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HISTORIA - MODERNA PLUS - Volume unico-187-189


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O Reino de Gana
O primeiro reino saheliano de destaque e o mais 
antigo foi o de Gana, a Terra do Ouro, onde predomi-
nava a etnia soninque. Seu desenvolvimento precede 
no tempo a islamização, que ocorreu com mais vigor 
a partir do século XI. O poder de Gana vinha do con-
trole das minas e dos entroncamentos do comércio 
caravaneiro. O ouro, o mais importante dos produtos 
vindos da região subsaariana, era explorado nas ricas 
zonas auríferas de Bambuk e Buré, nos territórios 
dos atuais Gana, Costa do Marfim, Mali e Senegal. Em 
troca obtinha-se o sal, produto trazido das salinas 
do Saara e indispensável para a sobrevivência dos 
habitantes da África tropical, tanto por suas pro-
Fonte: SILVA, Alberto da Costa e. A enxada e a lança: a África antes 
dos portugueses. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1996. p. 297.
A cultura islâmica
A expansão do Império Árabe no Magrebe, a 
parte noroeste da África, dinamizou o comércio tran-
saariano. O sentido da conversão islâmica, contudo, 
tornou-se menos intenso no Sahel do que havia sido 
no norte. Divulgado por meio de mercadores, mas 
também por funcionários, letrados e intelectuais, 
em Gana o islã se tornou presente pela conversão de 
ministros e assessores do gana (o dirigente maior) 
e pelo uso da escrita árabe por parte da burocracia 
e da administração do Reino. Nesses termos, o islã e 
sua cultura significaram mais um elemento capaz de 
adicionar poder, fortalecer e centralizar a autoridade 
do gana. O sentido político da islamização do Reino 
também transparecia na formação de uma unidade 
envolvendo tuaregues, malinques, fulas, songais, 
mandes e outros povos. Com o islã, instituiu-se um 
código de leis comum a todos, a charia, uma mesma 
cultura e língua, a árabe, e a ideia de serem todos 
irmãos em Maomé [doc. 3].
 Reinos e impérios do Sahel séculos DOC. 2
• oma ar bica. Produto silvestre 
coletado, sobretudo, em áreas da 
Senegâmbia e da Mauritânia, tal 
como o mel, a cera e a borracha.
• Sorgo. Planta da família das 
gramíneas, semelhante ao milho, 
muito cultivada na África, na Índia e 
na China.
• Milhete. Variedade de milho de 
grãos pequenos.
• mbar. Resina fóssil muito utilizada 
na fabricação de ornamentos.
• Alm scar. Perfume obtido a partir 
de uma substância secretada de 
plantas e animais.
DOC. 3 Crianças aprendem a ler o 
Alcorão, século XX, África Ocidental 
Francesa, próximo ao território do antigo 
Reino de Gana. Postal feito a partir de 
foto de Edmond Fortier (1862-1928). 
Casa das Áfricas, São Paulo.
Impérios ou reinos
Área de influência
islâmica até o século XVI
M
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ELHO
 
 OCEANO 
ÍNDICO
OCEANO
ATLÂNTICO
 Rio Níger
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 Rio Nilo 
Rio Senegal 
 MAR MEDITERRÂNEO 
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DESERTO DO SAARA
IMPÉRIO
DO MALI
ÍNDIA
ARÁBIA
Meca
REINO DE
GANA
REINO DE
SONGHAI
REINO
DE
BORNO
REINO DE
KANEM
ESTADOS
HAUÇÁS
ETIÓPIA
Timbuctu
 Rio Volta 
EGITO
Aksum
Madagascar
Melinde
 Mombaça
Quíloa
Benin
Djenné
Gao
Ifé Igbo-Ukwu
LÍBIA
REINO
IORUBA
REINO
DE BENIN
Rio Níger 
ÍNDIA
ARÁBIA
1.030 km
priedades conservantes quanto por seu valor como 
moeda de troca. 
