rígido controle do Estado. Até o momento em que os germanos ocuparam e se fixaram no território quando então se experimenta uma lenta modificação da ideia de ocupação do territó- rio e retirada progressiva do produto da terra, não se vislumbrou uma modificação da estrutura aristocrática do ocidente medieval. Pelo contrário, mesmo constituindo-se por pequenos e médios proprietários que trabalham na terra com seus familiares e alguns escravos, a influência dos homens livres e proprietários fundiários apresentou- se como consequência inafastável e responsável pela vassalagem. A preponderância destes elementos desaguou na construção de um equilíbrio social e dinâmica estatuída no interior do “feudo” tendo por um lado membros de uma aristocracia tanto laica como livre quanto clerical, e do outros homens livres, porém atados ao soberano em virtude da exploração da terra. Insere-se neste relato também a proeminência edificada em torno do feudalismo e suas relações sociais. PUC Minas Virtual • 3 Não existe uma perspectiva completa do feudalismo com formação social, sem que se pontue o papel central desempenhado pela Igreja no mesmo período. A impor- tância singular desta participação clerical na composição da formação social foi decisi- va pelas distintas formas de controle e universalização de padrões de comportamento por ela disseminados. Um dos aspectos desta densidade regulatória nos é apontado por Hilário Franco Junior, quando explicita a presença da Igreja numa sociedade es- sencialmente agrária e dia responsabilidade consistente em controlar todos os atos e aspectos íntimos dos indivíduos como enuncia o próprio autor quando destaca a apli- cação das referências da Igreja tais como “a consciência através da confissão, a vida sexual através do casamento; o tempo através do calendário litúrgico; o conhecimento através do controle sobre as artes, as festas, o pensamento; a própria vida e a própria morte através dos sacramentos”. A relação estabelecida entre o contexto do feudalismo entre nobre e servo não poderia ser vista ou definida como uma desigualdade manifesta e degenerativa no plano celestial. Tanto nobre como servo, ambos pertencem ao plano terrestre, sendo que aos servos cabia o cumprimento das determinações do trabalho e produção rece- bendo em contrapartida a segurança e proteção suficiente dos guerreiros, verdadeiros representantes da nobreza igualmente imbuída de suas funções. Logo, considerar o papel da Igreja como mediadora destas relações sociais é correto, dado que a Igreja colocou-se inclusive em posição externa à lei humana, por sua proximidade das forças divinas e o cada vez mais perceptível enfraquecimento do poder das monarquias. Pela manutenção do poder e das obrigações recíprocas no âmbito feudo- vassálico, a Igreja assume verdadeiramente uma missão de relevo, cabendo a ela ga- rantir o equilíbrio da sociedade de ordens. Igualmente conhecida por “ordo”, o pres- suposto de autoridade e coordenação exercidas pela Igreja serviu de parâmetro para o alinhamento de uma “organização justa e boa do universo”. A partir da retirada pro- gressiva de parte da aristocracia (participação de aristocratas nas denominadas “cru- zadas” e extinção dos recursos financeiros) amplia as atribuições da Igreja que agora faz uso do direito romano como suas próprias fontes do direito, capazes de adaptação e aprofundamento do estudo. O relevo e projeção espacial alcançados pela Igreja na idade média culmina- ram numa nova significação de propagação do estudo e ensino do direito e da ordem jurídica por toda a região. Numa transição do mundo da antiguidade o mecanismo elementar de estudo do direito numa base conhecida por trivium (ensino trivial), composto pelo apreço da gramática, da lógica (dialética) e da retórica. Tais pilares PUC Minas Virtual • 4 recebiam igualmente a influência do avanço da matemática (aritmética e geometria) e das artes liberais carregadas de significado que se traduziram na estrutura de uma nova hermenêutica (conjunto de métodos de interpretação) depositados sobre a juris- prudência. Em por falar ainda da jurisprudência, entende-se importante pontuar que a organização política da idade média relaciona-se diretamente com o estímulo da pro- cura de uma base única de compreensão do direito, decorrente