Buscar

Importância da Família na Psicoterapia Infantil

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 43 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 43 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 43 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

1 
 
 
A CRIANÇA E A FAMÍLIA 
1 
 
 
 
Sumário 
 
NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2 
Introdução ................................................................................................ 3 
A Família Freudiana: a ordem simbólica .............................................. 5 
A vida imaginária da criança na acepção psicanalítica de família de 
Melaine Klein ................................................................................................ 10 
Lacan: a Família como estrutura, o Simbólico e o Real ..................... 13 
A família na teoria psicanalítica .......................................................... 17 
A importância da família ..................................................................... 17 
Do sintoma dos pais ao sintoma da criança ....................................... 23 
O Sintoma Infantil ............................................................................... 28 
Considerações finais: sobre o tratamento psicanalítico com a família 34 
REFERÊNCIAS ..................................................................................... 39 
 
 
 
2 
 
 
 
NOSSA HISTÓRIA 
 
 
A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de 
empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de 
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como 
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. 
A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de 
conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a 
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua 
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, 
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o 
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. 
A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma 
confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base 
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições 
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, 
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 
 
 
 
 
 
 
 
 
3 
 
 
Introdução 
 
 
Os terapeutas envolvidos da psicoterapia para o público infantil sabem 
que a família possui extrema importância no desenvolvimento da criança. Tem-
se, nas primeiras etapas de vida, uma relação de dependência do indivíduo em 
relação aos cuidados proporcionados pelos pais, que devem acolher as 
necessidades da criança no sentido de ofertar um ambiente suficientemente bom 
para o desenvolvimento saudável de seus familiares (Winnicott, 1963/1983a). No 
entanto, nos casos de busca pelo atendimento infantil, observa-se 
frequentemente um cenário oposto a este, no qual se percebe uma dinâmica 
permeada por sintomas localizados na criança, mas advindos do funcionamento 
familiar como um todo (Ferrari, 2012). 
Sabe-se que na clínica psicanalítica com crianças, o paciente - que é a 
criança - raramente expressa o desejo de tratamento psicoterapêutico (Barbosa, 
2010). Esta função quem normalmente realiza são os pais da criança, ou mesmo 
a escola, que apresentam a queixa e o desejo inicial de que a criança seja 
tratada. Sendo assim, num primeiro momento, o analista escuta quem solicitou 
o tratamento - geralmente os pais do paciente - e o aparente sintoma do infante 
surge como algo que possa incomodar à própria criança, mas incomoda 
principalmente aqueles que procuraram pelo atendimento. 
4 
 
 
K. K. P. Telles (2011) aponta que é no seio familiar que o sujeito pode 
vivenciar seus interesses e necessidades, bem como experienciar conflitos e 
preparar-se para adentrar e se relacionar com círculos sociais maiores. No 
entanto, este processo nem sempre acontece. Muitas vezes o ambiente falha 
além da capacidade da criança em suportar as falhas, haja vista que o ambiente 
ideal nunca é perfeito, mas sim "suficientemente bom". Estas falhas em demasia 
acarretam consequências ao psiquismo da criança e ao seu desenvolvimento 
social, e é neste momento que pode surgir a procura do tratamento. 
M. Ramos (1998) afirma que raramente a família reconhece estar enferma 
e a queixa geralmente está centralizada em apenas um membro da família, que 
em muitos casos é a criança, o que acaba por dividir a família entre "membros 
saudáveis" e "membros doentes". No entanto, sabe-se que na maioria dos casos 
em que a família projeta suas questões em um membro identificado, elaboram-
se algumas questões e vez ou outra acabam por chegar numa questão da família 
como um todo. Priszkulnik (1995) aponta que a maioria dos pais inicia o 
tratamento queixando-se da criança e pedindo "dicas" de como lidar com esta. 
Percebe-se que se a demanda não obtém resposta, os pais começam a falar da 
própria dinâmica e dificuldades deles surgem em terapia. A escuta psicanalítica 
permite que as questões que se iniciam como sendo do filho, acabam por 
abranger a própria vida dos pais. 
Sendo assim, é importante que os pais estejam envolvidos com a 
psicoterapia da criança e cabe ao analista entender e saber manejar a situação 
para que o melhor encaminhamento seja realizado. Priszkulnik (1995) 
argumenta que, de qualquer modo, com o envolvimento dos pais ou não, estes 
sempre aparecerão em análise. Desta forma, alguns autores apontam diversos 
modos de se trabalhar com os pais na terapia infantil: alguns, como Anna Freud, 
prezavam apenas por entrevistas com os pais, com cunho de orientação 
educativa; Melanie Klein considerava de extrema importância a análise do 
mundo interno da criança, prezando pelo encaminhamento dos pais a outro 
analista; Dolto e Mannoni tinham como foco escutar os pais em entrevistas, não 
dando-lhes orientações, mas ajudando a redimensionar as questões da criança 
e auxiliando, também, na re-situação de suas questões; dentre outros teóricos 
(Priszkulnik, 1995). Entende-se que não há uma única modalidade de inserção 
5 
 
 
dos pais na terapia da criança, mas compreende-se a importância de se 
promovê-la. 
O analista de crianças, na concepção de Winnicott, é aquele que vai tornar 
o ambiente à criança similar àquele em que a mãe exerce na função de holding. 
É uma abordagem frente a um ambiente que fracassou na adaptação das 
necessidades da criança. Costa (2004) afirma que caberá ao analista, então, ser 
continente para as necessidades de seu paciente, não se precipitando em 
interpretações ou com o estabelecimento de diagnósticos. Ao analista é indicada 
uma comunicação espontânea com a criança. K. K.P. Telles (2011) aborda que 
é necessário que o paciente atinja o mínimo de maturação para que qualquer 
interpretação possa ser útil. Portanto, quando se ocorre uma falha no 
desenvolvimento do paciente, o terapeuta deve proporcionar um ambiente que 
se adapta às necessidades do indivíduo, assim como a mãe suficientemente boa 
se adapta às necessidades do bebê. Assim, Winnicott como um psicanalista não 
ortodoxo, apontou que o terapeuta tem liberdade de usufruir do setting e manejá-
lo da melhor maneira a cada paciente, oferecendo um ambiente suficientemente 
bom que se adapte às suas necessidades (K. K.P. Telles, 2011). 
Melo (2003), respaldada pela teoria winnicottiana, afirma que o analista 
deve deixar a criança livre em sessão e permitir que o paciente se comunique de 
sua forma, por meio de sucessões de ideias, pensamentos, impulsos e 
sensações sem um aparente sentido ou conexão, mas que é a forma deste 
manifestar seu material simbólico. É papel do analista buscar remover os 
bloqueios que possam surgir em tais sucessões. Tal remoção permite que a 
criança possa realizar o processo de recordar, repetir e elaborar fundamentado 
por Freud, conduzindo-a para novasformas de significação e desenvolvimento. 
Sendo o analista importante no processo de acolher as demandas do paciente e 
auxiliar nas formas de elaboração, posteriormente a criança irá aprender com 
suas próprias experiências, a saber, lidar com suas dificuldades (Costa, 2004). 
A Família Freudiana: a ordem simbólica 
 
Esse percurso se inicia na grande invenção freudiana do complexo de 
Édipo, ao final do século XIX, quando Freud introduz, na cultura ocidental cristã, 
6 
 
 
a ideia de que o pai gera o filho que será o seu assassino (ROUDINESCO, 2003). 
Esse pai morto é recuperado, por meio da vivência edipiana, como um pai 
simbólico, um pai de identificação. Passa-se, então, de uma leitura sociológica e 
antropológica da família, a uma acepção psicanalítica da mesma: “Assim, Freud 
chegou rapidamente a formular uma teoria da família [...] fundada sobre uma 
dissimetria, aparecida desde as primeiras investigações na situação dos dois 
sexos em relação ao Édipo [...]” (LACAN, 1938/1997, p.53). 
Freud introduz na teoria psicanalítica a noção de complexo de Édipo 
através da literatura, a releitura do mito de Sófocles, e, também, o personagem 
de Shakespeare, Hamlet, e de Dostoiévski, os irmãos Karamazov. Esses três 
heróis, Édipo (inconsciente), Hamlet (culpa do desejo) e irmãos Karamazov 
(morte do pai real), são transferidos por Freud para o psiquismo individual 
através do complexo de Édipo. Dessa forma, a família é introduzida no cerne de 
uma nova ordem – a ordem simbólica (CARVALHO FILHO, 2008; 2010). 
No ano de 1897 Freud abandona a teoria da sedução e menciona, pela 
primeira vez, o mito do Édipo. Por conseguinte, o homem edipiano vai aparecer 
no momento da passagem de Freud de uma concepção traumática do conflito 
neurótico à teoria do psiquismo inconsciente. Na Carta 71 à Fliess (FREUD, 
1897/1976), sem imaginar que posteriormente seu interlocutor utilizaria o bisturi 
para extirpar a doença das histéricas, Freud, em uma descrição cuidadosa das 
relações entre a criança e os pais, menciona, pela primeira vez, o mito grego de 
Édipo: “sendo assim, podemos entender a força avassaladora de Oedipus – Rex, 
apesar de todas as objeções levantadas pela razão contra pressuposições do 
destino” (FREUD, 1897/1976, p.365). Tal acento à universalidade do mito grego 
desvela que a compulsão captada por Édipo é reconhecida por cada pessoa, 
porque sente sua presença dentro de si, temendo a realização do sonho edípico 
(FREUD, 1897/1991). 
 Assim, Freud inicia a construção desse conceito, tarefa árdua e 
duradoura, que acompanhará todo o desenvolvimento da teoria psicanalítica. 
Neste sentido, o próprio termo “complexo de Édipo” será utilizado apenas 
posteriormente (FREUD, 1910/1976). Logo, para se entender como Freud 
desenvolveu o conceito de complexo de Édipo e, concomitantemente, a acepção 
de família, é necessário acompanhar sua progressiva construção da teoria da 
7 
 
