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2 Ebook_Farmacocinética Clínica e Farmacodinâmica_Volume VI_Editado

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Vol VI
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ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico
FARMACOCINÉTICA CLÍNICA E FARMACODINÂMICA
Thiago de Melo Costa Pereira
Volume VI
Vitae Editora
Anápolis (GO), 2021
Professor Thiago de Melo Costa Pereira
Professor no Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico. Graduado 
em Farmácia pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Mestre em Ciências Fisiológicas 
na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Doutor em Ciências Fisiológicas na 
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Pós-Doutor em Farmacologia na Universidade 
de Santiago de Compostela (USC- Espanha). 
EXPEDIENTE:
Autor: ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico
Revisão Técnica: Farmacêutica Me. Juliana Cardoso
Produção: Vitae Editora
Edição: Egle Leonardi e Jemima Bispo
Colaboraram nesta edição: Erika Di Pardi e Janaina Araújo
Diagramação: Cynara Miralha
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FARMACOCINÉTICA CLÍNICA E FARMACODINÂMICA
Por Thiago de Melo Costa Pereira
INTERPRETANDO AS BULAS “FARMACOCINETICAMENTE” – DISTRIBUIÇÃO 
E BIOTRANSFORMAÇÃO
Neste volume, o objetivo é focar na interpretação de bulas, baseando-se em conceitos já 
vistos anteriormente. Toma-se o exemplo do Cloridrato de Fluoxetina para conhecer alguns 
termos utilizados nas bulas que, por vezes, passam despercebidos pelo clínico.
ABSORÇÃO
O Cloridrato de Fluoxetina é bem absorvido após administração oral. Sua absorção é 
retardada com alimento, mas a quantidade total absorvida não é alterada. Concentrações 
plasmáticas máximas são alcançadas entre seis e oito horas.
- Cloridrato: base fraca;
- Bem absorvida com administração oral: possui alta biodisponibilidade;
- Absorção retardada com alimento: se fosse colocar a área sob a curva, esse deslocamen-
to estaria um pouco mais para direita;
- A quantidade total absorvida não é alterada: ou seja, a área sob a curva não é alterada. 
Existe o seu deslocamento da direita para a esquerda, mas não tem alteração na AUC;
- Concentração plasmática máxima alcançadas das 6h às 8h: pode-se utilizar um termo 
para isso (Cmax). 
DISTRIBUIÇÃO 
É a característica da substância se difundir nos tecidos após chegar à corrente sanguínea. 
Liga-se firmemente às proteínas do plasma e distribui-se largamente. As concentrações 
plasmáticas estáveis são alcançadas após doses contínuas durante várias semanas. 
As concentrações plasmáticas estáveis, após doses prolongadas, são similares às concen-
trações obtidas em quatro a cinco semanas. A distribuição é feita pela fluoxetina livre. Já 
aquela ligada às proteínas permanece no plasma. Se é uma base fraca, ela vai ser ligar a uma 
proteína chamada glicoproteína ácida.
Concentrações plasmáticas estáveis são alcançadas após doses contínuas durante várias 
semanas. Isso está relacionado ao steady state. Se ele beira a uma meia vida de 200h, ela só é 
alcançada depois de semanas porque é preciso ser multiplicado 200 x 5= 1.000 horas, ou seja, 
As concentrações plasmáticas estáveis após doses prolongadas são similares às concentrações 
obtidas em 4 a 5 semanas. Logo, estima-se que, após a sexta semana, as concentrações estão 
estáveis. 
A figura abaixo mostra bem a distribuição. Entre os quatro indivíduos, qual deles está 
diante de um fármaco bem distribuído? Na quarta figura, o homem está com o fármaco bem 
distribuído. Distribuição refere-se ao grau de fuga do plasma em direção aos tecidos. Se ele 
entra bem nos tecidos dentro das células, ele é um fármaco de intensa distribuição. 
Na figura, tem-se um registro crescente de distribuição, que vai do menos distribuído ao 
mais distribuído. 
Os fatores que determinam distribuição são: 
Quanto maior o fator sanguíneo, maior a distribuição.
