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1 A CRIANÇA E A FAMÍLIA 1 Sumário NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2 Introdução ................................................................................................ 3 A Família Freudiana: a ordem simbólica .............................................. 5 A vida imaginária da criança na acepção psicanalítica de família de Melaine Klein ................................................................................................ 10 Lacan: a Família como estrutura, o Simbólico e o Real ..................... 13 A família na teoria psicanalítica .......................................................... 17 A importância da família ..................................................................... 17 Do sintoma dos pais ao sintoma da criança ....................................... 23 O Sintoma Infantil ............................................................................... 28 Considerações finais: sobre o tratamento psicanalítico com a família 34 REFERÊNCIAS ..................................................................................... 39 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 Introdução Os terapeutas envolvidos da psicoterapia para o público infantil sabem que a família possui extrema importância no desenvolvimento da criança. Tem- se, nas primeiras etapas de vida, uma relação de dependência do indivíduo em relação aos cuidados proporcionados pelos pais, que devem acolher as necessidades da criança no sentido de ofertar um ambiente suficientemente bom para o desenvolvimento saudável de seus familiares (Winnicott, 1963/1983a). No entanto, nos casos de busca pelo atendimento infantil, observa-se frequentemente um cenário oposto a este, no qual se percebe uma dinâmica permeada por sintomas localizados na criança, mas advindos do funcionamento familiar como um todo (Ferrari, 2012). Sabe-se que na clínica psicanalítica com crianças, o paciente - que é a criança - raramente expressa o desejo de tratamento psicoterapêutico (Barbosa, 2010). Esta função quem normalmente realiza são os pais da criança, ou mesmo a escola, que apresentam a queixa e o desejo inicial de que a criança seja tratada. Sendo assim, num primeiro momento, o analista escuta quem solicitou o tratamento - geralmente os pais do paciente - e o aparente sintoma do infante surge como algo que possa incomodar à própria criança, mas incomoda principalmente aqueles que procuraram pelo atendimento. 4 K. K. P. Telles (2011) aponta que é no seio familiar que o sujeito pode vivenciar seus interesses e necessidades, bem como experienciar conflitos e preparar-se para adentrar e se relacionar com círculos sociais maiores. No entanto, este processo nem sempre acontece. Muitas vezes o ambiente falha além da capacidade da criança em suportar as falhas, haja vista que o ambiente ideal nunca é perfeito, mas sim "suficientemente bom". Estas falhas em demasia acarretam consequências ao psiquismo da criança e ao seu desenvolvimento social, e é neste momento que pode surgir a procura do tratamento. M. Ramos (1998) afirma que raramente a família reconhece estar enferma e a queixa geralmente está centralizada em apenas um membro da família, que em muitos casos é a criança, o que acaba por dividir a família entre "membros saudáveis" e "membros doentes". No entanto, sabe-se que na maioria dos casos em que a família projeta suas questões em um membro identificado, elaboram- se algumas questões e vez ou outra acabam por chegar numa questão da família como um todo. Priszkulnik (1995) aponta que a maioria dos pais inicia o tratamento queixando-se da criança e pedindo "dicas" de como lidar com esta. Percebe-se que se a demanda não obtém resposta, os pais começam a falar da própria dinâmica e dificuldades deles surgem em terapia. A escuta psicanalítica permite que as questões que se iniciam como sendo do filho, acabam por abranger a própria vida dos pais. Sendo assim, é importante que os pais estejam envolvidos com a psicoterapia da criança e cabe ao analista entender e saber manejar a situação para que o melhor encaminhamento seja realizado. Priszkulnik (1995) argumenta que, de qualquer modo, com o envolvimento dos pais ou não, estes sempre aparecerão em análise. Desta forma, alguns autores apontam diversos modos de se trabalhar com os pais na terapia infantil: alguns, como Anna Freud, prezavam apenas por entrevistas com os pais, com cunho de orientação educativa; Melanie Klein considerava de extrema importância a análise do mundo interno da criança, prezando pelo encaminhamento dos pais a outro analista; Dolto e Mannoni tinham como foco escutar os pais em entrevistas, não dando-lhes orientações, mas ajudando a redimensionar as questões da criança e auxiliando, também, na re-situação de suas questões; dentre outros teóricos (Priszkulnik, 1995). Entende-se que não há uma única modalidade de inserção 5 dos pais na terapia da criança, mas compreende-se a importância de se promovê-la. O analista de crianças, na concepção de Winnicott, é aquele que vai tornar o ambiente à criança similar àquele em que a mãe exerce na função de holding. É uma abordagem frente a um ambiente que fracassou na adaptação das necessidades da criança. Costa (2004) afirma que caberá ao analista, então, ser continente para as necessidades de seu paciente, não se precipitando em interpretações ou com o estabelecimento de diagnósticos. Ao analista é indicada uma comunicação espontânea com a criança. K. K.P. Telles (2011) aborda que é necessário que o paciente atinja o mínimo de maturação para que qualquer interpretação possa ser útil. Portanto, quando se ocorre uma falha no desenvolvimento do paciente, o terapeuta deve proporcionar um ambiente que se adapta às necessidades do indivíduo, assim como a mãe suficientemente boa se adapta às necessidades do bebê. Assim, Winnicott como um psicanalista não ortodoxo, apontou