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Análise Jurídica de Casos

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ESTÁGIO SUPERVISIONADO - PENAL 
 
1º - Ao chegar a um bar, Caio encontra Tício, um antigo desafeto 
que, certa vez, o havia ameaçado de morte. 
Após ingerir meio litro de uísque para tentar criar coragem de 
abordar Tício, Caio partiu em sua direção com a intenção de 
cumprimentá-lo. Ao aproximar-se de Tício, Caio observou que seu 
desafeto bruscamente pôs a mão por debaixo da camisa, momento em 
que achou que Tício estava prestes a sacar uma arma de fogo para vitimá-
lo. 
Em razão disso, Caio imediatamente muniu-se de uma faca que 
estava sobre o balcão do bar e desferiu um golpe no abdome de Tício, o 
qual veio a falecer. Após análise do local por peritos do Instituto de 
Criminalística da Polícia Civil, descobriu-se que Tício estava tentando 
apenas pegar o maço de cigarros que estava no cós de sua calça. 
Considerando a situação acima, responda aos itens a seguir, 
empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação 
legal pertinente ao caso. 
A) Levando-se em conta apenas os dados do enunciado, Caio 
praticou crime? Em caso positivo, qual? Em caso negativo, por que razão? 
Não, pois atuou sob o manto de descriminante putativa, 
instituto previsto no art. 20, § 1º, do CP, uma vez que supôs, com 
base em fundado receio, estar em situação de legítima defesa. Como 
se limitou a dar uma facada, a sua reação foi moderada, não havendo 
que se falar em punição por excesso. 
B) Supondo que, nesse caso, Caio tivesse desferido 35 golpes na 
barriga de Tício, como deveria ser analisada a sua conduta sob a ótica do 
Direito Penal? 
Ainda que tenha procurado se defender de agressão que 
imaginou estar em vias de ocorrer, Caio agiu em excesso doloso, 
devendo, portanto, responder por homicídio doloso, na forma do art. 
23, parágrafo único, do CP. 
 
2º - Larissa, senhora aposentada de 60 anos, estava na rodoviária 
de sua cidade quando foi abordada por um jovem simpático e bem 
vestido. O jovem pediu-lhe que levasse para a cidade de destino, uma 
caixa de medicamentos para um primo, que padecia de grave 
enfermidade. 
Inocente, e seguindo seus preceitos religiosos, a Sra. Larissa atende 
ao rapaz: pega a caixa, entra no ônibus e segue viagem. 
 
Chegando ao local da entrega, a senhora é abordada por policiais 
que, ao abrirem a caixa de remédios, verificam a existência de 250 
gramas de cocaína em seu interior. Atualmente, Larissa está sendo 
processada pelo crime de tráfico de entorpecente, previsto no art. 33 da 
Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006. 
Considerando a situação acima descrita e empregando os 
argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente, 
responda: qual a tese defensiva aplicável à Larissa? 
A questão pretende buscar o conhecimento acerca do instituto 
do erro de tipo essencial, inclusive para diferenciá-lo das demais 
modalidades de erro. 
A tese defensiva aplicável é a de que Larissa agiu em erro de 
tipo essencial incriminador, instituto descrito no art. 20, caput, do 
CP, pois desconhecia circunstância elementar descrita em tipo penal 
incriminador. 
Ausente o elemento típico, qual seja, o fato de estar 
transportando drogas, faz com que, nos termos do dispositivo legal, 
se exclua o dolo, mas permita-se a punição por crime culposo e, 
como o dispositivo legal do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 não admite 
a modalidade culposa, o fato se tornaria atípico. 
 
3º - Maurício, jovem de classe alta, rebelde e sem escrúpulos, 
começa a namorar Joana, menina de boa família, de classe menos 
favorecida e moradora de área de risco em uma das maiores comunidades 
do Brasil. 
No dia do aniversário de 18 anos de Joana, Maurício resolve 
convidá-la para jantar num dos restaurantes mais caros da cidade e, 
posteriormente, leva-a para conhecer a suíte presidencial de um hotel 
considerado um dos mais luxuosos do mundo, onde passa a noite com 
ela. 
Na manhã seguinte, Maurício e Joana resolvem permanecer por 
mais dois dias. Ao final da estada, Mauricio contabiliza os gastos 
daqueles dias de prodigalidade, apurando o total de R$ 18.000,00 
(dezoito mil reais). 
Todos os pagamentos foram realizados em espécie, haja vista que, 
na noite anterior, Maurício havia trocado com sua mãe um cheque de R$ 
20.000,00 (vinte mil reais) por dinheiro em espécie, cheque que Maurício 
sabia, de antemão, não possuir fundos. 
Considerando apenas os fatos descritos, responda, de forma 
justificada, os questionamentos a seguir. 
 
