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LEGISLAÇÃO E AVALIAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL Autoria: Ana Paula de Matos Oliveira Indaial - 2021 UNIASSELVI-PÓS 2ª Edição CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Jóice Gadotti Consatti Norberto Siegel Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Marcelo Bucci Revisão de Conteúdo: Bárbara Pricila Franz Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2021 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: O48l Oliveira, Ana Paula de Matos Legislação e avaliação do ensino superior no Brasil. / Ana Paula de Matos Oliveira. – Indaial: UNIASSELVI, 2021. 168 p.; il. ISBN 978-65-5646-357-5 ISBN Digital 978-65-5646-356-8 1. Educação superior. – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 370 Sumário APRESENTAÇÃO ............................................................................5 CAPÍTULO 1 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL ......... 7 CAPÍTULO 2 AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR ..................................... 69 CAPÍTULO 3 SISTEMA NACIONAL DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR – SINAES.................................................................. 127 APRESENTAÇÃO Caro estudante, neste estudo partimos do pressuposto de que as políticas públicas educacionais são decorrentes de fatos, interesses, práticas, ações, dos diversos sujeitos que estão em constante interação na sociedade. Dentre esses sujeitos estão os grandes empresários, os gestores públicos, a população com suas diversas demandas e, também, todo o cenário político e econômico internacional. Sendo assim, a elaboração de uma política pública envolve um constante jogo de interesses que se materializa e reflete determinado contexto histórico, econômico e social. Feita tal ponderação, buscaremos compreender de que maneira o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) se consolidou como política de avaliação e importante instrumento regulatório dessa etapa de ensino no Brasil. Para alçarmos esse entendimento mais amplo, do Sinaes como eixo estruturante da própria política para a educação superior, o que engloba a promulgação de normativos oficiais e diretrizes, o livro que subsidiará a disciplina de Legislação e Avaliação do Ensino Superior foi dividido em três capítulos. O primeiro capítulo, intitulado Marco legal da Educação Superior no Brasil está dividido em quatro seções. Na seção está demarcado o advento da Reforma Universitária de 1968 como um importante acontecimento histórico, pois dele haverá desdobramentos que possibilitam a configuração da atual educação superior brasileira. Na seção seguinte, são explicitados os principais marcos legais da educação superior após a promulgação da Constituição Federal de 1988 e de sua avaliação no Brasil. Na terceira seção são discutidos os principais documentos normativos da educação superior brasileira, dentre eles as Diretrizes Curriculares Nacionais, o Plano de Desenvolvimento Institucional, dentre outros que norteiam a avaliação da educação superior. Na última seção busca-se, a partir do debate histórico realizado, identificar como a avaliação tornou-se política pública no Brasil. No segundo capítulo, você aprofundará o estudo sobre a temática da avaliação no ensino superior. Na primeira parte, são debatidos os aspectos conceituais e metodológicos da avaliação, buscando caracterizar seus níveis e distintos objetivos. No segundo momento são detalhadas as principais avaliações da educação superior no século XX e como elas acabam subsidiando a criação do Sinaes, atual política de avaliação da educação superior. Na terceira e última parte do capítulo dois são abordados os aspectos da avaliação institucional. No terceiro e último capítulo o foco de estudo será o Sinaes. Na primeira seção são apresentados os princípios; objetivos e estrutura do Sinaes; e os principais atores envolvidos em sua realização. Na segunda seção, você conhecerá os diversos componentes do Sinaes. A regulação das instituições de educação superior pelo Sinaes será elucidada na terceira seção, inclusive apresentando alguns conceitos sobre regulação e o seu papel na gestão pública via avaliação. Na última seção serão apresentados aspectos contemporâneos do Sinaes e alguns debates de estudiosos sobre as necessidades de aprimoramento da avaliação da educação superior. Bons estudos! CAPÍTULO 1 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL A formação acadêmica desta disciplina ancora-se na perspectiva do saber- fazer. No eixo do “saber” estão os distintos conceitos teóricos que serão apreendidos e no do “fazer” as competências que serão desenvolvidas a partir dos conhecimentos adquiridos no decorrer deste capítulo. Sendo assim, com o propósito de contribuir para a tomada de consciência e inserção ativa dos cursistas na vida social e profi ssional, os estudos deste primeiro capítulo estão norteados pelos seguintes objetivos de aprendizagem: Reconhecer, apresentar e analisar criticamente os desdobramentos e as inovações das políticas para a educação superior delineadas nos documentos normativos a partir da Reforma Universitária de 1968. Refazer o percurso histórico dos marcos legais da educação superior no Brasil, observados os condicionantes históricos, políticos e sociais, desde a Reforma Universitária de 1968. Analisar criticamente os principais documentos normativos da educação superior, com destaque ao PPC, ao PPI e ao PDI, e como esses documentos podem nortear a avaliação da educação superior. Identifi car as inovações nas políticas públicas relacionas à avaliação da educação superior ao longo do período histórico abordado. Analisar criticamente a avaliação como um importante instrumento da política pública para a educação superior, reconhecendo sua atualidade na educação. 8 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL 9 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 1 CONTEXTUALIZAÇÃO Um rápido olhar para a temática da disciplina de legislação e avaliação do ensino superior no Brasil pode sinalizar que o seu estudo está centrado em um conjunto de diretrizes e normativos legais que estruturam e organizam essa etapa de ensino. Isso pode ocorrer porque normalmente pensamos em leis e diretrizes de uma forma estática, como um documento legal apresentado como regra a ser seguida por determinados setores da sociedade. No entanto, a legislação e a própria avaliação do ensino superior brasileiro não podem ser entendidas como resultado de uma ação isolada no tempo ou simples resultado das propostas de um determinado governo na gestão da educação do país. As ações políticas e as políticas públicas que podem ser resultantes dessas ações, formalizadas, por exemplo, em diretrizes e leis, estão entrelaçadas a um conjunto de outros fatores, no quais os aspectos sociais e econômicos se incluem. Apesar de os estudos nessa disciplina concentrarem-se no contexto brasileiro, é importante destacar que a história das sociedades é dinâmica e está em constante transformação. Podemos dizer, com base no debate de Dias Sobrinho (2000), que uma mudança em qualquer setor da sociedade interfere tanto local como globalmente. Como vivemos em um mundo globalizado, qualquer mudança em uma sociedade é decorrente de fatores internos e externos a ela. Um exemplo que nos permite observar como hoje o mundo está interconectado é o fato de problemas econômicos em determinado país atingir também a economiade vários outros. Sendo assim, a atual confi guração da educação superior brasileira é resultante de um intricado contexto histórico, em que estão englobas as questões políticas, econômicas e sociais. Dentre os acontecimentos da vasta história da educação superior no Brasil, vamos fazer um recorte na década de 1960, período em que ocorre a Reforma Universitária de 1968. As mudanças advindas dessa reforma constituíram-se em um marco para o estudo da educação superior no Brasil sendo fundamental para apreender de forma global quais os contornos foram dados a estrutura e funcionamento dessa etapa de ensino. Para ajudá-lo a alcançar os objetivos do saber-fazer da nossa disciplina, este primeiro capítulo está organizado em quatro seções. Na primeira seção, você conhecerá o contexto histórico da Reforma Universitária de 1968 e o seu papel para a nova estrutura da educação superior. Na segunda seção, a partir do reconhecimento dos condicionantes históricos, serão apresentados os principais marcos legais da educação superior brasileira. A terceira seção lhe possibilitará 10 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL identifi car e analisar os principais documentos normativos da educação superior. Por fi m, você reconhecerá em que momento da história da educação brasileira a avaliação institui-se como política pública estatal. 2 REFORMA UNIVERSITÁRIA DE 1968: MARCO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR Para compreendermos como a legislação e avaliação se consolidaram na primeira década do século XXI no campo da educação superior, não podemos perder de vista o contexto histórico. Para fi ns dos estudos, nessa disciplina vamos fazer um recorte na década de 1960, dados os impactos desse período para a educação superior. Vale lembrar que os acontecimentos históricos daquela década no país não foram resultado de um momento ímpar e específi co para o contexto brasileiro. Na realidade eles só concretizam uma série de ações no âmbito político e econômico e as constantes pressões sociais nas esferas nacional e internacional. 