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MULTICULTURALISMO_EMANCIPATORIO_pdf

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Perante o desafio proposto e mediante a multidimensionalidade e elasticidade da temática 
em análise, considerou-se pertinente estruturar o presente trabalho assente no seguinte 
tripé: I – Enquadramento do Multiculturalismo Emancipatório– em que se pretende 
contextualizar em linhas simples o Multiculturalismo Emancipatório enquanto movimento 
enquadrado no paradigma da Globalização contra-hegemónica; II – Caracterização do 
Multiculturalismo Emancipatório - Onde se visa evidenciar as características que 
consubstanciam e emolduram o Multiculturalismo Emancipatório ; III – Viabilidade do 
Multiculturalismo Emancipatório - Onde se pretende aferir e discutir a viabilidade do 
Multiculturalismo Emancipatório no contexto atual, onde o recrudescer do populismo aliado 
à xenofobia potenciam um agravamento da intolerância e o empobrecimento da inter-
etnicidade. 
 
 
 
 
 
RESUMO	
MULTICULTURALISMO	EMANCIPATÓRIO	
UTOPIA	OU	NECESSIDADE?	
	
	
«“Ter	em	conta	as	diferenças	implica	renunciar	à	igualdade	formal,	pilar	da	cultura	política	liberal;	mas	respeitar	uma	concepção	
rigorosamente	formal	da	igualdade	implica	negligenciar	a	procura	de	respeito	das	diferenças	que	emana	o	espaço	social”	Andrea	
Semprini.»	
Roberto	Romano	
Enquadramento	do	
Multiculturalismo	Emancipatório		
Caracterização	do	
Multiculturalismo	Emancipatório	
Viabilidade	do	Multiculturalismo	
Emancipatório	
	
1	 2	 3	
Sérgio	Adão	Afonso	Borges		
	 1	
 
 
I – Enquadramento do Multiculturalismo Emancipatório 
 
Para contextualizar o Multiculturalismo Emancipatório considera-se pertinente 
diferenciar os termos Multicultural e Multiculturalismo, sendo que para materializar esta 
diferenciação lança-se a âncora à posição sustentada por Stuart Hall (2013:267)	“	Multicultural	
é	 um	 termo	 qualificativo.	 Descreve	 as	 características	 sociais	 e	 os	 problemas	 de	 governabilidade	 apresentados	 por	
qualquer	 sociedade	 na	 qual	 diferentes	 comunidades	 culturais	 convivem	 e	 tentam	 construir	 uma	 vida	 em	 comum,	 ao	
mesmo	tempo	em	que	retêm	algo	da	sua	identidade	original.	Em	contrapartida,	o	termo	multiculturalismo	é	substantivo.	
Refere-se	 às	 estratégias	 e	 políticas	 adotadas	 para	 governar	 ou	 administrar	 problemas	 de	 diversidade	 e	multiplicidade	
gerados	 pelas	 sociedades	 multiculturais.”
1 O Multiculturalismo Emancipatório desponta de uma 
necessidade premente de resposta e combate a uma globalização hegemónica que 
dissemina a padronização e que paradoxalmente fez brotar uma nova óptica sobre a 
diversidade e as inerentes identidades múltiplas, em que a diferença e igualdade culminam 
na necessidade urgente de uma construção democrática de alta intensidade, materializada 
em novas articulações que desembocam na inclusão, na aceitação e respeito das 
diferenças de identidades e culturas díspares. O enquadramento e análise do 
Multiculturalismo Emancipatório emana indubitavelmente do protótipo da globalização 
contra-hegemónica, no quadro das práticas sociais e culturais de carácter transnacional, em 
que se procura incessantemente um diálogo intercultural assente em preocupações 
convergentes, apesar de expressas em linguagens diferenciadas e advindas de universos 
culturais diferentes, que por vezes raiando o antagónico alavancam uma monocidadania. 
 
II – Caracterização do Multiculturalismo Emancipatório 
 
A montante da caracterização do Multiculturalismo Emancipatório considera-se 
basilar referir que se o multiculturalismo é hoje um tema fraturante e de debate, esse facto 
advém de que durante um largo período de tempo viveu-se no exclusivo domínio de um 
monoculturalismo disfarçado de multiculturalismo, fundado na supressão de culturas 
alternativas que sempre existiram sob a cultura dominante, ou seja, um multiculturalismo 
conservador. Para contestar um multiculturalismo conservador, de pendor assimilacionista, 
que mesmo reconhecendo outras culturas, apenas admite a sua existência enquanto 
culturas inferiores, irrompe um Multiculturalismo Emancipatório assente fundamentalmente 
numa política e numa tensão dinâmica de elevada complexidade entre política de igualdade 
																																																								
1	LEISTER,	Margareth;	DICHER,	Marilu	(	2013)	Multiculturalismo	Emancipatório,	Igualdade	e	Tolerância,	Revista	Mestrado	em	
Direito.	P.	267	
	 2	
e política de diferença. A ideia de igualdade, é vinculada à redistribuição social, pois é pela 
redistribuição que se assimila a igualdade como princípio e prática, agregando a luta pela 
igualdade e a busca de inclusão e emancipação por meio do respeito dessas diferenças. 
O multiculturalismo emancipatório ancora-se no pressuposto de que todas as culturas são 
distintas internamente, o que inerentemente conduz a um reconhecimento da diversidade 
endógena e permite que dentro de cada cultura sobressaia a resistência, ou seja, a 
diferença. O reconhecimento da diversidade reflete-se na formação da própria identidade, 
conforme defendido por Stuart Hall, a identidade individual é formada a partir do olhar dos 
outros, o que transposto para o campo social transnacional desagua na formação de 
identidades híbridas que abarcam concomitantemente as formas clássicas de mistura e 
entrelaçamento entre modernidade e tradição, culturas de elite, culturas populares e 
culturas de massas. Neste encalço, importa ainda sublinhar a caracterização do 
Multiculturalismo Emancipatório, sem no entanto o escalpelizar dada a natureza do 
presente trabalho. Assim, em breves palavras, pode este conceito ser caracterizado como: 
Poliétnico; Participativo, Policêntrico, Múltiplo, Polissémico e Paradoxal, sendo obrigatório 
reconhecer que este paradigma que desponta nas sociedades atuais, constitui-se 
simultaneamente como gerador de conflitos e potenciador de diálogos. O Multiculturalismo 
Emancipatório torna-se essencial na construção do diálogo multivocal e produz-se na 
intercepção de forças centrípetas ( necessidade de ligação ao outro) e de forças centrífugas 
( necessidade de diferenciação do outro). 
 