Quanto maior a permeabilidade dos capilares, mais distribuído o fármaco é para aquela 
região. Comparando-se, por exemplo, o cérebro com o fígado, percebe-se que no fígado 
existe maior chance de distribuição, pois ele possui mais capilares fenestrados. Já o cérebro 
possui barreiras hematoencefálicas, por isso, nem tudo se distribui facilmente nessa região. 
Quanto mais lipossolúvel é o fármaco, melhor sua passagem, pois ele é difusível por 
membranas. Algumas substâncias lipossolúveis, ao induzirem toxicidade, torna o fígado 
um alvo em potencial, pois possui muitas fenestrações e é um órgão extremamente vascularizado. 
Quanto menos ligado à proteína, mais fácil a passagem, pois a fração livre é que determina 
sua fuga do ambiente plasmático. 
Essas são características que nem sempre são independentes.
A partir dos valores obtidos da distribuição, é possível prever se o fármaco é mais retido 
no plasma ou se é distribuído mais facilmente.
A imagem abaixo apresenta o que está livre e o que está ligado à proteína. As partes 
verde ou branca são as proteínas plasmáticas. Assim, quem está na fração livre pode ser 
biotransformado, interagir com a célula efetora ou mesmo ser excretado. 
Na figura, observa-se ainda que, quando o fármaco tem muita forma livre, a concentração 
do plasma é alta, é ele que tem chance de exercer os seus efeitos. Já o que está ligado à proteína 
funciona praticamente como um reservatório, de modo que quando a forma livre entra nos 
outros tecidos, o que está ligado a proteína se descola lentamente. 
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Segue uma aplicação prática da área sob a curva. Observa-se que a administração do 
Viagra com o alimento é representada pela bolinha branca, já em jejum é representada pela 
preta. Quando a bula apresenta: “ao ingerir o Viagra deve-se ingerir sem refeição”, significa 
que a absorção cai. Por isso, é oferecido para o indivíduo o Sildenafil e, em outra situação, 
após a alimentação, fazendo uma razão de uma área sob curva sobre outra, para observar 
o impacto desse cenário.
O paper abaixo apresenta um teste de biodisponibilidade absoluta:
O gráfico apresenta o perfil da concentração plasmática média do Sildenafil, seguido da administração 
oral (sinalizada em branco) e administração endovenosa (sinalizada em preto). Ao comparar as 
administrações, percebe-se a biodisponibilidade absoluta. Assim, por meio dos valores mostrados 
na imagem, é possível saber o impacto do Sildenafil por via oral, o quanto se perde nesse tipo de 
administração (530/1291= 41% do medicamento absorvido e 59% é perdido nas fezes).
Vê-se ainda a concentração máxima (Cmax), o tempo necessário para alcançar a máxima 
concentração (Tmax), tempo de meia vida (em torno de 4 horas), o clereance (Cl) e a fração (F).
No exemplo abaixo, tem-se o exemplo do Tadalafil, um medicamento concorrente do Sildenafil. 
O tempo de meia vida é de 17,5 horas em indivíduos normais e 21,6 horas em idosos, enquanto o 
tempo de meia vida do Sildenafil é de 4 horas, ou seja, o primeiro medicamento tem meia vida quatro 
vezes mais alta. Essa longa meia vida provê uma janela terapêutica de 36 horas para o Tadalafil. 
Portanto, não se pode confundir meia vida com tempo de funcionamento.
Os riscos de uma longa meia vida precisam ser completamente elucidados, mas não parecem ter 
maior chance de mortalidade com o Todalafil. Uma diferença nesse tempo de meia vida é que, em 
tratamentos de emergência com nitratos, pode ser necessário um espaço de 48 horas após a ingestão 
do Tadalafil comparado com 24 horas de Sildenafil.
