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Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional. Sumário clicável O princípio essencial da negociação1. Estilos de negociação2. Sumário Negociação baseada em princípios3. Estratégias de negociação4. MÉTODO DE NEGOCIAÇÃO Voltar ao sum ário 4 Prezado(a) estudante, por meio deste Percurso de Aprendizagem, estudaremos temas bastante atrati- vos e interessantes, que nos darão uma nova visão sobre o processo de negociação. Iniciamos nossos estudos abordando o princípio essencial da nego- ciação, que é a comunicação eficaz com as partes envolvidas. Abordaremos os estilos de negociação com base no iceberg comportamental e também a negociação baseada em princípios (Harvard Nego- ciation), a qual preconiza sermos duros nos méto- dos e suaves com as pessoas, criando, assim, maior valor ao que é negociado. Para encerrarmos nossos estudos, estudaremos as estratégias de negocia- ção para se alcançar os objetivos previamente esti- pulados pelo negociador. Bons estudos! Olá O princípio essencial da negociação1. Prezado(a) estudante, a negociação consiste em relacionamento e diálogo, e uma das bases do relacionamento é a comunicação. Você já avaliou como está a sua comunicação atualmente? Será que as pessoas entendem realmen- te o que você diz? A comunicação é o processo pelo qual uma ideia é transmi- tida de uma fonte para um receptor. A princípio, parece simples, no entanto, é mais complexo do que aparenta. Há uma pas- sagem bíblica, no Livro de Gênesis, a qual mostra a ocasião em que Deus quis castigar os homens por construírem a Torre de Babel, e a penalidade imposta foi justamente na área da comunicação. De repente, as pessoas começaram a falar várias línguas diferentes e o entendimento tornou-se praticamente impossível. E como está o processo de comunicação na sua casa? E na sua empresa? Será que, em- bora falando o mesmo idioma, as pessoas não andam se confundindo? Essa reflexão é importante, pois em muitos casos pensamos que a nossa comunicação é a ideal e, na verdade, aqueles à nossa volta não entendem perfeitamente. Voltar ao sum ário 5 De acordo com Martinelli e Ghisi (2006), a comunicação é um dos componentes essen- ciais do processo de negociação. Até o desfecho de um conflito estabelecido, há, inva- riavelmente, eventos múltiplos de comunicação, que podem ou não ser independentes entre si. Por essa razão, é de fundamental importância a compreensão das inúmeras influências de cada componente do processo de comunicação. Nesse sentido, é perfeitamente compreensível afirmarmos que o princípio essencial da negociação é a comunicação. A comunicação não é representada por aquilo que você disse, mas sim pelo que a outra parte entendeu. O processo de comunicação tem a forma da Figura 1, abaixo: Figura 1 – O processo de comunicação FFeedBackeedBack EmissorEmissor CodificaCodificaçãçãoo MensagemMensagem DecodificaDecodificaçãçãoo FFeedBackeedBack RespostaResposta RuRuíídodo MeioMeio Fonte: Adaptado de Wanderley (1998, p. 90). A comunicação é fundamental para o sucesso do processo de negociação. Nesse senti- do, Martinelli e Ghisi (2006, p. 62) enfatizam a estreita relação entre negociação e comu- nicação: Algumas definições importantes de negociação trazem as relações entre os pro- cessos de negociação e de comunicação. Negociação pode ser entendida como um processo de comunicação bilateral, com o objetivo de chegar a uma decisão conjunta entre as partes2. Outra definição para negociação e que apresenta essa relação é a seguinte: negociação é um processo de comunicação a fim de atin- gir um acordo agradável sobre diferentes ideias e necessidades. (MARTINELLI E GHISI, 2006, p. 62) Quando ocorre a transmissão de uma ideia para um receptor e este não capta com cla- reza, dizemos que houve uma distorção na comunicação ou um ruído. Para evitar essa ocorrência, é importante procurar saber o que o receptor captou da mensagem enviada, obtendo-se, desta forma, um feedback. Voltar ao sum ário 6 Diariamente somos bombardeados por diversas informações, que são enviadas pelos mais diversos modos, como, por exemplo, pelo rádio, por email, pelo whatsapp, pela in- ternet, enfim, há um turbilhão de mensagens enviadas. Em alguns, um gestor envia um email com uma informação e acredita que está tudo resolvido. No entanto, é essencial que seja checada a informação junto ao receptor, para verificar se ele realmente recebeu e entendeu a mensagem. Wanderley (1998) destaca que, em alguns casos, uma palavra pode ter significados dia- metralmente opostos. O termo “rudimentar”, por exemplo, pode significar tanto essencial ou básico quanto rudimentar. Além disso, as palavras adquirem novos significados de geração em geração. Azarar, que significara dar azar, má sorte, hoje em dia tem um novo significado, que é paquerar, arrumar namoro ou aventura amorosa. Qual o significado que o receptor dará, por exemplo, à sua mensagem enviada? Dependerá de sua idade, forma- ção, cultura e outras influências. Portanto, é importante ficar atento. De acordo com Martinelli e Ghisi (2006), saber utilizar a comunicação de maneira ade- quada, aproveitando suas variadas possibilidades, é um desafio para qualquer pessoa envolvida em uma negociação. Afinal, o sucesso de toda negociação está condicionado à ocorrência de um efetivo diálogo entre as partes envolvidas. Na função de criadora de identidade, por exemplo, uma comunicação eficaz pode auxiliar na criação, no interlocutor, da imagem que o negociador pretende formar de si mesmo, pois é por meio da comunicação que se manifesta, inclu- sive, o estilo — confrontador ou cooperativo — de quem trabalha na solução de um conflito. No que tange ao entendimento da mensagem, a partir da sua emissão até o entendimen- to pelo receptor, Wanderley (1998, p. 92) destaca: Existem três mecanismos que contribuem para o entendimento da mensagem: distorções, omissões e generalizações. Algumas mensagens são distorcidas em função de nossos estudos mentais, expectativas ou das óticas das nossas espe- cializações. Como ouvintes, algumas vezes projetamos nossas próprias ideias na mensagem de outras pessoas, ouvindo apenas aquilo que desejamos ouvir, o que também pode ser condicionado pela nossa formação. Assim, numa empresa, as pessoas de cada departamento como vendas, produção e finanças, tendem a perceber a realidade pela ótica das suas funções. (Grifou-se) No cotidiano corporativo, é muito comum os negociadores darem atenção excessiva à comunicação formal, sem ter, no entanto, o devido cuidado com as mensagens levadas Voltar ao sum ário 7 e trazidas por “mídias” informais. De igual modo, pouca atenção é dada aos elementos que interferem no conteúdo das mensagens ou mesmo na percepção do receptor (o alvo da comunicação). Martinelli e Ghisi (2006) enfatizam que, habitualmente, falta um feedback adequado, para que o emissor tenha condições de avaliar se sua mensagem foi, de fato, bem compreen- dida e quais impactos reais ela teve sobre a outra parte envolvida no processo. A esse respeito, destaca-se que a comunicação, especialmente o “saber ouvir”, é um instrumento essencial para identificar as necessidades das outras partes presentes na negociação. Comunicar-se de forma eficaz envolve: a. a escolha do canal adequado; b. a elaboração do conteúdo da mensagem (escolha das palavras certas); c. a identificação e redução de ruídos e interferências; d. o feedback (ou realimentação) por meio do qual se pode confirmar se a de- codificação da mensagem, pelo receptor, se deu da maneira esperada pelo emissor (MARTINELLI; GHISI, 2006, p. 64). Embora existam treinamentos constantes nas organizações empresariais a respeito das práticas e dos cuidados inerentes à boa comunicação, o ritmo intenso do cotidiano aca- ba induzindo os mais variados profissionais ao erro. A comunicação é uma ferramenta essencial à negociação e deve ser tratada com todaa atenção possível. Por menores que sejam as falhas cometidas nessa área, as consequências podem ser desastrosas, com resultados impactantes negativamente. O negociador como emissor de informações: a comunicação pressupõe que duas ou mais partes produzem entre si um entendimento recíproco a partir de trocas simbólicas. A comunicação pode ser definida como um comportamento intencionalmente produzido, com o objetivo de compartilhar uma determinada finalidade, explícita ou não. Esse com- portamento intencional é expresso na forma de mensagens (verbais e não verbais), trans- mitidas entre um emissor e um receptor, levando este último a modificar o seu padrão de comportamento em resposta. No tocante à conclusão do processo de comunicação, ou seja, quando o negociador tem certeza de que sua mensagem foi recebida e compreendida, é importante destacar que: [...] só há um processo de comunicação quando, de alguma forma, o conteúdo da mensagem é interpretado pelo receptor, ou seja, quando é observada uma resposta ao efeito da mensagem. Esta deve ser, pois, uma preocupação impres- cindível do executivo envolvido em um processo de negociação (MARTINELLI; GHISI, 2006, p. 68). Voltar ao sum ário 8 Que a comunicação é a base para o transcorrer de uma negociação de sucesso, não há dúvidas! Não é mesmo? Afinal, é