que o terapeuta tem liberdade de usufruir do setting e manejá- lo da melhor maneira a cada paciente, oferecendo um ambiente suficientemente bom que se adapte às suas necessidades (K. K.P. Telles, 2011). Melo (2003), respaldada pela teoria winnicottiana, afirma que o analista deve deixar a criança livre em sessão e permitir que o paciente se comunique de sua forma, por meio de sucessões de ideias, pensamentos, impulsos e sensações sem um aparente sentido ou conexão, mas que é a forma deste manifestar seu material simbólico. É papel do analista buscar remover os bloqueios que possam surgir em tais sucessões. Tal remoção permite que a criança possa realizar o processo de recordar, repetir e elaborar fundamentado por Freud, conduzindo-a para novasformas de significação e desenvolvimento. Sendo o analista importante no processo de acolher as demandas do paciente e auxiliar nas formas de elaboração, posteriormente a criança irá aprender com suas próprias experiências, a saber, lidar com suas dificuldades (Costa, 2004). A Família Freudiana: a ordem simbólica Esse percurso se inicia na grande invenção freudiana do complexo de Édipo, ao final do século XIX, quando Freud introduz, na cultura ocidental cristã, 6 a ideia de que o pai gera o filho que será o seu assassino (ROUDINESCO, 2003). Esse pai morto é recuperado, por meio da vivência edipiana, como um pai simbólico, um pai de identificação. Passa-se, então, de uma leitura sociológica e antropológica da família, a uma acepção psicanalítica da mesma: “Assim, Freud chegou rapidamente a formular uma teoria da família [...] fundada sobre uma dissimetria, aparecida desde as primeiras investigações na situação dos dois sexos em relação ao Édipo [...]” (LACAN, 1938/1997, p.53). Freud introduz na teoria psicanalítica a noção de complexo de Édipo através da literatura, a releitura do mito de Sófocles, e, também, o personagem de Shakespeare, Hamlet, e de Dostoiévski, os irmãos Karamazov. Esses três heróis, Édipo (inconsciente), Hamlet (culpa do desejo) e irmãos Karamazov (morte do pai real), são transferidos por Freud para o psiquismo individual através do complexo de Édipo. Dessa forma, a família é introduzida no cerne de uma nova ordem – a ordem simbólica (CARVALHO FILHO, 2008; 2010). No ano de 1897 Freud abandona a teoria da sedução e menciona, pela primeira vez, o mito do Édipo. Por conseguinte, o homem edipiano vai aparecer no momento da passagem de Freud de uma concepção traumática do conflito neurótico à teoria do psiquismo inconsciente. Na Carta 71 à Fliess (FREUD, 1897/1976), sem imaginar que posteriormente seu interlocutor utilizaria o bisturi para extirpar a doença das histéricas, Freud, em uma descrição cuidadosa das relações entre a criança e os pais, menciona, pela primeira vez, o mito grego de Édipo: “sendo assim, podemos entender a força avassaladora de Oedipus – Rex, apesar de todas as objeções levantadas pela razão contra pressuposições do destino” (FREUD, 1897/1976, p.365). Tal acento à universalidade do mito grego desvela que a compulsão captada por Édipo é reconhecida por cada pessoa, porque sente sua presença dentro de si, temendo a realização do sonho edípico (FREUD, 1897/1991). Assim, Freud inicia a construção desse conceito, tarefa árdua e duradoura, que acompanhará todo o desenvolvimento da teoria psicanalítica. Neste sentido, o próprio termo “complexo de Édipo” será utilizado apenas posteriormente (FREUD, 1910/1976). Logo, para se entender como Freud desenvolveu o conceito de complexo de Édipo e, concomitantemente, a acepção de família, é necessário acompanhar sua progressiva construção da teoria da 7 sexualidade. Para isso, retoma-se com Freud o surgimento da família e da civilização. Nos textos freudianos que versam sobre a família primeva, Moisés e o Monoteísmo (FREUD, 1939/1976) e, principalmente, em Totem e Tabu (FREUD, 1912-1913/1976), encontra-se as relações entre a horda primitiva, a civilização e a religião. Essa família primeva, anterior à edípica, caracteriza-se pela ausência da lei e pelo império de um pai não submetido à mesma, devorador e incestuoso. A relação entre a família primeva, o clã totêmico e o complexo de Édipo, núcleo da família moderna e conceito estruturante da mesma na teoria psicanalítica, será promovida por Freud por meio da ideia da herança arcaica. No complexo de Édipo, repara-se no sujeito a presença dessa herança. Durante a vivência edípica, as reações da criança não se apoiam apenas no que experimentou, mas no modelo de um acontecimento filogenético que traz elementos arcaicos vinculados a experiências de gerações anteriores. Esses traços de memória, esses precipitados psíquicos, são despertados por uma repetição real, pois, no romance familiar, a família da realidade psíquica se apresenta como um suporte para a família imaginária. Tal reativação, levada a termo pelo complexo de Édipo, constitui-se em passo decisivo que indica a passagem da natureza (sensório) para a cultura (intelectual). No Édipo, vivido na família, reedita-se a renúncia pulsional sob a pressão da autoridade paterna e, posteriormente, da instância que substitui e prolonga o pai – o supereu. Destarte, após a instalação da nova ordem (fraterna), inicia-se um desenvolvimento que tem por característica o retorno do recalcado. Na criança, a ambivalência, que se constitui como parte essencial da relação com o pai, sustenta a hostilidade presente e desperta o crime primordial do pai totêmico, ao apontar para as mesmas estruturas edipianas também presentes nas proibições de tabus totêmicos. Configurada, assim, a família primeva como primórdio da família edípica, examina-se agora a questão do tabu. Relacionando o banquete totêmico à morte do pai e ao aparecimento da lei, do remorso e da culpa, Freud promove a relação entre dois tabus fundamentais, o do incesto e o do totemismo, e a instituição da família moderna. Essa articulação é necessária, pois Freud