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Doenças Infectocontagiosas Dengue Introdução Dengue é uma doença febril, geralmente autolimitada, que envolve desde formas assintomáticas que evoluem para remissão dos sintomas até formas graves que exigem constantes reavaliações e intervenções para evitar o óbito. De acordo com a incidência máxima de dengue estabelecida para seu porte populacional, define-se a fase da dengue em um município. Fase silenciosa: incidência = 0; fase inicial: incidência < 20%; fase de alerta: incidência ≥ 20%; fase de emergência: incidência = 100% Transmissão O vírus da Dengue tem como reservatório natural o homem e como vetor o mosquito Aedes aegypti, um inseto de hábitos urbanos, pequeno raio de voo, vida curta (30 dias) e que faz criadouros em coleções de água., por isso os surtos de dengue ocorrem em épocas de chuva Prevenção Atualmente existem medidas de controle da transmissão da dengue que se baseiam em responsabilidades compartilhadas e ações integradas do poder público, comunidade, mídia e profissionais da saúde A eliminação dos criadouros é importante e não deve ser feita com larvicidas por produzir resistência e favorecer a acomodação da população. O controle do vetor pode ser feito através do isolamento de casos suspeitos. A nebulização em larga escala não é recomendada porque pode produzir resistência e toxicidade à população Dengue É considerado e deve ser notificado como caso suspeito de dengue aquele paciente com febre alta (39-40ºC) de duração de 2 a 7 dias e ao menos 2 dos seguintes sinais e sintomas: artralgia, mialgia, náusea, vômito, cefaleia, dor retro- orbitária, exantema maculopapular, prostração, prova do laço +, leucopenia e petéquias Toda criança com quadro febril agudo de duração de 2 a 7 dias sem foco de infecção aparente e proveniente de área de transmissão é definida como caso suspeito Confirmação laboratorial A confirmação laboratorial de um caso suspeito pode ser feita até o 5º dia desde o início dos sintomas através de isolamento viral, RT-PCR ou imuno-histoquímica. Além disso, a partir do 6º dia sintomático pode-se realizar sorologias. Se qualquer exame positivar, o caso é confirmado, mas se negativarem é necessário solicitar sorologia de IgM para confirmar o descarte da suspeita Sinais de Alarme Durante a defervescência da febre que ocorre entre o 3º e 7º dia da doença, podem surgir sinais que indicam que a doença tem potencial de evoluir para formas graves. Estes sinais devem ser pesquisados e valorizados pelos profissionais da saúde, além de descritos aos pacientes para que, assim que um deles surgir, ele procure um serviço de saúde imediatamente A maioria dos sinais de alarme resulta do aumento da permeabilidade vascular que levará à piora clínica do paciente, por isso o uso racional de líquidos é importante. São considerados sinais de alarme: ●Dor abdominal intensa e contínua, referida ou à palpação; vômitos persistentes mesmo após medicação; hepatomegalia dolorosa com aumento de mais de 2 cm do fígado abaixo do rebordo costal; desconforto respiratório ●Derrame cavitário como ascite, derrame pleural e derrame pericárdico; hipotensão postural e lipotimia; sangramento de mucosas ou hemorragias importantes; oligúria; hipotermia; letargia e irritabilidade; aumento progressivo do hematócrito Dengue Grave Se um sinal de alerta não for percebido ou não sejam tomadas medidas diante dele, o agravamento da dengue é iniciado e o paciente poderá evoluir para o óbito. Define-se como portador de dengue grave o paciente com suspeita de dengue e com ao menos um dos seguintes quadros: choque hipovolêmico; hemorragias graves; comprometimento grave de órgãos Choque hipovolêmico O aumento da permeabilidade vascular permite o extravasamento de um grande volume de plasma que leva ao surgimento do choque entre o 4º e 5º dia da doença. É um quadro de instalação rápida e curta duração Um paciente com choque prolongado pode ter hipoperfusão e comprometimento progressivo dos órgãos, acidose metabólica, coagulação intravascular disseminada, hemorragias graves e diminuição importante do hematócrito. Diante disso, o choque exige atenção porque tem capacidade de levar o paciente à óbito em até 12-24 horas. Os sinais clássicos de choque são: ●Hipotensão arterial em repouso; pulso periférico rápido, fraco e fino; enchimento capilar > 2 segundos; taquicardia, taquipneia, oliguria, pressão arterial convergente, ou PA diferencial < 20 mmHg; extremidades pálidas, frias e úmidas Hemorragias graves Hemorragias maciças acometem principalmente o aparelho digestivo, podendo ocorrer hematêmese, melena, metrorragia volumosa e até sangramentos no SNC Disfunções de órgãos Dengue pode levar à miocardite e insuficiência cardíaca identificadas através de alterações do ritmo cardíaco e ECG, além de elevações das enzimas cardíacas e