2.1 ANTECEDENTES DE 1968 Para citar algumas das importantes marcas da década de 1960 no Brasil temos: i) a instituição da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 4.024 de 20 de dezembro de 1961; ii) a criação por meio da União da Universidade de Brasília também e 1961, com propósito de fundar um novo perfi l de formação moderna na educação superior, com foco no ensino e na pesquisa; e, não menos importante, iii) a instauração do regime militar em 1964. Nesses primeiros anos da década de 1960, o país buscava atingir as demandas de desenvolvimento da economia industrial internacional e, para isso, era necessária a presença de mão de obra qualifi cada. Para o governo militar conseguir esta modernização nos setores da economia, precisava investir na formação de pessoas que atendessem às novas exigências do mercado de trabalho e, para tanto, dar maior atenção ao ensino superior era fundamental. Segundo Martins (2009) nesse período, para investir na modernização do país, o governo militar adotou medidas para viabilizar a expansão do ensino superior no Brasil, as quais caminhavam ao lado das ações de repressão aos movimentos estudantis e vigilância aos docentes. 11 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 Nos anos 1950, existia no Brasil um movimento em prol da modernização das universidades. Até os anos 1950, o ensino superior no Brasil tinha foco nos cursos de graduação com uma formação mais técnica. Diante da necessidade de modernizar o ensino superior com uma alta formação científi ca e cultural, visando o aprofundamento dos estudos empreendidos nas graduações, muitos docentes fi zeram cursos de mestrado e doutorado no exterior, incentivados por acordos entre Brasil e Estados Unidos da América que previam intercâmbio de estudantes e professores. Neste período, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) era constituída de um importante fórum que apoiava a comunidade acadêmica e científi ca nos debates sobre a criação de um novo modelo de sociedade. A SBPC foi criada em 1948, no pós-guerra, em um momento em que existia a necessidade de incentivar a ciência para promover o desenvolvimento social e econômico do país. Sendo o ensino superior o lugar de excelência para se formar cientistas. Martins (2009) ressalta que no início dos anos 1960 estudantes, professores e pesquisadores se mobilizavam em várias ações para reivindicar melhorias gerais na estrutura do ensino superior brasileiro. Muitos docentes, ao regressarem para o país após realizarem seus cursos de mestrado e doutorado no exterior, empenhavam-se para que as universidades brasileiras fossem referência na formação acadêmica, na pesquisa e nos projetos de extensão, que são aqueles que possibilitam a integração e retorno da universidade para as comunidades. Alguns autores debatem que, nas décadas de 1950 e 1960, o Brasil passava por um período urbano-industrial e a ideologia desenvolvimentista guiava as ações estatais. Nesse período ocorreu no país a instauração de várias indústrias, o que gerou empregos diversifi cados e necessidade de formação para os novos postos de trabalho. Educação e desenvolvimento econômico estavam atrelados. Nesse sentido era necessário investir na formação dos novos profi ssionais de nível superior para assegurar ao país o crescimento econômico, social e cultural que o possibilitasse competir de forma equilibrada com as os países mais desenvolvidos. Weber (2009, p. 126) discute que diante da necessidade de adequar o ensino ministrado à realidade socioeconômica, a política governamental de ensino superior passa a integrar o planejamento econômico e do desenvolvimento, mediante o estabelecimento de prioridades de formação de recursos humanos correspondentes às necessidades da realidade. 12 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL Nesse cenário o foco da educação era técnico, no sentido de formar mão de obra qualifi cada para o mundo da produção que estava em pleno desenvolvimento. Alguns pesquisadores do campo educacional denominam esse período de “economicismo” na educação. Trata-se da estreita relação entre educação e desenvolvimento econômico. O vínculo entre educação e crescimento econômico está associado à criação de uma disciplina de “educação e economia” em meados dos anos 1950 na universidade de Chicago, nos Estados Unidos da América. O professor dessa disciplina, Theodore W. Schultz, é considerado um dos principais formuladores do que fi cou conhecido como Teoria do Capital Humano, difundida especialmente nos anos 1960 e fortalecida após a crise econômica dos anos 1970. É importante frisar que o entendimento dessa relação entre educação e economia não é unilateral, pois ambos os setores estão imersos em processos contraditórios e complexos. No que se refere ao ensino superior, era necessário tanto ampliar as vagas no ensino superior como reorganizar a forma como ele estava organizado. A temática da qualidade do ensino ofertado pelas instituições ainda não era uma pauta de discussão na agenda governamental, essa começa a ser aventada só nos anos 1980, como você estudará no decorrer da disciplina. As discussões e reivindicações em torno da educação na década de 1960 estão refl etidas em vários dispositivos legais que surgiram para normatizar as novas demandas nacionais. Pode-se citar, por exemplo, a promulgação da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação brasileira, Lei nº 4.024 de 20 de dezembro de 1961, que dá respaldo legal para que o governo conseguisse expandir a oferta do ensino superior. A partir da promulgação Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.394 em 1996, a organização da educação escolar passou a ser dividida em dois níveis: (i) “educação básica”, composta por educação infantil, ensino fundamental e ensino médio;e (ii) “educação superior”, composta por pós-graduação, graduação, cursos sequenciais e extensão. (BRASIL, 1996). Dessa forma, a nomenclatura “ensino superior” é válida quando se tratar de um período anterior à publicação da LDB de 1996. 13 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 A partir da LDB de 1961, as instituições puderam criar sem muita burocracia cursos diferenciados. Segundo Weber (2009), esse propósito de adequar a educação às demandas econômicas do momento está expressa no Artigo 1º da LDB de 1961 que estabeleceu como um dos fi ns da educação “a preparação do indivíduo e da sociedade para o domínio dos recursos científi cos e tecnológicos que permitem utilizar as possibilidades e vencer as difi culdades”. No entanto, a referida autora assinala que, para o ensino superior, a LDB de 1961 não trouxe as renovações almejadas por docentes, estudantes e pesquisadores. A lei foi criticada diante dos seus aspectos burocráticos e de não sintonizar a estrutura e organização do ensino superior às novas demandas de desenvolvimento econômico e social. A LDB também instituiu o Conselho Federal de Educação (CFE), que será formalizado em fevereiro de 1962. No artigo 9º da lei estão as atribuições do CFE, das quais destacam-se: a) decidir sobre o funcionamento dos estabelecimentos isolados de ensino superior, federais e particulares; e) [...] estabelecer a duração e o currículo mínimo dos cursos de ensino superior, conforme o disposto no artigo 70; É possível notar que o Estado brasileiro reforça na legislação sua responsabilidade de regular o ensino superior, decidindo sobre o funcionamento das instituições e estabelecendo um currículo mínimo a ser trabalhado. No entanto, essa presença estatal não era uma novidade na universidade, que inclusive reivindicava autonomia para escolha de docentes, critérios mais rigorosos na defi nição dos docentes a partir de sua formação e títulos acadêmicos, dentre outros. Além disso, pesar de as universidades públicas terem aumentado o número de matrículas nos primeiros anos da década de 1960, as determinações expressas na lei não resolveram questões relacionadas à crescente demanda ao ensino superior e nem mesmo as reivindicações por maior integração entre ensino, pesquisa e a extensão, visto que predominavam faculdades e cursos isolados. A esse respeito Martins (2009, p. 19) apresenta que Em 1960, 29 mil estudantes não conseguiram vagas nas instituições para as quais tinham sido aprovados, número que aumentou para 162 mil em 1969. A questão dos “excedentes” constituiu-se num constante foco de tensão social. A pressão para a expansão do ensino superior estava relacionada à ampliação da taxa de matrícula do ensino médio [...]