diferencia o sistema totêmico, cujo 8 laço é mais forte, uma vez que o totem é herdado pela linhagem feminina, do sistema familiar no sentido moderno. Sabe-se que, inicialmente, as proibições incidiram sobre as relações incestuosas fraternais e com a mãe e, apenas posteriormente, regularam também as relações dos filhos com o pai. Sobretudo, as restrições do tabu proíbem aos membros do mesmo clã que se casem ou mantenham relações sexuais uns com os outros. Posto que o tabu do incesto proíbe o que as suas pulsões os inclinam, pois aquilo que a natureza proíbe é supérfluo que a lei o faça, a proibição do incesto não deve ser entendida como uma medida de higiene e eugenia, mas como uma proibição que incide sobre o desejo (CARVALHO FILHO, 2010). Para relacionar a família primeva com a família moderna, Freud (1912- 1913/1976) remete à fobia de crianças, em que algumas características do totemismo aparecem em inversão: a identificação total do pai com o animal totêmico (objeto fóbico) e a vivência emocional e ambivalente para com esse ancestral comum. O papel do totem é desempenhado pelo pai no complexo de castração e no complexo de Édipo (FREUD, 1924/1976), papel de um inimigo temível aos interesses sexuais da infância. Não matar o totem e não manter relações sexuais na mesma casa totêmica. Eis as principais leis do totemismo, que coincidem com os dois crimes de Édipo: matar o pai e casar-se com a mãe. Desse modo, o sistema totêmico é produto das mesmas condições presentes no complexo de Édipo, que possibilitará, então, o estabelecimento de um pacto. O pai se compromete a proteger e a cuidar da prole, e os filhos se comprometem a respeitar a vida do pai. Por intermédio da renúncia pulsional, a proibição do incesto é que permitirá o acesso à civilização, dado que, agora, são necessárias duas outras famílias, uma apta a fornecer um homem e outra uma mulher, que pelo casamento permitem o surgimento de uma terceira família. Logo, uma família não existiria sem a sociedade e seu processo social de aliança. Nesse processo podemos observar, por um lado, a troca, a circulação de mulheres e, por outro, a proibição do incesto, permitindo que as famílias se aliem umas às outras, não permanecendo cada uma em seu próprio nicho. Portanto, a proibição do incesto é condição tão necessária à criação de uma família quanto à união de um sexo a outro. 9 Vimos que Freud desenvolve o conceito de complexo de Édipo durante toda a sua obra, porém, alguns textos são específicos e primordiais, pois enfocam a família edípica e a teorização do complexo de Édipo. Entre esses destacam-se: Três ensaios sobre a sexualidade(1905/1976); Romance familiar do neurótico (1908 - 1909/1976); Leonardo da Vinci e uma lembrança de sua infância (1910/1976); Um tipo de escolha especial de objeto feita pelos homens (1910/1976); A dissolução do complexo de Édipo (1924/1976); e Sexualidade feminina (1931/1976). Percorrendo esses escritos, observa-se que Freud utiliza de vários elementos da história da sexualidade para a composição do conceito de complexo de Édipo: teorias sexuais infantis; romances familiares; lembranças infantis recuperadas como fantasias. Logo, pode-se concluir que a realidade familiar e edípica é, na verdade, realidade psíquica. Mas, posteriormente, uma nova conceitualização do complexo de Édipo é elaborada por Freud a propósito da Teoria da Identificação. Em 1924, no texto A dissolução do complexo de Édipo Freud apresenta as diferenças no complexo de Édipo do menino e da menina, e também indica a importância do estudo da sexualidade feminina. Esse trabalho de construção teórica conduziu Freud a deixar clara a diferença entre a realidade e a realidade psíquica da vivência edípica e da família. Assim, conforme dito anteriormente, o enfoque simbólico da concepção freudiana de família e do Édipo constitui uma posição que permite a Freud considerar que a família é a maior coletividade da humanidade sem obstar que, em cada família, os lugares da vivência edípica são encarnados por pais e mães da realidade. Finalmente, apesar de enfatizar a importância da fase pré-edípica, Freud não a teorizou. Esta tarefa coube a Melaine Klein. A seguir, verão como as contribuições de Melaine Klein, interessada na origem das psicoses e nas relações arcaicas da criança com a mãe, possibilitou o acesso ao mundo fantasmático de crianças muito novas cujas relações objetais, formadoras da família, ocupam posição central. 10 A vida imaginária da criança na acepção psicanalítica de família de Melaine Klein A autora diferenciou sua teoria do complexo de Édipo da teoria freudiana ao fundamentar suas ideias sobre o Édipo nos conceitos Imaginário e Phantasias inconscientes, postulando a precocidade da vivência edípica, a consequente formação do Supereu e o surgimento inevitável da culpa, consequência das tendências orais e anais, sob as quais afirma a presença da libido genital, como também, a existência de um ego mais organizado, embora cindido, logo no primeiro ano de vida. Ego capaz de estabelecer relações objetais parciais e mecanismos de defesa que visam à angústia. A problemática da phantasia inconsciente é um conceito nodal da teoria kleiniana, por meio do qual podemos unificar seus múltiplos aspectos teóricos e práticos. A grafia phantasia sugere a conotação psicanalítica do termo, mas, principalmente, a evolução de seu sentido na obra de Klein. Definida como expressão psíquica das pulsões, a função estruturante da phantasia estende-se a toda a vida psíquica. Mesmo reduzida à sua dimensão inconsciente, concerne a tudo o que pertence à vida pulsional e a todas as pulsões; ainda, mantém relação com os objetos e se insere na cultura. A phantasia possui uma objetividade própria, uma realidade psíquica incontestável (KLEIN, 1921/1970). 