fração de ejeção. Alguns pacientes podem desenvolver pneumonite, síndrome da angústia respiratória e sobrecargas de volume que geram desconforto respiratório A dengue pode provocar hepatite e disfunções hepáticas graves onde ocorre elevação das enzimas hepáticas e tempo de protrombina prolongado. Por fim, o acometimento do SNC pode ocorrer e provocar convulsões, meningite, encefalite, neuropatias e síndrome de Reye Dengue em Crianças Crianças podem ter dengue assintomática ou manifestada na forma de uma clássica síndrome febril viral, onde surgem sintomas inespecíficos que dificultam o diagnóstico como adinamia, sonolência, inapetência, vômitos e diarreia. Crianças com menos de 2 anos podem ter choro persistente e irritabilidade também O início da dengue em crianças geralmente passa despercebido e, quando se identifica a primeira manifestação clínica, em geral o quadro grave já se iniciou. O agravamento nessa faixa etária é mais súbito e os sinais de alarme mais facilmente detectáveis do que nos adultos Dengue em Gestantes A dengue oferece riscos de aborto e baixo peso ao nascer, por esse motivo toda gestante com sangramentos deve ser questionada sobre o histórico de febre nos últimos 7 dias para rastreio de dengue. O problema da dengue na gestação envolve os sangramentos de origem obstétrica e alterações fisiológicas da gravidez, ambos fatores que interferem nas manifestações clínicas da doença Classificação de Risco Em toda unidade de saúde deve-se realizar a classificação de risco com base em critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde. O estadiamento clínico através da anamnese e exame físico permite classificar o paciente em um dos 4 grupos de risco: grupo A, grupo B, grupo C ou grupo D Grupo A Faz parte do grupo A todo caso suspeito de dengue com prova do laço negativa, sem sinais de alarme, sinais de choque, sangramento espontâneo, comorbidades, condição clínica especial ou que faz parte de um grupo de risco Conduta A conduta clínica para pacientes do grupo A não exige exames específicos para confirmação diagnóstica. O acompanhamento será ambulatorial e só se solicita hemograma completo se o médico considerar necessário Enquanto o paciente aguarda a avaliação médica já se inicia a hidratação oral. Deve-se prescrever sintomáticos como antieméticos, antitérmicos e analgésicos (paracetamol ou dipirona), abolir o uso de salicilatos e AINEs, orientar repouso e prescrever dieta adequada Hidratação É necessário que o médico especifique o volume de líquido a ser ingerido pelo paciente de acordo com critérios pré- estabelecidos. Adultos devem ingerir 60 ml/kg/dia, sendo 1/3 de solução salina e 2/3 de outros líquidos caseiros como água, suco de frutas ou chás Crianças com idade menor do que 13 anos devem receber reidratação precoce e abundante com soro de reidratação oral. É recomendado que aqueles com menos de 2 anos de idade recebam 50-100 ml de líquidos por vez, enquanto crianças com mais de 2 anos recebam 100-200 ml por vez Peso da criança Volume a ser recebido < 10 kg 130 ml/ kg/ dia Entre 10 e 20 kg 100 ml/ kg/ dia > 20 kg 80 ml/ kg/dia Reavaliação Após a consulta, o paciente recebe o cartão de acompanhamento da dengue e deverá passar por reavaliação no dia da melhora da febre e, caso não ocorra a defervescência, no 5º dia da doença Observação Como os sinais de alarme tendem a surgir durante a remissão da febre, deve-se orientar o paciente a fazer retorno imediato na presença de qualquer um dos sinais Grupo B Faz parte do grupo B todo caso suspeito de dengue com prova do laço positiva, sangramento de pele espontâneo, condição clínica especial, risco social ou comorbidade, sem sinais de alarme ou sinais de choque São incluídos nesse grupo pacientes com: idade menor que 2 anos ou maior que 65 anos, gestantes, hipertensão arterial, diabetes, doença cardiovascular grave, DPOC, anemia falciforme, púrpuras, doença renal crônica, hepatopatias e doenças autoimunes Conduta A conduta clínica para pacientes do grupo B não exige exames específicos para confirmação diagnóstica. O acompanhamento será ambulatorial e só se solicita hemograma completo se o médico considerar necessário Enquanto o paciente aguarda a avaliação médica já se inicia a hidratação oral. Deve-se prescrever sintomáticos como antieméticos, antitérmicos e analgésicos (paracetamol ou dipirona), abolir o uso de salicilatos e AINEs, orientar repouso e prescrever dieta adequada Hemograma completo No momento do atendimento médico é colhida uma amostra de sangue para realização do hemograma completo e avaliação da hemoconcentração (hematócrito), exame complementar obrigatório para pacientes do grupo B. Até a saída dos resultados que leva no máximo 4 horas o paciente deve permanecer em observação Hematócrito normal Caso o hematócrito esteja normal, reclassifique o paciente e conduza como o grupo A. Agende um retorno para reclassificação até 48 horas após a queda da febre Hematócrito aumentado Se o hematócrito estiver aumentado em ao menos 10% o paciente deve permanecer em leito de observação com hidratação feita com soro fisiológico por via oral supervisionada ou por via endovenosa se necessário. 