. Além desses, outro fato marcante da década é o regime militar instaurado a partir do golpe de 1964. Nesse período, o governo militar criou mecanismos legais 14 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL para se fazer cumprir seus projetos para o campo educacional. Um exemplo disso é o estabelecimento da Constituição de 1967 que estabelece a obrigação da União para estabelecer os planos nacionais de educação e as diretrizes e bases da educação nacional. Também a constituição abriu espaço para que a iniciativa privada pudesse ofertar mais vagas no ensino superior, uma vez que as instituições públicas não conseguiam atender a alta demanda. Para isso, inclusive existia as transferências de recursos públicos para as instituições de ensino superior privado. No entanto, mesmo com a maior repressão e controle do regime militar, os movimentos sociais de estudantes e professores em prol de uma reforma no ensino superior brasileiro se mantiveram. A pressão era tanta que, buscando amenizar os constantes levantes dos estudantes, ainda em 1967 foi criada a Comissão Meira Mattos que buscava resolver alguns dos problemas do ensino superior, como o excedente de estudantes para essa etapa de ensino. Dentre os apontamentos da Comissão estão a necessidade de revisão da legislação educacional e a criação de um grupo de trabalho para dirigir essa ação (ROTHEN, 2008). Há também registros no ano de 1965 de ações do CFE, com destaque para a atuação do professor Newton Sucupira, que elaborou o Parecer nº 977/1965 que busca defi nir os cursos de pós-graduação e aponta que o seu desenvolvimento seria fundamental para proporcionar treinamento completo e adequado para as muitas carreiras oriundas do mundo moderno. A modernização da universidade nos moldes dos países industrializados então migrou da graduação para a pós- graduação (WEBER, 2009). Também aponta que os cursos de graduação tinham seus limites dentro da crescente especialização técnica e científi ca de cada área e, por isso, a necessidade da pós-graduação. O parecer ressalta que não se está pormenorizando a importância da formação da graduação no ensino superior, mas defende a introdução de um escalonamento dos níveis de estudos que iria da graduação até a pós-graduação. Nesse cenário ganha relevo a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), instituída em 1951 com o propósito de qualifi car o pessoal de nível superior. A partir da valorização dada à pós-graduação, passou a acompanhar e avaliar a qualidade das instituições e estabelecer os planos nacionais de pós-graduação. A CAPES, atualmente, é responsável pela aprovação, acompanhamento e avaliação da pós-graduação stricto-sensu (mestrado e doutorado). 15 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 2.2 A ECLOSÃO DE 1968 Já o ano de 1968 foi emblemático no mundo inteiro, como ressaltam Antunes e Ridenti (2007), diante dos vários protestos sociais que eclodiram, dentre eles a revolta operária, feminista, estudantil, de ambientalistas, dentre outras, muitas vezes marcados por um forte confronto com as forças policiais dos Estados. De acordo com os autores, apesar de as experiências de outros países, no Brasil as reivindicações e lutas em 1968 tiveram suas peculiaridades. Desde o golpe militar de 1964, apesar da dura perseguição da ditadura aos movimentos estudantis e aos docentes, esses continuavam a denunciar os abusos cometidos e requerer melhorias na educação pública. Porém, em 1968, o país vivia o período mais duro e obscuro da ditadura militar e o estopim para as mobilizações no país ocorreu quando um estudante secundarista, Édson Luís de Lima, foi morto no Rio de Janeiro, no mês de março, por um policial. Pode-se dizer que a partir de então, em 1968, esses movimentos se acirraram cada vez mais em várias capitais brasileiras, com muitos confrontos violentos com os militares, protestos que reuniam vários setores da sociedade como os estudantes, docentes, artistas, religiosos, dentre outros que faziam ocupações, passeatas etc. (VIEIRA, 2008; MARTINS, 2009). Diante da constante pressão e tensão social, sobretudo diante dos movimentos estudantis de 1968, o governo militar instituiu o Grupo de Trabalho para a Reforma Universitária (GTRU), no dia 02 de julho, por meio do Decreto nº 62.937/1968, buscando além de promover as mudanças na universidade, também acalmar os ânimos estudantis. O GTRU fez um diagnóstico da situação do ensino universitário e, segundo orientações do regime militar, pautou-se em “soluções realistas” e “medidas operacionais”, buscando maior efi ciência e produtividade nessa etapa de ensino (MARTINS, 2009; ROTHEN, 2008). Para a realização dessa reforma, o governo anunciou que deveria ser uma “expansão com contenção” de gastos, uma vez que foi anunciada a inexistência de recursos fi nanceiros para tal fi m. Vale frisar que a instituição do GTRU não representou uma pausa nas lutas e tão pouco uma abordagem mais pacífi ca das ações promovidas pela ditadura militar. Em junho de 1968 ocorreu uma grade passeata com mais de 100 mil pessoas no Rio de Janeiro, que pediam o fi m da censura, da repressão e redemocratizaçãodo país, tal como elenca Vieira (2008). A autora também cita o 30º congresso promovido pela União Nacional dos Estudantes (UNE), que ocorreu em outubro, momento em que mais de 900 pessoas foram presas pela política. 16 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL A UNE foi criada em 1937, como entidade máxima de representação dos estudantes brasileiros. Em 1964 o Decreto nº 4.464 extinguiu a UNE, em 1967 o Decreto nº 228 limitou a existência de grupos representativos de estudantes apenas no âmbito interno de cada universidade e, em 1969 o Decreto nº 477 impôs severas punições a professores e estudantes que fossem “hostis” ao regime militar. Mesmo com esses instrumentos repressores, os estudantes continuavam a se articular. É necessário lembrar que no dia 13 de dezembro de 1968 foi decretado o Ato Institucional nº 5 (AI-5), considerado símbolo da passagem do regime militar para a ditadura de fato. Antes de continuar essa discussão aqui, vale uma pausa para refl exão: mas o que é reforma? Se um grupo de trabalho foi criado para uma reforma, por que a manutenção de tantos confl itos? Em dicionários, o termo reforma é geralmente defi nido como fazer melhorias e corrigir erros. Pode-se dizer, de forma sintética, que esse termo remete sim a mudanças. Do ponto de vista das políticas educacionais, Vieira (2008) destaca que, em governos autoritários, como é o caso da ditadura militar, e naqueles democráticos, as reformas têm características distintas. Nos governos autoritários, as reformas educacionais tendem a ser mais coerentes com o propósito político- ideológico do governo. Nesse caso, não há debates com os distintos grupos e setores da sociedade. Já as reformas em governos democráticos, não há uma coerência interna com todos os propósitos do governo, pois os diferentes sujeitos que possam estar implicados nessa reforma são ouvidos e busca-se atender as necessidades de diversos setores. No fi m, a reforma em um governo democrático vai refl etir interesses de distintos atores e, portanto, vai ser mais representativo. Com relação à fi nalidade das reformas no campo educacional, Vieira (2008) debate que é possível identifi car dois grandes tipos: i) reformas voltadas para assegurar o acesso e ii) reformas voltadas para a qualidade. Diante desse debate, pode-se considerar que os trabalhos do GTRU e, posteriormente, a reforma que será implementada visaram atender aos interesses de um governo autoritário, com o objetivo de atender às intenções políticas, sociais e econômicas de uma minoria política e social do país. É importante ressaltar que, na análise da autora, a reforma universitária de 1968 respondeu, inicialmente, a uma demanda de expansão do acesso ao ensino superior e, depois, abriu margem para a questão 17 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 da qualidade. Sendo assim, em seu entendimento, é possível observar nesse período “o duplo caráter de uma reforma, na qual estão presentes orientações que visam a atender às exigências simultâneas de quantidade e qualidade” (VIEIRA, 2008, p. 14). Compreendidos os tipos e fi nalidades de reforma educacional, retomamos ao GTRU. Com base nos estudos e propostas apresentadas pelo GTRU e de outras ações que o antecederam, no dia 28 de novembro de 1968, foi instituída a Lei nº 5.540, conhecida como a Lei da Reforma Universitária ou simplesmente Reforma Universitária de 1968, a qual fi xa normas de organização e funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola média e dá outras providências. De acordo com Weber (2009), a Lei nº 5.540/1968 foi promulgada em meio ao contexto de repressão e intervenção militar em muitas universidades, mas que, mesmo ante a esse cenário, abriu as bases para que a formação até então ofertada se pautasse na construção do conhecimento. Além disso, foi sem dúvida um importante marco para as futuras conquistas para o ensino superior. Na análise empreendida por Vieira (1982, 2008), destaca-se o fato de uma lei promulgada ser a expressão de um ambiente político autoritário ou democrático e a sua confi guração acaba retratando, então, o contexto em que é concebida. Sendo assim, a autora analisa que [...] a proposta elaborada pelo GT(RU) apresentava um projeto reformista de reestruturação do ensino superior, que visava atender a interesses do Estado em promover um tipo de reforma universitária que não oferecesse perigos de comprometer um projeto político em andamento. Ao mesmo tempo, a reforma deveria receber um tratamento "específi co", o que, em outras palavras, signifi cava dizer que deveria ser acentuada a sua dimensão técnica, pois, a reforma não constituía, segundo a perspectiva enfatizada pelo GT(RU), uma questão política (VIEIRA, 1982, p. 60). Nesse sentido, o GTRU instituído no regime militar queria frisar apenas o aspecto técnico da reforma, alegando a não existência de questões políticas. No entanto, percebe-se aí as contradições e confl itos implícitos nessa tentativa de imprimir que as propostas apresentadas eram meramente técnicas. Os duros confl itos vividos na década de 1960 e, especialmente, em 1968, já são uma evidência da presença de fortes problemas políticos. Além disso, não há documentos e legislações neutros, uma vez que sempre vão refl etir as opiniões e decisões de grupos no poder, que podem ou não debater coletivamente, buscar conciliações, para tentar implementar uma ação que possa contemplar a maioria da população. 