11 Portanto, a phantasia situa-se na interação de uma realidade interna e de uma experiência efetiva, porém, reduzida, de início, da realidade externa. Constituindo a linguagem fundamental dos impulsos instintuais, está sujeita, como tal, ao princípio de prazer, ao processo primário, regente de todas as produções do inconsciente. Quanto ao imaginário kleiniano, esse é constituído por um conjunto de objetos internos, cuja representação denomina imago. Assim, cada imago é constituída pela phantasia inconsciente, à qual se acoplam as demais representações afins com o impulso a ela ligado. Esse conjunto de representações, cujo núcleo é a phantasia inconsciente primeira, é designado objeto interno. Para Klein, os inúmeros objetos internos se relacionam e se influenciam mutuamente, constituindo um mundo interno próprio a que se chama de Imaginário. Deste modo, o imaginário kleiniano obedece às leis do inconsciente, que se estrutura como phantasias. Tais conceitos, imago e imaginário, são necessários à tarefa de sistematizar os conceitos de complexo de Édipo e de família, na teoria kleiniana. Klein organiza suas ideias, presentes em artigos anteriores, no texto Algumas conclusões teóricas sobre a vida emocional do bebê (KLEIN, 1931/1982). Seu retorno ao conceito freudiano de pulsão de morte (até então, abandonado pelos autores pós-freudianos), visa afirmar que o conflito pulsional (libido vs. pulsão de morte), se encontra no cerne das tendências hostis presentes na vivência edípica e, portanto, na origem da agressividade humana e da angústia, vivenciada não como angústia de castração, mas como angústia de morte. A angústia é a reação imediata da pulsão de vida à ação destruidora da pulsão de morte. Divergindo de Freud, Klein afirma que a angústia humana mais fundamental não é o medo de castração, mas o medo de sua própria destruição (KLEIN, 1928/1970). Ao contrário de Freud, a autora tem acesso primeiro ao complexo de Édipo da menina, observado na análise de Rita, o que lhe permite descrever três longas etapas da vida edípica. Klein acentua o início do Édipo no desmame e, principalmente, afirma que os fenômenos típicos e definidos do complexo são apenas o resultado de uma evolução que se estende por anos. A consequência 12 do pensamento kleiniano do Édipo arcaico é a revisão total da teoria freudiana da sexualidade feminina, a nova interpretação da inveja do pênis e a introdução de um complexo de feminilidade do menino semelhante ao complexo de masculinidade na menina. Mediante tais mudanças, também as relações objetais, formadoras da família, foram necessariamente reinterpretadas. Posto que a concepção kleiniana do Édipo caracteriza-se por um alargamento considerável do campo de fenômenos associados a esse complexo, antes reduzido a uma manifestação contemporânea da fase fálica, crise breve e intensa, o complexo de Édipo torna- se um processo ordenado com duração de anos, e engloba a totalidade do desenvolvimento da criança, entre o desmame e o período de latência. As relações pré-fálicas da criança para com a mãe são enfatizadas por Klein, que, dessa forma, materniza mais as relações edípicas da criança, lidas por meio dos conceitos de phantasia, imago e imaginário. As projeções e introjeções nesse mundo interno, imaginário, que determinam a formação do eu, modificam a visão da realidade familiar da criança. Embora o pensamento kleiniano já esteja com seu núcleo construído a partir de 1927, a introdução dos conceitos de posição esquizo-paranoide e posição depressiva, momentos diferentes da evolução psíquica da criança que podem ser localizados no tempo (enquanto subdivisões do estádio oral), promovem modificações importantes cujas influências buscaremos compreender em sua teorização do complexo de Édipo. Klein aborda pela primeira vez, em 1934, os estádios infantis do desenvolvimento em termos de posição: “posição refere-se a conjuntos específicos de angústias e de defesas que se manifestam repetidas” (KLEIN, 1934/1970, p.15). Dessa forma, o aparecimento de uma nova posição não suprime totalmente a ação dos mecanismos e operações da posição anterior, o desenvolvimento, apresenta uma constante oscilação de uma posição a outra, conforme seus movimentos de regressão e progressão. As posições descrevem as relações de ódio e de amor entre a criança e a sua mãe, trazendo à luz da psicanálise todo o material recalcado que Freud só havia acessado em adultos em regressão. Isso centra a questão da família, na 13 obra kleiniana, nos primeiros anos de vida da criança e em sua relação com a mãe. Contudo, Klein não descarta a posterior vivência do Édipo, comodescrita por Freud. Segundo Klein (1995), sem que para tal utilize nenhuma realidade antropológica, a mãe é objeto de todas as projeções odiosas e fusionais. Na família moderna, estão presentes desejos funestos e tormentosos, geradores de inúmeras patologias e, portanto, requisitantes da norma no cerne da relação entre a mãe e o filho. Porém, essa norma, autoridade do pai, torna-se apenas suporte do poder da mãe sobre o filho, culminando na noção de autoridade partilhada, posteriormente desenvolvida por Winnicott (1975) no texto A criança e seu mundo. A partir das ideias de Winnicott, encontramos o conceito de família ligado à ideia de dinâmica. Assim, para se entender kleinianamente o funcionamento da família, descrito como a dinâmica do inconsciente, devemos recorrer aos mecanismos psíquicos básicos: a identificação projetiva e a identificação introjetiva. Desse modo, Melaine Klein acrescenta à acepção psicanalítica de família o acesso à vida imaginária da criança, as suas imagos maternas e paternas, bem como a vivência de seus objetos parciais. Porém, não tendo em sua prática clínica atendido aos pais, para dar ao atendimento com a criança o estatuto de psicanálise, em sua obra a autora não trabalha com a abordagem clínica da família. Em contrapartida, o próximo autor, Jacques Lacan, apresenta grande contribuição à acepção psicanalítica de família, assim como a uma nova leitura do complexo de Édipo. Lacan: a Família como estrutura, o