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Letras Português EAD/UNIFAP 2018 1º Semestre Prof. Dr. Rosivaldo Gomes Letras Português EAD/UNIFAP 2018 Leitura e Produção de Textos Acadêmicos UNIDADE 1 Você verá por aqui.... Iniciamos aqui o nosso percurso em uma nova disciplina: Leitura e Produção de Textos. Ao estudar a disciplina Língua Portuguesa, você já percebeu que toda a nossa comunicação cotidiana se estabelece a partir de textos que elaboramos de acordo com a situação que estamos vivendo. Lembra? São os gêneros textuais. Produzimos e lemos os diferentes gêneros através de competências que desenvolvemos em nosso processo de aquisição e desenvolvimento da linguagem. Você também deve se lembrar que utilizamos, nesse processo de comunicação, diferentes linguagens que, muitas vezes, se complementam: a linguagem verbal e as não-verbais. A linguagem verbal nós utilizamos de duas formas: oral e escrita. Muito bem. É na linguagem verbal que essa nossa disciplina se concentrará. Em nosso processo de ler e produzir textos, principalmente textos de caráter técnico, acadêmico e científico. Ao longo desta disciplina nós lidaremos com alguns conhecimentos necessários à produção de textos de natureza técnica, acadêmica e científica, tais como: resenhas, resumos, artigos científicos, relatórios. Portanto, estudaremos as características e as formas de organização de textos dessa natureza, assim como formas de utilizar citações ou elaborar referências. A ideia é somar todos esses conhecimentos aos já adquiridos na disciplina Língua Portuguesa e pô-los em prática na elaboração de seus textos. Bons estudos a tod@s! Ementa Relações entre linguagem oral e escrita e as perspectivas diversas. Os conceitos de letramento(s). Leitura e produção escrita de textos teóricos da esfera acadêmica. Os gêneros orais formais públicos (debate, seminário e exposição oral) voltados para a leitura e produção de textos teóricos (da esfera científica) na academia. Os mecanismos/fatores de textualização. Carga horária: 60h/a secretaria Realce secretaria Realce Objetivos Quem sou eu ? Discutir as relações entre linguagem oral e escrita e suas implicações para a leitura e produção textual; Analisar e produzir textos da esfera acadêmica, bem como discutir sobre gêneros orais formais públicos da academia; Compreender os conceitos de letramento(s) na perspectiva dos Novos Estudos do Letramento e do Letramento Crítico e analisar criticamente o letramento propiciado pela escola pública (orais e escritos). Pós-doutorando pelo Departamento de Pesquisa e Pós-graduação da Universidade Federal do Amapá, na área de Educação e formação de professores. Doutor em Linguística Aplicada - Universidade Estadual de Campinas/Instituto de Estudos da Linguagem (IEL/UNICAMP) na área de Linguagens, Educação Linguística e tecnologia, mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental e Políticas Públicas (PPGDAP/UNIFAP), com pesquisa voltada para materiais didáticos impressos de divulgação/popularização científica de educação ambiental para educação infantil. Graduado em Letras Português e Literatura pela Universidade Federal do Amapá. Professor Adjunto I de Língua Portuguesa e Didática das Línguas do Departamento de Letras e Artes da Universidade Federal do Amapá. Líder do Grupo de pesquisa Núcleo de Estudos e Pesquisas em Linguística Aplicada (NEPLA/CNPq- UNIFAP) e vice-líder do grupo Linguagem, Educação, Sociedade, Formação Inicial e Continuada de Professores. Tem experiência na área de Língua Portuguesa, Linguística aplicada, formação de professores e construção de materiais didáticos impressos e digitais, com pesquisas voltadas para ensino e aprendizagem de língua Portuguesa, formação de professores, redes sociais, discurso, atuando principalmente nos seguintes temas: gêneros discursivos como objeto de ensino, sequências didáticas e protótipos didáticos digitais, montagem e avaliação de material didático e mediação tecnológica no ensino de Língua Materna e formação de professores, escrita e letramento acadêmico, discurso em redes sociais e representação identitária .