 
sexualidade. Para isso, retoma-se com Freud o surgimento da família e da 
civilização. 
Nos textos freudianos que versam sobre a família primeva, Moisés e o 
Monoteísmo (FREUD, 1939/1976) e, principalmente, em Totem e Tabu (FREUD, 
1912-1913/1976), encontra-se as relações entre a horda primitiva, a civilização 
e a religião. Essa família primeva, anterior à edípica, caracteriza-se pela 
ausência da lei e pelo império de um pai não submetido à mesma, devorador e 
incestuoso. A relação entre a família primeva, o clã totêmico e o complexo de 
Édipo, núcleo da família moderna e conceito estruturante da mesma na teoria 
psicanalítica, será promovida por Freud por meio da ideia da herança arcaica. 
No complexo de Édipo, repara-se no sujeito a presença dessa herança. 
Durante a vivência edípica, as reações da criança não se apoiam apenas no que 
experimentou, mas no modelo de um acontecimento filogenético que traz 
elementos arcaicos vinculados a experiências de gerações anteriores. Esses 
traços de memória, esses precipitados psíquicos, são despertados por uma 
repetição real, pois, no romance familiar, a família da realidade psíquica se 
apresenta como um suporte para a família imaginária. Tal reativação, levada a 
termo pelo complexo de Édipo, constitui-se em passo decisivo que indica a 
passagem da natureza (sensório) para a cultura (intelectual). No Édipo, vivido na 
família, reedita-se a renúncia pulsional sob a pressão da autoridade paterna e, 
posteriormente, da instância que substitui e prolonga o pai – o supereu. 
Destarte, após a instalação da nova ordem (fraterna), inicia-se um 
desenvolvimento que tem por característica o retorno do recalcado. Na criança, 
a ambivalência, que se constitui como parte essencial da relação com o pai, 
sustenta a hostilidade presente e desperta o crime primordial do pai totêmico, ao 
apontar para as mesmas estruturas edipianas também presentes nas proibições 
de tabus totêmicos. Configurada, assim, a família primeva como primórdio da 
família edípica, examina-se agora a questão do tabu. 
Relacionando o banquete totêmico à morte do pai e ao aparecimento da 
lei, do remorso e da culpa, Freud promove a relação entre dois tabus 
fundamentais, o do incesto e o do totemismo, e a instituição da família moderna. 
Essa articulação é necessária, pois Freud diferencia o sistema totêmico, cujo 
8 
 
 
laço é mais forte, uma vez que o totem é herdado pela linhagem feminina, do 
sistema familiar no sentido moderno. Sabe-se que, inicialmente, as proibições 
incidiram sobre as relações incestuosas fraternais e com a mãe e, apenas 
posteriormente, regularam também as relações dos filhos com o pai. 
Sobretudo, as restrições do tabu proíbem aos membros do mesmo clã 
que se casem ou mantenham relações sexuais uns com os outros. Posto que o 
tabu do incesto proíbe o que as suas pulsões os inclinam, pois aquilo que a 
natureza proíbe é supérfluo que a lei o faça, a proibição do incesto não deve ser 
entendida como uma medida de higiene e eugenia, mas como uma proibição 
que incide sobre o desejo (CARVALHO FILHO, 2010). 
Para relacionar a família primeva com a família moderna, Freud (1912-
1913/1976) remete à fobia de crianças, em que algumas características do 
totemismo aparecem em inversão: a identificação total do pai com o animal 
totêmico (objeto fóbico) e a vivência emocional e ambivalente para com esse 
ancestral comum. O papel do totem é desempenhado pelo pai no complexo de 
castração e no complexo de Édipo (FREUD, 1924/1976), papel de um inimigo 
temível aos interesses sexuais da infância. Não matar o totem e não manter 
relações sexuais na mesma casa totêmica. Eis as principais leis do totemismo, 
que coincidem com os dois crimes de Édipo: matar o pai e casar-se com a mãe. 
Desse modo, o sistema totêmico é produto das mesmas condições 
presentes no complexo de Édipo, que possibilitará, então, o estabelecimento de 
um pacto. O pai se compromete a proteger e a cuidar da prole, e os filhos se 
comprometem a respeitar a vida do pai. Por intermédio da renúncia pulsional, a 
proibição do incesto é que permitirá o acesso à civilização, dado que, agora, são 
necessárias duas outras famílias, uma apta a fornecer um homem e outra uma 
mulher, que pelo casamento permitem o surgimento de uma terceira família. 
Logo, uma família não existiria sem a sociedade e seu processo social de 
aliança. Nesse processo podemos observar, por um lado, a troca, a circulação 
de mulheres e, por outro, a proibição do incesto, permitindo que as famílias se 
aliem umas às outras, não permanecendo cada uma em seu próprio nicho. 
Portanto, a proibição do incesto é condição tão necessária à criação de uma 
família quanto à união de um sexo a outro. 
9 
 
 
Vimos que Freud desenvolve o conceito de complexo de Édipo durante 
toda a sua obra, porém, alguns textos são específicos e primordiais, pois 
enfocam a família edípica e a teorização do complexo de Édipo. Entre esses 
destacam-se: Três ensaios sobre a sexualidade(1905/1976); Romance familiar 
do neurótico (1908 - 1909/1976); Leonardo da Vinci e uma lembrança de sua 
infância (1910/1976); Um tipo de escolha especial de objeto feita pelos homens 
(1910/1976); A dissolução do complexo de Édipo (1924/1976); e Sexualidade 
feminina (1931/1976). 
Percorrendo esses escritos, observa-se que Freud utiliza de vários 
elementos da história da sexualidade para a composição do conceito de 
complexo de Édipo: teorias sexuais infantis; romances familiares; lembranças 
infantis recuperadas como fantasias. Logo, pode-se concluir que a realidade 
familiar e edípica é, na verdade, realidade psíquica. Mas, posteriormente, uma 
nova conceitualização do complexo de Édipo é elaborada por Freud a propósito 
da Teoria da Identificação. Em 1924, no texto A dissolução do complexo de Édipo 
Freud apresenta as diferenças no complexo de Édipo do menino e da menina, e 
também indica a importância do estudo da sexualidade feminina. 
Esse trabalho de construção teórica conduziu Freud a deixar clara a 
diferença entre a realidade e a realidade psíquica da vivência edípica e da 
família. Assim, conforme dito anteriormente, o enfoque simbólico da concepção 
freudiana de família e do Édipo constitui uma posição que permite a Freud 
considerar que a família é a maior coletividade da humanidade sem obstar que, 
em cada família, os lugares da vivência edípica são encarnados por pais e mães 
da realidade. 
Finalmente, apesar de enfatizar a importância da fase pré-edípica, Freud 
não a teorizou. Esta tarefa coube a Melaine Klein. A seguir, verão como as 
contribuições de Melaine Klein, interessada na origem das psicoses e nas 
relações arcaicas da criança com a mãe, possibilitou o acesso ao mundo 
fantasmático de crianças muito novas cujas relações objetais, formadoras da 
família, ocupam posição central. 
 
10 
 
 
A vida imaginária da criança na acepção psicanalítica de 
família de Melaine Klein 
 
 
A autora diferenciou sua teoria do complexo de Édipo da teoria freudiana 
ao fundamentar suas ideias sobre o Édipo nos conceitos Imaginário e Phantasias 
inconscientes, postulando a precocidade da vivência edípica, a consequente 
formação do Supereu e o surgimento inevitável da culpa, consequência das 
tendências orais e anais, sob as quais afirma a presença da libido genital, como 
também, a existência de um ego mais organizado, embora cindido, logo no 
primeiro ano de vida. Ego capaz de estabelecer relações objetais parciais e 
mecanismos de defesa que visam à angústia. 
A problemática da phantasia inconsciente é um conceito nodal da teoria 
kleiniana, por meio do qual podemos unificar seus múltiplos aspectos teóricos e 
práticos. A grafia phantasia sugere a conotação psicanalítica do termo, mas, 
principalmente, a evolução de seu sentido na obra de Klein. Definida como 
expressão psíquica das pulsões, a função estruturante da phantasia estende-se 
a toda a vida psíquica. Mesmo reduzida à sua dimensão inconsciente, concerne 
a tudo o que pertence à vida pulsional e a todas as pulsões; ainda, mantém 
relação com os objetos e se insere na cultura. A phantasia possui uma 
objetividade própria, uma realidade psíquica incontestável (KLEIN, 1921/1970). 
11 
 
 
Portanto, a phantasia situa-se na interação de uma realidade interna e de 
uma experiência efetiva, porém, reduzida, de início, da realidade externa. 
Constituindo a linguagem fundamental dos impulsos instintuais, está sujeita, 
como tal, ao princípio de prazer, ao processo primário, regente de todas as 
produções do inconsciente. 
Quanto ao imaginário kleiniano, esse é constituído por um conjunto de 
objetos internos, cuja representação denomina imago. Assim, cada imago é 
constituída pela phantasia inconsciente, à qual se acoplam as demais 
representações afins com o impulso a ela ligado. Esse conjunto de 
representações, cujo núcleo é a phantasia inconsciente primeira, é designado 
objeto interno. Para Klein, os inúmeros objetos internos se relacionam e se 
influenciam mutuamente, constituindo um mundo interno próprio a que se chama 
de Imaginário. Deste modo, o imaginário kleiniano obedece às leis do 
inconsciente, que se estrutura como phantasias. 
Tais conceitos, imago e imaginário, são necessários à tarefa de 
sistematizar os conceitos de complexo de Édipo e de família, na teoria kleiniana. 
Klein organiza suas ideias, presentes em artigos anteriores, no texto 
Algumas conclusões teóricas sobre a vida emocional do bebê (KLEIN, 
1931/1982). Seu retorno ao conceito freudiano de pulsão de morte (até então, 
abandonado pelos autores pós-freudianos), visa afirmar que o conflito pulsional 
(libido vs. pulsão de morte), se encontra no cerne das tendências hostis 
presentes na vivência edípica e, portanto, na origem da agressividade humana 
e da angústia, vivenciada não como angústia de castração, mas como angústia 
de morte. A angústia é a reação imediata da pulsão de vida à ação destruidora 
da pulsão de morte. Divergindo de Freud, Klein afirma que a angústia humana 
mais fundamental não é o medo de castração, mas o medo de sua própria 
destruição (KLEIN, 1928/1970). 
Ao contrário de Freud, a autora tem acesso primeiro ao complexo de 
Édipo da menina, observado na análise de Rita, o que lhe permite descrever três 
longas etapas da vida edípica. Klein acentua o início do Édipo no desmame e, 
principalmente, afirma que os fenômenos típicos e definidos do complexo são 
apenas o resultado de uma evolução que se estende por anos. A consequência 
12 
 