de uma visão ainda mais ampla de poder universalista, imperial, já proposta por Carlos Magno (rei Franco até o ano de 800). Reunir o império numa visão universalista compreendia consolidar o poder das coroas da Alemanha, Itália e Borgonha; sabe-se, entretanto que uma no- breza enraizada em certas regiões destas coroas apresentava obstáculos a um poder centralizado e desproporcional ao imperador, incluindo-se neste plano a própria Igre- ja, igualmente insatisfeita com monarcas que ultrapassassem suas pretensões políti- cas e territoriais. Desde o reinado do Rei Pepino (também conhecido como “Pepino, o breve” – Rei dos Francos de 751-768 e pai de Carlos Magno) houve o reconhecimento da Igreja como legítima mandatária do poder imperial sobre o Ocidente e, portanto, cabia a ela coroar e entregar o título imperial ao rei que por ela fosse considerado como uma revelação da vontade divina. Este poder teocrático desempenhado pela Igreja no teor dos feudos foi muito significativo, pois no interior dos mesmos a força de um poder nacionalista contribuiu para que o rei feudal mantivesse relações contratuais com seus vassalos diretos (pro- tegidos do rei em troca da entrega de parte da exploração econômica da terra). Resta evidenciado assim que, desde a invasão dos povos bárbaros germanos e, posterior- mente dos reis francos, reconhecia-se o volume e intensidade inatacáveis de um direi- to costumeiro vinculado á tribo, que não podia ser alterado sem o consentimento da assembleia (composta por guerreiros que representavam a comunidade). A explícita contribuição deste direito costumeiro de natureza germânica pode ser considerada com uma etapa preliminar ao surgimento do direito romano e sua estrutura de pen- samento conectada com as leis e redações dos direitos populares de então (praticadas no interior dos feudos e comunas). Não se havendo dúvida da propagação da cristan-dade e sua presença e influência no interior dos feudos e comunas (formas de organi- zação política que viabiliza a presença de grupos sociais como a burguesia na tomada de decisões políticas), o estudo de uma teoria do direito escrito, reservado àqueles que detêm uma formação canônica. Um direito ensinado no interior dos conventos, PUC Minas Virtual • 5 tendo por professores os clérigos que interpretavam os textos do direito romano que adquiria cada vez mais validade geral. Uma das indagações que certamente povoam a curiosidade diz respeito às ca- racterísticas ou aspectos estruturantes dessas teorias do direito que florescia na idade média. Pode-se de antemão apontar que uma das exigências deste modelo de ordem jurídica é que se aplique uma noção de continuidade ou permanência, aqui caracteri- zada pela consideração dos elementos históricos da idade média como estruturas em contínua mudança e por consequência as novas culturas e tradições mantém uma re- lação sucessória com o ordenamento jurídico romano. Em síntese, a idade média é portadora de uma nova cultura que certamente sucede a anterior, mas sem deixar de considerar a estrutura do direito romano que ainda persiste com sua vigência. As necessidades de uma compreensão oral e escrita do direito na idade média conduzem a Bolonha nos idos de 1088, o ponto de partida formal dos estudos jurídi- cos devido principalmente à vocação da universidade na formação de funcionários pú- blicos, notários, defensores e advogados. Das aplicações práticas originadas do ensino em Bolonha, o Império Romano organizou seu conjunto de leis e disposições jurídicas no documento denominado Codex Juris Civilis, de autoria do Imperador Justiniano que, em linhas gerais subdivide desta maneira esta ordem de leis: - Instituições: Manual de didático de introdução ao direito sobre pessoas, coi- sas e ações; - Digesto: Coleções e resumos dos pareceres dos juristas romanos sobre as- suntos de interesse do direito; - Codex: Coleção de legislações dos imperadores romanos em áreas do direito penal, privado e administrativo; - Novellae Constitutiones: Conhecida por “últimas constituições”, congrega a legislação editada pelo próprio Imperador Justiniano. Mesmo que o direito romano tenha adquirido relevância prática no conjunto do pensamento jurídico medieval, o território italiano, onde se localiza a Universidade de Bolonha