A) Maurício e Joana cometeram algum crime? Justifique sua 
resposta e, caso seja positiva, tipifique as condutas atribuídas a cada um 
dos personagens, desenvolvendo a tese de defesa. 
Joana não cometeu qualquer crime porque não houve sequer 
conduta de sua parte. 
Assim, descabe analisar a existência de elemento subjetivo 
(dolo ou culpa), ilicitude ou culpabilidade, pois tais somente seriam 
apreciados quando houvesse conduta. 
Maurício, diferentemente de Joana, cometeu crime, qual seja, 
estelionato (ou teria praticado a conduta descrita no art. 171, caput, 
do CP), mas que poderia alegar em sua defesa a escusa absolutória 
prevista no art. 181, II, do CP. 
Ademais, aplicação da escusa absolutória não conduz à 
atipicidade da conduta. A conduta continua típica, ilícita e culpável, 
havendo apenas opção legislativa pela não imposição de sanção de 
natureza penal, embora a sentença possa produzir efeitos civis. 
B) Caso Maurício tivesse invadido a casa de sua mãe com uma 
pistola de brinquedo e a ameaçado, a fim de conseguir a quantia de R$ 
20.000,00 (vinte mil reais), sua situação jurídica seria diferente? 
Justifique. 
A condição jurídica de Maurício seria alterada na medida em 
que a isenção de pena prevista no Código Penal não se aplica aos 
crimes de roubo (ou à prática da conduta descrita no art. 157, caput, 
do CP), nos termos do art. 183, I, do CP. 
Portanto, Maurício seria processado e apenado pelo crime 
cometido. 
Além disso, levando em conta que o delito de roubo não se 
confunde com a extorsão, não será admitida fungibilidade entre as 
condutas de forma a se considerar qualquer das duas como a prática 
empreendida por Maurício. 
Por fim, não poderá ser considerada correta a resposta que 
imponha a causa de aumento de pena quanto ao uso de arma de 
brinquedo. Uma vez que no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, 
em 2001, cancelou o Verbete Sumular 174, no julgamento do REsp 
213.054/SP. 
 
4º - Wilson, extremamente embriagado, discute com seu amigo 
Junior na calçada de um bar já vazio pelo avançado da hora. A discussão 
torna-se acalorada e, com intenção de matar, Wilson desfere quinze 
facadas em Junior, todas na altura do abdômen. 
 
Todavia, ao ver o amigo gritando de dor e esvaindo-se em sangue, 
Wilson, desesperado, pega um taxi para levar Junior ao hospital. Lá 
chegando, o socorro é eficiente e Junior consegue recuperar-se das graves 
lesões sofridas. 
Analise o caso narrado e, com base apenas nas informações dadas, 
responda, fundamentadamente, aos itens a seguir. 
A) É cabível responsabilizar Wilson por tentativa de homicídio? 
Não, pois Wilson será beneficiado pelo instituto do 
arrependimento eficaz, previsto na parte final do art. 15 do Código 
Penal. 
Assim, somente responderá pelos atos praticados, no caso, as 
lesões corporais graves sofridas por Júnior. 
B) Caso Junior, mesmo tendo sido socorrido, não se recuperasse 
das lesões e viesse a falecer no dia seguinte aos fatos, qual seria a 
responsabilidade jurídico-penal de Wilson? 
Nesse caso, como não houve eficácia no arrependimento, o que 
é exigido pelo art. 15 do Código Penal, Wilson deverá responder pelo 
resultado morte, ou seja, deverá responder pelo delito de homicídio 
doloso consumado. 
 
5º - Erika e Ana Paula, jovens universitárias, resolvem passar o dia 
em uma praia paradisíaca e, de difícil acesso (feito através de uma trilha), 
bastante deserta e isolada, tão isolada que não há qualquer 
estabelecimento comercial no local e nem mesmo sinal de telefoniacelular. 
As jovens chegam bastante cedo e, ao chegarem, percebem que 
além delas há somente um salva-vidas na praia. Ana Paula decide dar 
um mergulho no mar, que estava bastante calmo naquele dia. 
Erika, por sua vez, sem saber nadar, decide puxar assunto com o 
salva-vidas, Wilson, pois o achou muito bonito. Durante a conversa, 
Erika e Wilson percebem que têm vários interesses em comum e ficam 
encantados um pelo outro. Ocorre que, nesse intervalo de tempo, Wilson 
percebe que Ana Paula está se afogando. Instigado por Erika, Wilson 
decide não efetuar o salvamento, que era perfeitamente possível. 
Ana Paula, então, acaba morrendo afogada. 
Nesse sentido, atento(a) apenas ao caso narrado, indique a 
responsabilidade jurídico-penal de Erika e Wilson. 
Segundo os dados narrados na questão, Wilson, por ser salva-
vidas, tem o dever legal de agir para evitar o resultado e, naquele 
momento, podia perfeitamente agir. Assim, trata-se de agente 
 
