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1 Volume 2 2 3 ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico FARMACOCINÉTICA CLÍNICA E FARMACODINÂMICA Thiago de Melo Costa Pereira Volume II Vitae Editora Anápolis (GO), 2021 Professor Thiago de Melo Costa Pereira Professor no Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico. Graduado em Farmácia pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Mestre em Ciências Fisiológicas na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Doutor em Ciências Fisiológicas na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Pós-Doutor em Farmacologia na Universidade de Santiago de Compostela (USC- Espanha). EXPEDIENTE: Autor: ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico Revisão Técnica: Farmacêutica Me. Juliana Cardoso Produção: Vitae Editora Edição: Egle Leonardi e Jemima Bispo Colaboraram nesta edição: Erika Di Pardi e Janaina Araújo Diagramação: Cynara Miralha 4 5 FARMACOCINÉTICA CLÍNICA E FARMACODINÂMICA Por Thiago de Melo Costa Pereira APRESENTAÇÃO A resposta biológica inerente ao uso de medicamentos depende de uma série de fatores que se estabelecem na relação entre o fármaco e a biofase. A determinação e a avaliação crítica de sistemas posológicos dependem da interpretação clínica de parâmetros farmaco- cinéticos e farmacodinâmicos que permitem prever o comportamento dos medicamentos empregados na farmacoterapia. Mais do que aplicar conhecimentos básicos de farmacologia, esse processo requer competências para a interpretação de fatores individuais que possam promover alguma variabilidade terapêutica, de forma que se promova o uso racional dos medicamentos. A farmacocinética abrange todo o movimento da substância ativa do xenobiótico por meio do corpo. Tudo o que o corpo faz com a droga é farmacocinética. E tudo o que a substância ativa faz com o organismo refere-se aos conceitos da farmacodinâmica. A farmacocinética é a ciência da farmacologia que estuda tudo o que o organismo faz com a substância. A farmacodinâmica é tudo aquilo que a substância faz com o organismo. VIAS DE ADMINISTRAÇÃO É importante lembrar que tudo o que se coloca por via sublingual não vai trazer uma melhor resposta de biodisponibilidade. Um exemplo vinculado ao cenário nacional, é o uso indiscriminado do Captopril por via sublingual e não oral em emergências hipertensivas. Abaixo, é possível ver um trabalho com efeito semelhante ao sublingual e ao oral em pacientes com crise hipertensiva, mostrando que não há diferença no controle da pressão arterial ao longo dos minutos. Embora a rota sublingual seja preferida para muitos medicamentos, o gosto não prazeroso dessa rota causa uma sensação desconfortável para os pacientes. Isso pode trazer problemas, como hipersensibilidade local e queimaduras químicas pelo contato direto da via sublingual na mucosa oral. Como resultado, uma sensação de queimação, de gosto metálico e de úlce- ras podem ser observadas na boca. Adicionalmente, em muitos estudos, o uso das drogas cardiovasculares que causam esse gosto ruim e a perda do gosto pode acontecer na boca. Por via inalatória, explora-se muito a área das bombinhas, os antiasmáticos. Quando se usa a bombinha de aerossol, a via inalatória deve ser separada da boca, no caso dos pufs. Quando ela é colocada na boca, o deslocamento do fármaco aerossolizado pode ter contato com o palato, com as bochechas, e não se distribuir muito bem para as regiões da orofaringe. Assim, perde-se muito do fármaco, caso seja administrado errado. É importante que se use o espaçador. Porém, na ausência dele, o paciente deve abrir bem a boca após uma expiração e, no momento da inspiração, disparar a bombinha, contando dez segundos antes de fazer a próxima expiração. Lembrando ainda da importância de realizar a limpeza bucal após o uso. Existem ainda as estratégias de anestesia geral, que podem ser exploradas por sevoflurano, isoflurano, enflurano, alotano, muito usados por anestesistas, viabilizando a via inalatória. Em Rio Preto, uma jovem morreu após inalar gás de buzina de festa. A referida buzina tem solventes orgânicos, extremamente apolares, capazes