Ou seja, apesar de não haver diferença de periculosidade, por ter uma meia vida muito maior, é 
preciso ter cuidado. Sabe-se que o espaço de uso entre nitratos de Sildenafil aumenta a chance de 
ataque cardíaco reflexo, por isso, deve ser evitada a exposição em um espaço de 24 horas, já que 
possui meia vida de 4 horas (4x5=20 horas para o Washout completo). Já para o Tadalafil, o autor 
sugere que se espere no mínimo dois dias, ou seja, dobra-se a necessidade de retirada do Tadalafil, 
porque, ao ter uma meia vida mais longa, o seu Washout também é maior. O autor orienta a segurança 
nas 48 horas, mas é válido ressaltar que, ao multiplicar 17,5 por cinco, chega-se a 87,5, ou seja, quase 
quatro dias de influência domedicamento em indivíduos normais (não idosos). 
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GLICOPROTEÍNA P
Trata-se de uma estrutura que está presente em vários sítios do organismo humano, 
como no intestino, barreira hematoencefálica dutos biliares, fígado, rins, testículos, ovários, 
rins, placenta. É uma proteção perfeita, na medida em expulsam os xenobióticos. 
Abaixo, segue um paper sobre um estudo feito em camundongos, afirmando que a 
glicoproteína P aumenta a biodisponibilidade portal da Loperamida em camundongos 
por reduzido metabolismo do efeito de primeira passagem. 
A Loperamida (Imosec) faz parte do grupo dos opioides, mesmo assim é vendida livremente. 
Alguns estudos evidenciam que o medicamento não tem efeito central. Assim, foi feito 
um estudo com camundongos no qual um grupo tinha P-gp competente e o outro P-gp 
deficiente. Para estudar se aquele fármaco é alvo da glicoproteína P, uma maneira encon-
trada foi retirando a glicoproteína P do processo. Quando administrada por via oral no 
animal, aqueles com glicoproteína P apresentaram uma área sob a curva praticamente na 
metade dos que não tinham P-gp. 
No cérebro de animais que não têm glicoproteína P, a quantidade de Loperamida que 
atravessa é de 75 comparada a 18. As tabelas mostram a administração por via intravenosa 
(esquerda) e por via ora (direita). Após a via ora, a diferença é absurda (4.1 em quem tem 
o gene e 55.3 em que não tem). 
Essa variação é justificada pois o intestino desponta como uma barreira. Se é feito por 
via endovenosa, não passa pelo intestino e o impacto passa a ser menor. Mostra-se como 
a P-gp é importante em vários tecidos para evitar a sua distribuição plena. 
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Isso também foi observado no fígado e nos testículos, mostrando como a P-gp é relevante 
em vários tecidos para evitar sua distribuição plena. Em alguns casos, isso é muito 
importante, pois evita toxicidade por xenobióticos. Contudo, se a ideia é usar um quimio-
terápico tendo ação testicular e o medicamento quimioterápico é alvo da P-gp, o quadro 
pode ser complicado.
APLICAÇÕES PRÁTICAS
O esquema abaixo mostra a atuação de uma droga chamada de Tariquidar, um inibidor 
de glicoproteína P, por meio da qual foi avaliado o quanto o Verapanil é capaz de passar 
as membranas e se distribuir. Se houver P-gp inibida, o Verapanil vai entrar e não será 
possível sair, ficando acumulado nesse meio.
Imaginando que isso aconteça com células endoteliais do sistema nervoso central. 
Naturalmente, ao passar a primeira barreira, teria a maior chance de atravessar a barreira 
hematoencefálica. Com quantidades crescentes de Tariquidar, quanto mais imagens 
vermelhas, maior a presença do Verapanil no meio. 
Na figura C, é possível ver que, à medida que a concentração de Tariquidar aumenta, 
mais glicoproteína P está inibida, portanto ocorreu um aumento importante do Verapanil. 
Um outro trabalho mostra o oposto, em que alguns fitoterápicos podem aumentar 
a expressão da P-gp. Ao aumentar a expressão, em um teste de western blot feito em 
intestino de animais, em que o aumento da expressão de P-gp aumentaria a expulsão de 
fármacos administrados.
Existem diversos substratos dessa P-gp, como os contraceptivos orais, a Rapamicina e 
outros. Quando se usa indutores da glicoproteína P, espera-se falha terapêutica de tudo 
isso, como a gravidez, rejeição ao órgão de transplante, coagulopatias, pressão não controlada 
ou um quadro alérgico não controlado. 