É coordenador do Projeto de Extensão UNIFAP Programa em Letramento Acadêmico, que objetiva o trabalho com práticas de leitura e escrita no contexto acadêmico. Iniciando a conversa ..... TEXTO ORAL E TEXTO: A PERSPECTIVA HETEROGÊNEA OU DIALÓGICA DE BASE ENUNCIATIVA Rosivaldo Gomes Departamento de Letras e Artes da Universidade Federal do Amapá Resumo: Neste ensaio, de forma não exaustiva, estabeleço algumas reflexões a respeito de diversas perspectivas que embasaram, durante algumas décadas, o estudo das relações entre as linguagens oral e escrita no campo de estudos das Ciências da Linguagem. Para isso, respaldo-me em autores da área da Linguística Textual, especialmente das teorias do texto (MARCUSCHI, 2001, 2008). Posteriormente, focalizo a perspectiva enunciativa, de base bakhtiniana (BAKHTIN, 2003[1952/3]) para defender, diferentemente de outros autores, que as relações entre fala e escrita devem ser compreendidas nas intrissicas relações dialógicas que as compreendem de forma heterogênea e não mais polarizadas ou apenas de um contínuum tipológico de manifestações, quer sejam apenas linguístico-textuais ou discursivas. 1 Oralidade e escrita: antagonismo ou protagnismo conjunto no campo dos estudos da linguagem? “A língua, seja na sua modalidade falada ou escrita, reflete, em boa medida, a organização da sociedade. Isso porque a própria língua mantém complexas relações com as representações e as formações sociais (MARCUSCHI, 2008:35)”. De acordo com Rojo (2008), nas últimas décadas do século passado, inúmeros trabalhos no campo da linguagem voltaram-se para as discussões que giram em torno das relações que se estabelecem entre as modalidades oral e escrita no uso da língua. A autora salienta também que as décadas de 70 e 80, do século passado, testemunharam uma abordagem dicotômica dos dois fenômenos, que buscava e, por vezes, mistificava semelhanças e diferenças de um oral tido como puro e de uma escrita tão transparente e pura. Porém, como esclarece Barros-Mendes (2005, p. 57), “pode-se dizer que se passou de uma situação de conflito, de oposição (oral versus escrito) a uma visão muito mais de complementaridade”, ou seja, a linguagem oral não pode ser vista independentemente da escrita, nem uma ser superior a outra, uma vez que secretaria Realce a escrita não pode ser tida como uma representação da fala, (...) visto que não consegue reproduzir muitos dos fenômenos da oralidade, tais como prosódia, a gestualidade, os movimentos do corpo e dos olhos. Em contrapartida, a escrita apresenta elementos significativos próprios, ausentes na fala, tais como o tamanho e o tipo de letras, cores e formatos, elementos pictóricos etc. (...) (MARCUSCHI, 2008, p.17). Nas colocações da citação, feitas por Marcuschi, reconhecemos que oralidade e escrita são práticas de usos de uma mesma língua, mas de modalidade diferentes, com características próprias, todavia não suficientemente opostas para caracterizá- las como dicotômicas, já que ambas permitem a construção de textos coesos e coerentes, construídos a partir da necessidade de cada locutor e interlocutor em contextos sociodiscursivos diferentes. Desse modo, como é defendido por Barros-Mendes (2005) reconhece-se, atualmente, que a linguagem oral e a linguagem escrita têm muito mais traços em comum do que diferenças. Nesse sentido, verificamos então, algumas perspectivas que embasam o estudo dessa relação como: a perspectiva dicotômica, a perspectiva do continuum tipológico de gêneros textuais e a perspectiva sócio- histórica e dialógica de base enunciativa. 1.1 A perspectivadicotômica Segundo Marcuschi (2008), atualmente é impossível investigar oralidade e letramento sem uma referência direta ao papel dessas duas práticas na civilização contemporânea. Esta ideia também pode ser aplicada à relação entre fala e escrita, ou seja, tanto uma como a outra são produzidas em contextos reais de práticas de uso da língua. Cabe aqui, antes de iniciar as discussões teóricas sobre a perspectiva dicotômica, esclarecer que para alguns autores como, por exemplo, Marcuschi (2008), a relação estabelecida entre oralidade e letramento, não equivale à relação estabelecida entre fala e escrita, pois para ele a terminologia fala e escrita, refere-se às duas modalidades da língua e não propriamente a duas línguas, sob o aspecto das formas linguísticas e das atividades de formulação em que produzimos um texto, seja ele oral ou escrito. Já oralidade e letramento, segundo o autor, podem ser entendidos quando nos referimos às práticas sociais ou práticas discursivas no uso das duas modalidades4. Nesta mesma linha de pensamento, Fávero (2002), defende que ao tratarmos da relação entre fala e escrita é preciso lembrar que estamos trabalhando com duas modalidades pertencentes ao mesmo sistema linguístico: o sistema da Língua portuguesa e que esse reconhecimento traz muitas implicações para o ensino e secretaria Realce aprendizagem de Língua Materna. Ao fazermos uma retrospectiva nos estudos existentes entre as décadas de 1950-1980, percebemos que a fala e escrita eram vistas como opostas, predominando