por meio da comunicação que transita a informação – principal insumo de qualquer processo de negociação – com os demais envolvidos. Nesse sentido, Carvalhal (2012, p. 76) enfatiza: Por meio da comunicação nas negociações são emitidas, transmitidas, recebi- das, codificadas e decodificadas as mensagens que, portanto, são interpretadas e reinterpretadas num fluxo contínuo. A interpretação das mensagens é a chave para a adequada análise do que é realmente informação nas negociações. (Car- valhal, 2012, p. 76) As principais características de comunicação que precisam ser trabalhadas e fortaleci- das pelos gestores, líderes e negociadores são: facilidade na exposição oral, facilidade de exposição escrita, objetividade, sensibilidade para captar o que a outra parte expressa, expor claramente ideias e opiniões, ser um bom ouvinte, controlar as emoções. Tal co- nhecimento favorece a posição relacional do negociador. Nesse contexto, Carvalhal (2012, p. 76) destaca a importância desse tipo de conhecimen- to para a obtenção da vantagem competitiva, por menor que seja, em um ambiente de negociação: É claro que certo conhecimento sobre comunicação não verbal e a linguagem do corpo é de grande utilidade na vida profissional. Compreender as motivações, os receios e os pontos fortes das pessoas que participam de grupo de candidatos a empregos ou situações onde haja negociações é um trunfo considerável no mundo ocupacional. A observação dos mais sutis movimentos na linguagem do corpo, enquanto ela acompanha a fala, pode ser uma das melhores maneiras de se obter vantagem. E o conhecimento sobre a linguagem do corpo pode ainda ajudar uma pessoa a melhorar seu desempenho em conferências, avaliações e mesmo nas situações do dia a dia. (CARVALHAL, 2012, p. 76) (Grifou-se) Alguns autores defendem que o “corpo fala”, em outros termos, uma observação atenta das reações de um indivíduo enquanto se expressa durante uma rodada de negociações pode ser a fonte de obtenção de importantes informações que certamente propiciarão vantagem ao observador mais atento. No que se refere à comunicação do corpo, ou da linguagem corporal, Carvalhal (2012, pp. 76-77) descreve: Voltar ao sum ário 9 Por meio da leitura da linguagem corporal do interlocutor (expressões faciais, alterações do ritmo respiratório, gestos, movimentos da cabeça, transpiração, movimentos dos olhos, postura, proximidade física ou rubor), o negociador pode obter sinais de maior ou menor adesão a um argumento que precede determina- da posição. Suas reações podem traduzir emoções (surpresa, raiva, tédio, ansie- dade, culpa, vergonha, constrangimento ou alegria), que significam aprovação, desconforto ou insatisfação com o rumo que as negociações estão tomando. (CARVALHAL, 2012, pp. 76-77) O corpo fala de um modo geral, emite sinais Por exemplo, quando nosso interlocutor está receptivo, ele frequentemente dá sinais, como sentar-se inclinado para frente (a proximidade sugere uma indi- cação de satisfação ou intimidade), apresentar um tom de voz suave, balançar a cabeça, acenando positivamente; aumentar o contato visual e sorrir (o olhar pode ser encorajador), tocar o queixo e a testa e descruzar as pernas. No en- tanto, quando o interlocutor não está receptivo, ele normalmente emite sinais, como girar o rosto na direção da porta, cruzar os braços ou os pés, reduzir o contato visual, mostrar-se disperso e movimentar-se com nervosismo (CAR- VALHAL, 2012). Um negociador experiente tem a habilidade de se concentrar nos aspectos verbais, ou seja, naquilo que é falado, mas também nos aspectos não verbais, simultaneamente. No jargão corporativo, costumamos dizer que o negociador fica com um olho no peixe e ou- tro no gato. Afinal, ele precisa extrair as informações importantes da outra parte e sempre estar na vantagem para o sucesso do seu trabalho. Em uma negociação não é fácil manter a outra parte atenta e conectada ao que se está discutindo, afinal, as motivações e interesses envolvidos são bastante distintos. Uma ferramenta comumente utilizada como modelo, para manter o interesse e a atenção, é o modelo AIDA, por meio do qual busca-se atrair a atenção, obter o interesse, despertar o desejo e incitar à ação. Esse modelo é válido para qualquer processo de comunicação, e pode ser muito útil em uma negociação. Por meio do Quadro 1, são ilustrados os seus elementos principais: Voltar ao sum ário 10 Quadro 1 – Etapas para se chegar a um acordo Fonte: Martinelli; Ghisi (2006, p. 71) É essencial ressaltar que os estágios “atenção”, “interesse”, “desejo” e “ação” formam uma hierarquia linear. Negociadores atentos devem orientar a elabora- ção de suas mensagens respeitando essa sequência, fazendo com que a outra parte passe por cada um desses estágios durante a negociação, a fim de não precipitar acordos — piores do que o pretendido. Dessa forma, para aceitar um acordo, a outra parte deve: Fonte: MARTINELLI; GHISI, 2006, p. 71. Caro(a) estudante, é relevante o destaque de que a atenção, o interesse, o desejo e a ação somente serão despertados caso aquilo que é oferecido em uma negociação puder, de algum modo, satisfazer as necessidades do cliente. Por essa razão, é necessário o desenvolvimento da capacidade de perguntar e saber ouvir, obtendo-se, assim, as infor- mações para a elaboração de uma mensagem que vá ao encontro dessas necessidades. Cresce, desta forma, a importância da habilidade do negociador, principalmente no que- sito comunicação. Voltar ao sum ário 11 A qualidade da comunicação em uma negociação depende tanto de um nível de entendi- mento mútuo quanto da eficiência do processo. Por isso, a escolha do canal de comuni- cação pode facilitar ou dificultar o entendimento da mensagem. Nesse sentido, Wander- ley (1998) apresenta algumas sugestões para que o processo de comunicação seja uma solução e não um problema a mais: • Fale com um objetivo. Defina com clareza o propósito de sua comunicação. • Considere que a efetividade da comunicação está na resposta que ela provoca e não na sua intenção. Se você quis elogiar uma pessoa e ela se sentiu ofendida, não importa qual era a sua intenção, você ofendeu a pessoa. Fique atento aos impac- tos da sua mensagem no receptor. • O emissor, e não o receptor, é responsável pelo entendimento da mensagem. Por- tanto, não culpe o receptor pelo não entendimento da sua mensagem. Pergunte-se: “Quando uma ideia é clara para mim, também é clara para os outros, ou seja, me fiz entender?” • O significado está nas pessoas e não nos símbolos. Cada pessoa pode ter uma compreensão diferente da mesma palavra. • Procure analisar se compreendeubem o que a outra pessoa quis dizer, sem julgar nem avaliar, antes de analisar a mensagem sob seu ponto de vista e responder. Procure realmente ouvir o ponto de vista do emissor. Não é possível ser ao mesmo tempo plenamente receptivo e emissivo. • Respeite os sentimentos dos outros quando são diferentes dos seus. Crie um cli- ma que facilite a comunicação. • Esforce-se conscientemente para construir possibilidades de retroalimentação (feedback) nas comunicações ineficientes. • Escute ativamente e registre o que está sendo dito. • Utilize os sentidos para fazer entender a sua mensagem. Além de falar, utilize recursos visuais ou quaisquer elementos que considerar convincentes ou neces- sários. • Utilize o mecanismo básico para obtenção de resultados. Se a resposta que você está obtendo não é a que queria, mude. Arranje outras formas de se fazer entender. Não fique repetindo uma coisa que não está dando certo (Adaptado de Wanderley, 1998, pp. 94-95). Voltar ao sum ário 12 Estilos de negociação2. Caro(a) estudante, as pessoas com as quais lidamos em nosso cotidiano são diferentes, pensam e agem cada qual de forma diferente da nossa. Portanto, em uma negociação, precisamos compreender essas diferenças comporta- mentais de modo a alcançar nossos objetivos e a obtenção do sucesso no processo. De acordo com Wanderley (1998, p. 103), “entender comportamen- tos para poder negociar conforme o estilo do outro negociador faz uma boa diferença”. De acordo com Wanderley (1998), não são as intenções que importam, mas sim os com- portamentos efetivos e as implicações decorrentes deles, ou seja, as respostas que obte- mos, conforme exemplificado abaixo: Assim, se quero elogiar alguém, mas esta pessoa se sente ofendida, eu, de fato, a ofendi, mesmo que a minha intenção tenha sido de elogiá-la. Daí a expressão: “De boas intenções o inferno está cheio”. Portanto, se pretendo uma negociação com resultado ganha/ganha, ou seja, que atenda aos interesses legítimos das partes, quero que tanto o meu comportamento quanto o do outro negociador sejam de cooperação (WANDERLEY, 1998, p. 48) (Grifou-se). Quando nos referimos ao estilo de negociação, inevitavelmente estamos tratando do comportamento do indivíduo. O comportamento de um indivíduo é função de dois fa- tores: a realidade externa e sua realidade interna. Nesse contexto, a realidade externa é descrita da seguinte forma: Por realidade externa entendemos o ambiente onde a pessoa se encontra. Isto quer dizer que nossos comportamentos não são independentes do ambiente onde nos encontramos, ao contrário, são bastante influenciados por ele, embora nós, frequentemente, não percebamos esta influência, chegando mesmo a ponto de negá-la. O ambiente nos fornece uma série de estímulos e gatilhos. Existe aqueles que nos fazem bem, enquanto outros nos causam profunda apreensão e desestímulo, como palavras assassinas (WANDERLEY, 1998, p. 48) (Grifou-se). Um outro fator que é determinante no comportamento dos indivíduos é a territorialidade, termo representado pela tendência do ser humano e de vários animais de estabelecer e defender uma área em particular ou território. Voltar ao sum ário 13 Em geral, nosso desempenho é melhor quando atuamos “em casa”. Como exemplo, pense no resultado das equipes de futebol quando atuam em seus estádios. Normalmente vencem seus adversários com mais facilidade do que se jogassem no território adversário. Devemos sempre diferenciar comportamento de realidade interna. Mas afinal, o que é comportamento? De acordo com Wanderley (1998, p. 49), “comportamento é toda manifestação de uma pessoa que podemos captar por um dos cinco sentidos – gestos, expressões, respiração e voz, por exemplo”. A realidade interna é assim descrita por Wanderley (1998, p. 49): “realidade interna é tudo o que não podemos perceber pelos sentidos e só sabemos quando se transforma em comportamento [...]