Simbólico e o Real Já em 1938, no texto Os complexos familiares (1997), a família, segundo Lacan, está sob a o ponto de vista da psicologia, por meio da análise e da observação. Utilizando-se de conhecimentos clínicos sobre o Édipo e de análise das teorias psicanalíticas, antropológicas e sociológicas, Lacan leva a uma compreensão sobre a família e sua evolução, valendo-se, inclusive, das ideias do biólogo alemão Jakob Von Meseküll. Grosso modo, a interiorização do meio 14 em que vive cada espécie determina a relação de dependência entre o meio e o indivíduo, mas, apoiando-se em Melaine Klein, Lacan considera que, em se tratando de família, o que é interiorizado são as representações marcadas pelo materno e pelo paterno a que se chama de imago. Porém, interpretando a Esfinge do Mito de Sófocles como a mãe, ao contrário de Freud que a coloca como pai, Lacan pôde ver na morte da Esfinge a emancipação das tiranias matriarcais e, assim, preocupar-se em separar o feminino do materno (ROUDINESCO, 2003). Nesse sentido, distancia-se de Klein. Para Lacan, a família moderna é uma contração da instituição familiar. Em seus estudos, objetiva os complexos presentes no desenvolvimento em detrimento aos instintos, o que lhe permite postular, como formadores da subjetividade, o complexo do desmame; o complexo da intrusão e o complexo de Édipo: Posteriormente, nos seminários As Psicoses (1955-1956/1988), As Formações do Inconsciente (1957-1958/1999) e, no texto avulso, O mito individual do Neurótico (1952- 1953/2008), entre outros, Lacan desenvolve a ideia do complexo de Édipo sustentado na função da metáfora paterna, desvelando sua importância na formação do sujeito, do simbólico e do inconsciente. Mas, é com a sua releitura revolucionária do complexo de Édipo freudiano, usando os conceitos do estruturalismo, da linguística e dos nós borromeanos, que Lacan contribui para o esclarecimento da acepção de família, agora como estrutura, ordenando a questão do falo, do Nome-do-Pai como significante da 15 lei, e estabelecendo os registros da falta e do objeto como frustração, privação e castração. Assim, para Lacan, a função paterna é romper a relação especular da criança com a mãe: o falo. O pai não produz a lei, mas é o efeito dessa lei e a representa. Portanto, o Nome-do-Pai é um significante privilegiado que substitui o desejo da mãe e instaura a divisão do sujeito. Segundo Lacan, em uma família, há lugares ou funções de mãe, de pai e de filho, que se articulam na constituição do sujeito. É no contato da criança com o Outro (Autre), inicialmente representado pela mãe, pela linguagem, que ela se constitui como sujeito: “Esse é o momento do Édipo, em que se interpõe à relação dual, imaginária por excelência, uma relação ternária, simbólica, instaurando o inconsciente” (CHAVES, 2002, p. 69). Na tentativa de se localizar, o sujeito dirige ao outro uma pergunta: O que quer? Pergunta fundamental para se pensar a posição do sujeito diante do desejo. Aí, tem-se a entrada do pai, cuja função é proibir o gozo por meio de duas proibições: à criança, não dormirás com sua mãe, e, à mãe, não reintegrarás o seu produto. Usando essa dupla proibição, o pai faz o corte fundamental entre a criança e a mãe, pois retira a criança do circuito mãe-filho e do lugar de objeto do desejo da mãe: o falo. O pai, como efeito da lei, apenas a representa. Ao se falar do Nome-do- Pai, está-se referindo a um significante privilegiado que substitui o desejo da mãe e instaura a divisão do sujeito, tornando-o ser de desejo. Ressalta-se que o lugar do pai pode ser ocupado por outras pessoas, desde que se coloquem no lugar da lei da interdição. Na metáfora paterna, o importante é o que a mãe faz com a palavra do pai, com sua autoridade, a maneira como ela preserva o Nome-do-Pai. Da parte do pai, sua relação com a lei deve considerar-se em si mesma. Lacan diz que “um pouco de severidade” não faz mal, se severidade é o rigor na observância da lei. Conclui-se que o pai severo é o melhor para promover a lei. Encontramos o pai sem sua vertente simbólica e em sua vertente de realidade. O pai simbólico é o pai morto, desnecessário, desde que a mãe faça 16 operar sua lei. Em contrapartida, é importante observar que se vê uma busca de uma figura do pai, de uma presença que melhor encarne a lei, alguém que articule esse significante. Não basta que ele seja trazido pelo discurso da mãe. Sabemos que Lacan define o Nome-do-Pai como um nome dado à alternância da presença e da ausência da mãe. Logo, outra coisa pode ser utilizada para funcionar nesse lugar, pois a função do pai não é uma função imaginária. Isso porque há limites ao alcance do simbólico que não recobre todo o real. Portanto, o pai como representante de uma função simbólica não a representa plenamente. Na impossibilidade da representação simbólica plena, encontra-se a figura do pai imaginário: Vemos, portanto, a distinção do pai simbólico, representante da lei, e do pai real como agente da castração. Isso indica, claramente, a necessidade de alguém que efetue esse corte, o qual não pode ser feito pelo pai simbólico cuja característica é a ausência. É necessário que haja a presença, real, de alguém que articule o Nome-do-Pai. A função do pai está ligada à efetuação de sua palavra. Por meio dela, o pai pode operar como agente da castração. Logo, afirma-se que o pai real é apenas um efeito de linguagem. Todavia, devemos considerar que, pai simbólico, pai real e pai imaginário são registros interligados, o que possibilita o exercício de sua função. Compreende-se, assim, porque, para Lacan, o pai tem tantos nomes que não há um que lhe convenha. O pai, como Nome, faz referência a variedades possíveis do Nome-do-Pai, modos de bordejar a falta. 