de atravessar as membranas com 6 7 muita facilidade. É possível perceber que essa via de fácil acesso também pode ser uma porta de entrada para diversos agentes tóxicos. Com relação à administração parenteral, ressalta-se que a via intramuscular necessita de uma inclinação da agulha muito diferente da via intradérmica, que não pode passar de 15°. Já na intramuscular pode chegar a 90°. Portanto, a intramuscular é preferível quando o objetivo é ter acesso a mais tecidos subcutâneos, ao passo que a intravenosa é utilizada mediante a necessidade do acesso direto com a corrente sanguínea. No caso da intradérmica é explorada quando a resposta é mais interessante por essa via, como por exemplo, a vaci- na BCG. Estudos realizados em décadas passadas mostraram que a vacina da tuberculose apresentava melhor resposta se feita por via intradérmica. Dessa forma, existe uma resposta imunológica, porém, não é a mais explorada por via terapêutica. A via subcutânea é muito explorada na área endócrina com proteínas. Se a via é rápida ou lenta, isso depende da natureza do fármaco. Por exemplo, a benzetacil, quando aspirada na seringa, possui um aspecto leitoso. Isso porque, tem-se a penicilina complexada com a benzatina. A complexação forma cristais, ou grumos que, ao serem aplicados por via intra- muscular, levam de 21 a 30 dias para serem deliberados. Portanto, a benzetacil não possui um amplo espectro de ação sobre as bactérias. O ato de aplicar por via intramuscular refere-se a uma aplicação cuja presença de penicilina é garantida por 21 dias. No caso da vacina da gripe, por exemplo, a absorção é bem mais rápida que a da benzetacil. A dor gerada pela penicilina deve-se à demora da substância na seringa, que entope a agulha. Por isso, precisa ser uma aplicação rápida, uma vez que a penicilina é insolúvel. Assim, o complexo insolúvel passa a ser armazenado no tecido muscular, provocando uma leve inflamação na região em que foi aplicado e gerando desconforto. Em relação à via subcutânea, abordam-se as proteínas ou moléculas de alto peso molecular, como a heparina. De início, parece uma contradição, já que é possível aplicar, por via subcutânea, uma heparina de baixo peso molecular (Clexane – Enoxaparina). Apesar de ser de baixo peso, ela é considerada subcutânea por ser de baixo peso em relação à heparina. Contudo, a Enoxaparina ainda tem um peso molecular extremamente elevado, o que inviabiliza sua administração por via oral. Por via endovenosa, um exemplo é um indivíduo fazendo a aplicação de heroína. Por via endovenosa, ele tem um melhor aproveitamento da substância. Trata-se de um grave problema no Canadá, onde indivíduos diluem heroína em diversos tipos de solventes. Em Vancouver, a prefeitura criou ilhas de consumo de heroína sendo administrada por profissionais de saúde, evitando o consumo por água contaminada. Ressalta-se que, muitos indivíduos vão a óbito não pelo uso da heroína, mas por infecções bacterianas ou endocardite pelo uso da substância associado aos veículos contaminados. Lembrando ainda que isso é uma porta de entrada muito relevante, visto que o sangue é estéril e a chance de contaminação é altíssima. Pela via intradérmica, observa-se que, após a aplicação é visível uma pápula que corresponde a um líquido que, ao longo dos minutos, vai se dissipando após algumas horas. Isso é comum em casos de compostos de imunossensibilização, como a vacina BCG do exemplo mencionado. BENZETACIL: QUAL O PROPÓSITO? A estrutura do benzetacil é composta pela benzilpelicilina complexada com a benzatina. Uma estrutura que não sugere uma boa interação com a água. Ao observar os anéis benzênicos de uma cadeia carbônica intermediária, isso confere uma insolubilidade em água suficiente para a penicilina conseguir ficar depositada por 21 dias, o que pode serútil para indivíduos analfabetos, indivíduos com baixa adesão ao tratamento, pessoas inconscientes ou que não podem ser submetidas a um tratamento diário sob acompanhamento, pacientes com febre reumática ou que não vão fazer o uso de penicilina diariamente. 