. O comportamento é a parte visível do iceberg”. (Grifou-se) Por meio da Figura 2, o iceberg comportamental é mais bem ilustrado: Figura 2 – Iceberg comportamental na negociação Fonte: Wanderley (1998, p. 49) Caro(a) estudante, conforme descrito na Figura 2, percebemos que a realidade interna é a parte invisível, mas que influencia diretamente no comportamento do indivíduo em um processo de negociação. Se quisermos compreender o comportamento de uma pessoa, é necessário que conheçamos os componentes ocultos no iceberg, os quais têm forte influência no estado mental de cada do indivíduo. São eles: a percepção, as expectativas, Voltar ao sum ário 14 as emoções/sentimentos/desejos, os metaprogramas, as crenças/valores e as necessi- dades. Os elementos ocultos do iceberg comportamental são assim descritos: 1. PERCEPÇÃO: percepção é a chave do comportamento, ou seja, as pessoas não se comportam de acordo com a realidade objetiva ou externa, mas sim de acordo com a realidade percebida. Embora sejamos influenciados pela realidade externa, cada um de nós recebe essa influência de forma própria, que é a maneira como nós interpretamos essa realidade. Assim, se considerarmos a realidade externa ou objetiva como sendo o território, e a realidade interna como sendo o mapa que formamos desta realidade, cons- tatamos que nós agimos em função do mapa da realidade que construímos em nossa mente. E é preciso que tenhamos em conta que duas pessoas não formam um mesmo mapa de uma mesma realidade, haja vista um acidente de automóvel com várias teste- munhas, em que cada uma tem uma versão diferente do acidente. IMPORTANTE Existem três mecanismos básicos que transformam o território no nosso mapa mental: omissão, distorção e generalização, isto é, ten- demos a omitir informações, sobretudo aquelas que nos desagra- dam. Distorcemos a realidade em função dos demais elementos do iceberg comportamental e generalizamos, ou seja, a partir de al- guns fatos tiramos conclusões que muitas vezes são apressadas e sem consistência. Convencido de que as pessoas se comportam de acordo com o mapa e não com o terri- tório, e compreendendo seus mecanismos, um famoso político mineiro costumava dizer: “O que importa não são os fatos, mas a versão”. Entender isso é extremamente importante, já que o nosso organismo age de acordo com o que percebemos ou interpretamos da realidade. Assim, se você estiver passando por uma rua mal iluminada e, em sua direção, vier outra pessoa que você suponha ser um assaltante, todo o seu organismo entrará em estado de alerta e vários hormônios serão injetados na sua corrente sanguínea, como o ACTH, a adrenalina e os corticoides. Seu organismo ficará pronto para a ação. Seu coração baterá com mais força. Não importa se a pessoa que caminha em sua direção seja ou não um assaltante. O que importa é que você supôs que era, e o sinal de perigo foi acionado. Posteriormente, você poderá verifi- car que se tratava de um pacato cidadão (WANDERLEY, 1998, pp. 49-50). Voltar ao sum ário 15 2. EXPECTATIVAS: nós costumamos ver aquilo que esperamos ver, e não vemos aquilo que não esperamos ver. Certa vez, foi feita uma experiência num hospital psiquiátrico. Pessoas perfeitamente normais simularam certos desvios de comportamento a fim de ser internadas. Uma vez internadas, contaram que tudo não passava de uma experiência acadêmica e passaram a se comportar normalmente. Os psiquiatras não acreditaram na história e consideraram tudo aquilo como mais uma evidência de distúrbio mental. Eles esperavam que aquelas pessoas fossem desequilibradas e nada que indicasse o contrá- rio poderia ser levado em conta. E isso apesar de todo o treinamento profissional. Ou, quem sabe, por causa dele. IMPORTANTE Uma outra faceta das expectativas é o chamado Efeito Pigmaleão, que consiste em transformar em realidade aquilo que se espera seja a realidade. Foi feito um teste na Universidade de Harvard com alunos de uma escola primária. Eles foram escolhidos aleatoriamente, independentemente deseus níveis de inteligência e ca- pacidade, e distribuídos em duas classes. Uma professora foi incumbida de desenvolver um programa com as duas turmas. Disseram a ela, que não conhecia os alunos, que a turma A era composta de alunos excelentes e a turma B, de alunos problemáticos. Algum tempo depois, os alunos das duas turmas submeterem-se a um teste: os da classe A ob- tiveram notas consideravelmente melhores do que os alunos da classe B. Isso significava que a professora havia transformado em realidade aquilo que ela esperava que fosse a realidade, por isso adotara um tratamento diferenciado para os alunos de cada classe. Os alunos da classe A eram incentivados, e os da classe B, admoestados, reprimidos e desvalorizados (WANDERLEY, 1998, pp. 50-51). 3. EMOÇÕES, SENTIMENTOS E DESEJOS: Sonhos, esperanças, medos, frustrações. O ser humano é cheio de sentimentos, desejos e emoções, que também compõem as relações humanas. Os sentimentos que temos pelas pessoas determinam a nossa compreensão dos seus atos. Um mesmo ato pode ser considerado de várias formas. Se gostamos de alguém, nossa propensão é só ver seus pontos positivos e negar ou justificar seus pontos negativos. Ao contrário, se não gostamos de alguém, tendemos a ser intolerantes e a ver apenas os seus defeitos. Voltar ao sum ário 16 Assim, se você perguntasse a uma pessoa conhecida “Você viu alguém do- brando a esquina?)”, e a resposta fosse “Eu não sei. Quando eu cheguei ela já estava dobrada”, qual seria sua reação? Depende dos seus sentimentos em relação à outra pessoa. Se fosse amiga, você daria uma boa risada, acharia que ela tem um fino senso de humor e iria em frente. Mas se fosse uma pes- soa com quem você não tem um bom relacionamento, por julgá-la irônica e debochada, você se sentiria profundamente insultado e agredido. Assim, um mesmo fato pode ter interpretações extremamente diferentes. Tudo depende do tipo de relacionamento que as pessoas têm, dos sentimentos e emoções que fluem entre elas. Quando o pianista português sentou-se afastado do piano e puxou-o, em vez de aproxi- mar-se dele, todo mundo comentou: “Como é burro este português”. Quando o pianista russo fez a mesma coisa, o comentário foi: “Como é forte este russo” (WANDERLEY, 1998, pp. 51-52).' 4. METAPROGRAMAS: outro fator que influencia percepção, julgamentos e ações são os nossos metaprogramas, programas interiores que usamos para decidir em que devemos prestar atenção e a forma como organizamos e processamos informações. São, portanto, padrões interiores, profundamente arraigados, que influenciam a forma- ção do mapa mental de uma pessoa e a definição dos seus comportamentos. Podemos considerá-los uma espécie de software mental. Assim, quando nos comunicamos com al- guém, se usarmos o programa adequado para aquela pessoa, seremos entendidos. Mas, se usarmos o errado, comprometeremos o relacionamento e poderemos até entrar em conflito. Em geral, os metaprogramas são compostos por pares de elementos. Os prin- cipais tipos de metaprogramas são: Aproximação e afastamento: aproximação é a tendência de buscar alguma coisa, mover-se em determinada direção e procurar fazer certo. Afastamento é a tendência de evitar erros. Existem pessoas que agem buscando o prazer, ou- tras fogem da dor e do desprazer. Assim, algumas pessoas compram um carro porque ele é confortável, tem um ótimo desempenho e uma bela aparência. Já outras compram um carro porque ele é seguro, consome pouco combustível e não tem problemas de manutenção. Voltar ao sum ário 17 Introvertidos e extrovertidos: introvertidas são as pessoas voltadas basica- mente para seus interesses, preocupadas em vencer. Extrovertidas são as pes- soas voltadas para os outros, para os relacionamentos. Nos casos extremos, os introvertidos seriam os grandes egoístas e os extrovertidos, os mártires. É conveniente ressaltar que as definições introvertido e extrovertido, no que se refere aos