passava igualmente por distintas transformações pelo engrandecimento eco- nômico inserida no espaço dos negócios da cidade. Novas considerações e percepções elevam-se na proteção do direito patrimonial das famílias, organização das sociedades empresárias e manutenção do sistema creditício, todas adaptáveis a uma espécie de consideração tida como “vulgar”, do livro do Digesto (livro que compunha o conjunto PUC Minas Virtual • 6 de livros do Codex de Justiniano). Esta iniciativa provoca uma inegável tensão entre o “direito popular” praticado e discutido nas cidades italianas e a possibilidade de se concentrar na Universidade de Bolonha a visibilidade de compreensão intelectual das matérias jurídicas, mediante o uso de recursos da tradição romana, como a expressão oral e escrita das normas e o rigor metodológico das concepções jurídicas. No horizonte prático da escola de Bolonha, o direito adquire um entusiasmo científico que o coloca em condições para eleger o livro do Digesto como um dos efeti- vos objetos de estudo diante de seu conhecimento pelas comunidades da Europa Oci- dental. A tendência da interpretação do Digesto praticado pelos estudiosos de Bolonha possibilitará a construção de um pensamento jurídico autônomo e acessível orientado pelas autoridades desejosas de manter sua própria autonomia às custas e uma corre- ta opção metodológica de análise e compreensão do texto puro. Sabe-se, portanto, que se conferiu a Bolonha a tarefa de investigação funda- mental da legislação romana, a partir de uma nova base cognitiva (aprofundamento do conhecimento). As afirmações e categorias de expressão máxima das normas, con- tavam com as necessárias articulações ou interligações entre o texto legal do Codex romano e o domínio imponente da Sagrada Escritura, textos dos Concílios (encontros entre as autoridades da Igreja para organização e classificação de normas) e influên- cia dos padres da Igreja sobre a teologia. Por outro lado, conhecimentos filosóficos propostos pelas ciências naturais em Aristóteles, valores humanistas e considerações sobre a verdade das coisas também se articulam para desempenhar o estudo do direi- to medieval praticado em Bolonha. A consciência de que o direito romano e suas instituições contavam com a flu- idez necessária para a redução dos conflitos de múltiplas regiões da Europa Ocidental colaborou para a propagação da ideia espiritual de Roma e a prevalência do seu texto jurídico perante o corpo de magistrados (conceito de magistratura e a ação do juiz decorrentes dos direito romano), juristas estudiosos do direito canônico e todos aque- les que encontravam no direito romano a percepção que a ele foi dado pelos estudio- sos de Bolonha: um direito da comunidade jurídica humana ou o direito natural da alta idade média. Delimitada como divulgadora das bases científicas e metodológicas do direito romano medieval, Bolonha externaliza um modelo expositivo revelado pelo estilo de interpretação praticada pelos chamados “glosadores” junto ao texto escrito. Os glosa- dores exercitavam a formalidade exigida na compreensão dos textos legais por meio do emprego de recursos de dedução lógica como a busca pela causa material, final, PUC Minas Virtual • 7 eficiente e formal. A adoção destes mecanismos pelos glosadores almeja garantir um sentido global e amplitude do texto, propor o domínio da razão ou ratio sobre o con- junto de tradições e estabelecer em cada texto uma autoridade do direito positivo es- tabelecido pelo monarca e da vontade política nacional. Com efeito, o direito terreno (criado pelo monarca ou feudo) não mais necessita obedecer ao direito intemporal nacional (direito romano influenciado pela interpretação da Sagrada Escritura), pois o legislador observou a razão e entendimento nele depositado por parte do glosador. Todo o limite referenciado pelos glosadores na interpretação de seus textos passa por uma harmonização com os pressupostos da teologia (saber cristão direcio- nado á essência da verdade, fé ou caminho da verdade pelo estudo da divindade) e do estudo da jurisprudência. Refletir o estudo do direito tanto pela cristalização dos efei- tos da jurisprudência tanto por condições e pressupostos predeterminados e modela- dos pela dogmática importou para os glosadores comprovar a justiça