a noção da supremacia da escrita sobre a fala. Street (1984) apud Marcuschi (2008) mostra que tal supremacia era entendida como “paradigma da autonomia”, e considerava fala e escrita como dicotômicas, atribuindo à escrita valores cognitivos intrínsecos no uso da língua. Nessa perspectiva dicotômica a fala é encarada como o lugar do erro e consequentemente do caos gramatical (FÁVERO, 2002). O quadro 1, montado a partir das discussões presentes em alguns teóricos como Marcuschi (2008), e Koch (2010), mostra as qualidades tidas como “privativas” de uma ou de outra modalidade, nos anos 80: Fala Escrita Contextualizada Dependente Implícita Redundante Não planejada Imprecisa Incompleta Versus Descontextualizada Autônoma Explícita Condensada Planejada Precisa Completa Predomínio de frases curtas, Simples ou coordenadas Pouco elaborada Não-normatizada Fragmentária Menor densidade lexical Normatizada Não fragmentada Elaborada Predomínio de frases complexas, com subordinação abundante Emprego frequente de passivas Maior densidade lexical Quadro 1 – A perspectiva dicotômica das modalidades da língua. Como é percebido pelo quadro, a fala era vista como desorganizada, variável, heterogênea e a escrita como lógica, racional, estável, homogênea; a fala seria não- planejada e a escrita, planejada e permanente; a fala seria o espaço do erro e a escrita, o da regra e da norma, enquanto a escrita serviria para comunicar à distância no tempo e no espaço; a fala somente aconteceria face a face; a escrita se inscreveria, a fala seria fugaz; a fala é expressão unicamente sonora; a escrita, unicamente gráfica. Por esses aspectos, percebemos que essas características foram sempre estabelecidas tendo por parâmetro o ideal da escrita, ou seja, costumava-se olhar a falada através da ótica de uma gramática projetada para escrita, o que levou de forma maciça a uma visão preconceituosa da fala. Esta dicotomia baseava-se em observações como esclarece Marcuschi (2008) das condições empíricas de uso da língua, ou seja, apenas do signo linguístico, o que envolvia planejamento, e verbalização, e não exclusivamente das características dos textos produzidos e de seus contextos de produção e enunciação. Quando se fala no espaço escolar - e nele incluem-se os materiais didáticos, - essa visão encontra espaço, já que segundo Marcuschi (2005), essa perspectiva ainda hoje é muito presente nos manuais escolares, visto que esses não costumam dar muito espaço a essas questões – fala e escrita, oralidade e letramento – e não as trata com a devida atenção, ou seja, “a distinção entre fala e escrita em livros didáticos vem sendo feita na maioria das vezes de maneira ingênua e numa contraposição simplista”, isto é, as posições continuam sendo preconceituosas para com a oralidade, e as situações de ensino vêm utilizando a modalidade oral unicamente como instrumento para permitir o tratamento dos diversos conteúdos (PCN, 1998). Rojo (2003) em suas pesquisas sobre LDP nos mostra que o trabalho com a linguagem oral ainda se apresenta como um dos pontos de menor clareza para os autores e editores de LDP: sobre como ensinar e sobre como aprender. Em função disso, acaba-se privilegiando, dentro de sala, somente a linguagem escrita em detrimento da linguagem oral, ou passa-se a concebê-las de formas dicotômicas. Enfim, a escola deve procurar desenvolver um ensino considerando todas as modalidades de uso da língua e assumir que tanto a linguagem escrita como a oral são importantes no processo de ensino-aprendizagem e não mais permitir que sejam dicotomizadas, mas mostrar que ambas possuem características em diversos gêneros textuais/discursivos e em contextos sociodiscursivos e enunciativos diversos, tais quanto são os usuários da língua. 1 A perspectiva do contínuo tipológico de gêneros: relativizando a perspectiva dicotômica. Os estudos que demonstravam a dicotomia entre fala e escrita cederam lugar para novas pesquisas que passaram a mostrar que o texto é um evento sociocomunicativo, o qual se realiza a partir de um processo interacional, ou seja, todo texto é resultado de uma produção entre falante/ouvinte e um contexto de produção e enunciação, em termos bakhtinianos. Nesses novos estudos, o que distingue o texto escrito do texto falado é a forma como essa produção se materializa, e não apenas o uso de um sistema linguístico. Koch (2010), por exemplo, nos mostra que no texto escrito, a produção se resume à consideração daquele para quem se escreve, não havendo assim participação direta e ativa deste na elaboração linguística do texto, devido ao distanciamento entre