metaprogramas, são diferentes das definições usuais para estes termos. Internos e externos: Internas são as pessoas autorreferentes, que tomam suas decisões com os elementos que têm dentro de si, sem buscar apoio em ou- tras pessoas. Já os externos estão muito voltados e atentos para as opiniões das outras pessoas. Assim, para convencer um interno, é preciso procurar ar- gumentos baseados em dados que ele já tem como referência interior. Para um externo, as opiniões, considerações e comportamentos de outras pessoas têm um peso muito significativo. Associadores e dissociadores: Associadoras são pessoas que enxergam semelhanças e estão mais voltadas para o global. Dissociadoras percebem diferenças e estão mais voltadas para os detalhes. Os associadores veem a floresta. Os dissociadores, as árvores. Se mostrarmos moedas para ambos, os associadores dirão que são moedas redondas e com duas faces. E os disso- ciadores dirão que elas têm tamanhos e valores diferentes e que foram cunha- das em épocas distintas. O que temos de fazer para convencer alguém: Este metaprograma está rela- cionado ao número de repetições que temos de fazer para impactar alguém, ao tempo de aceitação de cada pessoa e aos canais sensoriais que devem ser empregados. Existem pessoas às quais basta falar uma ou duas vezes sobre os benefícios de alguma coisa, enquanto outras necessitam ouvir mais vezes, mesmo que a mensagem já tenha sido entendida anteriormente. O tempo de aceitação está ligado ao tempo de assimilação de novas ideias, que pode ser bastante diferente para cada pessoa. Algumas aceitam de imediato, enquanto outras po- Voltar ao sum ário 18 dem ser bem lentas. Os canais sensoriais visual, auditivo e cinestésico auxiliam a pessoa a receber mais intensamente as mensagens. O canal cinestésico envolve o tato, o olfato, o paladar e as emoções. Todos nós temos uma combinação dominante desses metaprogramas. Assim, podemos ter, por exemplo, os metaprogramas extroversão, associação e aproximação. Por outro lado, cada um de nós não tem o metaprograma puro. Um interno, por exemplo, pode ser 80% interno e 20% externo, ou seja, sempre temos alguma coisa dos dois elementos do metaprograma (WANDERLEY, 1998, pp. 52-54). 5. CRENÇAS E VALORES : Uma empresa brasileira ofereceu alguns presentes típicos aos negociadores de um país árabe e, entre eles, um disco de um cantor bastante conhecido. Mas ninguém percebeu que na foto da capa o cantor estava usando um chapéu com uma estrela semelhante à estrela de Davi. O resultado foi um profundo mal-estar. Valores e crenças são formados por educação e cultura e definem o que é importante para nós. Crenças são generalizações que fazemos a respeito do mundo, de nós mesmos, das pessoas, do que é certo ou errado e de como as coisas devem ser ou funcio- nar. Nossas crenças são muito fortes e nem sempre temos consciência delas. Há duas expressões que mostram isto. A primeira diz: “Quer você acredite que pode, quer você acredite que não pode, você esta certo”. A outra diz: “Contra crenças não há fatos”. Isto é, contra fatos existem as crenças. Valores são as prioridades que damos às crenças. Existem crenças que julga- mos mais importantes do que outras. Valores são nossas prioridades compor- tamentais . Assim, se eu tenho como valor ajudar os outros e, de fato, eu não os ajudo, isto significa que ajudar os outros não é um valor efetivo para mim. É um valor “fantasia”. Pode ser uma boa ideia, mas não é um valor ou uma crença. Nossos valores estão relacionados ao tempo que dedicamos efetivamente a eles e ao peso que assumem quando temos de decidir alguma coisa. Voltar ao sum ário 19 A importância das crenças para o nosso sucesso ou fracasso é relatado por Robert Dilts, terapeuta especializado no assunto. A mãe de Dilts tinha um câncer de mama que se es- palhou para o crânio, espinha dorsal, costelas e pélvis. Para os médicos, o melhor a fazer era proporcionar a ela o máximo conforto possível, enquanto o fim não chegasse. Dilts trabalhouintensamente com sua mãe, os sistemas de crenças dela sobre si mesma e sobre sua doença, ajudando-a a modificar algumas crenças limitadoras e a integrar con- flitos importantes. Como consequência das mudanças em suas crenças, a saúde dela teve uma melhora fantástica, e ela se recuperou completamente, sem nenhum sintoma de câncer. Existem algumas crenças que são extremamente úteis quando se quer alcan- çar resultados significativos. Entre elas destacamos: 5.1 – Considerar tudo o que nos acontece como uma oportunidade, como na his- tória de Milton Erickson, psiquiatra e um dos pais da hipnose moderna. Sua con- tribuição é uma das bases da Programação neurolinguística. Aos 17 anos sofreu uma paralisia infantil de alto grau e ficou imobilizado numa cama. A partir dessa si- tuação, começou a desenvolver a sua acuidade sensorial de tal forma que percebia que as irmãs diziam sim quando queriam dizer não, que o andar de seu pai indicava seu estado de espírito e até o cômodo da casa para onde ele se dirigia. Erickson reaprendeu a andar e utilizou esse aprendizado na indução de transes hipnóticos. Mais tarde, quando alguém comentou sobre sua infelicidade por ter tido paralisia infantil tão grave, ele respondeu: “Eu tive sorte, pois graças a ela pude desenvolver todas as minhas habilidades”. 5.2 – Assumir responsabilidade pelo que lhe acontece, pois só dessa forma você pode ser o timoneiro do seu barco. Aqueles que estão sempre achando desculpas e responsabilizando outras pessoas pelos seus males também estão dizendo que não podem fazer nada para mudar a própria vida, já que tudo está fora do alcance de suas possibilidades. 5.3 – Considerar os próprios erros não como fracasso, mas como um feedback negati- vo, ou seja, uma informação que indica que estamos no caminho errado e que é preciso fazer alguma coisa diferente, que é preciso mudar. 5.4 – Não é preciso saber tudo para agir, é necessário correr algum risco, sobretudo na época atual, em que vivemos situações de incerteza, ambiguidade, insegurança e mu- dança. Onisciente, onipresente e onipotente, só Deus (WANDERLEY, 1998, pp. 54-55). Voltar ao sum ário 20 6. NECESSIDADES: Na parte mais profunda do iceberg comportamental está a origem de nossos comportamentos. O ser humano age para satisfazer suas necessidades, grandes impulsionadoras e motivadoras. Tudo o que fazemos ou dizemos é para satisfazer ou evitar a privação de alguma de nossas necessidades. Nós temos uma estrutura de ne- cessidades. Vamos mencionar quatro, entre os tipos de necessidades que formam esta estrutura: realização, reconhecimento, associação e segurança. A estrutura de necessidades é formada por uma combinação destas quatro. Há pessoas nas quais essas necessidades estão distribuídas de forma equilibrada. Já em outras exis- te uma preponderância acentuada de uma, com manifestação bem menos acentuada das outras três. Além dessas quatro necessidades, que formam a base para a identifica- ção dos estilos comportamentais já citados nesse percurso de aprendizagem, devemos considerar as necessidades fisiológicas e as necessidades de autorrealização. As fisio- lógicas são as necessidades primárias das pessoas, como abrigo, alimentos e roupas. As de autorrealização são a necessidade de crescimento e a utilização do pleno potencial de uma pessoa (WANDERLEY, 1998, p. 56). Negociação baseada em princípios3. Prezado(a) estudante, normalmente afirmamos que existem apenas duas ma- neiras de negociação. A primeira maneira, com a utilização da empatia, levan- do o negociador a agir com muita benevolência, fazendo várias concessões, com o objetivo de evitar ao máximo o conflito. A segunda maneira, utilizando o rigor e a assertividade, associada a um comportamento áspero, típico daque- le negociador que quer vencer sempre, a qualquer custo, não cedendo e não abrindo mão de sua posição, prejudicando o estabelecimento de um acordo e também de futuros relacionamentos entre as partes. Voltar ao sum ário 21 Analisando esses dois modos de negociação, podemos afirmar que um deles é melhor? A resposta correta seria: – depende dos objetivos alcançados!”