de uma norma jurídica ou decreto com o conteúdo da doutrina e preceitos comentados pelos juristas romanos no interior do Digesto. Um contexto especial alude e agrega ao direito medi- eval uma autoridade pré-estabelecida e dirigida à busca da verdade em que os glosa- dores faziam uma leitura do texto, uma reflexão analítica, a exemplificação de suas causas e as operações sintéticas para a formação de futuras regras. O que é justamente o intento desta unidade 1 passa pela reflexão ininterrupta e comparativa do desenvolvimento histórico do direito medieval como pressuposto do estudo do direito romano e da introdução de perspectiva discursivas sobre a ideia ou conceito de justiça. A ocupação inicial dos glosadores de Bolonha consistiu na percep- ção do direito romano em sua harmonização com os conflitos práticos da sociedade medieval enaltecendo a autoridade, permanência da dogmática e o formalismo lógico. A formação e perseguição de um projeto descritivo das próprias condições de justiça ficaram a cargo da teologia, cuja ampliação de sua base doutrinária expõe a força espiritual da Igreja e ao mesmo tempo esboça uma saudável correspondência entre a compreensão históricado direito privado e o impacto do “direito da Igreja”. Como já mencionado, a base dos estudos da teologia serviu de parâmetro para que os glosadores e intérpretes da Universidade de Bolonha, revelassem as bases do direito natural adequado ao plano espiritual e dogmático e consequentemente implementasse um domínio técnico e racional para o controle dos conflitos humanos. Um olhar vivo e inquieto foi possibilitado pela perspectiva teológica, pois sua sintonia com a ordem jurídica terrena ou “profana” já se experimentava de direito de família, testamentos e direitos sobre bens móveis e imóveis. Contudo, a referência PUC Minas Virtual • 8 central ou contributiva da Igreja para a construção dos conceitos jurídicos temporais, tenha se dado em virtude dos estudos da dogmática e da teologia moral. Pressupondo uma possibilidade de compartilhamento do mesmo espaço, direito e teologia ou uma “abordagem teológica do direito”, João Décio Passos revela que “abordar teologi- camente o direito pode, portanto, ter um significado clássico e um significado atual. O primeiro significado aponta para os paradigmas construídos na longa duração da história do Cristianismo. O direito se apresenta como um momen- to decisivo dos ordenamentos normativos das sociedades em geral e, de mo- do particular, nas sociedades ocidentais, expondo os nexos entre os valores religiosos, a objetivação e consolidação dos costumes (a moral) e os orde- namentos propriamente jurídicos (codificações legais)”. Enquanto concebida como um conjunto de normas voltadas à regulação dos conflitos (lógica formal e normativa), a teologia acrescenta a existência de uma divin- dade transcendente e a autonomia do ser humano para que procure o caminho da verdade por si mesmo, por vias racionais ou religiosas. As múltiplas tendências e aná- lises sobre a moral permitirão um confronto com as normas legais existentes, apreci- ando-as criticamente e propondo mudanças que aproximem o bom, o justo e o legal. Com o consentimento e continuidade das estruturas históricas ora adaptadas ao ressurgimento do direito romano em escala ocidental na idade média e a ação de- cisiva dos glosadores para o tratamento científico das manifestações jurídicas, esta unidade 1 da disciplina de direito romano e história do direito almeja situar o aluno para discussão da importância e posicionamento da teologia para que fosse possível o trabalho dos intérpretes da Universidade de Bolonha. Posteriormente, cabe enaltecer também a relevância do pensamento teológico para a discussão sobre a possibilidade de se reivindicar um espaço natural para a moral e a ética na abordagem do direito. Ao se considerar tanto na esfera de interpretação do Digesto pelos glosadores como pela teologia atual, ver-se-á que a justiça ocupa um lugar de destaque na fé cristã, verdadeiro chamamento para que todos comunguem das mesmas expectativas num ambiente de solidariedade. Temas tão amplamente discutidos na cena jurídica nacional, como justiça so- cial, formas de preservação e garantia da dignidade da pessoa humana e a coletânea de normas que remete ao