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PRINCÍPIOS DE CIRURGIA TORÁCICA: Alguns procedimentos torácicos aparecem como valiosas armas nos tratamentos de emergência, nas vítimas de politraumatismo e em outras situações não traumáticas, sendo seu conhecimento fundamental para o médico que lida com urgências, como a punção pleural tanto diagnóstica como esvaziadora e a drenagem pleural. FISIOPATOLOGIA PLEURAL: o espaço pleural é praticamente virtual, existindo apenas um estreito “filme” líquido seroso entre as pleuras visceral e parietal, com função de lubrificação, podendo em situações patológicas sofrer acúmulo de líquido ou ar. O acúmulo de líquidos de diversos tipos na cavidade pleural, também conhecido como “derrame pleural”, promove um aumento na pressão hidrostática intrapleural, que por sua vez leva a um colapso do parênquima pulmonar adjacente. Isso equivale a uma compressão extrínseca do tecido pulmonar, que fica impossibilitado de realizar as trocas gasosas. Dependendo da quantidade de líquido acumulado e da velocidade desse acúmulo, ocorrerá uma alteração maior ou menor da capacidade de trocas gasosas. Dependendo das características macroscópicas do líquido obtido ou dos achados bioquímicos e de celularidade, ou ainda da presença de flora bacteriana, indica-se, em seguida à toracocentese, uma drenagem de maior permanência na cavidade pleural (drenagem pleural). Líquidos turvos ou purulentos, sangue ou linfa, assim como o ar, devem ter uma abordagem mais prolongada, por meio da inserção de um tubo de toracostomia conectado em um frasco com nível líquido. Também se julga adequado realizar esse tipo de drenagem pleural sob selo d’água, quando as toracocenteses são repetidas em derrames recidivantes, ou quando se pretende realizar posteriormente uma pleurodese por instilação de alguma substância irritante (talco, tetraciclina, bleomicina, nitrato de prata e outras) pelo dreno. Em algumas situações, a simples análise do líquido pleural não é suficiente para definir o diagnóstico, e nessas situações indica-se a biópsia da pleura, especialmente se as hipóteses diagnósticas forem neoplasias pleurais ou tuberculose. Dois tipos de biópsia são possíveis: à beira do leito, no mesmo procedimento da toracocentese, quando é usada uma agulha específica, chamada agulha de Cope ou por videotoracoscopia. PUNÇÃO PLEURAL: o acesso à cavidade pleural por meio de uma agulha é um procedimento invasivo, que pode ter finalidade tanto diagnóstica como terapêutica. A punção pleural (toracocentese) para fins diagnósticos deve ser indicada sempre que ocorrer acúmulo de líquido no espaço pleural sem causa clínica aparente, ou com característica recidivante ou persistente. Mesmo quando há motivos clínicos evidentes, como situações de marcada hipoproteinemia ou insuficiência cardíaca, os acúmulos de grandes quantidades de líquido devem ser esvaziados para promover um retorno ao melhor estado fisiológico possível. Entretanto, a avaliação radiográfica inicial poderá determinar uma conduta expectante se a quantidade de líquido acumulada for pequena. A punção pleural pode ser realizada com o paciente sentado com um apoio anterior para os braços ou em decúbito oblíquo com um coxim lateral elevando-se o hemitórax que se pretende abordar. A antissepsia deve envolver uma área ampla e não apenas o local da punção. A punção deve ser realizada com uma agulha de calibre adequado, para não ocorrer obstrução por coágulos de fibrina e sangue ou por secreção purulenta. Existem cateteres especiais para a punção pleural, mas cateteres de politetrafluoretileno (PTFE), habitualmente usados em punção venosa, podem ser usados e são muito úteis para diminuir a chance de lesão do pulmão com a ponta afiada da agulha, embora possam dobrar, produzindo uma obstrução ao fluxo do líquido. Para minimizar esse problema, pode- se realizar uma ou duas perfurações laterais no cateter de PTFE com uma lâmina de bisturi, para melhorar a vazão e evitar a obstrução. No paciente em posição sentada, a abordagem é dorsal, utilizando-se a extremidade inferior da escápula como ponto de reparo anatômico superior introduzindo-se a agulha cerca de 2 centímetros abaixo dela, o que, na maior parte dos indivíduos, equivale