O comércio do ouro e do sal, bem como o de outros 
produtos, como a goma arábica, o sorgo, o milhete, o 
âmbar, o almíscar, as peles e o marfim, era bastante 
antigo, sendo conhecido desde o século II, com a 
introdução do camelo e das caravanas, que possi-
bilitaram as viagens pelo deserto. Por meio dessas 
rotas, as culturas do Sahel começaram a se interessar 
pelo mundo de fora, fornecendo ao Mediterrâneo e ao 
mundo árabe seu mais valioso e cobiçado produto: o 
ouro. Assim, séculos antes da exploração dos metais 
preciosos na América pelos europeus, os povos do 
Sahel já mantinham contato com ideias, mercadores 
e religiosos vindos do norte.
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O mpério do Mali
O poder do Império do Mali, território do grupo 
linguístico malinque ou mandinga, sucedeu o de Gana. 
O Império do Mali floresceu entre os séculos XIII e 
XVI, governado por dirigentes chamados de mansas, 
alguns deles famosos por suas peregrinações a Meca 
e a Medina. No Mali, a islamização parece ter sido 
mais completa.
As viagens dos mansas reuniam numerosas 
caravanas, que levavam grande quantidade de 
mercadorias e presentes e serviam para fortalecer 
a diplomacia dos mansas e do Reino. Elas também 
visavam equiparar a autoridade dos governantes do 
Mali à dos demais dirigentes do mundo árabe, espe-
cialmente quando recebiam sua mais alta honraria: 
o título de Al Hajj. 
A representação iconográfica dessas peregri-
nações aparece nos primeiros atlas e portulanos 
europeus, elaborados no século XIV, que trazem 
informações sobre a África Ocidental e nos quais 
a imagem do dirigente maliano é associada à sua 
esplendorosa riqueza em ouro. 
Um dirigente de destaque foi Mansa Musa, que go-
vernou o Mali entre 1312 e 1337, e a quem se atribui, além 
de uma maior islamização da sociedade, a expansão do 
Império, a reorganização das províncias governadas por 
emires e, por fim, a conquista das importantes cidades 
de Ualata, Timbuctu, Takedda e Gao [doc. 4]. 
Alguns dos mansas tiveram seus feitos registrados 
tanto nos relatos dos eruditos árabes quanto na tradi-
ção oral difundida na região e recentemente compilada 
pelo historiador senegalês Tamsir Djibril Niane em sua 
obra Sundjata, ou, a epopeia mandinga [doc. 5]. Nela, o 
autor apresenta Sundjata, o herói fundador, colocando- 
-se acima das diversas chefaturas mandingas e expan-
dindo os limites do Reino em direção a Gana.
• mir. Título de nobreza historicamente 
utilizado nos países islâmicos do Oriente 
Médio e da África.
DOC. 4 Mansa Musa e sua peregrinação 
feita entre 1324 e 1325
O Atlas catalão, de 1375, foi feito por Abraão e 
Jahuda Cresques, judeus da Espanha. Os escritos que 
nele aparecem são do escritor árabe Al-Umari (1300- 
-1384). Ele relata a peregrinação de Mansa Musa pelas 
cidades de Tagaza, Tuat, Cairo, Meca e Medina, uma 
viagem descrita como fantástica e repleta de ouro e 
de presentes.
“Este senhor negro é aquele muito melhor senhor dos 
negros de Guiné. Este rei é o mais rico e o mais nobre senhor de 
toda esta parte, com abundância de ouro na sua terra. Embaixo 
do globo de ouro que o imperador Mansa Musa segura na mão 
direita está a representação da cidade de Tumbuctu.”
In: DAVIDSON, Basil. Os impérios africanos. 
In: História em Revista (1300-1400). A era da calamidade. 
Rio de Janeiro: Abril Livros/Time-Life, 1992. p. 149.
Atlas catalão [detalhe], de Abraão e Jahuda Cresques, 1375. Biblioteca Nacional da França, Paris.