. Nesse sentido, Maraschin (2017) enfatiza que, para melhor assimilar e aplicar a teoria da negociação, faz-se necessário superar alguns paradigmas, tal como a ideia de que existe sempre um lado vencedor e outro perdedor, além da noção de que o ganho de alguém implica necessariamente em uma perda para o outro. Desta forma, é importante que entendamos o método de negociação baseada em prin- cípios, desenvolvido pelo Harvard Negotiation Project, o qual preconiza o princípio de ser duro nos méritos da negociação e suave com as pessoas: O método da negociação baseada em princípios, desenvolvido no Projeto de Ne- gociação de Harvard, consiste em decidir as questões a partir de seus méritos, e não através de um processo de regateio centrado no que cada lado se diz dispos- to a fazer e não fazer. Ele sugere que você procure benefícios mútuos sempre que possível e que, quando seus interesses entrarem em conflito, você insista em que o resultado se baseie em padrões justos, independentes da vontade de qualquer dos lados. O método da negociação baseada em princípios é rigoroso quanto aos méritos e brando com as pessoas. Não emprega truques nem a assunção de posturas (MARASCHIN, 2017, p. 14). Caro(a) estudante, por meio dessa definição, é possível compreendermos que aquilo que buscamos com a negociação é um resultado em que ambas as partes fiquem satisfeitas, sem a necessidade do uso de truques ou de armadilhas, afinal a ideia é tratar a outra parte não como oponente, mas como parceiro para realização de um acordo, que será bom para ambos. Afinal, para realização de um acordo, faz-se necessária a colaboração de todos os participantes. O que se almeja com a utilização desse método é a criação de maior valor antes da dis- tribuição entre as partes envolvidas no processo de negociação. Podemos utilizar, como exemplo, a imagem de um bolo e afirmar que devemos aumentar o bolo para só então cortá-lo e distribuí-lo. Desta forma, quanto maior o bolo, maior será a possibilidade de satisfação entre os participantes e a chance de se chegar a um acordo aumenta significa- tivamente. Entretanto, devemos ficar atentos ao fato de que o negociador é naturalmente parcial e que o seu principal objetivo é a obtenção daquilo que almeja, evitando ao máxi- mo ceder o que não deve. Maraschin (2017) descreve que, na literatura atual, são apresentados vários métodos e enfoques para condução de negociações, sendo o mais famoso o método de Harvard, o qual enfatiza que se deve utilizar as seguintes premissas em um processo de negociação: Voltar ao sum ário 22 1. Separar as pessoas dos problemas; e 2. Não negociar por posições, e sim por interesses. Tais premissas são descritas por Fisher et al. (2005 apud Maraschin, 2017, p. 22), os quais defendem que os negociadores profissionais “são aqueles que apresentam o méto- do da negociação baseada em princípios ou negociação dos méritos. Este método é fun- damentado em quatro passos: pessoas, interesses, opções e critérios”, vistos a seguir: Pessoas: separe as pessoas do problema - Antes de qualquer coisa, negocia- dores são pessoas. Como é difícil lidar com sentimentos, percepções, cultu- ras, crenças e valores diferentes dos nossos, é preciso focar nos dois princi- pais interesses envolvidos em uma negociação: ganho e relacionamento. O relacionamento contínuo entre negociadores auxilia nas relações e negociações futu- ras. Focar na resolução do problema e, ao mesmo tempo, manter uma boa relação com a contraparte pode ser um bom caminho para um bom acordo. Para lidar com problemas psicológicos, use técnicas psicológicas. Por exemplo, em caso de percepções diferentes ou mal-entendidos entre as partes, procure esclarecê-los aprimorando a comunicação. Lembre-se de que você também possui frustrações, raiva e outros sentimentos que preci- sam ser entendidose tratados. Veremos mais à frente como minimizar essas diferenças (CASTRO, 2020, p. 22). Interesses: concentre-se nos interesses, não nas posições - Interesses são seus reais motivos da negociação. Enquanto as posições são as formas de alcançar es- ses interesses, o “como” chegar lá. Para um interesse, pode haver várias posições. Para entender as posições por trás dos interesses, pergunte “por quê” e “por que não” (Fisher et al., 2005). É importante que o negociador entenda os motivos das posições da contraparte. E, para isso, deve se colocar no lugar do outro e, assim, entender seus reais motivos ou obstáculos. É comum que os negociadores tenham interesses múltiplos. Identifique esses interes- ses antes de supor que os interesses de outros negociadores são incompatíveis com os seus. As posições tendem a ser concretas e explícitas, enquanto os interesses podem ser não expressos e intangíveis. As pessoas, normalmente, têm medo de expor seus reais interesses. Para que isso aconteça, é preciso muita escuta ativa e confiança entre as par- Voltar ao sum ário 23 tes. Certa vez, ao negociar uma proposta de um projeto de marketing para uma rede de clínicas de odontologia, ouvi do cliente a seguinte frase: “Gostei de sua proposta técnica e o valor está dentro do esperado, mas vou te propor algo ainda melhor!”. Na hora não entendi bem o que seria “algo melhor”, mas me coloquei aberta para escutar. E a proposta foi a seguinte: ele me pagaria metade do valor do projeto ao longo da execução e, durante o ano subsequente ao projeto, ele me pagaria um percentual do incremento de fatura- mento, que era esperado após o projeto concluído. Para mim, a resposta, de cara, seria: “NÃO!”. Por vários motivos: 1. como iria acompanhar o faturamento após a entrega do projeto?; 2. variáveis de mercado e de recursos das clínicas estavam fora do meu con- trole e poderiam interferir no resultado do negócio; 3. não era de meu interesse uma “sociedade” e alguns outros motivos... Mesmo assim, é importante que o negociador saiba escutar. Por isso, respirei fundo e, com muita paciência, pus-me a perguntar e entender melhor a contraparte. Não é fácil descobrir os reais interesses. É preciso estar bem atento às entrelinhas, criar confiança e escutar sem filtros. Depois de muita conversa, descobri que o cliente havia contratado um serviço semelhante anteriormente e não tinha tido resultados. O seu real interesse era a garantia. A forma de pagamento não era relevante para ele, já que não tinha problemas com o fluxo de caixa. Sendo assim, a forma de pagamento era apenas uma posição, isto é, uma forma que ele enxergava para diminuir as incertezas do contrato. Entendendo isso, foi possível propor formas de minimizar os riscos do projeto na percepção do cliente, como, por exemplo, rescisão do contrato a qualquer momento sem multas, indicadores de resultados parciais e andamento do projeto com periodicidade acordadas previamen- te etc. Voltar ao sum ário 24 IMPORTANTE É normal que as pessoas tenham medo de expor seus motivos du- rante uma negociação. Muitos acreditam que os interesses são es- tratégicos e não podem ser expostos para a contraparte. Existem sim fatores estratégicos em uma negociação, como seus limites, suas motiva- ções, mas não o que realmente quer. Imagine que, ao decidir comprar uma casa, você procure um corretor e diga que pretende comprar um apartamento. Ele vai lhe mostrar dezenas de apartamentos, você não gos- tará de nenhum e os dois perderão tempo. Por isso, o que se quer, a casa e suas carac- terísticas, deve ser exposto. Entretanto, seu limite financeiro ou o fato de ter acabado de receber uma herança, isso sim, pode ser estratégico para a negociação. Sem saber o que o outro quer, você raramente fará uma oferta que o agrade. Por outro lado, o outro rara- mente adivinhará o que você quer como resultado de uma negociação. A Figura 1 representa a diferença entre interesses e posições. A carinha triste é seu es- tado atual hoje, você tem alguma necessidade que precisa conquistar. A carinha alegre é o seu interesse, aonde realmente quer chegar após a negociação. Em azul, sua posição, isto é, como você acredita ser a melhor maneira de alcançar seu interesse. E, em verme- lho, percebemos várias maneiras de chegar ao mesmo patamar desejado. Basta ter a mente livre e buscar os ganhos mútuos na negociação! (CASTRO, 2020, pp. 22-25). Figura 3 – Interesses versus posições Fonte: Castro (2020, p. 24) Voltar ao sum ário 25 Perceba que no exemplo da Tabela 1 os interesses são mais amplos e flexíveis para uma negociação. Eles são os motivos, os porquês. As posições já restringem um pouco o acordo, pois determinam o que deve ser feito para o negociador atingir seus interesses. Já os objetivos respondem a perguntas como: “como?”; “quanto?”; “onde?” e “quem?”, e assim são bem mais específicos, limitando o acordo em algumas situações. É possível obter segurança e ampliar o espaço da família com uma reforma, como é possível ca- pacitar a equipe com um treinamento interno. Sendo assim, o negociador que foca em posições pode restringir o acordo (CASTRO, 2020, p. 25). Tabela 1 – Interesse, objeto e objetivo Fonte: Castro (2020, p. 25) Opções: crie variedade de possibilidades antes de decidir o que fazer. Depois de entender a necessidade da outra parte, esse passo fica bem mais simples. Segundo Fisher et al. (2005 apud Castro, 2020, p. 25), há quatro obstáculos fundamentais que inibem a inven- ção de uma multiplicidade de opções: No planejamento, analisamos, a partir de nossas estimativas, as necessidades da outra parte e buscamos ofertas que satisfarão as duas partes. Lembro que são apenas estima- tivas. Sendo assim, ajudam muito, mas nem sempre são verdadeiras. O outro momento, durante a interação, pode ser bem mais rico. Uma boa forma de ativar a criatividade du- Voltar ao sum ário 26 rante uma negociação é basear-se no modelo das reuniões de brainstorming, separando o momento da criação de alternativas do momento da decisão. Quando o momento da criatividade é isento de julgamentos, boas opções podem surgir. Importante, neste mo- mento, é doutrinar a contraparte para obter bons resultados. DICA Lembre-se que nem todos conhecem o processo negocial e que poucos estão acostumados a essa técnica. Deixe bem clara a dis- tinção entre o momento de criação e o momento de tomada de de- cisão. É comum que a outra parte queira decidir logo ou que reaja de forma negativa logo à primeira ideia exposta. Por isso, explique o processo de