17 A família na teoria psicanalítica Encontra-se a questão da família nos primeiros escritos freudianos, porém, mais importante, observa-se que Freud e Lacan apresentam textos específicos sobre a família. Freud, em seus escritos sobre a família primeva e, Lacan no texto Os Complexos Familiares (1938/1997). Freud já nos apontava para o fato de que, apesar da importância do conceito complexo de Édipo, é necessário considerar que os lugares dessa estrutura são ocupados por pais e mães, homens e mulheres “encarnados” por pais da realidade, não apenas simbólicos.Vimos com Lacan (1992) que há limites ao alcance do simbólico que não recobre todo o real, que o pai como representante de uma função simbólica não a representa inteiramente. Logo, apesar das funções e dos lugares, contribuição do estruturalismo, não se pode negligenciar que estes lugares são ocupados por determinados pais e mães. Como não são abstratos, esses pais da realidade têm sua história, estruturam-se de determinada maneira e estão submetidos a influências culturais distintas. Portanto, a acepção de família, na psicanálise, é dada por intermédio do complexo de Édipo e, tanto teoricamente, quanto na clínica, se lida também com a realidade da família. Tal fato remete ao difícil assunto do tratamento psicanalítico com a família. A importância da família 18 Para Ferrari, Kaloustian e Manoug (1994, p.11) “a família desempenha papel decisivo na educação formal e informal dos filhos. Em seu espaço são absorvidos os valores éticos e humanitários, aprofundam-se os laços de solidariedade, constroem-se as marcas entre as gerações e são observados valores culturais.” Rodrigues (1981,p.52) diz que “A escolha da família como unidade de análise tem levado, em diversos estudos empíricos, à possibilidade de se apreender um “trabalho” conjunto da família, voltado para a sobrevivência e a reprodução.” Sua análise sobre esse tipo de investigação revela que o produto final das estratégias da família tomada como um todo, ou seja, suas adaptações às mudanças externas e aos estágios do ciclo de vida familiar, obedecem a padrões razoavelmente nítidos em famílias inseridas num determinado segmento social ou, mais genericamente, às diversas classes sociais”. Ao falarmos de família devemos ter em mente que “a discussão sobre família, enquanto uma porta de entrada para a compreensão de uma sociedade, começa com o questionamento sobre o significado do termo família e sobre o estatuto teórico que damos a ele”. (Almeida; Carneiro; Paula, 1987, p. 13). Nestes três recorte sobre o conceito de família podemos notar diferentes aspectos em relação a família, todos de grande importância, um relacionado a educação e a valores, outro ao trabalho na família com vista a reprodução e sobrevivência, e por último a relação da família com a análise da sociedade. 19 Pode-se dizer que a família influencia e é influenciada por quase todos os setores da vida. Estes e outros autores como Petrini (2003) e Gomes e Pereira (2005), no entanto, concordam quanto à influência da família no desenvolvimento e manutenção da saúde e no equilíbrio emocional de seus membros, daí a importância para todas as áreas da saúde se aprofundarem no tema. Para Petrini (2003) a família carrega uma responsabilidade civilizatória, uma capacidade de humanizar e socializar as pessoas. A educação familiar é também a base para a criatividade e o comportamento produtivo do ser humano. A família, segundo a tradição grega é constituída pelos cônjuges e filhos, este conceito sofreu transformações, e pode-se dizer que pela Constituição da República Federativa do Brasil (2010) é definida como a união estável entre homem e mulher ou qualquer dos pais e seus descendentes. A criança é então responsabilidade de três instituições: a família, a sociedade e o Estado. É clara a importância e influencia dada por estes três na criação e educação do indivíduo. Quando uma criança chega em nosso consultório com algum problema, temos que ter uma visão ampla que englobe estes três fatores para a sua análise. Não se pode imputar na criança toda a responsabilidade por seu fracassos intelectuais, motores e emocionais, pois esta se desenvolve como sujeito a partir do encontro com os outros e com o meio ambiente a sua volta. Embora a situação atual esteja em constante mudança, algumas heranças históricas estão marcadas profundamente ainda hoje, são elas: a romana, onde há a autoridade do chefe (pai) da família, a submissão da esposa e dos filhos; na era medieval perpetua-se o caráter sacramental do casamento 20 originado no século XVI; e da cultura portuguesa, temos a solidariedade, o sentimento de sensível ligação afetiva, abnegação e desprendimento. (Simionato e Oliveira, 2003) Priore (1999) faz um estudo sobre essa posição da mulher na sociedade. Desde os ensinos Cristão, a mulher por herança de Eva, primeira mulher no mundo, não somente era criada a partir de um homem, como também seria responsável pelo pecado original. O corpo da mulher era “erigido como altar da procriação, o útero em funcionamento apontava a mulher normalizada, identificada com os esforços da Igreja em redimir os males cometidos por Eva”. Na idade média e moderna ser mulher carregava uma conotação inferior, e a mulher teria que casar e ter um filho para poder ser respeitada. As lutas feministas lutaram por mudar este fato, mas não conseguiram apagar seu passado e suas influências até hoje em diversas culturas. (Priore, 1999) Outro aspecto importante é que a família não se constitui como um núcleo, mas como uma rede. Esta rede envolve a rede de parentesco de sangue como um todo e outras pessoas ligadas à família ou que possam dar condições melhores de vida a um filho. Uma família, não é uma família sem a existência do filho, é a criança que confere responsabilidade e peso para esta família, no entanto, as condições básicas para tal podem faltar, e nestes casos, os avós e irmãos são os primeiros a serem convocados a cuidar dessas crianças. Padrinhos e pais adotivos para o filho também são considerados. A adoção, principalmente não formal de uma criança é um assunto delicado, pois pode envolver a troca de favores. Os pais de sangue consideram que estão dando uma dádiva aos pais que não podem ter filhos e os pais adotivos podem achar que estão fazendo um favor à família pobre. Dessa forma há sempre uma expectativa de retorno ou reconhecimento de suas partes. (Sarti, 1996). Segundo Soifer (1982), a família se apresenta como um conjunto de pessoas que convivem por um tempo prolongado, relacionando-se com a sociedade e com a cultura. Por conseguinte, o infans, ao nascer, carece de noções fundamentais para sua sobrevivência. Incapaz de sobreviver sozinho, ele necessita dos pais para que o ensine desde os atos mais simples aos mais complexos, para constituir-se de forma sentimental e profissional. 