8 9 PARA PENSAR A partir da leitura da bula do Haloperidol, pretende-se descobrir a qual caixa pertence: A diferença está no uso do Decanoato, ou seja, a uma estrutura de dez carbonos ligados ao Haloperidol faz com que, ao ser administrado por intramuscular, ela fique represada no ambiente do músculo por muito tempo. É uma formulação de depósito. O Decanoato de Haloperidol é útil para pacientes esquizofrênicos que não aderem a tratamentos, que precisam ter uma melhor convivência familiar. Para isso, é necessário fazer uma formulação de depósito de Haloperidol, para que que ela seja liberada ao longo dos dias. Conquista-se essa possibilidade com a adição de uma cabine carbônica longa. Já o segundo Haloperidol tem um efeito mais rápido, pois trata-se de apenas uma molécula Haloperidol, que não está associada a nenhuma estrutura de cadeia carbônica longa. Portanto, essa posologia se aplica ao segundo caso. Em relação às duas marcas: Celestone a Diprospan, alguns acreditam que a primeira é mais fraca em relação à segunda. Porém, de onde surgem essa constatação, visto que ambas são feitas de betametasona? - Celestone: fosfato de sódio de betametasona mais acetato; - Diprospan: fosfato de sódio mais dipropionato. Ambos apresentam fosfato dissódico. Contudo, o Celestone tem acetato. Os acetatos são dois carbonos ligados à betametasona. E no Diprospan é sipropionato, di = dois, prop = três, 2x3 = 6. Ou seja, é uma estrutura de betametasona ligada a um componente com seis carbonos. Logo, se está conjugada a uma cadeia carbônica maior, o tempo de liberação da betametasona também será maior. A ideia é promover um efeito rápido com glicocorticoide, por meio de uma substância solúvel em água, podendo ter o seu início de ação na primeira hora de uso. Observando a propaganda, quem age por 30 minutos é o Fosfato dissódico de betametasona e quem age por 15 dias é o acetato de betametasona. A segunda propaganda fala de resposta em 30 minutos, ou seja, quem age é o Fosfato dissódico de betametasona. E quem age por 30 dias é o dipropionato de betametasona. Esse medicamento dura mais tempo porque tem uma substância hidrossolúvel. Quanto maior o tamanho da cadeia carbônica, maior será o depósito e mais tempo de liberação da substância ativa. A Celestone será útil, por exemplo, para uma gestante que, faltando 15 ou 20 dias para o parto, se expõe ao medicamento com o objetivo de produzir mais líquido surfactante no feto, o que é chamado de “amadurecimento do pulmão”. Não faz sentido prescrever Diprospan para as gestantes, uma vez que não é desejável ter corticoide 20 dias antes do parto ou ainda dar à luz e continuar tendo corticoide circulante. Se o objetivo é ter por apenas 15 dias antes do parto, no período perinatal, não faz sentido substituir Celestone por Diprospan. O Diprospan seria mais aplicável para pacientes portadores de doenças autoimunes, que necessitam da administração mensal e, portanto, usam uma substância de efeito mais prolongado. Quando se prescreve Diprospan o efeito não acontece só nos primeiros dias, ou seja, a presença da betametasona pode perdurar por até um mês. 10 11 Observando as estruturas químicas, pode-se perceber o Fosfato dissódico de betametasona presente tanto no Celestone quanto no Diprospan. Fosfato é uma substância mais solúvel em água, podendo interagir com ligações íon dipolo com a água. Mas, na forma de acetato, foi adicionada uma estrutura de dois carbonos, enquanto no dipropionato são seis. A adição dos seis carbonos promoveu um efeito de maior duração por conta do represar do Dipropionato de betametasona na via intramuscular. Logicamente, nenhuma das duas substâncias pode ser administrada por via endovenosa, por conta do acetado e do dipropionato. Se fosse apenas o fosfato em um veículo de boa miscibilidade com a água, sim. É preferível, por via endovenosa, fazer uso de hidrocortisona, um corticoide de maior solubilidade. Nada de extremo efeito lipossolúvel pode ser adminis- trado via endovenosa por conta do risco de embolia. PATCHES Os patches viabilizam sua absorção por meio da via transdérmica. Alguns exemplos são a nicotina, que viabiliza um fácil acesso para o sistema nervoso central a partir da exposição pela pele. Isso não se confere