criar ideias e, depois, tomar deci- sões quantas vezes forem necessárias. Você pode até começar com uma ideia absurda, assim, a contraparte perceberá como funciona o brainstorming. Lembro que, novamente, a confiança é peça fundamental. Pessoas sem integridade po- dem usar uma proposta que foi feita no brainstorming como se tivesse sido uma proposta final e usar isso como barganha posteriormente (CASTRO, 2020, pp. 25-26). Critérios: insista que o resultado tenha algum padrão objetivo. Os critérios objetivos são padrões ou procedimentos utilizados como critérios de decisão baseados, não na vonta- de das partes, mas em princípios imparciais que permitirão a discussão do problema e de possíveis soluções. De acordo com Fisher et al. (2005), os padrões justos podem ser: valor de mer- cado, um precedente, uma opinião científica, padrões profissionais, tratamen- to igualitário, padrões morais, tradição. Enquanto procedimentos justos, podem ser a antiga maneira de repartir um bolo entre duas crianças: um divide e o outro escolhe com qual parte vai ficar. Isto é, as partes definem o que acreditam ser um acerto justo e, depois, seus respectivos papéis nesse acordo. Os padrões de decisões baseados em imparcialidade, eficiência ou mérito científico sina- lizam maior probabilidade de apresentarem uma decisão sensata e justa para as partes envolvidas (Fisher et al. 2005). Fisher et al. (2005) sugerem queesses quatro passos para Voltar ao sum ário 27 uma negociação baseada em princípios devem servir de fundamentos para todo o pro- cesso negocial, passando pela análise, planejamento e discussão. Na análise, deve ser feito um diagnóstico da situação e reflexão sobre esta. Devem ser consideradas percep- ções individuais, questões pessoais, emoções envolvidas e ruídos na comunicação. As opções para soluções já explicitadas devem ser identificadas. Durante o planejamento, é preciso analisar quais são os reais interesses, o nível de importância de cada um deles e quais são as soluções que podem ser levadas à discussão e os critérios para decisão. No momento da discussão, as diferenças de percepções e sentimentos devem ser reco- nhecidas e abordadas para que cada uma das partes compreenda a outra. Depois, ambos poderão criar as opções de ganhos mútuos. Prezado(a) estudante, com base nos princípios de negociação apresentados, é muito provável que você esteja se perguntando: “– Mas afinal, qual é o princí- pio essencial da negociação?” Nesse contexto, você já deve ter percebido que não há uma resposta enfática, definitiva ou final, não é mesmo? Talvez a res- posta que melhor se encaixe a esse questionamento seja: o princípio essencial da negociação é o ganho mútuo! A negociação baseada em princípios é focada na resolução das questões envolvidas em um processo de negociação, com base nos méritos e prioriza os ganhos mútuos. Há uma forte preocupação na obtenção de uma percepção correta a respeito dos interesses da outra parte. Nesta situação, a negociação é vista como uma ferramenta, existe troca de informações legítima entre os negociadores e, no caso de eventual conflito, os resulta- dos são baseados em critérios justos. A negociação baseada em princípios é também conhecida como sendo rigorosa com os problemas e amena com as pessoas. Em outros termos, há a possibilidade de obtenção daquilo que se deseja e ainda assim agir com decência. Quando estamos envolvidos em uma negociação baseada em princípios, há necessidade de lidarmos com os fatores emocionais, presentes sempre em um processo de negocia- ção. É essencial agirmos com empatia e cautela com a outra parte e termos a percepção para sabermos quando e como “bater o martelo”, ou seja, fechar um acordo justo e sensa- to, de modo que não haja comprometimento do relacionamento. Quando participamos de uma negociação, cuja base são os princípios, produzimos resultados com um toque de refinamento, com elegância moral, de modo colaborativo, através de informações com- partilhadas voluntariamente, respeitando os interesses dos participantes. Neste modelo de negociação, todas as atenções são direcionadas de modo a que obtenhamos ganhos mútuos, confiança e fortalecimento do relacionamento. Voltar ao sum ário 28 ATENÇÃO! A negociação por princípios, além de exigir um bom preparo de seus participantes, também exige criatividade, pois há necessida- de de, no processo, que se inventem soluções que satisfaçam os envolvidos, afinal, é necessário o máximo empenho para a geração de benefícios mútuos. Em muitos casos, a solução de impasses em uma negociação é resultado da aplicação de uma solução criativa. Estratégias de negociação4. Caro(a) estudante, que o segredo para uma boa negociação é o planejamento você já sabia, não é mesmo? No entanto, é nessa fase que estabelecemos as estratégias e táticas para a obtenção de um resultado satisfatório no processo de negociação. Costumamos pronunciar a palavra estratégia praticamente todos os dias em nossas vidas, no entanto, é importante conhecermos sua definição. Mas de que forma podemos definir estratégia? É importante compreendermos que não há consenso na definição de estratégia. Vários autores a denominam de formas bastante di- ferentes, inclusive, incluindo metas e objetivos como parte da estra- tégia. Nesse aspecto, Johnson (2011, p. 25) assim descreve estratégia: Estratégia é a orientação e o alcance de uma organização a longo prazo, que con- quista vantagens num ambiente inconstante por meio da configuração de recur- sos e competências com o intuito de atender às expectativas dos stakeholders. (JOHNSON, 2011, p. 25) Voltar ao sum ário 29 Entretanto, para Mintzberg (2011, p. 29), a definição de estratégia apresenta um viés de maior complexidade: Uma estratégia é o padrão ou plano que integra as principais metas, políticas e sequências de ação da organização em um todo coeso. Uma estratégia bem formulada ajuda a organizar e alocar os recursos de uma organização em uma postura única e viável, baseada em suas competências e deficiências internas relativas, mudanças antecipadas no ambiente e movimentos contingentes por parte dos oponentes inteligentes. (MINTZBERG, 2011, p. 29) As estratégias existem em muitos níveis de grandes organizações empresariais e, prin- cipal e necessariamente, no ambiente de negociações. Quando executamos a fase de planejamento, é muito comum definirmos as estratégias a serem traçadas no processo de negociação, pois não podemos prever o desfecho do evento, em virtude da diferença de culturas, comportamentos e perfis dos negociadores envolvidos. Nesse sentido, as estratégias são compreendidas como diretrizes a serem seguidas a todo o momento, de modo a se ter um norte, uma direção. As estratégias consistem em ações que a empresa deve realizar para o alcance de seus objetivos e desafios. O negociador estrategista Prezado(a) estudante, todo negociador que se preze é estrategista por nature- za, afinal possui tanto a inteligência para a compreensão de situações diver- sas mesmo sem vê-las – sentido da visão para a negociação em seu plano geral – quanto a imaginação e a criatividade necessárias para desenvolver soluções satisfatórias a ambas as partes . O resultado de uma negociação é uma caixinha de surpresas, somos incapazes de ante- ver as ações, as reações e o seu desfecho. No entanto, podemos nos empenhar, por meio da definição de uma boa estratégia, para uma situação que seja favorável ou menos pior para os envolvidos. Você provavelmente já ouviu aquela frase: “deixar sempre as portas abertas por onde passo, para, assim, poder voltar com tranquilidade”. No processo de negociação não é diferente! De acordo com Stern e Mouton (2018), uma negociação nunca se encerra, sem- pre são introduzidas outras, sendo preciso, portanto, que o negociador saiba, no momen- to de começá-la, as perspectivas para as quais deseja abrir caminho: Voltar ao sum ário 30 Ninguém nasce um negociador! Ao longo de nossas experiências, vamos adquirindo know-how e nos aprimorando nessa nobre e difícil arte. No entanto, é essencial que saibamos que, para ser um bom negociador, é necessário unir a experiência com uma certa dose de cultura de estratégia. Não existe negociador sem conhecimento de estratégia e sem cultura. De um modo geral, conhecemos um pouco as reações das pessoas à nossa fala. Por essa razão, o negociador precisa estar preparado, principalmente com as palavras e termos que serão utilizados para negociar. Atualmente, as pessoas se magoam muito facilmente ou ficam melindradas com palavras mal inter- pretadas. A estratégia em ação Qual deve ser a estratégia escolhida pelo negociador? Como ele vai aplicá-la? E como vai integrar, simultaneamente, os objetivos e argumentos, sem perder de vista a relação de forças? É sempre importante lembrar que do outro lado haverá também um negociador, com uma estratégia definida. Nesse sentido, importa considerar as três ferramentas que permitem melhor compreen- são dos mecanismos de estratégia relacionados à negociação: Voltar ao sum ário 31 A teoria dos jogos examina a interdependência dos negociadores. A partir da análise de várias negociações, encontram-se dois tipos de comportamento: a. a interdependência competitiva: a negociação alcança seus