 
do pensamento kleiniano do Édipo arcaico é a revisão total da teoria freudiana 
da sexualidade feminina, a nova interpretação da inveja do pênis e a introdução 
de um complexo de feminilidade do menino semelhante ao complexo de 
masculinidade na menina. Mediante tais mudanças, também as relações 
objetais, formadoras da família, foram necessariamente reinterpretadas. 
 Posto que a concepção kleiniana do Édipo caracteriza-se por um 
alargamento considerável do campo de fenômenos associados a esse 
complexo, antes reduzido a uma manifestação contemporânea da fase fálica, 
crise breve e intensa, o complexo de Édipo torna- se um processo ordenado com 
duração de anos, e engloba a totalidade do desenvolvimento da criança, entre o 
desmame e o período de latência. As relações pré-fálicas da criança para com a 
mãe são enfatizadas por Klein, que, dessa forma, materniza mais as relações 
edípicas da criança, lidas por meio dos conceitos de phantasia, imago e 
imaginário. As projeções e introjeções nesse mundo interno, imaginário, que 
determinam a formação do eu, modificam a visão da realidade familiar da 
criança. 
Embora o pensamento kleiniano já esteja com seu núcleo construído a 
partir de 1927, a introdução dos conceitos de posição esquizo-paranoide e 
posição depressiva, momentos diferentes da evolução psíquica da criança que 
podem ser localizados no tempo (enquanto subdivisões do estádio oral), 
promovem modificações importantes cujas influências buscaremos compreender 
em sua teorização do complexo de Édipo. 
Klein aborda pela primeira vez, em 1934, os estádios infantis do 
desenvolvimento em termos de posição: “posição refere-se a conjuntos 
específicos de angústias e de defesas que se manifestam repetidas” (KLEIN, 
1934/1970, p.15). Dessa forma, o aparecimento de uma nova posição não 
suprime totalmente a ação dos mecanismos e operações da posição anterior, o 
desenvolvimento, apresenta uma constante oscilação de uma posição a outra, 
conforme seus movimentos de regressão e progressão. 
As posições descrevem as relações de ódio e de amor entre a criança e 
a sua mãe, trazendo à luz da psicanálise todo o material recalcado que Freud só 
havia acessado em adultos em regressão. Isso centra a questão da família, na 
13 
 
 
obra kleiniana, nos primeiros anos de vida da criança e em sua relação com a 
mãe. Contudo, Klein não descarta a posterior vivência do Édipo, comodescrita 
por Freud. 
Segundo Klein (1995), sem que para tal utilize nenhuma realidade 
antropológica, a mãe é objeto de todas as projeções odiosas e fusionais. Na 
família moderna, estão presentes desejos funestos e tormentosos, geradores de 
inúmeras patologias e, portanto, requisitantes da norma no cerne da relação 
entre a mãe e o filho. Porém, essa norma, autoridade do pai, torna-se apenas 
suporte do poder da mãe sobre o filho, culminando na noção de autoridade 
partilhada, posteriormente desenvolvida por Winnicott (1975) no texto A criança 
e seu mundo. A partir das ideias de Winnicott, encontramos o conceito de família 
ligado à ideia de dinâmica. Assim, para se entender kleinianamente o 
funcionamento da família, descrito como a dinâmica do inconsciente, devemos 
recorrer aos mecanismos psíquicos básicos: a identificação projetiva e a 
identificação introjetiva. 
Desse modo, Melaine Klein acrescenta à acepção psicanalítica de família 
o acesso à vida imaginária da criança, as suas imagos maternas e paternas, bem 
como a vivência de seus objetos parciais. Porém, não tendo em sua prática 
clínica atendido aos pais, para dar ao atendimento com a criança o estatuto de 
psicanálise, em sua obra a autora não trabalha com a abordagem clínica da 
família. Em contrapartida, o próximo autor, Jacques Lacan, apresenta grande 
contribuição à acepção psicanalítica de família, assim como a uma nova leitura 
do complexo de Édipo. 
 
Lacan: a Família como estrutura, o Simbólico e o Real 
 
Já em 1938, no texto Os complexos familiares (1997), a família, segundo 
Lacan, está sob a o ponto de vista da psicologia, por meio da análise e da 
observação. Utilizando-se de conhecimentos clínicos sobre o Édipo e de análise 
das teorias psicanalíticas, antropológicas e sociológicas, Lacan leva a uma 
compreensão sobre a família e sua evolução, valendo-se, inclusive, das ideias 
do biólogo alemão Jakob Von Meseküll. Grosso modo, a interiorização do meio 
14 
 
 
em que vive cada espécie determina a relação de dependência entre o meio e o 
indivíduo, mas, apoiando-se em Melaine Klein, Lacan considera que, em se 
tratando de família, o que é interiorizado são as representações marcadas pelo 
materno e pelo paterno a que se chama de imago. Porém, interpretando a 
Esfinge do Mito de Sófocles como a mãe, ao contrário de Freud que a coloca 
como pai, Lacan pôde ver na morte da Esfinge a emancipação das tiranias 
matriarcais e, assim, preocupar-se em separar o feminino do materno 
(ROUDINESCO, 2003). Nesse sentido, distancia-se de Klein. 
Para Lacan, a família moderna é uma contração da instituição familiar. Em 
seus estudos, objetiva os complexos presentes no desenvolvimento em 
detrimento aos instintos, o que lhe permite postular, como formadores da 
subjetividade, o complexo do desmame; o complexo da intrusão e o complexo 
de Édipo: 
 
 
Posteriormente, nos seminários As Psicoses (1955-1956/1988), As 
Formações do Inconsciente (1957-1958/1999) e, no texto avulso, O mito 
individual do Neurótico (1952- 1953/2008), entre outros, Lacan desenvolve a 
ideia do complexo de Édipo sustentado na função da metáfora paterna, 
desvelando sua importância na formação do sujeito, do simbólico e do 
inconsciente. 
Mas, é com a sua releitura revolucionária do complexo de Édipo freudiano, 
usando os conceitos do estruturalismo, da linguística e dos nós borromeanos, 
que Lacan contribui para o esclarecimento da acepção de família, agora como 
estrutura, ordenando a questão do falo, do Nome-do-Pai como significante da 
15 
 
 
lei, e estabelecendo os registros da falta e do objeto como frustração, privação 
e castração. 
Assim, para Lacan, a função paterna é romper a relação especular da 
criança com a mãe: o falo. O pai não produz a lei, mas é o efeito dessa lei e a 
representa. Portanto, o Nome-do-Pai é um significante privilegiado que substitui 
o desejo da mãe e instaura a divisão do sujeito. 
Segundo Lacan, em uma família, há lugares ou funções de mãe, de pai e 
de filho, que se articulam na constituição do sujeito. É no contato da criança com 
o Outro (Autre), inicialmente representado pela mãe, pela linguagem, que ela se 
constitui como sujeito: “Esse é o momento do Édipo, em que se interpõe à 
relação dual, imaginária por excelência, uma relação ternária, simbólica, 
instaurando o inconsciente” (CHAVES, 2002, p. 69). 
Na tentativa de se localizar, o sujeito dirige ao outro uma pergunta: O que 
quer? Pergunta fundamental para se pensar a posição do sujeito diante do 
desejo. Aí, tem-se a entrada do pai, cuja função é proibir o gozo por meio de 
duas proibições: à criança, não dormirás com sua mãe, e, à mãe, não 
reintegrarás o seu produto. Usando essa dupla proibição, o pai faz o corte 
fundamental entre a criança e a mãe, pois retira a criança do circuito mãe-filho e 
do lugar de objeto do desejo da mãe: o falo. 
O pai, como efeito da lei, apenas a representa. Ao se falar do Nome-do-
Pai, está-se referindo a um significante privilegiado que substitui o desejo da mãe 
e instaura a divisão do sujeito, tornando-o ser de desejo. Ressalta-se que o lugar 
do pai pode ser ocupado por outras pessoas, desde que se coloquem no lugar 
da lei da interdição. 
Na metáfora paterna, o importante é o que a mãe faz com a palavra do 
pai, com sua autoridade, a maneira como ela preserva o Nome-do-Pai. Da parte 
do pai, sua relação com a lei deve considerar-se em si mesma. Lacan diz que 
“um pouco de severidade” não faz mal, se severidade é o rigor na observância 
da lei. Conclui-se que o pai severo é o melhor para promover a lei. 
Encontramos o pai sem sua vertente simbólica e em sua vertente de 
realidade. O pai simbólico é o pai morto, desnecessário, desde que a mãe faça 
16 
 
 
operar sua lei. Em contrapartida, é importante observar que se vê uma busca de 
uma figura do pai, de uma presença que melhor encarne a lei, alguém que 
articule esse significante. Não basta que ele seja trazido pelo discurso da mãe. 
Sabemos que Lacan define o Nome-do-Pai como um nome dado à 
alternância da presença e da ausência da mãe. Logo, outra coisa pode ser 
utilizada para funcionar nesse lugar, pois a função do pai não é uma função 
imaginária. Isso porque há limites ao alcance do simbólico que não recobre todo 
o real. Portanto, o pai como representante de uma função simbólica não a 
representa plenamente. Na impossibilidade da representação simbólica plena, 
encontra-se a figura do pai imaginário: 
 
Vemos, portanto, a distinção do pai simbólico, representante da lei, e do 
pai real como agente da castração. Isso indica, claramente, a necessidade de 
alguém que efetue esse corte, o qual não pode ser feito pelo pai simbólico cuja 
característica é a ausência. É necessário que haja a presença, real, de alguém 
que articule o Nome-do-Pai. 
A função do pai está ligada à efetuação de sua palavra. Por meio dela, o 
pai pode operar como agente da castração. Logo, afirma-se que o pai real é 
apenas um efeito de linguagem. Todavia, devemos considerar que, pai 
simbólico, pai real e pai imaginário são registros interligados, o que possibilita o 
exercício de sua função. 
Compreende-se, assim, porque, para Lacan, o pai tem tantos nomes que 
não há um que lhe convenha. O pai, como Nome, faz referência a variedades 
possíveis do Nome-do-Pai, modos de bordejar a falta. 
 