21 De acordo com Soifer (1982), durante o processo de aprendizagem dos filhos, os pais os ensinam a amar, como também a serem solidários. Junto à função de ensinar deve estar a de pôr limites. Estes objetivam dar a noção da realidade ao infante opondo-se à fantasia, já que o ser humano tende, fortemente, a seus ímpetos. Sendo assim, a noção da realidade tem papel importante para a criança na contenção de seus impulsos. Entretanto, para se estabelecer este processo é essencial haver por parte das figuras parentais um investimento sobre a criança, isso significa que para o ser humano, existir não é análogo à vida. Antes de nascer, uma criança pode obter um lugar na família, criado a partir do desejo do par parental e, assim sendo, estes nomeiam os filhos e criam expectativas sobre eles. A partir do contato que a criança mantém com o Outro, inicialmente com a mãe, e, a posteriori, com a linguagem e com a cultura, é que o sujeito se constitui (Meira, 2003). Esta mesma autora afirma que a função materna está atrelada ao cuidar do filho e, com isso, ela transmite amor, propiciando caminhos para que o sujeito possa se constituir. Entretanto, a mãe não é dotada de perfeição e nem é completa, por isso, sua criança acaba por ocupar o lugar que lhe falta. Neste instante, dá-se a entrada do pai – função paterna –, sendo este uma criação, um engenho fundamental para a constituição desse sujeito. Podemos dizer que a função paterna não só proíbe o gozo da plenitude, como também faznascer o desejo do sujeito. Ainda conforme Meira (2003), o pai é aquele que fará o corte na relação da criança com a mãe, sendo isso imprescindível, pois possibilitará ao infante que deixe o lugar de objeto materno. É importante salientar que falamos de função e, sendo assim, esta pode ser desempenhada por pessoas diversas. Dessa forma, o pai pode desempenhar a função materna de cuidar do filho e desejá-lo, assim como a mãe ou outras pessoas podem exercer a função paterna desde que se coloquem no lugar da interdição, da lei. Dentro dessa visão Mendonça (2013) acredita que a família é a estrutura responsável pela transmissão e inserção do infante na cultura por meio das figuras parentais que exercem funções primordiais na inscrição da criança no universo simbólico. A autora sublinha que por se tratar de funções simbólicas não se faz necessário que o agente das funções materna e paterna recaia sobre 22 as figuras da mãe e do pai, respectivamente, o que não quer dizer, com isso, que são funções anônimas, as quais qualquer um pode exercê-las, já que pressupõe o desejo do outro. Jerusalinsky (2009), cita que há um tempo para que o infans possa construir-se por intervenção do Outro e, dessa forma, tornar-se parte da história familiar. Esse tempo para a mãe e o bebê é constante e circundante sendo antecedido pelo tempo do desejo. Dessa forma, a mãe apresenta o bebê como objeto do seu desejo e, simultaneamente, investe-o com seus cuidados, oferta- lhe bem-estar e permite-lhe sobreviver. Conforme a autora, para que a dimensão psíquica possa ser constituída, é fundamental que a relação entre mãe e filho se inscreva numa relação de falta e isso se dá através da presença e ausência daquela. Assim, a partir dos autores citados acima, vemos que o sujeito é o efeito da família, do desejo da mãe, do efeito da interdição o qual impede que entre mãe e filho haja uma “colagem”, na medida em que o pai atua como princípio da separação do que diz respeito ao desejo da mãe, ou desejo do Outro. Nesta reflexão, Meira (2003) questiona qual seria o lugar da família, concluindo que a esta caberia a tarefa de constituir o sujeito e ajudá-lo a lidar com o mal-estar constante que faz parte da estrutura de todos os sujeitos. Para isto, esta família tem que se reconhecer faltosa para que possa emergir o desejo. Sendo assim, a família só opera enquanto fracassa, uma vez que pais e mães são insuficientes na medida que não são plenos. De acordo com Roudinesco (2003), na contemporaneidade, a família pode ser definida por uma junção entre duas pessoas que buscam intimidade e realização através do sexo. Assim, a autoridade se modifica, já que novos arranjos familiares anulam os lugares antes seguros por pais e filhos, pois o avanço do declínio do patriarcado foi acelerado pelo decréscimo da autoridade moral do pai e da exclusividade do seu poder econômico. Ainda, conforme a autora, a elevação dos valores do homem de respeito a outrem, após o término da Segunda Guerra Mundial, propiciou um cenário para a emancipação feminina. Dessa forma, a hegemonia na qual se tinha como base a imagem do pai, atualmente, dilui-se garantindo novas formas de parentalidade com inúmeras consequências para o processo de subjetivação dos filhos. Segundo a autora, a 23 família contemporânea é uma instituição democrática, horizontal; seu poder está descentralizado e repartido entre seus membros. Para ela “esta família se assemelha a uma tribo insólita, a uma rede assexuada, fraterna, sem hierarquia nem autoridade, e na qual cada um se sente autônomo ou funcionalizado” (Roudinesco, 2003, p.155). Ainda segundo Kehl (2001), não se deve dividir a família em papéis tradicionais como: pai, mãe e filhos e sim em um pai