objetivos se os “ou- tros” não alcançarem os deles; essa interdependência desencadeia uma negocia- ção deresultado nulo ou negativo, em que todos saem perdendo. b. a interdependência cooperativa: essa interdependência desencadeia uma nego- ciação com resultado positivo, em que todos saem ganhando (STERN; MOUTON, 2018, p.54). Essa ferramenta apresenta dois estilos de negociador: o distributivo e o integrativo. O negociador distributivo quer ganhar tudo, esmagar o outro. Ele espalha para si mes- mo os ganhos de negociação antecipadamente, como se o outro não existisse. O negociador integrativo incorpora à sua abordagem a legitimidade do pedido do outro. Os dois estilos terão consequências diferentes no clima de negociação no curto e no médio prazo. A ferramenta em questão permite diagnosticar o estilo de ambos os negociadores e ajustar o comportamento de um ao do outro (STERN; MOUTON, 2018, P. 59). Essa ferramenta utiliza no contexto da negociação os conceitos de poder concebidos por Michel Crozier. O poder em uma organização reparte-se em quatro zonas que se recompõem permanentemente, conforme a evolução do contexto: • Zona hierárquica: o estatuto de autoridade. • Zona de expert: competên- cia em determinado campo. • Zona de informação: conhe- cimento de uma informação determinante. • Zona de ambiente: ligação com os atores que estão na periferia da organização. O negociador faz o levantamento de suas forças e fraquezas apoiando-se dialetica- mente nessas quatro zonas (STERN; MOUTON, 2018, p. 70). Voltar ao sum ário 32 Existe uma frase, proferida pelo guru da administração Peter Drucker, bastante conhecida no meio corporativo, que é: “Quem detém a informação, detém o poder!”. A informação é um importante insumo para que a negociação seja desenvolvida conforme a estratégia delineada. Ninguém vai para uma rodada de negociações sem estar munido de informa- ções e sem ter uma estratégia mínima traçada. A estratégia de negociação deve começar com o entendimento amplo da situação e com a organização das informações. E isso pode ser feito com a utilização da Matriz de Pon- tos Fortes e Pontos Fracos, conforme ilustrado na Figura 4: Figura 4 – Matriz de Pontos Fortes e Fracos Fonte: Wanderley (1998, p. 139) O procedimento prático para a elaboração da Matriz é o seguinte: primeiro, identificamos e listamos tudo aquilo que consideramos nossos pontos fortes, depois, nossos pontos fracos. Fazemos a mesma coisa em relação à outra parte. A identificação dos pontos fortes e fracos é feita com base no Quadrilátero Estratégico, ou seja, a concorrência, a própria organização, a clientela e os produtos e serviços e as fontes de poder e dispo- nibilidade de tempo. Uma vez feito tal levantamento, passamos a correlacionar nossos pontos fortes e fracos com os pontos fortes e fracos do outro lado e colocamos as infor- mações na Matriz (WANDERLEY, 1998). O próximo passo consiste na construção do Quadro de Ameaças e Oportunidades e dos procedimentos que devemos adotar para enfrentar as ameaças e aproveitar as oportuni- dades, ou seja, as estratégias e as táticas de negociação propriamente ditas. O Quadro de Ameaças e Oportunidades tem duas colunas. Na primeira estão relacionadas as opor- Voltar ao sum ário 33 tunidades, em ordem de importância. Na segunda, as ameaças (WANDERLEY, 1998). Nesse contexto, existem quatro princípios estratégicos a serem considerados: • As estratégias e as táticas referem-se a informação, tempo e poder. A infor- mação é a matéria-prima básica da negociação. Toda negociação ocorre no tempo e é um jogo de influências, de poder. • Estratégias e táticas estão relacionadas às etapas da negociação. Tudo o que acontece numa negociação faz parte de alguma etapa. • Uma tática percebida a tempo pode ser neutralizada. Existem negociadores que são previsíveis e usam as mesmas táticas constantemente. • O bom negociador dispõe de um repertório de táticas. Isso significa mais flexibilidade e maior probabilidade de alcançar objetivos (WANDERLEY, 1998, p. 160). Para o sucesso em uma negociação, comumente se utilizam as estratégias de informa- ção, de tempo e de poder, conforme descrição abaixo: ESTRATÉGIA DE INFORMAÇÃO: em toda negociação são tomadas decisões essenciais para o sucesso das organizações empresariais. Caso as informações disponíveis forem boas, nossa decisão terá grande probabilidade de ser a acertada. A estratégia de infor- mação visa identificar quais informações devemos obter, quais devemos dar e quais de- vemos negar. Como faremos isso será definido pelas táticas que utilizaremos. Quando se trata de informação, precisamos levar em conta alguns princípios. Entre eles, os se- guintes: Deve-se sempre buscar a forma mais adequada de dar a informação. Suponhamos que você vá a uma quitanda comprar um quilo de feijão. O ven- dedor pode proceder de duas formas ao pesar o feijão. Uma delas consiste em colocar mais de um quilo na balança e ir tirando o excesso aos poucos, até chegar a um quilo. A outra forma consiste em colocar menos de um quilo e ir acrescentando pouco a pouco até chegar a um quilo. Não importa qual a forma adotada, teremos no final um quilo de feijão. Mas com certeza, você sentirá emoções diferentes. Na primeira, uma sensação de perda. Na segunda, de ganho. • Em toda a informação há forma e conteúdo, o presente e a embalagem do presente. Há quem se impressione mais com a embalagem do que com o conteúdo. Voltar ao sum ário 34 • As informações relevantes estão relacionadas ao MIN – Modelo Integrado de Nego- ciação, ao tempo e ao poder. De qualquer forma, é necessário entender que nem toda informação é poder. Há muita informação equivocada e contrainformação. Portanto, é preciso separar o joio do trigo. • A informação para ser entendida deve ser formulada na linguagem do receptor. • Utilizar instrumentos que impactem todos os canais sensoriais: visual, auditivo e ci- nestésico. • Informações privilegiadas são extremamente importantes e de conhecimento restri- to. Exemplo: conhecer lucros ou prejuízos de uma empresa antes que o balanço tenha sido publicado. Descobrir que um grande investidor está pagando suas operações com cheques sem fundos antes que isso seja do conhecimento do mercado. Saber, em primeira mão, que o governo fará um grande empreendimento em uma região desvalorizada. Conhecer os custos fixos ou a cotação de determinada empresa para determinado cliente. • As informações privilegiadas têm de ser utilizadas enquanto são privilegiadas. Quan- do caem em domínio público, perdem o poder de impacto. • Não se pode ser, simultaneamente, receptivo e emissivo, isto é, não se pode falar e ouvir ao mesmo tempo. • Existem palavras e frases genéricas e específicas. As genéricas são utilizadas por hipnotizadores e políticos. “Você vai sentir uma sensação de bem-estar”. “Isso é para o bem de todos e felicidade geral da nação”. “O brasileiro gosta do Carnaval”. Para fugir da hipnose é preciso especificar. “O que se quer dizer como sensação de bem- -estar”. “O que é felicidade geral da nação”. “Que porcentagem de brasileiros gosta de Carnaval?” • Existem palavras e frases descritivas e avaliativas. Palavras descritivas: o carro é amarelo e tem quatro portas. Palavras avaliativas: é um ótimo carro. Caso você tenha trocado o farol de seu carro e ele não esteja funcionando direito, o descritivo será: “O farol alto não está funcionando”. E o avaliativo seria: “Esta oficina só tem incompeten- tes”. Ou: “Estão querendo me roubar”. As palavras avaliativas podem causar rejeição, defesa e afastamento. Portanto, devem ser usadas com cautela e no momento apro- priado. Assim, ao começar sua argumentação, apresente os fatos de forma lógica e racional. Só depois considere avaliações e conclusões. • A não revelação total não corresponde à tática suja, ou ganha/perde. Pode-se omitir, desde que isso não descaracterize a realidade. Voltar ao sum ário 35 • As mentiras baseadas na estatística e/ou na matemática são as mais perigosas. Se- gundo Disneli, há três espécies de mentira:mentiras, mentiras descaradas e estatís- ticas [...]. • O bom negociador sabe buscar e solicitar informações e reconhecer as respostas corretas (WANDERLEY, 1998, pp. 163-165). A ESTRATÉGIA DE TEMPO: o tempo é outra variável extremamente importante numa negociação. Nas conversações de Paz para pôr fim à Guerra do Vietnã em 1968, os ame- ricanos acreditavam que as negociações seriam rápidas e alugaram apartamentos, por uma semana, num dos melhores hotéis de Paris. Os norte-vietnamitas, ao contrário, alugaram uma casa nos arredores da cidade por dois anos. Só para definir o formato da mesa de negociação foram gastos oito meses. [...]