4 horas após a reidratação deve-se realizar reavaliação. Se houver normalização do hematócrito e ausência de sinais de alarme, o paciente é reclassificado para o grupo A e deve seguir com o esquema de hidratação domiciliar Observação Como os sinais de alarme tendem a surgir durante a remissão da febre, deve-se orientar o paciente a fazer retorno imediato na presença de qualquer um dos sinais, momento onde o paciente passa a pertencer ao grupo C Grupo C Faz parte do grupo C todo caso suspeito de dengue com algum sinal de alarme. São obrigatórios os exames para confirmação da doença e outros como hemograma completo, albumina sérica, dosagem de transaminases e tipagem sanguínea. Se julgar necessário, o médico pode solicitar gasometria arterial, glicemia, ureia, creatinina, ecocardiograma, raio-x de tórax e ultrassom de abdome Conduta Pacientes do grupo C devem ter acompanhamento em leito de internação até a estabilização por no mínimo 48 horas, onde receberão reposição volêmica intravenosa imediata de 10 ml/kg de soro fisiológico por 2 horas. Uma hora depois se faz a reavaliação clínica e duas horas depois a reavaliação do hematócrito Manutenção da hidratação Se houver melhora clínica e laboratorial, sinais vitais e PA estáveis, diurese normal e queda do hematócrito, inicia-se a manutenção da hidratação. Na primeira fase o paciente recebe 25 ml/kg em 6 horas. Se houver melhora inicia-se a segunda fase, onde receberá 25 ml/kg em 8 horas sendo 1/3 de soro fisiológico e 2/3 de soro glicosado Reclassificação Se não houver melhora, repita a fase de expansão até 3 vezes. Se ainda assim o paciente permanecer no mesmo estado, reclassifique ele e conduza como grupo D Critérios de alta O paciente recebe alta, é reclassificado e conduzido conforme o grupo B se atender a todos os seguintes critérios: estabilização hemodinâmica e ausência de febre por 48 horas, melhora visível do quadro clínico, hematócrito normal e estável por 24 horas, plaquetas em elevação e ausência de sintomas respiratórios Grupo D Faz parte do grupo D todo caso suspeito de dengue com algum sinal de gravidade como hemorragias graves, disfunções graves de órgãos ou sinais de choque. São obrigatórios os exames para confirmação da doença e outros como hemograma completo, albumina sérica, dosagem de transaminases e tipagem sanguínea. Se julgar necessário, o médico pode solicitar gasometria arterial, glicemia, ureia, creatinina, ecocardiograma, raio-x de tórax e ultrassom de abdome Conduta Pacientes do grupo D devem ter acompanhamento em leito de terapia intensiva para imediata expansão volêmica parenteral com solução salina isotônica 20 ml/kg em 20 minutos. De acordo com a necessidade, repetir essa reposição até 3 vezes. A reavaliação clínica deve ser feita de 15-30 minutos e do hematócrito a cada 2 horas Melhora do hematócrito Diante da melhora, reclassifique o paciente como grupo C e tome as condutas de acordo com ele. Estes pacientes devem permanecer em leito de UTI até a estabilização por no mínimo 48 horas, sendo encaminhados em seguida para um leito de internação Hematócrito em elevação Diante da persistência do choque e elevação do hematócrito, use expansores plasmáticos, coloide sintético e solução de albumina. Diante da melhora, reclassifique o paciente como grupo C e tome as condutas de acordo com ele Hematócrito em queda Hematócrito em queda exige investigação de hemorragias e coagulopatia de consumo. Se houver hemorragia, transfunda concentrado de hemácias, se houver coagulopatia, administre plasma, vitamina K e criopreciptado. Diante da melhora, reclassifique o paciente como grupo C e tome as condutas de acordo com ele Se não houver hemorragia ou coagulopatia, investigue sinais de desconforto respiratório, insuficiência cardíaca congestiva e hiper-hidratação. Diante disso, diminua a infusão de líquidos, administre diuréticos e inotrópicos se necessário. Diante da melhora, reclassifique o paciente como grupo C e tome as condutas de acordo com ele Transfusão de plaquetas É indicada a transfusão de plaquetas diante de sangramentos persistentes e descontrolados, trombocitopenia e aumento do tempo de ativação de protrombina mesmo tendo sido corrigidos os fatores de coagulação e do choque Interrupção da infusão de líquidos Deve-se interromper ou reduzir para a velocidade mínima a infusão de líquidos se não houver mais extravasamento plasmático; normalização da diurese, PA, pulso e perfusão periférica; diminuição do hematócrito na ausência de hemorragias; resolução dos sintomas abdominais