17 
 
 
A família na teoria psicanalítica 
 
Encontra-se a questão da família nos primeiros escritos freudianos, 
porém, mais importante, observa-se que Freud e Lacan apresentam textos 
específicos sobre a família. Freud, em seus escritos sobre a família primeva e, 
Lacan no texto Os Complexos Familiares (1938/1997). 
Freud já nos apontava para o fato de que, apesar da importância do 
conceito complexo de Édipo, é necessário considerar que os lugares dessa 
estrutura são ocupados por pais e mães, homens e mulheres “encarnados” por 
pais da realidade, não apenas simbólicos.Vimos com Lacan (1992) que há limites ao alcance do simbólico que não 
recobre todo o real, que o pai como representante de uma função simbólica não 
a representa inteiramente. Logo, apesar das funções e dos lugares, contribuição 
do estruturalismo, não se pode negligenciar que estes lugares são ocupados por 
determinados pais e mães. Como não são abstratos, esses pais da realidade 
têm sua história, estruturam-se de determinada maneira e estão submetidos a 
influências culturais distintas. 
Portanto, a acepção de família, na psicanálise, é dada por intermédio do 
complexo de Édipo e, tanto teoricamente, quanto na clínica, se lida também com 
a realidade da família. Tal fato remete ao difícil assunto do tratamento 
psicanalítico com a família. 
 
A importância da família 
 
18 
 
 
 
Para Ferrari, Kaloustian e Manoug (1994, p.11) “a família desempenha 
papel decisivo na educação formal e informal dos filhos. Em seu espaço são 
absorvidos os valores éticos e humanitários, aprofundam-se os laços de 
solidariedade, constroem-se as marcas entre as gerações e são observados 
valores culturais.” 
Rodrigues (1981,p.52) diz que “A escolha da família como unidade de 
análise tem levado, em diversos estudos empíricos, à possibilidade de se 
apreender um “trabalho” conjunto da família, voltado para a sobrevivência e a 
reprodução.” Sua análise sobre esse tipo de investigação revela que o produto 
final das estratégias da família tomada como um todo, ou seja, suas adaptações 
às mudanças externas e aos estágios do ciclo de vida familiar, obedecem a 
padrões razoavelmente nítidos em famílias inseridas num determinado 
segmento social ou, mais genericamente, às diversas classes sociais”. 
Ao falarmos de família devemos ter em mente que “a discussão sobre 
família, enquanto uma porta de entrada para a compreensão de uma sociedade, 
começa com o questionamento sobre o significado do termo família e sobre o 
estatuto teórico que damos a ele”. (Almeida; Carneiro; Paula, 1987, p. 13). 
Nestes três recorte sobre o conceito de família podemos notar diferentes 
aspectos em relação a família, todos de grande importância, um relacionado a 
educação e a valores, outro ao trabalho na família com vista a reprodução e 
sobrevivência, e por último a relação da família com a análise da sociedade. 
19 
 
 
Pode-se dizer que a família influencia e é influenciada por quase todos os setores 
da vida. 
Estes e outros autores como Petrini (2003) e Gomes e Pereira (2005), no 
entanto, concordam quanto à influência da família no desenvolvimento e 
manutenção da saúde e no equilíbrio emocional de seus membros, daí a 
importância para todas as áreas da saúde se aprofundarem no tema. Para Petrini 
(2003) a família carrega uma responsabilidade civilizatória, uma capacidade de 
humanizar e socializar as pessoas. A educação familiar é também a base para 
a criatividade e o comportamento produtivo do ser humano. 
A família, segundo a tradição grega é constituída pelos cônjuges e filhos, 
este conceito sofreu transformações, e pode-se dizer que pela Constituição da 
República Federativa do Brasil (2010) é definida como a união estável entre 
homem e mulher ou qualquer dos pais e seus descendentes. 
 
A criança é então responsabilidade de três instituições: a família, a 
sociedade e o Estado. É clara a importância e influencia dada por estes três na 
criação e educação do indivíduo. Quando uma criança chega em nosso 
consultório com algum problema, temos que ter uma visão ampla que englobe 
estes três fatores para a sua análise. Não se pode imputar na criança toda a 
responsabilidade por seu fracassos intelectuais, motores e emocionais, pois esta 
se desenvolve como sujeito a partir do encontro com os outros e com o meio 
ambiente a sua volta. 
Embora a situação atual esteja em constante mudança, algumas 
heranças históricas estão marcadas profundamente ainda hoje, são elas: a 
romana, onde há a autoridade do chefe (pai) da família, a submissão da esposa 
e dos filhos; na era medieval perpetua-se o caráter sacramental do casamento 
20 
 
 
originado no século XVI; e da cultura portuguesa, temos a solidariedade, o 
sentimento de sensível ligação afetiva, abnegação e desprendimento. 
(Simionato e Oliveira, 2003) 
Priore (1999) faz um estudo sobre essa posição da mulher na sociedade. 
Desde os ensinos Cristão, a mulher por herança de Eva, primeira mulher no 
mundo, não somente era criada a partir de um homem, como também seria 
responsável pelo pecado original. O corpo da mulher era “erigido como altar da 
procriação, o útero em funcionamento apontava a mulher normalizada, 
identificada com os esforços da Igreja em redimir os males cometidos por Eva”. 
Na idade média e moderna ser mulher carregava uma conotação inferior, 
e a mulher teria que casar e ter um filho para poder ser respeitada. As lutas 
feministas lutaram por mudar este fato, mas não conseguiram apagar seu 
passado e suas influências até hoje em diversas culturas. (Priore, 1999) 
Outro aspecto importante é que a família não se constitui como um núcleo, 
mas como uma rede. Esta rede envolve a rede de parentesco de sangue como 
um todo e outras pessoas ligadas à família ou que possam dar condições 
melhores de vida a um filho. Uma família, não é uma família sem a existência do 
filho, é a criança que confere responsabilidade e peso para esta família, no 
entanto, as condições básicas para tal podem faltar, e nestes casos, os avós e 
irmãos são os primeiros a serem convocados a cuidar dessas crianças. 
Padrinhos e pais adotivos para o filho também são considerados. A adoção, 
principalmente não formal de uma criança é um assunto delicado, pois pode 
envolver a troca de favores. Os pais de sangue consideram que estão dando 
uma dádiva aos pais que não podem ter filhos e os pais adotivos podem achar 
que estão fazendo um favor à família pobre. Dessa forma há sempre uma 
expectativa de retorno ou reconhecimento de suas partes. (Sarti, 1996). 
Segundo Soifer (1982), a família se apresenta como um conjunto de 
pessoas que convivem por um tempo prolongado, relacionando-se com a 
sociedade e com a cultura. Por conseguinte, o infans, ao nascer, carece de 
noções fundamentais para sua sobrevivência. Incapaz de sobreviver sozinho, 
ele necessita dos pais para que o ensine desde os atos mais simples aos mais 
complexos, para constituir-se de forma sentimental e profissional. 
21 
 
 
De acordo com Soifer (1982), durante o processo de aprendizagem dos 
filhos, os pais os ensinam a amar, como também a serem solidários. Junto à 
função de ensinar deve estar a de pôr limites. Estes objetivam dar a noção da 
realidade ao infante opondo-se à fantasia, já que o ser humano tende, 
fortemente, a seus ímpetos. Sendo assim, a noção da realidade tem papel 
importante para a criança na contenção de seus impulsos. 
Entretanto, para se estabelecer este processo é essencial haver por parte 
das figuras parentais um investimento sobre a criança, isso significa que para o 
ser humano, existir não é análogo à vida. Antes de nascer, uma criança pode 
obter um lugar na família, criado a partir do desejo do par parental e, assim 
sendo, estes nomeiam os filhos e criam expectativas sobre eles. A partir do 
contato que a criança mantém com o Outro, inicialmente com a mãe, e, a 
posteriori, com a linguagem e com a cultura, é que o sujeito se constitui (Meira, 
2003). 
Esta mesma autora afirma que a função materna está atrelada ao cuidar 
do filho e, com isso, ela transmite amor, propiciando caminhos para que o sujeito 
possa se constituir. Entretanto, a mãe não é dotada de perfeição e nem é 
completa, por isso, sua criança acaba por ocupar o lugar que lhe falta. Neste 
instante, dá-se a entrada do pai – função paterna –, sendo este uma criação, um 
engenho fundamental para a constituição desse sujeito. Podemos dizer que a 
função paterna não só proíbe o gozo da plenitude, como também faznascer o 
desejo do sujeito. Ainda conforme Meira (2003), o pai é aquele que fará o corte 
na relação da criança com a mãe, sendo isso imprescindível, pois possibilitará 
ao infante que deixe o lugar de objeto materno. É importante salientar que 
falamos de função e, sendo assim, esta pode ser desempenhada por pessoas 
diversas. Dessa forma, o pai pode desempenhar a função materna de cuidar do 
filho e desejá-lo, assim como a mãe ou outras pessoas podem exercer a função 
paterna desde que se coloquem no lugar da interdição, da lei. 
Dentro dessa visão Mendonça (2013) acredita que a família é a estrutura 
responsável pela transmissão e inserção do infante na cultura por meio das 
figuras parentais que exercem funções primordiais na inscrição da criança no 
universo simbólico. A autora sublinha que por se tratar de funções simbólicas 
não se faz necessário que o agente das funções materna e paterna recaia sobre 
22 
 