18 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL Nesse cenário de instituição da Reforma Universitária de 1968, Fávero (2006), Vieira (1982) e Weber (2009) sublinham o papel dos estudantes para a promulgação da Reforma. A autora dá destaque à atuação da UNE, que realizava seminários e congressos anuais, buscando mobilizar e articular vários setores da sociedade para unirem forças na luta pelas causas em favor da educação. O movimento estudantil é apontado como fundamental para pressionar e, com isso, acelerar a ação do governo no sentido de instaurar a reforma. Isso porque o governo precisava minimizar a crise com os movimentos estudantis, de certa forma legitimando o regime militar entre os estudantes e, ao mesmo tempo, promover as mudanças para possibilitar o desenvolvimento econômico almejado. Outros atores que exerceram infl uência na Reforma foram os acordos que vinham sendo celebrados entre Ministério da Educação (MEC) e Organismos Internacionais, desde os anos 1950, com ações que fortaleceram a pós- graduação, com pagamento de bolsas para os professores brasileiros realizarem seus cursos de mestrado e doutorado nos Estados Unidos. Inclusive há registros de consultores dos Estados Unidos que trabalham junto ao MEC e escreveram um relatório com propostas de mudanças para o ensino superior (VIEIRA, 1982). O texto da Lei nº 5.540, de 28 de novembro de 1968, Lei da Reforma Universitária, possui um total de 59 artigos. Na análise realizada por Vieira (1982), ela apresenta esses artigos sintetizados em cinco grandes temáticas articuladas que expressam as metas da reforma: i) racionalização; ii) expansão; iii) fl exibilização; iv) integração e v) autonomia. Com relação à estrutura para guiar a gestão das instituições pautou-se na articulação entre ensino, pesquisa e extensão. A lei trouxe várias inovações para o ensino superior, visando superar a forma de ensino isolado. Anteriormente, as instituições, em grande parte, funcionavam como faculdades isoladas. Já no artigo 2º da Lei, está prevista a estruturação das instituições em universidades, buscando promover a indissociabilidade entre pesquisa e o ensino. Dentre as medidas implementadas pela lei, destacam- se a criação do regime departamental (Art. 11b), a realização dos vestibulares classifi catórios, o que resolvia o problema de excedente e da nota mínima para ingresso (Art. 17 e 21º), a criação de um ciclo básico nos cursos entre si, entre outroscursos (Art. 23 § 2º), a criação de uma carreira docente única (Art. 32 § 1º), a exigência de títulos universitários para o ingresso e a promoção na carreira docente do magistério superior (Art. 32 § 2º), a extinção da cátedra vitalícia (Art 33 § 3º), possibilidade de expansão de regime de dedicação exclusiva para os docentes (Art. 34), incentivo à pós-graduação (Art. 17 b, Art. 24, Art. 27). Para Vieira (1982), Martins (2009) e Dias Sobrinho (2003), a Reforma de 1968 produziu efeitos contraditórios, pois de um lado modernizou uma parte das 19 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 universidades públicas que gradualmente iniciaram as modifi cações acadêmicas que foram propostas, unindo a pesquisa ao ensino. Por outro lado, não rompeu com as tradições conservadoras do regime militar e continou restringindo a liberdade de ensino e pesquisa das instituições. Mesmo diante do rígido controle do regime militar sobre as instituições de ensino superior, a Reforma de 1968 possibilitou a instituição de uma carreira docente, a dedicação exclusiva dos docentes e o incentivo à pós-graduação. Essas ações permitiram a criação de Planos Nacionais de Pós-Graduação, os quais tiveram um papel fundamental no fortalecimento do ensino superior, dando- lhe subsídios para se reestruturar, vinculando de forma mais sólida a formação e atividade profi ssional. Após a Reforma de 1968, para fi ns de absorver a crescente demanda por vagas no ensino superior, ocorreu um aumento de instituições privadas de ensino. Martins (2009) salienta que, nesse período, parte dos membros de CFE, órgão que autorizava o funcionamento das instituições, era vinculado à iniciativa privada e isso facilitou a abertura de novos estabelecimentos de ensino superior. O autor enfatiza que a Reforma de 1968 abriu brechas que facilitaram as aprovações de estabelecimentos privados, pois foi possibilitada a criação de estabelecimentos isolados em caráter excepcional (Art. 31, Art. 32 a). Como o governo ofi cialmente tinha declarado a falta de recursos e a necessidade de expansão do ensino superior, ocorreu um discurso que as instituições privadas colaborariam com a rede pública na ampliação do ensino superior. 2.3 ALGUNS ACONTECIMENTOS DO PÓS 1968 Apesar do pouco investimento nas universidades públicas, essas instituições também conseguiram aumentar o número de matrículas. No período de 1967 a 1980, as matrículas foram de 88 mil para cerca de 500 mil estudantes. Os números do ensino privado também mostram um crescimento em número de novos cursos, de 1968 a 1972, o CFE aprovou a abertura de 759 cursos em instituições privadas (MARTINS, 2009). As instituições privadas caracterizam-se por oferecerem cursos isolados e eram de pequeno porte. Existiam críticas com relação ao ensino ofertado por essas instituições, visto que eram marcadamente profi ssionalizantes e estavam distantes da articulação entre ensino e pesquisa. De acordo com Martins (2009), grande parte das novas instituições tinham um perfi l empresarial, que 20 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL empregavam professores horistas, que se dedicavam tão somente ao ensino; e com poucos professores com titulação em mestrado e doutorado. No fi nal dos anos 1980, as instituições isoladas foram se organizando em universidades e “entre 1985 e 1996, o número de universidades particulares mais do que triplicou, passando de 20 a 64 estabelecimentos” (MARTINS, 2009, p. 23). Cabe destacar que no início dos anos 1980, diante da crise econômica que atravessava o país, o movimento de expansão das universidades diminuiu. Além disso, começaram a existir diversas críticas a estabelecimentos privados e, nesse período, o número de autorizações para a abertura de novos cursos nesse setor caiu. De acordo com Dias Sobrinho (2003), o maior número de instituições de ensino superior, pós-reforma de 1968, expressa o modelo efi cientista do regime militar que abriu as portas para a privatização da educação no Brasil. Diante disso, o governo passou a ter a necessidade de controlar como os recursos fi nanceiros destinados à educação superior e checar a qualidade dos estabelecimentos. Nesse sentido, as primeiras intenções de se realizar uma avaliação do ensino superior tinham o propósito de controlar como os recursos fi nanceiros estavam sendo empregados, uma espécie de prestação de contas ao governo. O ano de 1976 marcou o início das políticas de avaliação no ensino superior. Nesse período foi realizada a primeira experiência de avaliação da pós-graduação coordenada pela CAPES. O estudo de Hora (2013) aponta que a avaliação realizada pela CAPES estabeleceu padrões para sistematizar a avaliação e dentre os seus objetivos estão a necessidade de aprimoramento e investimento em qualidade dos programas de pós-graduação. A autora ressalta que a efi ciência (alcance de objetivos em menor tempo e com menos recursos) dos programas era um dos pontos do programa, pois em sua maioria se destinavam à formação profi ssional. Segundo a autora Essa intervenção externa, por meio das avaliações, é uma das interferências que o Estado exerce sobre a educação superior como forma de controle, que não necessariamente está atrelada à garantia de uma educação de qualidade, mas, sobretudo, está relacionada à distribuição de recursos públicos nas instituições, o que dá início à constituição de um “Estado avaliador” (HORA, 2013, p. 40). A terminologia de “Estado avaliador” surgiu nos anos 1980 a partir dos estudos de Neave (2001) que, ao analisar o ensino superior europeu, identifi cou várias mudanças na ação do Estado e que essas mudanças estariam presentes em vários países. Seguindo um fl uxo coordenado pelos organismos internacionais, muitos países, a partir dos anos 1980, iniciaram seus processos de avaliação, os quais também se articulavam às intenções de reforma estatal. 21 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 No Brasil, depois da experiência de avaliação da pós-graduação em 1976, outras começaram a ser organizadas. Dias Sobrinho (2003) destaca que nos anos 1980 o mundo vivenciou uma crise econômica e o regime militar brasileiro dava sinais de esgotamento. Esses fatores fortaleceram as discussões em torno da necessidade de avaliação para direcionar os recursos públicos e impor a “racionalidade da efi ciência”. O autor destaca duas avaliações instauradas no contexto dos anos 1980, mas que duraram pouco tempo: Programa de Avaliação da Reforma Universitária (Paru), criado em 1983 e o Grupo Executivo para a Reformulação da Educação Superior (Geres) em 1986. De acordo com Barreyro e Rothen (2008) e Dias Sobrinho (2003), o Paru tinha como grupo gestor pessoas ligadas à Capes e ao CFE, além de pesquisadores com vasta experiência. O Paru tinha como foco dois temas: a gestão das instituições e o processo de produção e disseminação do conhecimento. Para atingir seus objetivos, era necessária a participação efetiva da comunidade acadêmica e de outros seguimentos externos à universidade. Em seu estudo, Hora (2013) sublinha que o Paru pode ser considerado uma das primeiras experiências de avaliação institucional no ensino superior. Como o programa de avaliação recebeu pouco apoio do MEC, ele foi desativado em 1984. Nesse período já se tinha a compreensão dos gestores públicos da importância da avaliação como instrumento que colaborava para o controle da educação superior por parte do Estado. Então, em 1985, no governo de José Sarney, foi instituída uma Comissão de especialistas chamada de “Comissão de Notáveis”, formalmente Comissão Nacional para Reformulação do Ensino Superior (CNRES), que iniciou um processo de construção de um documento para