ao 7º ou 8º espaço intercostal. Na região dorsal, o músculo diafragma se insere mais inferiormente que na região anterior e lateral, criando um recesso mais baixo para onde o líquido costuma escoar e se acumular no paciente sentado. Embora a obrigatoriedade do exame físico pareça corriqueira e evidente, algumas complicações nesse procedimento podem ter seu início na inobservância desse preceito e na avaliação inadequada dos exames de imagem. Para diminuir a chance de ocorrer um acidente hemorrágico, um detalhe técnico muito importante é a realização da punção sempre na borda superior da costela, para evitar o feixe vasculonervoso. A introdução exageradamente profunda da agulha pode levar à perfuração do parênquima e produzir pneumotórax e/ou hemotórax. Nos indivíduos obesos, em gestantes ou na presença de ascite em que ocorre elevação do músculo diafragma, punção abaixo dos limites preconizados ou quando a agulha é muito introduzida ou direcionada para baixo, pode haver punção inadvertida da cavidade abdominal e perfuração de vísceras sólidas (baço, fígado com hemoperitônio) ou de vísceras ocas. Por isso, recomenda-se que a introdução da agulha pare assim que se obtenha o líquido e se mantenha na cavidade pleural somente a extremidade ou o material plástico/PTFE do cateter utilizado. A realização de uma boa anestesia local é muito importante, pois a dor é muito desconfortável, além de poder prejudicar a realização do procedimento. A anestesia local não deve ficar limitada à pele e ao tecido subcutâneo, pois alguns pacientes podem apresentar um quadro semelhante a uma síncope vasovagal, com sudorese fria, taquicardia e hipotensão arterial, associada à sensibilidade pleural. Quando isso ocorre, o procedimento deve ser interrompido, a agulha retirada da cavidade, o paciente colocado em posição supina e os membros inferiores elevados para melhorar o retorno venoso. O esvaziamento muito rápido do líquido acumulado está relacionado a outra complicação: o edema pulmonar. Esse evento é conhecido como “edema de reexpansão” ou edema ex vacuum e pode ocorrer em minutos ou até várias horas após o esvaziamento, trazendo grande prejuízo ao paciente. O doente apresentará tosse com expectoração rósea espumosa e dispneia de gravidade variada, podendo até mesmo ser fatal. Uma das formas de evitar essa complicação é deixar o líquido fluir lentamente pela ação da gravidade, gotejando em um frasco estéril apropriado. Também se pode controlar adequadamente o esvaziamento fazendo uso de uma torneira de três vias conectada a um equipo de soro e, com uma seringa de injeção, coletar o líquido da cavidade pleural e seguidamente empurrá-lo na direção do frasco. O pneumotórax pode ocorrer após a punção pleural como consequência de uma lesão ao tecido pulmonar produzida pela extremidade afiada da agulha de punção, ou, de uma forma menos grave, mas também importante, como decorrente da entrada inadvertida de ar do meio externo para a cavidade pleural. Uma vez que a agulha ou a extremidade plástica do cateter esteja na cavidade pleural, deve-se ocluir o orifício externo com o dedo até conectar o sistema para evitar a entrada de ar. Mesmo que o objetivo dessa punção seja terapêutico, recomenda-se que o material obtido com a punção seja enviado o mais rapidamente possível para a devida avaliação laboratorial. A punção pleural é considerada o primeiro procedimento na abordagem das doenças pleurais e é pré-requisito para a realização da drenagem pleural com dreno tubular. Porém, pode ser o único procedimento a ser realizado, uma vez que nem todos os tipos de derrame pleural necessitam de sistemas de drenagem de maior permanência. DRENAGEM PLEURAL: é definida como a introdução cirúrgica de um tubo estéril (dreno) de material o mais inerte possível,conectado a um sistema fechado e valvulado no espaço pleural, fazendo com que os líquidos e o ar possam apenas sair da cavidade e nunca entrar. Dessa forma, há um respeito à fisiologia normal do espaço pleural, uma vez que esse método promove a expansão do parênquima pulmonar de maneira eficaz e permanente, ao lado da possibilidade de contínua eliminação de líquido ou ar. As indicações para drenagem pleural são bem definidas. A presença