 
as figuras da mãe e do pai, respectivamente, o que não quer dizer, com isso, 
que são funções anônimas, as quais qualquer um pode exercê-las, já que 
pressupõe o desejo do outro. 
Jerusalinsky (2009), cita que há um tempo para que o infans possa 
construir-se por intervenção do Outro e, dessa forma, tornar-se parte da história 
familiar. Esse tempo para a mãe e o bebê é constante e circundante sendo 
antecedido pelo tempo do desejo. Dessa forma, a mãe apresenta o bebê como 
objeto do seu desejo e, simultaneamente, investe-o com seus cuidados, oferta-
lhe bem-estar e permite-lhe sobreviver. Conforme a autora, para que a dimensão 
psíquica possa ser constituída, é fundamental que a relação entre mãe e filho se 
inscreva numa relação de falta e isso se dá através da presença e ausência 
daquela. 
Assim, a partir dos autores citados acima, vemos que o sujeito é o efeito 
da família, do desejo da mãe, do efeito da interdição o qual impede que entre 
mãe e filho haja uma “colagem”, na medida em que o pai atua como princípio da 
separação do que diz respeito ao desejo da mãe, ou desejo do Outro. Nesta 
reflexão, Meira (2003) questiona qual seria o lugar da família, concluindo que a 
esta caberia a tarefa de constituir o sujeito e ajudá-lo a lidar com o mal-estar 
constante que faz parte da estrutura de todos os sujeitos. Para isto, esta família 
tem que se reconhecer faltosa para que possa emergir o desejo. Sendo assim, 
a família só opera enquanto fracassa, uma vez que pais e mães são insuficientes 
na medida que não são plenos. 
De acordo com Roudinesco (2003), na contemporaneidade, a família 
pode ser definida por uma junção entre duas pessoas que buscam intimidade e 
realização através do sexo. Assim, a autoridade se modifica, já que novos 
arranjos familiares anulam os lugares antes seguros por pais e filhos, pois o 
avanço do declínio do patriarcado foi acelerado pelo decréscimo da autoridade 
moral do pai e da exclusividade do seu poder econômico. Ainda, conforme a 
autora, a elevação dos valores do homem de respeito a outrem, após o término 
da Segunda Guerra Mundial, propiciou um cenário para a emancipação feminina. 
Dessa forma, a hegemonia na qual se tinha como base a imagem do pai, 
atualmente, dilui-se garantindo novas formas de parentalidade com inúmeras 
consequências para o processo de subjetivação dos filhos. Segundo a autora, a 
23 
 
 
família contemporânea é uma instituição democrática, horizontal; seu poder está 
descentralizado e repartido entre seus membros. Para ela “esta família se 
assemelha a uma tribo insólita, a uma rede assexuada, fraterna, sem hierarquia 
nem autoridade, e na qual cada um se sente autônomo ou funcionalizado” 
(Roudinesco, 2003, p.155). 
Ainda segundo Kehl (2001), não se deve dividir a família em papéis 
tradicionais como: pai, mãe e filhos e sim em um pai ou uma mãe que realize 
esta função, pois a família é o que estrutura edipicamente os sujeitos. E é nessa 
estrutura, que se chama família, que a criança vai ser interpelada pelo desejo 
que a constituiu, o desejo do Outro, e vai deparar-se com o seu próprio desejo. 
E é nesse enviesamento que ela se tornará um ser de linguagem, barrada em 
relação ao gozo do Outro. Porém, para isso é necessário que o pai, enquanto 
função, e por isso simbólico, se faça presente como agente da castração, ou 
seja, aquele que promoverá o corte na relação narcísica e especular que se 
constitui entre a mãe e a criança. Trata-se aqui do Complexo de Édipo, drama 
subjetivo constituído por uma triangulação – criança, mãe e pai – que gira em 
torno de um objeto de desejo – o falo. 
 
Do sintoma dos pais ao sintoma da criança 
 
Lacan inicia sua Nota sobre a criança indicando que a família tem como 
papel essencial a transmissão da constituição subjetiva, que não é da mesma 
ordem da satisfação das necessidades, mas precisa ter “relação com um desejo 
que não seja anônimo” (LACAN, 1969/2003, p. 369). Enquanto a satisfação das 
necessidades se volta para a criança enquanto ser vivo, animal, a constituição 
subjetiva não se reduz a tal satisfação, já que se volta para a criança enquanto 
um ser pulsional e desejante, e que, por conseguinte, quer muito além do que 
lhe é oferecido. E para o sujeito se constituir, o desejo dos pais não pode ser 
anônimo; pelo contrário, esse desejo precisa nomear o filho, inscrevendo-o na 
família, por meio do simbólico. 
É então pela crença e expressão de seu desejo que os pais transmitem à 
criança a possibilidade de ela advir como sujeito. E como se dá essa 
24 
 
 
transmissão? “Da mãe, na medida em que seus cuidados trazem a marca de um 
interesse particularizado [...]. Do pai, na medida em que seu nome é vetor de 
uma encarnação da Lei no desejo” (LACAN, 1969/2003, p. 369). Ao cuidar de 
seu filho, a mãe demonstra interesse porque ele a atrai, como exemplifica Vieira: 
“imaginem uma mãe que adora o filho porque ele tem um jeitinho disso e daquilo, 
isso é diferente - ela conseguiu particularizar o interesse dela” (VIEIRA, 2005, p. 
4). A função materna, portanto, refere-se à relação da mãe com o “cuidar, e que 
seus cuidados mostrem um interesse; que esse interesse porte a marca de uma 
particularidade da criança” (idem). Se a mãe se interessa pela criança, é porque 
uma característica específica dessa chamou a atenção daquela, o que quer dizer 
que a mãe reconhece na criança um ser singular. É isso que dá início à 
constituição subjetiva. É sempre bom relembrar que, para facilitar a leitura, 
costumamos usar os termos “mãe” e “função materna” como equivalentes. No 
entanto, a função materna é um lugar vazio, pronto para ser ocupado por quem 
se dispuser. 
No caso da função paterna, “a lei no desejo seria o pai pegar esse desejo 
da mãe e dizer: ‘tudo bem, mas tem limite’, ou mais ou menos isso” (VIEIRA, 
2005, p. 5). A função paterna implica a interdição de algo no desejo da mãe, 
provocando o rompimento da dualidade imaginária mãe-bebê. Assim, a mãe não 
vai tomar a criança toda para ela, já que seu desejo é de, como um crocodilo, 
“abocanhar” o filho, reintroduzindo-o em si mesma (LACAN, 1969-70/1992). 
Entretanto, quando a mãe traz outros interesses além do filho, isso é sinal de 
que a função paterna está se fazendo presente no discurso dela. Nesse 
movimento, a mãe se assume como um ser que segue a desejar, visto que o 
filho não obturou sua falta. A criança se intriga com o desejo da mãe e, de início, 
se aliena a esse desejo, tomando-o como algo que pode suprir sua falta. Dito de 
outra forma, a criança se aliena ao desejo do Outro para depois se afirmar como 
sujeito desejante. Assim, a criança é, primariamente, efeito do desejo da família, 
ou seja, ela não se constitui originalmente como sujeito por si mesma sem 
ser/estar inserida no campo do Outro. 
No texto, Lacan faz menção às funções materna e paterna para lançar 
sua tese: “o sintoma da criança acha-se em condição de responder ao que existe 
de sintomático na estrutura familiar. [Portanto,]o sintoma pode representar a 
25 
 
 
verdade do casal familiar” (LACAN, 1969/2003, p. 369). Lacan é claro aqui. Ele 
não afirma que o sintoma da criança é o sintoma dos pais, mas que o sintoma 
da criança “pode” representar o sintoma dos pais. A tradução é literal do texto 
original em francês: “Le symptôme peut représenter la vérité du couple familial” 
(LACAN, 1969/2001, p. 373). Mas por que insistimos nisso que, de início, parece 
apenas um detalhe? Porque, numa leitura apressada, pode-se entender que 
Lacan reduzia o sintoma da criança ao sintoma dos pais, conferindo a ela, 
portanto, a condição de ser apenas um reflexo do inconsciente parental. Ao usar 
o verbo “pode”, Lacan aponta que o sintoma da criança representa o sintoma 
dos pais, mas que também representa uma formação inconsciente autêntica, por 
meio da qual a criança lida com aquilo que a afeta. 
Podemos ver em Checchinato (2007)essa redução do sintoma da criança 
ao sintoma dos pais, o que já se anuncia no título de seu livro: Psicanálise de 
pais: criança, sintoma dos pais. Ele não fala em psicanálise de crianças, pois a 
tese defendida é a de que “se a criança é sintoma dos pais, de seus problemas, 
importava ir à causa e não ao sintoma. Removida a causa, certamente o sintoma 
desapareceria” (CHECCHINATO, 2007, p. 14). O autor inicia assim sua 
argumentação: 
Ao considerar as entrevistas dessa autora [Maud Mannoni] com os pais 
de seus e suas pacientes e suas preciosas observações clínicas sobre as 
relações traumáticas entre pais e filhos, convenci-me de que a chave da clínica 
não seria a criança, mas os pais. Posteriormente, Lacan confirmou 
explicitamente essa ideia [sic] de M. Mannoni, em breve carta à doutora Jenny 
Aubry [Nota sobre a criança], quando afirmou que a criança é sintoma dos pais. 
(CHECCHINATO, 2007, p. 13, grifo do autor). 
Conforme exposto anteriormente, Lacan (1969/2003) não afirma que a 
criança “é” sintoma dos pais, mas que o sintoma da criança “pode” representar 
a verdade do casal parental, ou seja, que há uma possibilidade de que o sintoma 
da criança esteja articulado ao sintoma dos pais, mas há também uma 
possibilidade de que o sintoma da criança seja uma solução particular para 
responder ao seu lugar no desejo dos pais. É aqui que podemos buscar o sujeito-
criança em articulação e desarticulação com a subjetividade dos pais. No 
sintoma da criança, encontramos a sua subjetividade. Subjetividade essa que se 
26 
 