III – Viabilidade do Multiculturalismo Emancipatório 
	
Num contexto de globalização hegemónica galopante, consubstanciada numa forte 
pressão dos Países centrais para impor uma modernização de características vincadamente 
neoliberais, as comunidades e culturas sujeitas a esta pressão, partem para uma 
conflitualização alicerçada e justificada na reivindicação violenta de uma identidade, que 
inexoravelmente conduz ao fundamentalismo. A pressão exercida pela cultura única e 
padronizada alimenta o despertar de uma consciência cultural que ganha forma no 
antagonismo político ancorado numa busca exasperada de identidade. Em resultado desta 
pressão, desponta a prevalência de movimentos radicais que tendem a manipular a vontade 
de preservação da nossa própria identidade e tradição. Os gritantes apelos nacionalistas 
que mesclam identidade nacional com protecionismo, isolacionismo e xenofobia, não dispõe 
de mais para oferecer senão o regresso a um fatídico passado. 
Os sucessivos esforços na implementação de um modelo de governação tipicamente 
capitalista, ocidental e neoliberal, diametralmente opostos à matriz cultural e identitária de 
Países como o Afeganistão, Iraque e a Líbia, resultaram num vazio de poder, numa 
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exacerbada conflitualidade interétnica que fomenta um movimento migratório maciço e 
desordenado, que desemboca numa Europa fragilizada por uma outra vertente da 
globalização hegemónica, o capitalismo selvagem e devorador. A emergência de discursos 
populistas e xenófobos advindos do medo do “outro”, incitam o não reconhecimento da 
multiculturalidade e traduzem a concessão de cidadania numa malha cada vez mais 
apertada, conduzindo ao monoculturalismo. Num continente que se autointitula como 
guardião de valores, liberdades e garantias, ganha evidencia a permuta desmesurada de 
liberdadese garantias por uma segurança quimérica que nos protege do “outro”. Caminha-
se assim, para uma sociedade supostamente multiétnica, mas que na realidade não passa 
de uma simples miscelânea de atores e culturas heterogéneos que coexistem no mesmo 
local e que tendencialmente marcha para a sobreposição da cultura do mais forte. É neste 
quadro de intolerância, xenofobia, populismo, conflitualidade interétnica e interpretação 
europeia hegemónica dos direitos humanos, que se questiona a viabilidade do 
Multiculturalismo Emancipatório enquanto alternativa viável aos efeitos nefastos da 
globalização hegemónica. Para aferir viabilidade ao fenómeno do Multiculturalismo 
Emancipatório enquanto prática contrahegemónica, é imperativo um cruzamento das 
múltiplas visões do que é o político, do que é a democracia e do que são as formas de 
participação na causa pública que conduzam a uma justa e equilibrada redistribuição social. 
Mas para que se materialize este cruzamento, torna-se vital a complementaridade despida 
de superioridade, dogmatismos e etnocentrismo, o que leva a uma visão descentrada e 
policêntrica da democracia. 
BIBLIOGRAFIA	
AA.	VV.	(2003)	Globalização,	Ciência,	Cultura	e	Religiões.	Lisboa:	Fundação	Carlos	Gulbenkian.	
ANDRÉ,	João	Maria	(2012)	Multiculturalidade,	Identidades	e	Mestiçagem.	Coimbra:	Palimage.	
AA.VV.	(2000)	As	Chaves	do	Século	XX.	Lisboa:	Instituto	Piaget.	
SANTOS,	Boaventura	de	Sousa	(	2005)	Globalização	Fatalidade	ou	Utopia?	Porto:	Edições	Afrontamento	
	
PUBLICAÇÕES	
MUDDE,	Cas	(2016),	“A	Ameaça	do	Populismo”,	XXI	TER	OPINIÃO	Nº7,Lisboa:46-53	
	
WEBGRAFIA	
GANDIN,	Luís;	HYPOLITO,	Álvaro	(2003)	Dilemas	do	Nosso	Tempo:	Globalização,	Multiculturalismo	e	Conhecimento,	Currículo	
Sem	Fronteiras.	Disponível	em:	http://www.boaventuradesousasantos.pt/documentos/curriculosemfronteiras.pdf	,	data	de	
consulta	a	05-04-2017.	
LEISTER,	Margareth;	DICHER,	Marilu	(	2013)	Multiculturalismo	Emancipatório,	Igualdade	e	Tolerância,	Revista	Mestrado	em	
Direito.	Disponível	em:		
https://www.academia.edu/4349984/MULTICULTURALISMO_EMANCIPATÓRIO_IGUALDADE_E_TOLERÂNCIA_-
_EMANCIPATORY_MULTICULTURALISM_EQUALITY_AND_TOLERANCE	,	data	de	consulta	a	07-04-2017.

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