propor uma nova política para a educação superior (SOBRINHO, 2003). O relatório da CNRES tinha um caráter mais tecnicista, criticando a articulação entre ensino, pesquisa e extensão. Também apresentavacomo problemas a falta de informações sobre a qualidade das instituições de ensino superior, o que difi cultava um controle do governo. Em 1986, o documento produzido pelo CNRES foi ampliado pelo Geres. Para Barreyro e Rothen (2008), o Geres centrou a proposta de reforma das instituições federais de ensino superior, pois argumentava que a Reforma de 1968 limitava a autonomia universitária. Dias Sobrinhos (2003) destaca que o relatório do Geres apontava a realização da avaliação dos cursos de graduação por uma comissão de especialistas, com a elaboração e indicadores de efi ciência que permitissem checar a proporção professor/aluno, custo por estudante, evasão, dentre outros. O autor ressalta ainda que no documento estava a proposta de um exame nacional para a graduação. Diante do exposto até aqui é possível notar que a Reforma de 1968 abre 22 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL um período de transformações no ensino superior, podendo ser considerada a propulsora das demais mudanças da estrutura e funcionamento desta etapa de ensino. Tal como sublinha Vieira (2008), os acontecimentos iniciados com a Reforma de 1968 abrem um novo capítulo da história da educação superior, a qual continuamos a ler até hoje. Nas próximas seções vamos continuar a estudar os marcos legais que vão sendo delineados a partir da instituição da Constituição Federal de 1988. 3 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA A PARTIR DA REDEMOCRATIZAÇÃO A seção anterior tratou brevemente dos antecedentes legais da educação superior no Brasil e deteve-se na Reforma Universitária de 1968, inserida nas políticas públicas do período histórico da ditadura militar. Nesta seção, será abordada a legislação em educação superior no Brasil a partir da redemocratização. Para tanto, destaca-se a Constituição Federal de 1988 como o dispositivo legal que lançou as bases para toda a legislação da educação superior nas últimas três décadas. Em alguns de seus artigos, a Carta Magna contempla a educação superior. Destacam-se os artigos 207, 208 e 218, além do artigo 212, que aborda a aplicação de quantitativo da receita dos impostos pela União (nunca menos de 18%), Estados, Distrito Federal e Municípios (nunca menos de 25%) para a manutenção e o desenvolvimento do ensino e do artigo 213, que trata da destinação de recursos públicos para “escolas comunitárias, confessionais ou fi lantrópicas, defi nidas em lei” (BRASIL, 1988, s.p.): Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático- científi ca, administrativa e de gestão fi nanceira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. [...] Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: [...] V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; [...] A rt. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científi co, a pesquisa, a capacitação científi ca e tecnológica e a inovação (BRASIL, 1988, s.p.). 23 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino. [...] Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou fi lantrópicas, defi nidas em lei, que: [...] § 2º As atividades de pesquisa, de extensão e de estímulo e fomento à inovação realizadas por universidades e/ou por instituições de educação profi ssional e tecnológica poderão receber apoio fi nanceiro do Poder Público (BRASIL, 1988). Embora a Constituição de 1988 tenha celebrado a educação em todos os seus níveis como dever do Estado e direito de todos, o processo de mercantilização da educação foi acentuado pela globalização e pelo neoliberalismo, com os governos Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, que deu início à Reforma Administrativa. Dessa forma, há um descompasso entre o que a CF celebrava em seus dispositivos, uma Carta Magna de inspiração social-democrata, e a chegada das políticas neoliberais no Brasil, que preconizavam a redução do investimento público na educação superior. Os anos 1990 foram marcados pelas demandas do neoliberalismo no campo da política e da gestão educacional. Como resultado da infl uência de organismos internacionais sobre a América Latina, como o Banco Mundial, Dourado (2002) destaca o binômio privatização e mercantilização da educação. O governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), guiado por essa nova orientação do capitalismo mundial, promoveu reformas na educação. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei n°. 9.394, de 20 de dezembro de 1996 – é a primeira lei complementar no campo da educação promulgada depois da Constituição de 1988. A LDB de 1996 dedica os artigos 43 a 57 à educação superior. 24 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL O processo de tramitação e o texto fi nal da LDB, de acordo com Dourado (2008), negligenciaram os debates encampados pela sociedade civil, em particular o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública. A gestão de Fernando Henrique Cardoso, em sintonia com a reforma de Estado, que modifi cou drasticamente a intervenção estatal, espelha mais as tendências educacionais dos anos 1980 do que as garantias da CF 1988, como a gratuidade do ensino, a gestão democrática da educação, a integração entre ensino, pesquisa e extensão e a autonomia universitária. No Brasil, a década de 1980 foi marcada pela retomada dos movimentos sociais em todas as áreas, em pleno processo de redemocratização do país. Na educação, o movimento pela educação tomou corpo, forma e crítica ao modelo de educação e de formação nos moldes da racionalidade técnica e produtiva, o que fez surgir um dos movimentos considerados marcos na articulação das forças progressistas em prol da educação em âmbito nacional: o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública (FNDEP). Trata- se de um movimento que perpassou as décadas de 1980, 1990, 2000 e continua a sua defesa e seu horizonte por políticas públicas de formação humana em detrimento de políticas públicas para formação de recursos humanos. Trata-se também de uma ação, em certa medida, institucionalizada, que congrega em seu interior outros movimentos sociais, sindicatos, correntes parlamentares e instituições e iniciativas, características pouco presentes nas análises clássicas sobre os movimentos sociais. FONTE: MARTINS, Fernando José; ALMEIDA, Janaína Aparecida de Mattos. Movimento social e educação: o caso do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública: um movimento? Reunião Científi ca Regional da ANPED: educação, movimentos sociais e políticas governamentais, 24 a 27 de julho de 2016, UFPR, Curitiba, Paraná. Disponível em: https://cutt.ly/9v3Vua3. Acesso em: 15 jul. 2020. De acordo com Dourado (2002), alguns normativos relacionados a esse nível de ensino prepararam o terreno para a LDB: a Lei n° 9.192/95, que alterou o processo de escolha de dirigentes das universidades federais; a Lei n° 9.131/95, que instituiu o Conselho Nacional de Educação (CNE) e criou previsão legal para avaliações nas instituições e nos cursos superiores; a Portaria n° 249/96 do 25 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 Ministério da Educação que regulamentou os exames nacionais de cursos (ENC- Provão); e o Decreto n° 2.026/96, que instruiu os procedimentos de avaliação dos cursos e das instituições de educação superior. É possível observar, desde esses documentos normativos precedentes, que a regulação da educação superior passou a se integrar com a avaliação de instituições e cursos, fato que é corroborado pelos artigos daLDB de 1996 que contemplam a educação superior. Sobre a caracterização dos cursos de educação, eles podem ser: sequenciais, de graduação, de pós graduação e de extensão (artigo 44). O artigo 45 dita que esse nível de ensino pode ser ministrado por instituições públicas ou privadas, com vários graus de abrangência ou especialização, que devem ser credenciadas e terem seus cursos autorizados e reconhecidos, como prevê o artigo 46. É preciso destacar que “os vários graus de abrangência e especialização” se referem às políticas que resultaram na diversifi cação da organização acadêmica em universidades, centros universitários, faculdades integradas, faculdades, institutos superiores ou escolas superiores, de acordo com o artigo 7° do Decreto 3.860, de 9 de julho de 2001. Para ilustrar a dinâmica da evolução na legislação da educação superior, o processo regular de avaliação da educação superior sobre o qual aborda o artigo 46 foi estabelecido pela Lei n° 10.861, de 14 de abril de 2004, que instituiu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). Além disso, a Lei n° 13.530, de 7 de dezembro de 2017, incluiu parágrafos a esse artigo, relacionados à possibilidade de sanar as defi ciências das instituições públicas identifi cadas no processo de avaliação e às sanções, resultantes desse processo, comutadas às instituições privadas. Art. 46. A autorização e o reconhecimento de cursos, bem como o credenciamento de instituições de educação superior, terão prazos limitados, sendo renovados, periodicamente, após processo regular de avaliação (Vide Lei nº 10.870, de 2004). § 1º Após um prazo para saneamento de defi ciências eventualmente identifi cadas pela avaliação a que se refere este artigo, haverá reavaliação, que poderá resultar, conforme o caso, em desativação de cursos e habilitações, em intervenção na instituição, em suspensão temporária de prerrogativas da autonomia, ou em descredenciamento (Vide Lei nº 10.870, de 2004). § 2º No caso de instituição pública, o Poder Executivo responsável por sua manutenção