 
constrói a partir da alienação ao campo do Outro, mas por meio da qual a criança 
afirma sua singularidade. Mesmo que sejam os pais aqueles que levam a criança 
à análise, eles não podem “impedir que o analista tome as produções da criança 
como formações do inconsciente de um sujeito em particular, sem o que não 
haveria escuta da criança” (PETRI, 2006, p. 92). 
Assim sendo, os significantes advindos dos pais produzem efeitos na 
criança, mas ela tem seu modo singular de responder, aderindo e/ou resistindo 
a esses significantes, ressignificando assim sua posição no discurso dos pais. 
Nesse sentido, é possível falar de sintoma da criança, no qual ela se implica, e 
não somente da criança enquanto sintoma dos pais. O sintoma da criança tem 
relação com a subjetividade dos pais, mas sem se reduzir a ela. Os pais são 
imprescindíveis para que a criança possa advir como sujeito, para que ela possa 
ser inserida na ordem simbólica, que lhe dará condições de fazer parte da 
cultura. A criança, paradoxalmente, se aliena ao campo do Outro, para se afirmar 
enquanto sujeito. Nesse sentido, ela não é apenas um reflexo do inconsciente 
dos pais e, por isso, precisa ser escutada como sujeito do próprio discurso. 
O sujeito-criança entre o sintoma e a fantasia dos pais é o sujeito do 
próprio discurso que se manifesta quando é escutado. Em outras palavras, 
quando nos perguntamos sobre como pensar o sujeito-criança em articulação 
com a subjetividade dos pais, temos como possibilidade de resposta que esse 
sujeito é aquele que aparece em análise. Porque é na análise que a criança 
poderá se desvencilhar do sintoma dos pais, construindo o seu próprio. Nesse 
ponto, consideramos essencial a contribuição de Melanie Klein, pois ela 
“descobriu que o brincar das crianças era a via régia de acesso ao inconsciente, 
pois suas brincadeiras, desenhos e histórias fantasiosas podiam ser escutados 
exatamente como se escutavam associações livres dos pacientes adultos” 
(FRANÇA, 2006, p. 21). 
Freud (1908[1907]/1996), no texto Escritores criativos e devaneio já havia 
destacado o brincar como uma poderosa ferramenta de acesso ao mundo interno 
da criança. No entanto, foi Melanie Klein quem desenvolveu a técnica da análise 
de crianças utilizando-se do brincar, tomando por base a experiência do jogo do 
fort-da, narrado por Freud (1920/2006), em Além do princípio de prazer. Ao 
adaptar a técnica psicanalítica para a criança, ela “garantiu, pela consideração 
27 
 
 
da análise a partir da constatação da potencialidade de representação do 
simbolismo lúdico, a entrada efetiva da criança no campo da analisabilidade” 
(VORCARO, 2004, p. 60-61). 
A técnica do brincar veio responder à dificuldade de se propor a uma 
criança pequena que praticasse a associação livre (pressuposto básico que 
torna possível a análise de um adulto). Assim, impossibilitada por sua lógica 
precária de expressar verbalmente seus conflitos psíquicos, a criança 
representaria através das brincadeiras o que um adulto, por exemplo, 
manifestaria e elaboraria por meio de sua fala. Mas mesmo concordando que 
crianças não fazem associações livres como os adultos, Klein (1927/1996) 
levantou a hipótese de que isso acontecia porque a ansiedade impunha uma 
resistência às verbalizações. Portanto, a representação indireta dos seus 
conflitos através do brincar expunha a criança a uma cota menor de ansiedade 
do que aquela vivenciada pelo adulto, em que os conflitos são verbalizados 
diretamente por meio da fala. 
Entrementes, ao se submeter à linguagem, a criança não se mantém 
passiva aos significantes advindos do mundo dos adultos, mas, para isso, é 
preciso dar a ela a chance de se expressar, o que foi feito por Klein, como 
destaca Corso: “Melanie Klein [...] arrola a produção da criança, documenta seu 
processo, ressalta seu ponto de vista. Outros antes haviam dado voz à criança 
propriamente dita, mas foi acima de tudo Klein que acreditou nas suas 
associações” (CORSO, 1998, p. 114). 
Portanto, é pelo discurso, que faz laço social, que o sujeito expressa e 
comunica a sua singularidade. No entanto, no caso da criança, esse discurso 
não se reduz à palavra falada, mas se estende à brincadeira. Assim considerada 
em sua particularidade, a criança pode ser ouvida como sujeito do próprio 
discurso. Discurso esse que colocará em jogo o sintoma “da” criança e não 
somente o sintoma e o discurso dos pais, dos quais ela “pode” ser o reflexo ou 
extensão. 
Quando destacamos que há um sintoma “da” criança e não apenas um 
sintoma dos pais “na” criança, fazemos isso por acreditarmos que houve uma 
leitura equivocada do que foi exposto por Lacan (1969/2003) em Nota sobre a 
28 
 
 
criança. No setting analítico, a criança não pode ficar reduzida a um depósito do 
sintoma dos pais. Esse mau entendimento da teoria lacaniana acerca do sintoma 
da criança gera concepções equivocadas, como a de Checchinato (2007), que 
afirma ser necessário tratar apenas os pais, já que eles são a causa do sintoma 
que a criança apresenta. Se a criança não é a “chave da clínica” 
(CHECCHINATO, 2007, p. 13), como o autor afirma, então não há psicanálise 
da criança, apenas psicanálise dos pais. 
Certamente, a escuta dos pais é imprescindível, pois se eles levam a 
criança para a análise é porque o sintoma apresentado por ela despertou algo 
de insuportável neles, quem sabe um enigma cuja resposta, muitas vezes, eles 
preferem não conhecer. Ouvindoos pais, é possível encontrar qual o lugar 
ocupado pelo filho nessa relação. Além disso, a transferência, inicialmente, 
acontece com os pais. Se eles são “descartados” pelo analista, ou seja, se a eles 
não é oferecido um mínimo de escuta, as chances de a criança ser 
escutada/analisada se reduzem muito, pois são eles que a levam até o analista. 
Ressaltamos, assim, que é preciso dispor de certo critério com relação à 
leitura da Nota sobre a criança, para que não se desconsidere a existência do 
sintoma “da” criança enquanto uma formação do inconsciente dela, que implica 
tanto um sentido a ser decifrado quanto uma satisfação pulsional, o que, 
necessariamente, aponta para a resposta singular da criança àquilo que a afeta. 
Desconsiderar o sintoma “da” criança é desprezar a contribuição lacaniana da 
constituição subjetiva, além de ser um retrocesso no que diz respeito à conquista 
kleiniana, qual seja, a perspectiva de um tratamento psicanalítico possível da 
criança. 
O Sintoma Infantil 
 
29 
 
 
 
O sintoma na criança é sempre um apelo ao Outro, um pedido de socorro 
e além disso está imerso em um fantasma familiar. Em “Nota sobre a criança de 
Lacan (1969/2003), este afirma que o sintoma da criança representa a verdade 
do par familiar, ou seja, o que há de sintomático na estrutura familiar reflete na 
criança. 
Quando o bebê nasce já existem expectativas quanto ao seu futuro, ele 
realiza a presença do objeto a (objeto de desejo que simboliza a completude) na 
fantasia materna. Satura o modo de falta específico do desejo da mãe, de forma 
que esta se distancia de sua própria verdade, a da castração. Em um primeiro 
momento isto é necessário, mas não deve persistir, a entrada do terceiro termo, 
o pai, tem que provocar uma separação nessa diade, e colocar o sujeito em sua 
posição de filho, formando-se então uma tríade. Lacan (1969/2003) já aponta 
aqui a possibilidade do sintoma somático como tendência desse tamponamento 
da falta, na forma de uma exigência da criança de ser protegida: 
 
A culpabilidade aqui referida é implícita, a doença além de reclamar 
cuidados é indicadora de uma falta materna. Essa relação dual pode ser 
entendida como uma tentativa de retorno ao Um, a um momento de gozo do ser, 
30 
 
 
o qual só é subjetivado a posteriore com sua perda, ou seja, com a alienação à 
linguagem, ao Outro. 
O sintoma na criança é então segundo Lacan, resultante do fantasma 
familiar, de uma estrutura precedente ao sujeito. Quando temos um sintoma 
infantil sem a entrada do pai, o tratamento parece mais difícil de atingir uma 
“cura”. Ao passo que se já houver uma tríade, ou seja, uma castração simbólica 
já efetuada, os sintomas sejam eles quais foram, acham uma maior abertura ao 
tratamento. 
Segundo Mannoni (1967) a criança deve passar por conflitos que lhe são 
necessários. Estes conflitos são identificatórios e não conflitos com o real; e, se 
o mundo exterior é sentido pela criança como bom ou ruim, sabemos que não 
se trata de uma situação biológica, ou animal, de luta pela vida, mas de uma 
situação imaginária, que deve pouco a pouco simbolizar-se. 
O sintoma na criança se diferencia do sintoma no adulto em alguns 
pontos, sua estruturação simbólica ainda está em vias de constituição, seu 
contato com o mundo externo é muito novo e ela depende inteiramente das 
pessoas a sua volta. A criança está alienada ao Outro e suas escolhas, como ja 
vimos, são forçadas, ela está a merce do Outro e tudo que ela tem como suporte 
para entender o que acontece consigo e a sua volta é seu imaginário, é ele que 
permitirá o intecâmbia entre o simbólico e o real. 
Para Dolto (1996), quando uma criança apresenta distúrbios, 
encontramos em sua primeira infância ainda próxima, se pudermos conhecer 
sua história, os “momentos determinantes dos fracassos da simbolização do 
desejo ou dos traumas emocionais precoces das quais a angústia é o único 
testemunho.” (p.256) Essa época infantil do ser humano é onde “se enraízam a 
saúde, a inteligência e a sensibilidade potencial, juntamente com o esboço 
arcaico das modalidades do desejo e com as armadilhas em que este esbarra, 
desde os estágios oral e anal, já linguísticos e já morais, por concernirem ao ser, 
ao ter e ao fazer” (p.256) 
No sintoma infantil, temos assim, um trabalho de deciframento do sintoma, 
não apenas através do atendimento da criança mas também dos pais, da história 
dessa família que será a base para a criação desta criança. 
31 
 