locutor e interlocutores. Desse modo a dialogicidade constitui- se numa relação “ideal”, em que o escritor leva em conta a perspectiva do leitor. Já o texto falado, surge no próprio momento de interação entre os interlocutores, e por isso, pode-se dizer que tal interação é ativa. Por essa razão, a linguagem falada difere em muitos pontos da escrita. Entretanto, embora tal especificidade esteja bastante presente nessa relação, isso não significa, porém, que fala e escrita devam ser vistas de forma dicotômica, estanque, como era comum até algum tempo e, por vezes, como acontece ainda (KOCH, 2010). Com a decadência – parcial - da visão dicotômica vem-se postulando a visão da relação entre a linguagem oral e escrita através de diversas práticas sociais de produção textual, que se situam segundo Marcuschi (2001), ao longo de um continuum tipológico, sendo que em cada extremidade desse contínuo estariam, de um lado, a escrita formal e, de outro, a conversação espontânea, coloquial. Assim, para Marcuschi (2001, 2008), para se situar as diversas produções textuais ao longo desse contínuo, pode-se levar em conta, além do critério do meio, oral ou escrito, o critério da proximidade/distância, e também o envolvimento maior ou menor dos interlocutores. Nessa esteira, o contínuo tipológico distingue e correlaciona os textos de cada modalidade quanto às estratégias de formação textual que determinam o contínuo de suas características, surgindo daí semelhanças e diferenças ao longo de contínuo sobreposto. Segundo Koch (2010) nesse contínuo, num dos polos estaria situada a conversa face a face, no outro a escritaformal, como os textos acadêmicos, por exemplo. No entanto, a autora salienta que existem textos escritos que se situam, no contínuo mais próximo ao polo da fala conversacional como, por exemplo, bilhetes, cartas familiares textos publicitários e textos de humor, mas também, muitos textos escritos se situam próximos ao polo da fala, também há muitos textos falados que mais se aproximam do polo da escrita formal como, por exemplo, conferências, entrevistas profissionais, palestras, seminários, etc. As colocações feitas por Koch seguem, em certa maneira, o que é proposto por Mascurchi (2008, p. 38), a partir da figura 2, na qual o autor nos mostra as premissas para a observação da relação fala/escrita, por meio da perspectiva do contínuo de produção textual, e não na relação dicotômica de polos opostos: Fonte: Marcuschi (2008, p. 38). Embora, mesmo com significativas contribuições as observações que Marcuschi faz no que ser refere à relação entre linguagem oral e escrita vista pelo viés do continuum, para Barros-Mendes (2005) e também para nós, é necessário apontarmos para o fato de que, na (re)configuração da linearidade polar da noção tradicional para a visão de um “novo continuum de natureza gradual ou escalar” entre linguagem oral e escrita, verifica-se também marcas que encaminham para uma polarização, mesmo que de forma mais sutil nas proposições feitas por esse autor: Considerando os aspectos até aqui envolvidos, gostaria de propor três conjuntos de gêneros textuais (GT) 5: (a) GT tipicamente orais [GTO]; (b) GT tipicamente escritos [GTE] (c) GT produzidos na interface [GTO-E] ou [GTE-O]. Nos casos de (c), tomo a tipicidade como uma extensão particular da interface, o que daria um texto escrito recebido pela via oral, como os noticiários de TV; ou então um texto oralmente produzido, mas transmitido pela via escrita, como os contos populares ou as entrevistas das páginas amarelas da revista VEJA. (MARCUSCHI, 2008, p. 44-45). Em outras falas do autor, como a que segue, fica evidente as noções de gêneros tipicamente orais ou tipicamente escritos aparecem como modelos representativos ou da modalidade oral ou da modalidade escrita: assim, um determinado gênero da fala (GF), por exemplo, uma conversação espontânea, seria o GF1 e representaria uma espécie de protótipo da modalidade, não sendo aconselhável compará-lo com um gênero escrito (GE), tal como o GE1 que seria protótipo da escrita”. (MARCUSCHI, 2008, p.38). A partir dessa fala, a leitura que se faz como propõe Barros-Mendes (2005) é a de que há linguagem escrita pura de um lado e linguagem falada pura de outro, ou seja, a dicotomia permanece nos dois extremos da escala, enfraquecendo a sua posição de colocar-se numa visão de continuum, (re)interpretada, ou numa visão nova de continuum. O que se vê, nos exemplos dados pelo autor, em “c”, são “práticas de linguagem” nas quais, linguagem oral e linguagem escrita se imbricam de forma indissociável em alguns gêneros textuais/discursivos de forma hibrida como defendem Signorini (2001), Rojo (2001) et. al., ficando quase impossível separar o oral do escrito. 