acompanhará o processo de saneamento e fornecerá recursos adicionais, se necessários, para a superação das defi ciências. § 3º No caso de instituição privada, além das sanções previstas no § 1o deste artigo, o processo de reavaliação poderá resultar em redução de vagas autorizadas e em suspensão temporária 26 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL de novos ingressos e de oferta de cursos (Incluído pela Lei nº 13.530, de 2017). § 4º É facultado ao Ministério da Educação, mediante procedimento específi co e com aquiescência da instituição de ensino, com vistas a resguardar os interesses dos estudantes, comutar as penalidades previstas nos §§ 1º e 3º deste artigo por outras medidas, desde que adequadas para superação das defi ciências e irregularidades constatadas (Incluído pela Lei nº 13.530, de 2017) (BRASIL, 1996. s.p.). Seguindo com os próximos artigos, o artigo 47 propugna que o ano escolar tenha pelo menos 200 dias de efetivo trabalho, subtraídos os dias destinados aos exames fi nais. No artigo 48, estabelece-se que os diplomas reconhecidos possuem validade em todo o território nacional e aqueles expedidos por instituições estrangeiras devem ser registrados em universidades públicas. Os artigos seguintes versam sobre transferência de alunos regulares para cursos afi ns, desde que haja vagas e por meio de processo seletivo, e preveem as transferências ex offi cio (artigo 49); a possibilidade de abertura de vagas para matrículas em disciplinas de seus cursos para alunos não regulares, mediante processo seletivo anterior (artigo 50); e a obrigatoriedade de as instituições de educação superior articularem-se com os órgãos normativos dos sistemas de ensino, uma vez que, embora as universidades possam deliberar sobre critérios e normas de seleção e admissão de estudantes, essas devem considerar que esses critérios exercem infl uência sobre a orientação do ensino médio (artigo 51). O artigo 52 defi ne as universidades como “instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profi ssionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano” (BRASIL, 1996), em se destacando o inciso I na caracterização dessas instituições pela “ produção intelectual institucionalizada mediante o estudo sistemático dos temas e problemas mais relevantes, tanto do ponto de vista científi co e cultural, quanto regional e nacional” (BRASIL, 1996). O inciso II determina que, no mínimo, um terço do corpo docente deve ter titulação de mestre e doutor e o inciso III determina que, ao menos, um terço do corpo docente pertença ao regime de tempo integral. No parágrafo único do artigo 52, “é facultada a criação de universidades especializadas por campo do saber” (BRASIL, 1996, s.p.). O artigo 53 estabelece que o exercício da autonomia universitária se dá nas seguintes atribuições conferidas a essas instituições: I - criar, organizar e extinguir, em sua sede, cursos e programas de educação superior previstos nesta Lei, obedecendo às normas gerais da União e, quando for o caso, do respectivo sistema de ensino; II - fi xar os currículos dos seus cursos e programas, observadas as diretrizes gerais pertinentes; 27 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 III - estabelecer planos, programas e projetos de pesquisa científi ca, produção artística e atividades de extensão; IV - fi xar o número de vagas de acordo com a capacidade institucional e as exigências do seu meio; V - elaborar e reformar os seus estatutos e regimentos em consonância com as normas gerais atinentes; VI - conferir graus, diplomas e outros títulos; VII - fi rmar contratos, acordos e convênios; VIII - aprovar e executar planos, programas e projetos de investimentos referentes a obras, serviços e aquisições em geral, bem como administrar rendimentos conforme dispositivos institucionais; IX - administrar os rendimentos e deles dispor na forma prevista no ato de constituição, nas leis e nos respectivos estatutos; X - receber subvenções, doações, heranças, legados e cooperação fi nanceira resultante de convênios com entidades públicas e privadas. A Lei n° 13.490, de 10 de outubro de 2017, alterou o artigo 53, transformando o parágrafo único em parágrafo primeiro e adicionando os parágrafos segundo e terceiro: § 1º Para garantir a autonomia didático-científi ca das universidades, caberá aos seus colegiados de ensino e pesquisa decidir, dentro dos recursos orçamentários disponíveis, sobre: I - criação, expansão, modifi cação e extinção de cursos; II - ampliação e diminuição de vagas; III - elaboração da programação dos cursos; IV - programação das pesquisas e das atividades de extensão; V - contratação e dispensa de professores; VI - planos de carreira docente. § 2º As doações, inclusive monetárias, podem ser dirigidas a setores ou projetos específi cos, conforme acordo entre doadores e universidades. § 3º No caso das universidades públicas, os recursos das doações devem ser dirigidos ao caixa único da instituição, com destinação garantida às unidades a serem benefi ciadas. Destaca-se, no parágrafo primeiro, a gestão democrática por intermédio dos órgãos colegiados deliberativos, o que é esmiuçado pelo artigo 56: Art. 56. As instituições públicas de educação superior obedecerão ao princípio da gestão democrática, assegurada a existência de órgãos colegiados deliberativos, de que participarão os segmentos da comunidade institucional, local e regional. Parágrafo único. Em qualquer caso, os docentes ocuparão setenta por cento dos assentos em cada órgão colegiado e comissão, inclusive nos que tratarem da elaboração e modifi cações estatutárias e regimentais, bem como da escolha de dirigentes(BRASIL, 1996, s.p.). 28 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL O artigo 54 segue tratando da autonomia das universidades em: propor, com base nos recursos disponíveis seu quadro de pessoal docente, técnico e administrativo e plano de cargos e salários (inciso I) e elaborar o regulamento de seu pessoal (inciso II), em se observando em ambos os casos a devida conformidade com normas gerais pertinentes; gerir, de acordo com os recursos alocados pelo Poder mantenedor das instituições, recursos para obras, serviços e aquisições em geral (inciso III); elaborar seus orçamentos anuais e plurianuais (inciso IV). Atente-se aos incisos seguintes do artigo 54 e ao artigo 55: V - adotar regime fi nanceiro e contábil que atenda às suas peculiaridades de organização e funcionamento; VI - realizar operações de crédito ou de fi nanciamento, com aprovação do Poder competente, para aquisição de bens imóveis, instalações e equipamentos; VII - efetuar transferências, quitações e tomar outras providências de ordem orçamentária, fi nanceira e patrimonial necessárias ao seu bom desempenho. § 2º Atribuições de autonomia universitária poderão ser estendidas a instituições que comprovem alta qualifi cação para o ensino ou para a pesquisa, com base em avaliação realizada pelo Poder Público. Art. 55. Caberá à União assegurar, anualmente, em seu Orçamento Geral, recursos sufi cientes para manutenção e desenvolvimento das instituições de educação superior por ela mantidas (BRASIL, 1996, s.p.). Por fi m, no artigo 57, determina-se que, nas instituições públicas, os docentes devam ministrar pelo menos oito horas semanais de aulas. Após passar em revisão esses artigos da LDB, observa-se que as tônicas dessa legislação são a autonomia universitária e a avaliação. No entanto, a avaliação torna-se um instrumento de controle e regulação das instituições, que termina por limitar a atuação universitária e por padronizar a educação superior em território nacional. Ademais, a LDB reafi rma o ensino privado em todos os níveis, ampliando sua atuação nos anos seguintes e submetendo as instituições privadas à avaliação e aos atos regulatórios de credenciamento de instituições, autorização e reconhecimento de cursos. A LDB, em suas disposições transitórias (art. 87, § 1°), determinou ainda que a União deveria, no prazo de um ano, encaminhar ao Congresso proposta de Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelecesse diretrizes e metas para a Década da Educação. Mesmo com o engajamento da sociedade civil, a versão aprovada representou a vitória do Poder Executivo, que teve êxito ao impor sua agenda ao Legislativo: o documento, aprovado em 2001, não garantia a expansão dos recursos do governo federal para a educação superior, mas assegurava o crédito 29 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 educativo mediante recursos públicos estaduais, ampliava a participação da educação a distância e enfatizava a avaliação para aferir a qualidade do ensino. No documento não havia previsão de fi nanciamento para a expansão da educação pública, o que resultou num movimento de privatização e na atuação do Estado na implementação de um sistema nacional de avaliação – e não de educação – que ora atua na fl exibilização, ora atua na regulação/controle (DOURADO; CATANI; OLIVEIRA, 2003). Bello de Souza (2014) refl etirá sobre a implicação da hegemonia dos interesses do Poder Executivo: os nove vetos presidenciais limitaram a gestão e o fi nanciamento da educação, sobretudo, a educação superior. Por isso, afi rma que o PNE 2001-2010 era inconsistente, pois não previa custos, tampouco recursos para fi nanciamento, ainda que suas metas contemplassem a expansão dos níveis e modalidades da educação. Previsto pela Lei nº 10.172/2001 (BRASIL, 2001), o PNE defi niu diagnósticos, diretrizes e 295 objetivos e metas relacionadas ao conjunto de níveis – educação básica (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio) e educação superior – e modalidades de ensino – Educação de Jovens e Adultos, Educação