 
As crianças nascem em contextos familiares característicos e toda a 
história que será constituída terá os fatos que precederam o seu nascimento e, 
consequentemente, os que irão acontecer ao longo da sua vida. As 
singularidades como o sexo, o instante de seu nascimento, situações referentes 
à gestação e ao parto, o lugar que ocupa em relação a seus irmãos, são dotados 
de significados para cada um dos pais e marcam um lugar em que a criança 
responderá a partir de determinada posição (Braeur, 1994). 
Assim, o filho não é apenas um sucessor, um descendente biológico ou o 
resultado de uma cópula, feito por um homem e por uma mulher. Ele é de carne, 
e o mais relevante é que ele é constituído de significantes, "pode ser o filho que 
eu fui, ou aquele que eu queria ter sido [...] Um filho é mesmo um significante a 
ser lido". (Bastos, 1999, p.79). 
Sabemos que o desencadeamento do sintoma pode surgir devido à 
vivência edipiana e Checchinato (2007) afirma que a lei decorre da função 
paterna a qual introduz a criança na castração da mãe, retirando esse infante da 
ordem da natureza e introduzindo-o na cultura. Conforme esse autor, são os pais 
que podem e devem propiciar o desenvolvimento sadio de seus filhos garantindo 
e facilitando uma escolha edípica normalizadora. O desdém na relação edípica 
tem produzido efeitos aniquiladores, pois há pais que se relacionam com seus 
filhos intimamente; pais que expõem suas vidas íntimas na presença de seus 
filhos e irmãos que se relacionam sexualmente com irmãos. Assim a desordem 
edípica impede a identidade subjetiva do sujeito. "O desequilíbrio na relação 
triangular produz efeitos diversos na identificação sexual ou é origem de 
patologias graves" (Checchinato, 2007, p.108). 
Conforme Checchinato (2001), o filho será continuamente vítima e/ou um 
beneficiário da estrutura psíquica da mãe. Este filho será um substituto do objeto 
(falo) que falta a essa mãe. A posição da criança como sintoma é devastadora, 
pois esta responde à falta daquela, ofertando-lhe o corpo para cuidar, 
entregando-lhe a existência, não arriscando nada que não seja direcionado por 
ela ou que sem sua proteção é impossível substituir. A criança prolonga sua 
infantilização e serve como tampão. Desse modo, impede a mãe ter acesso à 
verdade que o filho deixa escondida. Mãe e filho convivem de forma sintomática 
em um jogo de esconde-esconde. A contradição dessa posição de alienação que 
32 
 
 
a criança se constituiu serve de obstáculo para a mãe se deparar com a 
realidade. Para o autor, a doença do infante manifesta-se através dos sintomas 
que faz uma denúncia do estado psíquico que decorre de como o sujeito foi 
concebido, gestado e mantido no decorrer do desenvolvimento (Checchinato , 
2007). 
Para Mannoni (2004), a "doença" do infante faz uma denúncia que traduz 
nos conflitos dinâmicos característicos dele próprio, diante das exigências do 
social e do desafio do complexo de Édipo normal, como também pode gerar 
consequências como uma angústia reativa nos pais que se tornam incapazes de 
ajudar os filhos devido à inabilidade perante a sociedade. Segundo a autora, a 
complicação dos filhos rememora as carências, na estrutura edípica, não 
somente dos pais, mas dos avós, e até mesmo dos bisavós, o que indica uma 
enorme neurose familiar. A criança em desordem, presentifica um conflito vivo, 
latente, aceito ou ocultado pelos pais, que podem serdesejos reprimidos de pais 
não satisfeitos em sua vida conjugal ou mesmo social e que de alguma forma, 
aguardam de sua cria a cura ou uma forma compensatória para sua derrota. 
 
A autora infere que não se perceba que por trás de um sintoma infantil, há 
alguma desordem familiar. Todavia, não é certo que a essa desordem tenha uma 
correspondência explícita com os distúrbios expressados pela criança. O que 
traz prejuízo ao sujeito não é somente o confronto real da criança com a verdade 
penosa e traumatizante, mas também aquilo que não foi verbalizado de forma 
clara, possibilitando o seu confronto com a “mentira” do adulto. É o que não foi 
dito que assume relevância suscitando danos psíquicos. Mannoni menciona a 
relevância tanto da palavra do pai como da palavra da mãe, especialmente. 
Além disso, a posição que o pai assume para a criança dependerá do 
lugar que ele ocupa no discurso materno. A autora evidencia, ainda, como é 
comum ouvir que toda criança-problema reflete pais-problemas. É difícil não 
33 
 
 
perceber que por trás do sintoma, ocorre desordem familiar. Todavia, não é 
verdadeiro que essa desordem familiar possua uma relação direta de causa e 
efeito com os distúrbios da criança. Concluindo, o grande fator prejudicial ao 
sujeito é a recusa dos pais a enxergarem essa desordem, o empenho deles em 
palavra, para aí mudar uma complexa situação que muitas vezes escapa à sua 
consciência (Mannoni, 2004). 
Para Dolto (2004), a criança é aquela que encarna e presentifica – por 
meio dos seus sintomas – o resultado de um conflito vivo, familiar ou conjugal, 
velado e aceito por seus pais. Diz respeito a ela arcar, inconscientemente, com 
a força das tensões e das interferências provenientes da dinâmica emocional, 
sexual, inconsciente em ação nos pais, da qual o efeito da contaminação doentia 
se torna mais intensa na medida em que o silêncio e o segredo são guardados 
ao seu redor. 
Por conseguinte, os sintomas infantis de impotência manifestados seriam 
uma ressonância às angústias ou uma reação às angústias dos pais. Ainda, de 
acordo com Dolto, existem situações em que a linguagem verbal se torna falha 
para comunicar alguma coisa e os comportamentos são representativos, 
sintomáticos, assumindo esta função. A autora não culpa os pais, porém acredita 
que pais e filhos de tenra idade são participantes de forma dinâmica, 
indissociados pelas suas ressonâncias libidinais inconscientes. 
Dolto (2002) também evidencia o primado da palavra e a relevância do 
“falar à criança”. Assim, confirma a magnitude de “falar a verdade”, uma vez que 
o silêncio enganador promove a angústia e a verdade, quando dita, possibilita 
ao sujeito construir-se e humanizar-se. 
 
Um dos primeiros acontecimentos para reconhecer o filho enquanto 
sujeito, portador de sofrimentos, angústias e faltas é exposto por Dolto (1990), 
através da castração dos próprios pais. 
34 
 
 
Ela coloca a necessidade de levá-los a enxergar no filho um semelhante, 
um ser humano com inteligência e entendedor das coisas da vida, uma criança 
portadora de desejos, ao passo que eles não a veem a não ser um corpo que 
anseia cuidados, mal regrado e falho que precisa ser recondicionado, como se 
eles tivessem que desempenhar tal função, suscetível de ser realizada e 
dependente de um fator determinante, independente do tempo. 
Checchinato (2007) ressalta que a formação da criança é marcada 
especialmente pela maneira como os pais relacionam entre si. A forma de como 
um é para o outro deixam marcas indeléveis no inconsciente dos filhos, mas 
muitos pais disfarçam suas dificuldades no casamento o que leva a delegar o 
sintoma a seu filho como sendo uma forma de encobrir seus conflitos. Assim, há 
uma desestruturação em muitas dinâmicas familiares, interferindo de forma 
negativa e relevante no desenvolvimento dos filhos, os quais são dependentes 
do par parental, e, mais tarde, essas crianças serão geradoras de outras famílias 
(Gomes, 1998). 
Desta forma, na visão de Nominé (1997), para se ter uma família "sadia", 
é fundamental que cada um de seus membros ocupe seu lugar e que o par 
parental funcione de forma adequada, pois caso isso não ocorra, o sintoma da 
criança pode vir a emergir como a verdade do par familiar. 
 
Considerações finais: sobre o tratamento psicanalítico 
com a família 
 
35 
 
 
 
Sabe-se que Freud designou a família como a maior coletividade da 
humanidade. Posteriormente, Lacan apontou o diferencial entre o coletivo e o 
grupo: no coletivo não há a identificação com o líder, indispensável ao grupo. 
Sabemos que o cálculo do coletivo leva em conta que, uma pessoa, só pode 
saber sobre si a partir do outro, e de possibilitar o conhecimento da lógica dessa 
situação supondo o um-por-um. Assim, delimita-se o campo de trabalho no 
atendimento com a família: não se dirige ao grupo, à família, mas a sujeitos 
distintos. 
A dinâmica transferencial convida o psicanalista a ocupar diferentes 
lugares, em diferentes momentos, para os sujeitos presentes. Enquanto 
destinatário de transferência cabe ao analista fazer semblant de falta, necessária 
a cada um. 
Uma vez que o trabalho com a família apoia-se nos conceitos 
fundamentais, inconsciente, transferência, repetição e pulsão, e, se o analista 
mantém a escuta, operando com o desejo do analista, está de fato comprometido 
com a ética da psicanálise, mesmo com uma estratégia diferente da análise 
individual. 
A família, além de sua tarefa de constituir o sujeito, precisa ajudá-lo a lidar 
com o mal- estar, permanente produto do “estranho”, do não-todo estrutural do 
sujeito. Freud (1919/1976,p.177) postula o estranho familiar: “aquela categoria 
do assustador, que remete ao que é conhecido, de velho, e há muito familiar”. 
36 
 
 
Sua questão pode ser assim formulada: como é possível e, em que 
circunstâncias, o familiar pode tornar-se estranho e assustador? 
Para Freud, a resposta está no fato de que o familiar traz, também, algo 
escondido, oculto, que se mantém fora de vista. Um estranho, nada de novo ou 
alheio, familiar, há muito estabelecido na mente e dela alienado por meio do 
processo de recalque. Porém, tal impressão de estranheza manifesta-se na vida 
cotidiana, na criação estética, quando certos complexos infantis recalcados são 
abruptamente despertados em diversos temas angustiantes (ROUDINESCO, 
2003). 
A angústia do sujeito, frente ao irrompimento do “Estranho”, do Real, é 
encontrada na família, em seu ponto vazio, em sua constituição, no não-todo. 
Isso porque a família, assim como a mulher, por um lado, encontra-se submetida 
ao que é da ordem do falo, portanto, sujeita à castração. Por outro, ao não-todo 
fálico. Articulada ao que é do campo do significante, ao que é da ordem da 
castração, a família institui-se conforme a estrutura do complexo de Édipo, tendo 
sua origem, suas leis e normas que a ordenem. Mas, justamente no que diz 
respeito ao que é da ordem do gozo, do pulsional, inarticulável, exige algo que a 
barre e faça-lhe borda, insurge o “Estranho”, o insuportável. 
Portanto, a família é uma estrutura ancorada na lógica do não-todo fálico, 
apresentando em sua estrutura um ponto vazio no qual não há palavra que possa 
dizê-la toda. Logo, a família tem, em sua base, a falta, falta essa estrutural. Os 
mitos familiares, as ficções presentes no romance familiar, permitem bordejar 
esse ponto vazio da estrutura familiar. 
O que a psicanálise propõe então, introduzindo o conceito de sujeito, é 
que a família possa ser vista não como uma massa, uma soma de 
individualidades, mas, sim, como um conjunto aberto, uma coleção de 
singularidades, em que cada membro possa ser tomado um- a-um. 
Assim, do ponto de vista da psicanálise, a família deve ser tomada em 
suas particularidades. Não pensando “A família” como modelo, mas famílias, 
com suas particularidades de funcionamento. 
37 
 