sistema de proteção dos direitos humanos, todos eles de alguma forma aludem um sentido de justiça e manifestação de misericórdia para aqueles que são socialmente excluídos. PUC Minas Virtual • 9 A importante narrativa histórica envolvendo as fontes do direito no período medieval despertou com igual relevo o interesse investigativo das origens do próprio direito natural. Como se sabe, a raiz do direito natural submeteu-se a uma escala de gradativa transformação desde o início sua apreciação divina para a razão proveniente do indivíduo. Uma das considerações que definem com precisão este novo marco do direito natural, avança para a consideração onde a solvabilidade do problema entre o bem e o mal passa pelo uso e desenvolvimento dos recursos e ferramentas de conhecimen- tos herdadas pelo homem a partir de sua íntima relação com Deus. A crença sincera da população medieval sobre a origem e autoridade dos textos sagrados revelou um estágio de comportamento preponderante no período medieval, segundo o qual o do- mínio imponente da Sagrada Escritura surgiu como revelação no plano de expansão da compreensão do direito. Tomando-se como medida o homem e sua capacidade de garantir o bem e a própria felicidade e dos seus semelhantes, o que se constata é a inserção da razão como base ou elemento primordial do ser humano. Assim a realização do sumo bem adquire um contorno universalista e detentor de uma base jurídico-metodológica pró- pria. O modo de pensar proveniente do homem contribuiu para o reconhecimento do universo empírico (associado ao campo da experiência do homem) voltado a um percurso relevante rumo à compreensão dos acontecimentos e possível correção dos rumos da razão humana. Sob a perspectiva da intensificação das formas de interpre- tação do padrão moral em compasso de modificação ou autoafirmação das diversas relações de sociabilidade entre os homens, o direito natural passou a sustentar junto ao Estado um espaço reconhecidamente adequado de participante na construção de um ordenamento social. A formulação de codificações e outros instrumentos legislativos de caráter dogmático serviram para ilustrar um caráter comum de organização do objeto de apreciação jurídica, antes pela visão estritamente religiosa, agora com a aproximação aos benefícios da racionalidade aplicada ao tratamento dos problemas de natureza temporal. Com a noção e descrição da ação do direito natural, uma possível integra- ção jurídica, representada peça interação entre integrantes da mesma família benefi- ciada foi defendida, sem que com isto não diminua a plena liberdade dos espaços de autonomia a serem dados à sociedade. PUC Minas Virtual • 10 É possível assim adotar-se como referência do direito natural e sua corrente atrelada ao pensamento judaico-cristão, a condição do indivíduo, seus valores, cren- ças e comportamentos. A manipulação progressiva das condições explicitadas pela civilização ocidental, principalmente a europeia, conduziu a um processo civilizatório e emancipatório das populações. Mesmo que os povos apresentassem condições diver- sas de caráter social e até econômico, a história universal e a realidade histórica par- ticular são tratadas de forma semelhante em todas as nações. Logo, fez-se indispen- sável a fixação de um conjunto mínimo de leis que pudesse propiciar o funcionamento da sociedade humana mediante o aprimoramento de um conjunto normativo único e bem aceito pelo povo. Quando se sobrepõe preceitos como “justiça”, “liberdade” e a “felicidade”, o conteúdo valorativo da razão se define por direitos da sociedade estruturados confor- me uma base legal positivada e ancorada nas leis supremas do homem, quais sejam: a moral e a ética. A proclamação de um saber válido agora referenciado no bojo da filosofia e da razão iluminista encontrou diversos autores, todos responsáveis pelo favorecimento da relação de continuidade advinda da ordem política, econômica e cultural de cada civilização. Neste plano, a desvinculação das ligações do sagrado e às divindades jurí- dicas concebe um modelo de leis gerais que incluem o homem não apenas como par- ticipante do plano divino de salvação como também prorroga o interesse à ética social voltada à produção de normas jurídicas.
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