a Distância e Tecnologias Educacionais, Educação Tecnológica e Formação Profi ssional, Educação Especial e Educação Indígena –, tratando também da Formação dos Professores e Valorização do Magistério, do Financiamento e Gestão, além do Acompanhamento e Avaliação do Plano, propugnando a efetivação de uma gestão descentralizada pela via do regime de colaboração entre os entes federativos (BELLO DE SOUZA, 2014, p. 150). Texto: Balanço do Plano Nacional de Educação (PNE) 2001- 2010. Disponível em: https://cutt.ly/qv3VWDn. Cabe ainda acrescentar que outras legislações supervenientes, como o Decreto n° 3.860, de 9 de julho de 2001, tiveram por objetivo afi nar as competências do Ministério da Educação (MEC), do Conselho Nacional de Educação (CNE) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Esse decreto viria a ser revogado pelo Decreto n° 5.773, de 9 de maio de 2006, que dispunha sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e sequenciais no sistema federal de ensino, durante o governo Luiz 30 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL Inácio Lula da Silva (2003-2010). Por fi m, o decreto de 2006, foi revogado pelo Decreto n° 9.235, de 15 de dezembro de 2017, com a mesma ementa do anterior, mas com alterações que confi guraram um novo marco regulatório da educação superior, no governo de Michel Temer (2016-2019). Para refl exão acerca da privatização da educação superior no Brasil, vale citar os dados sintetizados por Dourado (2008, p. 9): O processo de privatização da educação superior é fortemente intensifi cado na década de 1990, particularmente após 1995 com as mudanças introduzidas nas políticas e gestão para esse nível de ensino [...]. Merece ser ressaltado que o setor privado que respondia em 1980 por 68,64% das 404.814 vagas, em 1990 por 69,16% das 502.784, em 1995 por 70,81 das 610.355, em 2000 por 79,8% das 1216.287 passou a responder em 2002 por 83,34% das 1.773.087 vagas para a educação superior. Trata-se [...] de lógica de expansão predominantemente privada. Em se refl etindo nessa lógica de expansão predominantemente privada, aguardavam-se mudanças no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003- 2010), como indicava seu plano de governo, em que constavam os seguintes compromissos: ampliação da educação superior pública por meio da garantia de fi nanciamento público; a expansão da oferta de vagas para a educação superior em instituições públicas e a abertura de vagas em cursos noturnos; o envolvimento das IES na qualifi cação de docentes da educação básica. De fato, observou-se a efetivação da expansão da oferta em educação superior, com a criação de 14 universidades federais, entre as quais 4 tinham por objetivo promover a integração regional e internacional e 10 promoviam a interiorização da educação superior pública (MOREIRA; MOREIRA; SOARES, 2018). O Plano de Desenvolvimento da Educação, lançado em 2007, previa a expansão de vagas tanto na rede federal quanto na rede privada. Além disso, o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), instituído pelo Decreto n° 6.096, de 24 de abril de 2007, como uma das ações do PDE, promoveu a criação de novos cursos e a expansão da rede federal. Também foram criados o Programa Ciência sem Fronteiras, o Programa de Bolsa Institucional de Iniciação à Docência (Pibid), instituído por Portaria normativa da Capes n° 38, de 12 de dezembro de 2010, e o Programa Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes), instituído pelo Decreto n° 7.234, de 19 de julho de 2010, que visavam a incentivar a permanência dos estudantes nas instituições públicas, além de fomentarem a dedicação desses aos estudos. No caso do Ciência sem Fronteiras, propiciou-seaos estudantes a possibilidade de 31 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 intercâmbio internacional. A educação a distância em nível superior desenvolveu- se por meio do Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB). Houve também incremento no Financiamento Estudantil (Fies) para estudantes do ensino privado, criado, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, pela Lei n° 10.260, de 12 de julho de 2001, e modifi cado pela Lei n° 12.202, de 14 de janeiro de 2010. Instituiu-se, por meio da Lei n° 11.096, de 13 de janeiro de 2005, o Programa Universidade para Todos (Prouni), que promoveu a distribuição de bolsas em instituições privadas para estudantes de baixa renda: bolsas integrais para estudantes com famílias que aufi ram até um salário mínimo e meia per capita e bolsas parciais para aqueles com famílias cuja renda contabilizasse até três salários mínimos per capita. As instituições de educação superior que aderem ao Prouni são benefi ciadas por isenção fi scal. Esses programas, obviamente, não fortaleceram o setor público, mas fi nanciaram o setor privado por meio de recursos públicos. A Lei n° 10.861, de 14 de abril de 2004, instituiu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). Como o Capítulo 3 será dedicado exclusivamente à análise do Sinaes, no presente capítulo serão apontados apenas alguns aspectos da avaliação organizada por esse sistema. O artigo 1° trazia o objetivo desse sistema: a garantia de processo nacional de avaliação das instituições de educação superior; dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico dos estudantes, mediante o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes. Merece destaque a avalição institucional, concretizada pela autoavaliação, coordenada pela Comissão Própria de Avaliação (CPA); e a avaliação externa, realizada pelos avaliadores do Banco de Avaliadores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (BASIs). Os recursos referentes à avaliação externa são julgados pela Comissão Técnica de Acompanhamento da Avaliação (CTAA). Da avaliação institucional externa, resulta o Conceito Institucional (CI). A operacionalização do Sinaes fi cou a cargo do Inep e o estabelecimento de suas diretrizes e de sua coordenação, a cargo da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), instância deliberativa, colegiada e vinculada ao ministro da Educação. De acordo com a legislação, 13 membros são indicados pelo ministro da Educação, entre os quais 5 nomes de grande relevância nacional em avaliação ou gestão acadêmica em educação superior, um membro do Inep e um membro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), um representante da Secretaria de Educação Superior (Sesu/MEC), um da Secretaria de Educação Profi ssional e Tecnológica (Setec/MEC) e um da Secretaria de Educação a Distância (Seed/MEC), além de um representante dos estudantes, dos técnico-administrativos e dos professores das instituições de educação superior. Os desafi os da Comissão são a promoção do aprimoramento 32 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL constante do Sinaes, a garantia de sua qualidade e a articulação entre avaliação e regulação, que merece uma análise mais detida. O Conceito Preliminar de Curso (CPC) é um índice que avalia os cursos de graduação, com base no desempenho dos estudantes no Enade, aplicado a cada ano por grupo de áreas do conhecimento, e variáveis como infraestrutura e instalações, recursos didático-pedagógicos e corpo docente. Essas variáveis são retiradas do Enade, como o questionário socioeconômico. O CPC vai de 1 a 5 e, sendo preliminar, trata-se de um indicador prévio da situação dos cursos de graduação no país. Para que os conceitos atribuídos sejam consolidados, comissões de avaliadores farão visitas in loco para confi rmar ou modifi car o conceito. O CPC é divulgado anualmente, junto com os resultados do Enade. Cursos que obtiverem CPC 1 e 2 serão automaticamente incluídos no cronograma de visitas dos avaliadores do Inep. Os demais casos, que incluem cursos com conceito igual ou maior que 3, podem optar por não receber a visita dos avaliadores e, assim, transformar o CPC em conceito permanente. O conceito 3 classifi ca cursos que atendem aos critérios de qualidade, ao passo que o conceito 5 categoriza cursos de excelência, que são vistos como referência no país. O conceito permanece, Conceito de Curso (CC), é utilizado para subsidiar o processo de regulação dos cursos de graduação no país. Outro indicador de desempenho das instituições é o Índice Geral de Cursos (IGC), que é calculado com base na média ponderada do Conceito Preliminar de Curso (CPC) dos cursos de graduação. O IGC tem pontuação variável de um a cinco pontos. Uma instituição que obtenha de três a cinco pontos atende de forma satisfatória aos critérios de qualidade estabelecidos pelo Sinaes; abaixo de dois a atuação é insatisfatória. Seu cálculo segue o ciclo de três anos, em combinação com o resultado do Enade, que mede o desempenho dos estudantes. Ainda no âmbito do Sinaes, a regulação passou a contar com três momentos distintos: autorização, reconhecimento e renovação do reconhecimento, que serão defi nidas a seguir: • A autorização é realizada quando a instituição solicita ao MEC a abertura de um curso. Dois avaliadores observam três dimensões do curso: organização didático-pedagógica, corpo docente e técnico-administrativo e instalações físicas. • O reconhecimento se dá quando a primeira turma do curso inicia a segunda metade do curso, após a instituição solicitar ao MEC. 33 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 Dois avaliadores se encaminham à instituição para verifi car se os pontos arrolados no projeto inicial foram cumpridos. • A renovação do reconhecimento obedece ao ciclo do Sinaes, que corresponde ao período de três anos. Com base no CPC, os cursos que alcançaram os conceitos 1 ou 2 – que são insatisfatórios – são avaliados por dois especialistas. Os cursos