de sangue, pus, linfa ou ar são as indicações clássicas. A presença de sangue na cavidade pleural (hemotórax) pode estar associada a uma lesão de maior gravidade. Entretanto, lesões de vasos sanguíneos de pequeno calibre, como artérias intercostais, torácicas internas (mamárias internas), veias intercostais ou mesmo lacerações do parênquima pulmonar também podem resultar em volumosos hemotóraces. Por outro lado, também se podem presenciar lesões graves parcialmente tamponadas em grandes vasos e até mesmo no coração, inicialmente associadas a pequenos sangramentos. Nos traumas (contusos ou penetrantes), o sangue está frequentemente associado ao acúmulo de ar por lesão concomitante do parênquima pulmonar ou pela solução de continuidade da parede torácica. Dependendo do volume de sangue perdido no espaço pleural, haverá um grau maior ou menor de alteração hemodinâmica e ventilatória. A drenagem quantificará o sangue perdido agudamente ou acumulado durante o tempo entre o trauma e a drenagem e permitirá uma avaliação constante por meio da medida do débito nas horas subsequentes. TIPOS DE DRENO E LOCAL DE DRENAGEM: • Tubulares com perfurações laterais; • Drenos de Wayne, popularmente chamados de pigtail (pelo seu formato de rabo de porco na parte distal). O dreno com maior utilização em drenagem pleural é o tubular, o qual será indicado em todas as drenagens de líquidos e nos pós- operatórios de cirurgia torácica, sendo também o dreno indicado nos casos de pneumotórax traumático, inclusive por barotrauma, visto que os traumas predispõem ao aparecimento de hemotórax subsequente. O calibre do dreno variará de acordo com o tamanho do paciente, podendo-se usar desde drenos tubulares calibrosos (meia polegada) até extremamente finos, como n. 8, em recém- nascidos. Sempre que se colocam drenos tubulares, deve-se utilizar uma localização inferior, sendo o local mais indicado o 4º ou 5º espaço intercostal na linha axilar de média para posterior, sempre na borda superior da costela. Nos casos de coleções pleurais septadas, introduz-se o dreno no local em que estiver a loja, na borda superior do espaço intercostal. Nesses casos, pode-se utilizar a ultrassonografia para orientação. Os drenos do tipo pigtail com calibre menor têm sido difundidos principalmente para o tratamento do pneumotórax, mas também podem ser utilizados para a drenagem de líquidos não muito espessos, como quilotórax ou derrames neoplásicos. Trata-se de drenos tubulares com perfurações laterais, porém com o segmento distal enrolado como um “rabo de porco” e com a ponta mais afilada que o restante do tubo. A técnica de inserção desses drenos é bem diferente, uma vez que se utiliza um “guia” metálico no interior do tubo para deixar o conjunto mais rígido, propiciando a introdução na cavidade por uma punção. O dreno é parcialmente tracionado e o segmento distal “enrolado” do dreno fica em contato com a pleura parietal. Esse procedimento tende a ser menos doloroso que a drenagem convencional. Em geral, os drenos tipo pigtail são fabricados para serem acoplados a um sistema de drenagem com uma válvula unidirecional “seca”, ou seja, sem o selo d’água (válvula de Heimlich). Essa válvula é composta de um conjunto de duas ou três lâminas de borracha montadas em uma câmara de plástico. Essas lâminas se fecham na inspiração, evitando a entrada de ar para o interior do sistema, e se abrem na expiração, proporcionando a drenagem do conteúdo pleural para uma bolsa graduada na extremidade final do sistema. De outra maneira, nada impede que esse tipo de dreno possa ser acoplado ao sistema clássico de drenagem em selo d’água. Apesar de práticos e mais modernos, esses drenos têm um custo elevado, o que inviabiliza seu uso na maioria dos serviços públicos. Outros tipos de dreno, como o dreno de Blake, eventualmente são usados na cavidade pleural, mas não são recomendados em emergências ou urgências, devendo ser reservados para situações eletivas bem específicas e de uso por especialistas. SISTEMA DE DRENAGEM: pelo fato de o tórax ser submetido a variações de pressão durante a mecânica respiratória, os drenos não podem, após a introdução na cavidade pleural, ser mantidos simplesmente abertos para o meio externo, pois, com