 
No atendimento coma família produz-se um campo discursivo com seu 
encadeamento de significantes, produto e efeito da estrutura familiar. Escuta-se 
o discurso do Outro, dos pais, que opera transferencialmente. Escuta que se faz 
de um-a-um. 
Portanto, a escuta analítica da família pode sustentar-se, legitimar-se e 
ser formalizada a partir do fundamento mesmo que norteia a práxis psicanalítica: 
o sujeito do inconsciente. Esse trabalho possibilita, na família, mudanças nos 
discursos dos sujeitos, ressignificando, reposicionando, enfim, alterando a 
cadeia de significantes que sustenta a subjetividade dos sujeitos da família. 
Formalizar o trabalho psicanalítico com a família só é possível na medida 
em que a cadeia de significantes familiares impõe a missão de possibilitar a 
abertura do inconsciente, que não é inconsciente coletivo, de forma que a cadeia 
familiar na qual os sujeitos se apresentam, possa quebrar-se e, libertos os 
sujeitos da família, possam constituir uma cadeia aberta ao deslizamento dos 
significantes. 
O trabalho da psicanálise com a família deve considerar um duplo 
caminho. Por um lado, como qualquer psicanálise, definir o trabalho com a 
transferência, e, por outro, a direção do tratamento tendo, por meta, um final. 
Mas também se faz necessário que se considere a família como uma 
estrutura da lógica do coletivo, e não como um grupo, mantendo a sustentação 
de que trabalhamos com a incidência do real, do estranho. 
Para esse trabalho com a família, é necessário pensar a família como um 
coletivo e, portanto, na lógica do um-a-um, cada um em relação ao outro, o que 
possibilita manter no campo da psicanálise e, dessa forma, evitar o 
aconselhamento ou a pedagogia. 
Escutar a família psicanaliticamente, na lógica do coletivo, detectar o 
entrecruzamento dos fantasmas e fantasias e de seus componentes, permite 
detectar a função de algo residual dentro da família. Na função do resíduo, 
encontra-se a constituição subjetiva que implica a relação de um desejo “não 
anônimo”, no qual incide o real, portanto, o mal-estar, o impossível. Nas 
38 
 
 
considerações sobre a família feitas por Lacan no texto Duas notas sobre a 
criança (1969), ele destaca que a função de resíduo: 
 
A escuta psicanalítica com a família inclui o mal-estar, pondo em destaque 
o que é da ordem da desconstrução. Operando com a demanda na família, 
criam-se possibilidades de utilização do dispositivo analítico. Esse trabalho com 
a família é possível por existir a lógica do coletivo, proposta por Lacan, marcando 
diferença com a lógica do grupo. Na lógica do coletivo, toma-se a família como 
“conjunto”, que funciona graças ao elemento que lhe é exterior. A família, tomada 
na lógica do coletivo, vai tratar “um-por-um”, o não-todo, as diferenças. Portanto, 
não se pode dizer que a clínica com a família ocorre com o grupo, como afirma 
Freud em Psicologia das massas e análise do ego (1921/1976), mas a 
psicanálise com a família toma-a na sua dimensão não-toda, do um-por-um, das 
diferenças, pois cada família tem um conjunto de significantes que determina o 
dizer de cada sujeito, configurando uma particularidade familiar. Assim, na 
clínica com a família, deve-se levar em consideração tanto os aspectos do sujeito 
quanto os aspectos da família, dentro de uma lógica do coletivo. 
Empreender um atendimento com a família, sob a ética da psicanálise, 
implica desconstruir certo imaginário familiar, diminuindo seus efeitos, 
esvaziando fantasias, retificando posições subjetivas e reinscrevendo o sujeito 
no campo do Outro, também barrado. Tarefa árdua, principalmente porque ainda 
em desenvolvimento, mas presente em demandas clínicas. 
 
 
 
 
 
39 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
Almeida, A. M. "O Desejo No Neurótico Obsessivo". Psic. Rev. São Paulo, 
Vol.19, Nº 1, P.33- 57, 2010. Disponível Em: 
Http://Revistas.Pucsp.Br/Index.Php/Psicorevista/Article/Download/5219/3753. 
Barbosa, M. E. S. (2010). O Brincar Na Psicanálise: Do Objeto 
Transicional A Constituição Do Sujeito [Monografia]. Recuperado Em 
Http://Repositorio.Favip.Edu.Br:8080/Bitstream/123456789/656/1/Tcc+Complet
o.Pdf 
Bastos, R. F. A Criança No Discurso Parental. In: I Congresso 
Internacional De Psicanálise E Suas Conexões. Rio De Janeiro: Cia De Freud, 
1999. 
Carvalho Filho, J. G. T. A Acepção De Família Na Teoria Psicanalítica: 
Sigmund Freud, Melanie Klein E Jacques Lacan. Dissertação De Mestrado, 
Programa De Pós-Graduação Em Psicologia, Universidade Federal De São João 
Del-Rei, São João Del Rei. 
Carvalho Filho, J. G. T. O Conceito De Família Na Teoria Psicanalítica: 
Uma Breve Revisão. Pesquisas E Práticas Psicossociais [On-Line] V.3 N.1, 
2008. Disponível Em: < 
Http://Www.Ufsj.Edu.Br/Portalrepositorio/File/Revistalapip/Volume3_N1/Pdf/Car
valho_Filho.Pd F>. 
Chaves, W. C. A Noção Lacaniana Da Subversão Do Sujeito. Psicologia, 
Ciência E Profissão, V. 22, N.4, P.68-73, 2002. 
Checchinato, D. "Psicanálise Dos Pais". Pulsional Revista De Psicanálise, 
Xix/Xv (152/153), P. 42-69, 2001.Disponível Em: 
Http://Www.Editoraescuta.Com.Br/Pulsional/152_153_04.Pdf. 
Checchinato, D. Psicanálise De Pais: Criança, Sintoma Dos Pais. Rio De 
Janeiro: Companhia De Freud, 2007. 
Costa, T. (2004). Psicanálise Com Crianças (Vol. 75). Rio De Janeiro, Rj: 
Zahar. 
Dolto, F. Auto-Retrato De Uma Psicanalista. Rio De Janeiro: Editora 
Zahar, 1990. 
Dolto, F. Tudo É Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2002. 
Dolto, F. Prefácio. In: Mannoni, M. A Primeira Entrevista Em Psicanálise. 
Rio De Janeiro: Campus, 2004. 
Ferrari, A. G. (2012). Sintoma Da Criança, Atualização Do Processo 
Constitutivo Parental? Tempo Psicanalítico, 44(2),299-319. 
França, C. P. Em Nome Da Mãe: O Brado Kleiniano. In: Carvalho, A. C.; 
França, C. P. (Orgs.). Estilos Do Xadrez Psicanalítico: A Técnica Em Questão. 
Rio De Janeiro: Imago, 2006. 
Freud, S. A Dissolução Do Complexo De Édipo. Edição Standard Das 
Obras Psicológicas Completas De Sigmund Freud. (V. Xix, P. 214-224). Rio De 
Janeiro: Imago. 1976. (Texto Original Publicado Em 1924). 
Freud, S. Além Do Princípio De Prazer (1920). Rio De Janeiro: Imago, 
2006. P. 123-198. (Obras Psicológicas De Sigmund Freud: Escritos Sobre A 
Psicologia Do Inconsciente, 2) 
Freud, S. Caso 4 - Katharina (Freud) (1893-1895). Rio De Janeiro: Imago, 
1996. P. 151-160. (Ed. Standard Brasileira Das Obras Psicológicas Completas 
De Sigmund Freud, 2) 
40 
 
 
Freud, S. Escritores Criativos E Devaneio (1908[1907]). Rio De Janeiro: 
Imago, 1996. P. 131-143. (Ed. Standard Brasileira Das Obras Psicológicas 
Completas De Sigmund Freud, 9) 
Freud, S. Extrato Dos Documentos Dirigidos A Fliess. Edição Standard 
Das Obras Psicológicas Completas De Sigmund Freud. (V. I, P. 381-520). Rio 
De Janeiro: Imago. 1973. (Texto Original Publicado Em 1897-1923). 
Freud, S. La Naissance De La Psychanalyse. Paris: Puf. 1991 (Texto 
Original Publicado Em 1897). 
Freud, S. Leonardo Da Vinci E Uma Lembrança De Sua Infância. Edição 
Standard Das Obras Psicológicas Completas De Sigmund Freud. (V. Xi, P. 59-
126). Rio De Janeiro: Imago. 1976. (Texto Original Publicado Em 1910). 
Freud, S. Moisés E O Monoteísmo. Edição Standard Das Obras 
Psicológicas Completas De Sigmund Freud. (V. 23, P. 13-161). Rio De Janeiro: 
Imago. 1976 .(Texto Original Publicado Em 1934-1939). 
Freud, S. O Estranho. Edição Standard Brasileira Das Obras Psicológicas 
Completas De Sigmund Freud. (V. Xvii, P. 275-314). Rio De Janeiro: Imago. 1976 
(Texto Original Publicado Em 1919). 
Freud, S. O Mal-Estar Na Civilização (1930[1929]). Rio De Janeiro: Imago, 
1996. P. 65-148. (Ed. Standard Brasileira Das Obras Psicológicas Completas De 
Sigmund Freud, 21) 
Freud, S. Psicologia Das Massas E Análise Do Ego. Edição Standard 
Brasileira Das Obras Psicológicas Completas De Sigmund Freud. (V. Xviii, P. 81-
178). Rio De Janeiro: Imago. 1976. (Texto Original Publicado Em 1921). 
Freud, S. Psicologia De

Continue navegando