com conceito 3 ou 4 pontos, caso a instituição solicite, serão também avaliados. No capítulo 3, também serão abordadas as legislações supervenientes ao Sinaes. Por ora, cabe destaque à Portaria Normativa MEC n° 40, de 12 de dezembro de 2007, que instituiu o sistema e-MEC, que transpôs ao meio eletrônico a gestão de informações e o fl uxo de trabalho relacionados aos processos de regulação, avaliação e supervisão da educação superior no sistema federal de educação. Também instituiu o Cadastro e-MEC de instituições e cursos superiores, que consolidou informações sobre indicadores de qualidade, sobre o Enade e sobre o Banco de Avaliadores (BASIs). O e-MEC facilitou o acesso a informações e garantiu a transparência às instituições e aos cidadãos que pretendem obter dados para a escolha de um curso e de uma instituição. Por meio da Lei n° 11.892, de 29 de dezembro de 2008, foi instituída a Rede Federal de Educação Profi ssional, Científi ca e Tecnológica e foram criados os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFs), que são autarquias que, além do ensino técnico de nível médio, também oferecem cursos de educação superior, como os tecnólogos, licenciaturas e bacharelados, e cursos de pós-graduação lato e stricto sensu. Como instituições de educação superior, os IFs oferecem a tríade ensino, pesquisa e extensão. O acesso à educação superior foi signifi cativamente modifi cado pela adesão das universidades públicas ao novo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), em 2009, e pela criação do Sistema de Seleção Unifi cado (Sisu), por meio da Portaria Normativa n° 2, de 26 de janeiro de 2010, permitindo aos estudantes a inscrição em um exame de acesso e a possibilidade de tentar o ingresso em uma das universidades que aderiram ao Sisu e substituíram seu exame vestibular pelo Enem. Além disso, a nota no Exame tornou-se critério de seleção de candidatosao Prouni e para a concessão de fi nanciamento pelo Fies. 34 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL O Censo da Educação Superior de 2010, realizado pelo Inep, fornece o panorama da primeira década do século XX. O número de IES passou de 1.391, em 2001, para 2.378, em 2010, considerando-se que as públicas, nesse período, passaram de 183 para 278, e as privadas, para o mesmo período, cresceram de 1.208 para 2.100. Nota-se que o setor privado continuou avançando. De acordo ainda com o Censo (BRASIL, 2010, p. 39), o número total de matrículas avançou de 3.036.113, em 2001, para 6.379.299, em 2010. A participação percentual do setor privado cresceu de 68,9% (2.091.529) para 74,2% (4.736.001), ao passo que a participação percentual do setor público retraiu de 31,1% a 25,8%. Isso indica que, no período entre 2001 e 2010, o aumento de 944.584 para 1.643.298 vagas públicas foi proporcionalmente inferior ao acréscimo de vagas privadas. Foi esse o cenário encontrado pela sucessora Dilma Rousseff (2011-2015 e 2015-2016), que assumiu com o compromisso de seguir com a política para a educação do governo anterior, centrada no aumento da oferta de vagas em universidades e institutos federais. A expansão universitária por meio do REUNI deu prosseguimento, no entanto, também avançou o fi nanciamento do Estado no ensino privado, por meio do crédito estudantil (FIES) e da concessão de bolsas pelo PROUNI. A aprovação da chamada Lei de Cotas – Lei n° 12.711, de 29 de agosto de 2012 – garantiu a reserva de 50% das matrículas nas universidades federais e institutos federais de educação, ciência e tecnologia a alunos que cursaram o ensino médio público, regular ou da educação de jovens e adultos (EJA), ou àqueles que concluíram o ensino médio por meio de exames de certifi cação. A lei determinava a subdivisão dessas vagas para dois grupos de estudantes de escolas públicas: oriundos de famílias com renda bruta igual ou inferior a um salário mínimo e meio per capita; e oriundos de famílias com renda bruta superior a um salário mínimo e meio. Nos dois grupos, deveria ser observado o percentual mínimo correspondente aos pretos, pardos e indígenas no estado da instituição, conforme o último censo demográfi co do Instituto Brasileiro de Geografi a e Estatística (IBGE). Para os estados com grande concentração de indígenas, o MEC recomendava – dentro dos limites da autonomia das instituições – critérios adicionais de reserva de vagas para esses estudantes. As instituições teriam quatro anos para oferecerem progressivamente as vagas para cotistas, considerando-se que, em 2013, teriam de ser reservadas, no mínimo, 12,5% das vagas ofertadas anualmente. 35 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 Texto: Em 16 anos de cotas raciais, UnB formou 4.791 pretos, pardos e indígenas. Disponível em: https://cutt.ly/Pv3BldG. Surgiu a expectativa de que o documento fosse convertido no projeto de lei a ser entregue ao Congresso, no entanto, mais uma vez, como ocorrera com o PNE 2001-2010, o Poder Executivo encaminhou outra proposta, o PL n° 8.035/2010. É preciso acrescentar que a Conae também suscitou debates acerca da criação de um Sistema Nacional de Educação, já previsto na LDB (BRASIL,1996), mas jamais articulado pelo governo federal. O projeto de lei foi convertido na Lei n° 13.005, de 25 de junho de 2014, com 20 metas subdivididas em estratégias para a educação. As referentes à educação superior são a 12, a 13 e a 14, as quais discutiremos a seguir: Meta 12: elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% (cinquenta por cento) e a taxa líquida para 33% (trinta e três por cento) da população de 18 (dezoito) a 24 (vinte e quatro) anos, assegurada a qualidade da oferta e expansão para, pelo menos, 40% (quarenta por cento) das novas matrículas, no segmento público (BRASIL, 2014). A discussão acerca do Plano Nacional de Educação que sucederia o do decênio 2001-2010 foi igualmente bastante agitada na sociedade civil, com a realização da I Conferência Nacional de Educação (Conae), que resultou na entrega do Documento Final da Conae. Esse documento consolidava as propostas discutidas na sociedade, com vistas à redução de desigualdades e à gestão democráticas das instituições. A Meta 12, acompanhada de 21 estratégias, traz dois indicadores que merecem ser elucidados. De acordo com Brasil (2016, p. 272-273), a taxa bruta de matrículas é um indicador: 36 LEGiSLAÇÃo E AVALiAÇÃo Do ENSiNo SuPErior No BrASiL da capacidade de absorção do sistema educacional em determinado nível de ensino. É defi nida conceitualmente pelo total de matriculados (independentemente da idade) em relação ao total populacional em idade considerada adequada para cursar o nível de ensino em análise. O PNE considera a população de 18 a 24 anos como aquela que está na idade de referência para cursar a graduação. A TBM na graduação, portanto, indica, aproximadamente (sem considerar as vagas ociosas), qual é a capacidade de absorção de todos os cursos de graduação do País em relação ao tamanho da população de 18 a 24 anos de idade. Por sua vez, a taxa líquida de matrícula é um indicador (BRASIL, 2016, p. 279): A taxa líquida de matrícula (TLM) é um indicador de acesso ao sistema educacional por uma população considerada na idade de referência para cursar um determinado nível de ensino. Em sua defi nição clássica, a TLM considera apenas o percentual da população de uma faixa etária matriculada em um nível de ensino em relação ao tamanho total da população nessa faixa etária. A taxa líquida de escolarização (TLE) é um aperfeiçoamento desse indicador que considera também o percentual da população que está dentro da idade de referência, mas já concluiu o nível de ensino em questão (INEP, 2012). Esse aperfeiçoamento evita que o indicador seja penalizado por um fato virtuoso da escolarização dos jovens: a titulação na idade adequada. As estratégias incluem objetivos tangíveis, como ofertar, no mínimo, um terço das vagas em cursos noturnos, elevar a relação de estudantes por professor para 18, elevar a taxa de conclusão de cursos de graduação presenciais nas universidades públicas para 90%, assegurar, no mínimo, 10% dos créditos em atividades de extensão. No entanto, a maioria delas não são mensuráveis, como interiorizar o acesso à graduação, fomentar a educação superior pública e gratuita para a formação de professores da educação básica, ampliar as políticas de inclusão e assistência estudantil, reduzir as desigualdades de acesso e propiciar a mobilidade acadêmica, inclusive em âmbito internacional, ampliar Fies e Prouni. O Relatório de Monitoramento bianual do PNE constatou a persistência das desigualdades regionais e identifi cou, quanto aos indicadores da Meta, o seguinte: A taxa bruta de matrícula na educação superior cresceu 6,2 p.p. entre 2012 e 2019, registrando, neste ano, a taxa de 37,4%. Para o alcance da meta de 50% até 2024, será necessário um crescimento de 12,6 p.p. (2,5 p.p. ao ano). A taxa líquida de escolarização na educação superior teve crescimento de 5,4 p.p. entre 2012 e 2019, quando atingiu seu valor mais elevado (25,5%). Para o alcance da meta de 33%, será necessário um crescimento de 7,5 p.p. (1,5 p.p. ao ano). (BRASIL, 2020, p. 275-276). 37 MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Capítulo 1 A meta seguinte determina: “Meta 13: elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior para 75% (setenta e cinco por cento), sendo, do total, no mínimo, 35% (trinta e cinco por cento) doutores” (BRASIL, 2014). Apresentam-se 9 estratégias, que, pelo menos quanto à qualidade, não são facilmente mensuráveis. Propõe-se o aperfeiçoamento do Sinaes, o aumento do quantitativo de estudantes a serem avaliados pelo Enade, a
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