os movimentos respiratórios (inspiração e expiração), o ar entraria e sairia pelo dreno, ocasionando um pneumotórax aberto, com consequente balanço do mediastino. Assim sendo, somente se pode utilizar a drenagem aberta do tórax quando existirem pequenas lojas pleurais com o restante das pleuras já aderidas ou em casos de encarceramento pulmonar. Nos demais casos, é obrigatório o uso de um sistema que, ao ser conectado com o tubo de drenagem, resulte em uma válvula unidirecional. Por isso, na grande maioria das drenagens pleurais, conecta-se o dreno a um sistema de drenagem sob selo d’água (definindo, assim, a drenagem pleural fechada). PRINCIPAIS VIAS DE ACESSO E SUAS INDICAÇÕES MAIS FREQUENTES: • Toracotomia lateral: também chamada de lateral poupadora, esta via de acesso é a mais comumente usada para abordagens pulmonares eletivas. É realizada entre os músculos peitoral maior e latíssimo do dorso, liberando, mas não abrindo, este último. Os resultados de dor e recuperação podem ser comparados aos das técnicas minimamente invasivas, e pode ser ou não associada a técnicas de preservação de nervos intercostais e outras técnicas para melhora da dor pós- operatória. • Toracotomia posterolateral clássica: assemelha-se à lateral, mas é ampliada anterior e posteriormente, criando uma figura de “S itálico”. Esta via de acesso promove um amplo afastamento das costelas, podendo se estender ao redor de toda a escápula até a artéria torácica interna, anterior. O músculo latíssimo do dorso é seccionado e o intercosto é todo aberto. Atualmente é utilizada nas ressecções de grandes tumores, principalmente com invasão de parede torácica. • Toracotomia anterior: realizada sob o peitoral maior, é a incisão de escolha para biópsias pulmonares pouco invasivas ou toracotomias de emergência, quando não há tempo para mudar de posição. • Toracotomia posterior: a abordagem posterior é realizada com o paciente em decúbito ventral (posição de Overholt), com incisão no trígono da ausculta. É muito indicada em pacientes com síndromes supurativas pulmonares e malformações esofágicas. • Esternotomia mediana vertical: incisão de uso corrente para cirurgias cardíacas, mas com muitas indicações em cirurgia torácica, como timectomias e ressecções de grandes tumores de mediastino e como opção na ressecção de metástases bilaterais. • Incisões combinadas: é possível combinar duas vias de acesso para um acesso ainda maior, como as incisões combinando toracotomia e esternotomia com uma incisão supraclavicular, para abordagem de tumor do estreito torácico superior. • Bitoracotomia com esternotomia mediana horizontal: incisão comum em transplantes pulmonares e usada ocasionalmente para a ressecção de tumores de mediastino anterior. É uma via que sempre deve compor o arsenal de recursos do cirurgião de trauma, que pode iniciar um procedimento por uma via anterolateral, mas necessitar ampliar, seccionando o esterno transversalmente e abrindo anterolateralmente o outro lado, proporcionando uma grande exposição do mediastino e de ambas as cavidades pleurais. TORACOTOMIA: A toracotomia é indicada em casos de sangramento intenso após drenagem do tórax, hemorragias volumosas, trauma de tórax, lesões graves no esôfago, traqueia e brônquios, hemotórax coagulado,entre outros. Existem diferentes tipos de toracotomia, como a de urgência e a ressuscitativa, cada uma com suas indicações específicas. A via de acesso preferencial em situações de emergência é a toracotomia anterolateral no 4º ou 5º espaço intercostal, que oferece boa exposição das estruturas torácicas e pode ser realizada rapidamente. Em casos graves, pode ser necessário realizar uma laparotomia simultaneamente para corrigir lesões abdominais associadas. Após a abertura da cavidade pleural, lesões hemorrágicas graves devem ser abordadas rapidamente, controlando-se o sangramento e suturando ou ligando as estruturas afetadas. É importante realizar os procedimentos com o máximo de cuidado e investimento possível para o restabelecimento do paciente, e apenas cirurgiões experientes devem realizar a toracotomia de emergência, mantendo sempre a crença nas possibilidades de vida do paciente.
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