2 A perspectiva heterogênea ou dialógica de base enunciativa. Partindo das reflexões estabelecidas até agora sobre as correlações entre fala e escrita, novas correntes de estudos – enunciativo-discursivas e didáticas - começam a interpretar as relações entre linguagem oral e linguagem escrita a partir de um caráter heterogêneo de gêneros discursivos construídos sócio-historicamente, como propõe Bakhtin (2003 [1953/1979]). Um desses estudos mais significativos origina-se de produções com raízes nas teorias francófonas e genebrinas, mais precisamente do grupo de pesquisa GRAFÉ, composto pelo professor Dr. Bernard Schneuwly6 e pelo professor Dr. Joaquim Doz e outros pesquisadores que tomam por base de pesquisa a linha bakhtiniana, o sociointeracionismo de orientação vygostskana e o interacionismo sociodiscursivo de Bronckart. Nessa perspectiva, a língua é vista como uma atividade, ou seja, uma prática sociointerativa constituída historicamente em práticas sociais situadas, como lembra Bakhtin (2003 [1953/1979]) “a utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana.” Para Barros-Mendes, (2005), nessa perspectiva, os gêneros discursivos incluem toda sorte de diálogos cotidianos bem como enunciações da vida pública, institucional, artística, científica e filosófica, ou seja, nada impede que uma forma do mundo cotidiano possa entrar para a esfera da ciência, das artes, da filosofia, por exemplo, e entrando em contato com ela, ambas as esferas se modificam e se interpenetram. Assim, pelo viés dessa perspectiva, fala e escrita apresentam dialogicidade, funções interacionistas, envolvimento, negociação, situacionalidade e coerência, que demonstram o caráter enunciativo/dialógico que tanto a fala como a escrita possui. Dessa maneira, igualmente a Schneuwly e Dolz (2004), entendemos que mais do que procurar classificar as modalidades oral e escrita e estabelecer suas possíveis relações de semelhanças e diferenças, interessa-nos distinguir as diversas modalidades de realização das ações de linguagem no uso dessas modalidades, pois toda ação de linguagem implica diversas capacidades por parte do sujeito: adaptar- se às características do contexto e do referente (capacidades de ação), mobilizar modelos discursivos (capacidade discursivas) e dominar as operações psicolinguísticas e as unidades linguísticas (capacidades linguístico-discursivas). Tal distinção torna-se mais efetiva quando analisada pela ótica dos gêneros textuais/discursivos, pois, segundo Schneuwly e Dolz (2004), a apropriação não é senão o desenvolvimento das capacidades individuais correspondentes aos instrumentos materiais de produção. Ou seja, a apropriação de uma totalidade de instrumentos de produção é o desenvolvimento de uma totalidade de capacidade nos próprios indivíduos. Desse modo, partindo do pressuposto de que há gêneros textuais orais, sob diversas formas, que se relacionam com gêneros escritos, de forma muita diversa também, Schneuwly e Dolz (2004,p. 134-135) defendem com clareza a noção de que há “um imbricamento entre fala/escrita”, e que esse imbricamento em certas situações de comunicação, como propõem os autores, são interdependentes, há orais que se aproximar do escrito e mesmo dele depender – como é o caso da exposição oral, bem como também podem estar distanciados, por exemplo, no caso dos debates ou na conversação cotidiana. Algumas considerações Em linhas gerais, compreendemos que as relações existentes entre o oral e o escrito devem ser analisadas por meio de um caráter heterogêneo, ou seja, a relação entre linguagem oral e escrita deve ser vista/trabalhada a partir de uma visão sócio- historica e discursiva que concebe diferentes “práticas de linguagem heterogêneas” (CORRÊA, 2001; SCHNEUWLY, 1997 [2004]; ROJO, 2001A, 2001B, 2001c), que se concretizam nos diferentes gêneros textuais/discurso, sendo papel da escola trabalhar as diversas capacidades de linguagem que estão envolvidas no uso dessas modalidades. Desse modo, assim como Barros-Mendes (2005), Rojo (2003), Schneuwly (2004), e outros autores, estamos nos afiliando a esta última perspectiva, pois compreendemos que existem gêneros secundários orais e escritos, da mesma forma que existem os gêneros primários orais e escritos e que serão as diferentes mídias, esferas e situações comunicativas que definirão as diferentes formas e estilos de falar ou de escrever, de ditar ou de ler em voz alta, de escutar ou de tomar notas e assim por diante.