com qualquer substância, pois são necessárias estruturas lipos- solúveis o bastante para vencer as membranas biológicas. Da mesma forma ocorre com os anticoncepcionais e alguns exemplos como substâncias potentes, como o Fentanyl (opioide para ação central) e a Lidocaína (embora sua concentração fique mais localizada na região, trabalhos mostram que existem chances de a Lidocaína alcançar outros pontos da aplicação). A Lidocaína é um clássico gel-patch, mas com função tópica e algumas respostas mais distantes da região da aplicação devido ao efeito da Lidocaína, que atua como bloqueador de canal de sódio. Convém lembrar que, embora seja classicamente usada por agentes aparentemente locais, é preciso ensinar aos pacientes que o patch contém lidocaína e, em alta exposição, isso pode chegar a danos tóxicos, como bloqueio cardíaco sinotrial, ou seja, uma parada cardíaca por uso de lidocaína. Felizmente, a administração é feita por meio de uma concentração baixa, então, o efeito analgésico teria a finalidade de bloquear os estímulos dolorosos por meio do bloqueio de canal de sódio. CURIOSIDADE Algumas empresas lançaram absorventes internos com produtos da cannabis. São supositórios vaginais para diminuir cólicas menstruais. Atualmente, já está sendo comercializado nos Estados Unidos. Lembrando que as formas de óvulos vaginais não objetivam efeito sistêmico, a menos que a substância lipossolúvel tenha a chance de ser distribuída como tal. A ideia é ter um efeito rápido na região uterina, promovendo uma distribuição plena no aparelho geniturinário feminino, com o mínimo de efeitos colaterais. AGENTES TÓPICOS Nem tudo o que se coloca sobre a pele possui a mesma a chance de passagem pelas membranas. Quatro exemplos possibilitam essa diferenciação: um protetor solar denominado Clear Gel, Nebacetin, Quadriderm e Omcilon. Colocar tais produtos na pele não garante a mesma chance de alcançar a corrente sanguínea. Lembrando que via tópica significa que o medicamento não deverá ser absorvido, embora isso possa ocorrer. 12 13 Por exemplo, uma pessoa com afta aplica a base lipofílica com uma droga lipofílica e isso não é tão absorvido, porque já está no seu ambiente de melhor absorção. Ela interage, por meio de ligações de Van Der Waals, com a sua própria estrutura, passando em parte, já que é lipossolúvel e pode interagir com as membranas celulares presentes na epiderme e na derme. Depois, ela consegue alcançar o tecido subcutâneo. Mas, não será tão fácil, a menos que seja uma exposição muito constante. Esse seria um fato intermediário de absorção. No caso do Quadrederm, em que a droga é lipossolúvel, mas a base é hidrofílica, existe a chance de passar, porque já não está tão solúvel e não interage com a ligação de hidrogênio com a água. Mas, quando encontra o estrato córneo, que tem membrana celular, parte do epitélio e depois alcança o tecido subcutâneo, percebe-se o potencial que essa formulação tem de permitir uma absorção mais alta do corticoide, principalmente em regiões em que o estrato córneo não é tão desenvolvido, como em regiões das pálpebras, virilha, axilas, escroto. Portanto, em peles que são mais fragilizadas há maior chance de travessia e efeito sistêmico do corticoide. Isso não se aplica ao Nebacetin. Se a substância é hidrofílica e a base é lipofílica, não será tão solúvel nesse meio, mas, por ser hidrofílica ela não consegue vencer facilmente as barreiras epiteliaispara alcançar a corrente sanguínea. Assim, substância de baixa absorção possui efeito mais local. Quando a substância é hidrofílica com a base hidrofílica, tem-se praticamente uma absorção nula. Portanto, a chance de absorção de uma substância lipossolúvel de um creme será maior quando a base é hidrofílica, como o caso do Quadriderm, recomendado para feridas em crianças. Isso acaba funcionando, em tese, por conter gentamicina com cetoconazol, antifúngico e antibacteriano. É preciso ter cuidado ao se utilizar a substância com um corticoide, cuja resposta inflamatória também é regredida, pois pode haver absorção dos corticoides, ainda que seja por via tópica.
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