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Abaixo, segue um exemplo de impacto grave. O primeiro gráfico mostra um paciente 
que tomava Ciclosporina e foi exposto à erva de São João. As concentrações de Ciclospo-
rina despencaram e, quando ele parou de ter contato, em um mês, tudo voltou ao normal 
e o indivíduo passou a ter a mesma dose. 
No segundo gráfico, o indivíduo também tomava Ciclosporina. Ao ter contato com a 
erva de São João, a Ciclosporina despencou e, ao parar de tomar a erva, a Ciclosporina 
voltou ao normal.
O problema é que, na fase em exposição ao fitoterápico, o paciente corria risco de rejeição 
ao órgão. Às vezes, o paciente espera por anos pelo transplante e, por conta de um fitote-
rápico, estimula a glicoproteína P e aumenta a expulsão do imunossupressor. 
A P-gp tem uma participação fundamental na integridade da barreira hematoencefálica. 
Na estrutura celular em azul da imagem abaixo, se for ampliada, é possível observar que, 
entre a barreira sangue – cérebro, existe a chance de as substâncias passarem (por portadores, 
transcitose, via paracelular ou por proteínas lipossolúveis). Vale lembrar que, indepen-
dentemente das formas de transporte, ainda existem as bombas de fluxo, capazes 
de expulsar o fármaco que venceu a barreira. Isso é alvo de investigação, pois existem 
muitos anticonvulsivantes são alvos da P-gp. Em alguns casos, o paciente toma Carbama-
zepina, Fenitoína ou Fenobarbital e não respondem a ele, em parte julga-se que seja pelo 
excesso de P-gp.
Quanto mais recente são os artigos, mais se mostra a participação da P-gp na expulsão 
de fármacos.
Um dado de 2020 apresenta a massa encefálica, mostrando que, nessa região, as células 
dificilmente vão passar. Essa barreira é feita por junções plenas entre as células, as tight 
junctions. Existe uma membrana basal por células que fazem um filtro para não passar 
qualquer coisa. Mas, nessas células endoteliais existe a P-gp e outra proteína semelhante, 
que foi encontrada em células cancerígenas da mama, com a mesma capacidade de expulsar 
fármacos, além das enzimas que biotransformam na célula endotelial. Extingue-se, assim, 
a ideia de que apenas o fígado faz esse processo de expulsão e biotransformação.
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Veja um exemplo que demonstra o impacto desse problema. Deseja-se que os anticon-
vulsivantes ultrapassem a barreira. No entanto, parte deles é impermeável por conta da 
P-gp que expulsa. Pacientes que não têm crises convulsivas controladas podem ter uma 
liberação excessiva de glutamato, que estimula o receptor, chamado NMDA, que ativa 
uma resposta inflamatória mediada por COX2 que aumenta a expressão de P-gp. Assim, 
quanto mais P-gp na região mais difícil é a entrada do anticonvulsivante, pois ele está com 
a sua expressão aumentada. O acesso ao sistema nervoso central passa a ser diminuído.
O paciente está com insucesso no tratamento para anticonvulsivantes. No momento 
do retorno do anticonvulsivante, é capaz dele funcionar cada vez menos, caso a crise se 
estenda, uma vez que a expressão de P-gp aumenta mediante a doença. Quanto menos 
controlada a doença estiver, mais P-gp, mais expulsão e menos acesso ao anticonvulsivante 
no sistema nervoso central. 
Outro aspecto relevante é a diferença entre os três medicamentos a seguir. Os três impedem o 
vômito, mas, para promover maior segurança, o ideal a Domperidona, usada inclusive na 
pediatria. Ela é mais utilizada nessa fase, porque tem maior peso molecular, o que impede de 
atravessar a massa encefálica, o oposto do que ocorre com a Metoclopramida. Essa, por sua vez, por 
ter menor peso molecular, atravessa facilmente a barreira hematoencefálica, aumentando a chance das 
chamadas Síndromes Extrapiramidais, acompanhadas de parkinsonismo, acatisia, dificuldade para 
manter o foco e para realizar movimentos rápidos, alternados e coordenados, entre outras.

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