. Eles tinham perspectivas temporais distintas. Os norte-vietnamitas já vinham lutando ha- via muitas dezenas de anos contra chineses, japoneses e franceses, e um ou dois anos a mais ou a menos não fariam muita diferença. Para os negociadores americanos, havia a pressão interna da opinião pública para o término da guerra, além disso, em um ano de eleição, e o presidente Johnson queria uma solução rápida para o problema. Essa diferen- ça de perspectiva temporal foi um enorme trunfo para os norte-vietnamitas. Os princípios de tempo mais importantes são os seguintes: • Sempre temos um prazo para fechar uma negociação e o prazo-limite força uma decisão. É importante saber que esse prazo pode ser resultado de uma pressão real ou psicológica. • O tempo gasto numa discussão costuma ser inversamente proporcional à sua impor- tância (Lei de Parkinson). • Em geral as pessoas administram mal o tempo e costumam adiar a decisão até o fim do prazo-limite, deixando tudo para a última hora. • As principais concessões tendem a ser feitas quando se aproxima o prazo-limite. • O prazo-limite pode ser negociado. Portanto, é necessário procurar uma nova ideia de convencer alguém de alguma coisa, devemos levar em conta que as pessoas têm um tempo de elaboração e assimilação, e esse processo não é instantâneo. Muitas vezes a pessoa precisa ser exposta várias vezes a uma mesma ideia para aceitá-la. • Negociações rápidas são perigosas. As negociações por telefone são um exemplo disso, sobretudo quando o telefonema nos apanha despreparados. • Negociações curtas acontecem quando há grande aceitação e certeza. • Negociações longas ocorrem quando há incerteza, insegurança e ambiguidade. Voltar ao sum ário 36 • O tempo ótimo de negociação é aquele que maximiza a relação benefício/custo, sen- do que o custo neste caso é o tempo. • A negociação só acaba depois de cumpridas duas etapas: a etapa de ação final, ou seja, a formalização do acordo, e a etapa relativa ao controle e avaliação, isto é, ao cumprimento do que foi acordado. Portanto, é preciso ter cuidado para evitar surpre- sas de última hora (WANDERLEY, 1998, pp. 164-165). ESTRATÉGIA DE PODER: toda negociação implica em influências recíprocas, isto é, num jogo de poder. Identificar o balanço de poder entre as partes e saber usar, da melhor ma- neira possível, o próprio poder faz a diferença. Assim, conhecer as fontes de poder é o ponto de partida. Há várias formas de poder, entre elas as seguintes: • Legitimidade: é o chamado poder legal, relativo a leis, regulamentos e normas. O po- der que alguém tem por ocupar determinado cargo numa organização inclui-se nessa categoria [...]. • Alternativas: quem não tem alternativa fica numa posição de fragilidade ou na total dependência da outra parte. [...]. Existem dois tipos de alternativa: uma refere-se às al- ternativas relativas à própria proposta, como preço à vista ou a prazo. Outro refere-se a outras pessoas ou empresas com quem se pode negociar, isto é, aos concorrentes das empresas ou às pessoas com quem estamos negociando. Uma alternativa muito importante é a MADI, Melhor Alternativa Disponível no caso de um Impasse. Quanto melhor a MADI de um negociador, mais forte ele está na mesa de negociação. • Precedente: refere-se à força do passado. De uma forma ou de outra, as pessoas aca- bam, mesmo quando não deviam, prendendo-se muito ao passado. Daí a expressão “em time que está ganhando não se mexe”. A utilização dessa força de inércia pode trazer bons dividendos. Outra forma é recorrer a atos praticados anteriormente. Exem- plo: revelar ao vendedor o preço que deu na negociação com outra empresa. • Relacionamentos e associações: os relacionamentos e associações, quando bem trabalhados e positivos, são uma força muito útil para o bom desfecho de uma nego- ciação. Caso contrário, podem trazer fragilidade e vulnerabilidade. Esses relaciona- mentos e associações às vezes implicam outros negociadores, os parceiros que não estão à mesa de negociação e nossa própria equipe. Uma equipe desarticulada pode transformar-se num verdadeiro desastre. • Recursos materiais: dispor de recursos, como uma boa infraestrutura, é básico para o êxito de uma negociação, sobretudo as mais complexas. Voltar ao sum ário 37 RESUMO DO PERCURSO DE APRENDIZAGEM Prezado(a) estudante, vimos nesse percurso de aprendizagem temas bastante relevantes para a utilização no ambiente de negociação. Iniciamos nossos estudos com o princípio essencial da negociação, que é caracterizado pela comunicação eficaz entre as partes envolvidas. Vimos alguns detalhes da comunicação verbal e da comunicação não verbal e que, um negociador habilidoso e atento, pode tirar grande proveito, por meio da obser- vação da linguagem corporal, obtendo significativa vantagem competitiva. Abordamos também os estilos de negociação, com base no iceberg comportamental, afinal, o estudo do comportamento dos indivíduos, a sua realidade interna e realidade externa, pode representar o sucesso em uma negociação. Identificamos os elementos ocultos do iceberg, como: a percepção, as expectativas, as emoções, os sentimentos e os desejos, os metaprogramas (a forma como organizamos e processamos informações), as crenças e os valores e as necessidades dos indivíduos. Estudamos também sobre a negociação baseada em princípios, ou ainda, o Projeto de Negociação de Harvard, o qual consiste em decidir as questões a partir de seus méritos e não através de um processo de regateio centrado no que cada lado se diz disposto a fazer e não fazer. Esse método sugere que você procure benefícios mútuos sempre que possível e que, quando seus interesses entrarem em conflito, você insista em que o re- sultado se baseie em padrões justos, independentes da vontade de qualquer dos lados. O método da negociação baseada em princípios é rigoroso quanto aos méritos e brando com as pessoas, não empregando truques nem a assunção de posturas. Finalizando nosso circuito, estudamos as estratégias de negociação, que representam as formas pelas quais alcançaremos os objetivos traçados. Identificamos as estratégias de tempo, de informação e de poder, essenciais para o negociador ter sucesso. Afinal, a informação é a matéria-prima básica da negociação. Toda negociação ocorre no tempo, e é um jogo de influências, de poder. Voltar ao sum ário 38 REFERÊNCIAS CARVALHAL, E. [et al.]. Negociação e administração de conflitos. 5. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2012. CASTRO, M. Negociação Plug & Play. Lisboa: Grupo Almedina (Portugal), 2020 [Minha biblioteca]. JOHNSON, G. [et al.]. Fundamentos de estratégia. Porto Alegre: Bookman, 2011 [Minha Biblioteca]. MARASCHIN, M. U. [Org] Manual de negociação: baseado na teoria de Harvard. Brasília: EAGU, 2017. MARTINELLI, D. P.; GHISI, F. A. [Org] Negociação. 2. ed.. São Paulo: Editora Saraiva, 2006 [Minha biblioteca]. STERN, P.; MOUTON, J. Negociação. Tradução de Marcelo Vieira; [revisão técnica] Erik Guttman. 1. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018 [Minha biblioteca]. MARTINELLI, D. P; GHISI, F. A. Negociação. 2. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2006 [Minha biblioteca]. MINTZBERG, H. O processo da estratégia. Porto Alegre: Bookman, 2011 [Minha bibliote- ca]. WANDERLEY, J. A. Negociação total: encontrando soluções, vencendo resistências, ob- tendo resultados.São Paulo: Editora Gente, 1998. Voltar ao sum ário 39 UNIVERSIDADE DE FORTALEZA (UNIFOR) Presidência Lenise Queiroz Rocha Vice-Presidência Manoela Queiroz Bacelar Reitoria Fátima Maria Fernandes Veras Vice-Reitoria de Ensino de Graduação e Pós-Graduação Maria Clara Cavalcante Bugarim Vice-Reitoria de Pesquisa José Milton de Sousa Filho Vice-Reitoria de Extensão Randal Martins Pompeu Vice-Reitoria de Administração José Maria Gondim Felismino Júnior Diretoria de Comunicação e Marketing Ana Leopoldina M. Quezado V. Vale Diretoria de Planejamento Marcelo Nogueira Magalhães Diretoria de Tecnologia José Eurico de Vasconcelos Filho Diretoria do Centro de Ciências da Comunicação e Gestão Danielle Batista Coimbra Diretoria do Centro de Ciências da Saúde Lia Maria Brasil de Souza Barroso Diretoria do Centro de Ciências Jurídicas Katherinne de Macêdo Maciel Mihaliuc Diretoria do Centro de Ciências Tecnológicas Jackson Sávio de Vasconcelos Silva AUTORIA HENRIQUE LACERDA NIEDDERMEYER Ex-oficial do Exército Brasileiro (1º. Tenente de Infantaria), formado em administração pela Universidade Positivo (Cu- ritiba-PR), MBA Executivo em Gestão Empresarial pela Unic- esumar (Maringá-PR) e Mestrado em Gestão do Conheci- mento nas Organizações pela Unicesumar (Maringá-PR). Atuando na docência do ensino superior desde 2002. Autor de 45 livros na área de gestão. Atualmente é coordenador de cursos de graduação na área de gestão e coordenador de pós-graduações na modalidade à distância da Unimar – Universidade de Marília. RESPONSABILIDADE TÉCNICA COORDENAÇÃO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Coordenação Geral de EAD Douglas Royer Coordenação de Ensino e Recursos EAD Andrea Chagas Alves de Almeida Supervisão de Ensino e Aprendizagem Carla Dolores Menezes de Oliveira Supervisão de Planejamento Educacional Ana Flávia Beviláqua Melo Supervisão de Recursos EAD Francisco Weslley Lima Supervisão de Operações e Atendimento Mírian Cristina de Lima Analista Educacional Lara Meneses Saldanha Nepomuceno Projeto Instrucional Maria Mirislene Vasconcelos Revisão Gramatical José Ferreira Silva Bastos Identidade Visual / Arte Francisco Cristiano Lopes Editoração / Diagramação Emanoel Alves Cavalcante Produção de Áudio e Vídeo José Moreira de Sousa Pedro Henrique de Moura Mendes Ana Bárbara Lima Pontes Gabriel Laureno Jucá Programação / Implementação Márcio Gurgel Pinto Dias Douglas Kauan Felix Farias Victor Torres de Melo Oliveira