garantidor. Nesse caso, responde por delito comissivo por omissão, 
qual seja, homicídio doloso praticado via omissão imprópria: art. 121 
c/c o art. 13, § 2º, a, ambos do CP. 
Erika, por sua vez, por ter instigado Wilson a não realizar o 
salvamento de Ana Paula, responde como partícipe de tal homicídio, 
nos termos do art. 29 do CP. 
Não há que se falar em omissão de socorro por parte de Erika, 
pois, conforme dados expressos no enunciado, ela não sabia nadar e 
nem tinha como chamar por ajuda. 
 
6º - Carlos foi condenado pelos crimes de tráfico de entorpecentes 
e posse de arma de fogo de uso permitido, em concurso material, sendo 
sua conduta tipificada da seguinte forma: art. 33 da Lei n. 11.343/2006 
e art. 12 da Lei n. 10.826/2003, na forma do art. 69 do Código Penal. 
A pena ficou estabelecida em 05 anos de reclusão em regime 
fechado para o crime de tráfico e 1 ano de detenção em regime semiaberto 
pelo crime de posse de arma de fogo. 
Apenas a defesa técnica apelou, requerendo a mudança do regime 
de pena aplicado para o crime do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, tendo o 
feito transitado em julgado para a acusação. 
O recurso foi desprovido. Todavia, de ofício, sem reflexo no 
quantum, que permaneceu em 06 anos de pena privativa de liberdade, o 
Tribunal reclassificou o fato para o art. 33 c/c o art. 40, IV, da Lei n. 
11.343/2006, afastando o crime autônomo da lei de armas e aplicando a 
causa de aumento respectiva. 
Considerando as informações narradas na hipótese, responda aos 
itens a seguir. 
A) Poderia ser aplicado regime inicial de cumprimento da pena 
diverso do fechado para o crime de tráfico ilícito de entorpecentes, 
previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006? 
A questão narra que Carlos foi condenado pela prática de um 
crime de tráfico de drogas e posse de arma de fogo de uso permitido. 
Em que pese o crime de tráfico ser equiparado a hediondo, hoje 
o entendimento que prevalece no âmbito do Supremo Tribunal 
Federal é no sentido de que é possível a aplicação de regime inicial 
de cumprimento de pena diverso do fechado, sendo a previsão do 
art. 2º, § 2º, da Lei n. 8.072/90 inconstitucional, pois violadora do 
princípio da individualização da pena. 
Assim, analisando as circunstâncias do caso concreto, nada 
impede que o magistrado fixe o regime semiaberto ao caso, até 
 
porque a pena base não se afastou do mínimo legal, o que indica que 
as circunstâncias do art. 59 do CP são favoráveis. 
 
B) Poderia o Tribunal de Justiça em sede de recurso da defesa 
realizar a reclassificação adotada? 
Ainda consta do enunciado que o Tribunal de Justiça, em 
julgamento exclusivo da defesa, optou por realizar uma 
reclassificação da conduta, aplicando a causa de aumento de pena 
do art. 40, inciso IV, da Lei n. 11.343, em vez de manter a 
condenação pelo crime de posse de arma de fogo. 
Não poderia, porém, o Tribunal ter adotado essa conduta, pois 
ela é prejudicial ao réu. Como o recurso foi exclusivo da defesa, a 
reclassificação viola o princípio da vedação da reformatio in pejus. 
O prejuízo da nova classificação decorre de alguns fatores: para 
o cálculo de eventual prescrição, tendo em vista que a causa de 
aumento é considerada para fixação do prazo prescricional, 
enquanto que, havendo dois crimes, o prazo seria fixado de maneira 
separada para cada um; um dos crimes é punido com detenção, o que 
impede fixação do regime inicial fechado, deixando isso de ocorrer 
com a causa de aumento; na execução, a progressão de regime, no 
caso da causa de aumento, será calculada em 2/5 (ou 3/5, se 
reincidente) do total de 6 anos, enquanto, se mantidas as 
condenações separadas, esse percentual somente seria aplicado 
sobre a pena de 05 anos, pois sobre 1 ano seria aplicado o percentual 
de 1/6, já que a posse de arma de fogo não é crime hediondo.

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