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DOC. 5 A epopeia mandinga
“Sou griot. Meu nome é Djeli Mamadu Kuyatê, filho de 
Bintu Kuyatê e de Djeli Kedian Kuyatê, mestre na arte de 
falar. Desde tempos imemoriais estão os Kuyatês a serviço 
dos príncipes Keita do Mandinga: somos os sacos de palavras, 
somos o repositório que conserva segredos multisseculares. 
A arte da palavra não apresenta qualquer segredo para nós; 
sem nós, os nomes dos reis cairiam no esquecimento; nós so-
mos a memória dos homens; através da palavra, damos vida 
aos fatos e façanhas dos reis perante as novas gerações.
Recebi minha ciência de meu pai DjeliKedian, que a 
recebeu igualmente de seu pai; a história não tem mistério 
algum para nós; ensinamos ao vulgo tudo que aceitamos 
transmitir-lhe; somos nós que detemos as chaves das doze 
portas do Mandinga. [...]
Ensinei a reis a história de seus ancestrais, a fim de que 
a vida dos antigos lhes servisse de exemplo, pois o mundo 
é velho, mas o futuro deriva do passado.”
NIANE, Tamsir Djibril. Sundjata, ou, a epopeia mandinga. 
São Paulo: Ática, 1982. p. 11.
 As cidades-irmãs: 
Djenné e Timbuctu
Entre as cidades sahelianas, destacaram-se as de 
Djenné e Timbuctu, que se desenvolveram na região 
do médio Níger, próximas ao delta interior formado 
pelo curso do rio e numa região de solo fértil em ra-
zão do regime de cheias e vazantes. As duas cidades 
tiveram suas histórias interligadas pelos constantes 
e muito antigos contatos mercantis.
Djenné, a mais antiga das cidades, originou-se por 
volta do século III a.C. Seus moradores praticavam 
a agricultura, a criação de bois e, desde cedo, o co-
mércio. A importância comercial de Djenné cresceu 
principalmente com a islamização, no século XIII. A 
cidade converteu-se em poderosa praça mercantil do 
comércio de ouro em direção aos mercados do norte. 
Entre os mercadores que passavam por ela, predo-
minavam soninques, malinquês, wangaras e diulas, 
grupos especializados na atividade comercial. 
Timbuctu, a cidade-irmã de Djenné, teve um papel 
relevante nas trocas mercantis, congregando po-
pulações de mercadores berberes, árabes e judeus 
vindos da África do Norte, do Oriente Médio e do 
Saara. A fundação de Timbuctu é atribuída a grupos 
de tuaregues que ali se estabeleceram no início do 
século XII. Seus moradores aprenderam com seus 
parceiros e vizinhos de Djenné a arte de construir 
casas, mesquitas e edifícios públicos [doc. 6]. 
Além de serem pontos de encontro para os que via-
javam de canoa pelos rios ou de camelo pelo deserto, 
a importância das cidades sahelianas se devia ao fato 
de constituírem metrópoles políticas e centros cul-
turais. Timbuctu era especialmente notável por suas 
numerosas oficinas de produção artesanal, como 
também por ser um dos mais importantes centros 
intelectuais do Sahel. Na cidade, destacavam-se as 
escolas corânicas e a universidade de Sankore, que 
reunia comunidades de letrados e sábios e as mais 
significativas obras do conhecimento desenvolvido 
pelo mundo árabe da época. A cidade chegou a ter 
uma população permanente de cerca de 70 a 80 mil 
habitantes, além dos mercadores em trânsito. 
• Griot. Nas sociedades africanas, fortemente 
marcadas pela tradição oral, o griot era a pessoa 
responsável por transmitir a tradição histórica, 
atuando como cronista, poeta e músico.
DOC. 6 Mesquita às 
margens do Rio Níger, 
postal feito a partir de 
foto de Edmond Fortier 
(1862-1928). Casa das 
Áfricas, São Paulo.
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