ou uma mãe que realize esta função, pois a família é o que estrutura edipicamente os sujeitos. E é nessa estrutura, que se chama família, que a criança vai ser interpelada pelo desejo que a constituiu, o desejo do Outro, e vai deparar-se com o seu próprio desejo. E é nesse enviesamento que ela se tornará um ser de linguagem, barrada em relação ao gozo do Outro. Porém, para isso é necessário que o pai, enquanto função, e por isso simbólico, se faça presente como agente da castração, ou seja, aquele que promoverá o corte na relação narcísica e especular que se constitui entre a mãe e a criança. Trata-se aqui do Complexo de Édipo, drama subjetivo constituído por uma triangulação – criança, mãe e pai – que gira em torno de um objeto de desejo – o falo. Do sintoma dos pais ao sintoma da criança Lacan inicia sua Nota sobre a criança indicando que a família tem como papel essencial a transmissão da constituição subjetiva, que não é da mesma ordem da satisfação das necessidades, mas precisa ter “relação com um desejo que não seja anônimo” (LACAN, 1969/2003, p. 369). Enquanto a satisfação das necessidades se volta para a criança enquanto ser vivo, animal, a constituição subjetiva não se reduz a tal satisfação, já que se volta para a criança enquanto um ser pulsional e desejante, e que, por conseguinte, quer muito além do que lhe é oferecido. E para o sujeito se constituir, o desejo dos pais não pode ser anônimo; pelo contrário, esse desejo precisa nomear o filho, inscrevendo-o na família, por meio do simbólico. É então pela crença e expressão de seu desejo que os pais transmitem à criança a possibilidade de ela advir como sujeito. E como se dá essa 24 transmissão? “Da mãe, na medida em que seus cuidados trazem a marca de um interesse particularizado [...]. Do pai, na medida em que seu nome é vetor de uma encarnação da Lei no desejo” (LACAN, 1969/2003, p. 369). Ao cuidar de seu filho, a mãe demonstra interesse porque ele a atrai, como exemplifica Vieira: “imaginem uma mãe que adora o filho porque ele tem um jeitinho disso e daquilo, isso é diferente - ela conseguiu particularizar o interesse dela” (VIEIRA, 2005, p. 4). A função materna, portanto, refere-se à relação da mãe com o “cuidar, e que seus cuidados mostrem um interesse; que esse interesse porte a marca de uma particularidade da criança” (idem). Se a mãe se interessa pela criança, é porque uma característica específica dessa chamou a atenção daquela, o que quer dizer que a mãe reconhece na criança um ser singular. É isso que dá início à constituição subjetiva. É sempre bom relembrar que, para facilitar a leitura, costumamos usar os termos “mãe” e “função materna” como equivalentes. No entanto, a função materna é um lugar vazio, pronto para ser ocupado por quem se dispuser. No caso da função paterna, “a lei no desejo seria o pai pegar esse desejo da mãe e dizer: ‘tudo bem, mas tem limite’, ou mais ou menos isso” (VIEIRA, 2005, p. 5). A função paterna implica a interdição de algo no desejo da mãe, provocando o rompimento da dualidade imaginária mãe-bebê. Assim, a mãe não vai tomar a criança toda para ela, já que seu desejo é de, como um crocodilo, “abocanhar” o filho, reintroduzindo-o em si mesma (LACAN, 1969-70/1992). Entretanto, quando a mãe traz outros interesses além do filho, isso é sinal de que a função paterna está se fazendo presente no discurso dela. Nesse movimento, a mãe se assume como um ser que segue a desejar, visto que o filho não obturou sua falta. A criança se intriga com o desejo da mãe e, de início, se aliena a esse desejo, tomando-o como algo que pode suprir sua falta. Dito de outra forma, a criança se aliena ao desejo do Outro para depois se afirmar como sujeito desejante. Assim, a criança é, primariamente, efeito do desejo da família, ou seja, ela não se constitui originalmente como sujeito por si mesma sem ser/estar inserida no campo do Outro. No texto, Lacan faz menção às funções materna e paterna para lançar sua tese: “o sintoma da criança acha-se em condição de responder ao que existe de sintomático na estrutura familiar. [Portanto,]o sintoma pode representar a 25 verdade do casal familiar” (LACAN, 1969/2003, p. 369). Lacan é claro aqui. Ele não afirma que o sintoma da criança é o sintoma dos pais, mas que o sintoma da criança “pode” representar o sintoma dos pais. A tradução é literal do texto original em francês: “Le symptôme peut représenter la vérité du couple familial” (LACAN, 1969/2001, p. 373). Mas por que insistimos nisso que, de início, parece apenas um detalhe? Porque, numa leitura apressada, pode-se entender que Lacan reduzia o sintoma da criança ao sintoma dos pais, conferindo a ela, portanto, a condição de ser apenas um reflexo do inconsciente parental. Ao usar o verbo “pode”, Lacan aponta que o sintoma da criança representa o sintoma dos pais, mas que também representa uma formação inconsciente autêntica, por meio da qual a criança lida com aquilo que a afeta. Podemos ver em Checchinato (2007)essa redução do sintoma da criança ao sintoma dos pais, o que já se anuncia no título de seu livro: Psicanálise de pais: criança, sintoma dos pais. Ele não fala em psicanálise de crianças, pois a tese defendida é a de que “se a criança é sintoma dos pais, de seus problemas, importava ir à causa e não ao sintoma. Removida a causa, certamente o sintoma desapareceria” (CHECCHINATO, 2007, p. 14). O autor inicia assim sua argumentação: Ao considerar as entrevistas dessa autora [Maud Mannoni] com os pais de seus e suas pacientes e suas preciosas observações clínicas sobre as relações traumáticas entre pais e filhos, convenci-me de que a chave da clínica não seria a criança, mas os pais. Posteriormente, Lacan confirmou explicitamente essa ideia [sic] de M. Mannoni, em breve carta à doutora Jenny Aubry [Nota sobre a criança], quando afirmou que a criança é sintoma dos pais. (CHECCHINATO, 2007, p. 13, grifo do autor). Conforme exposto anteriormente, Lacan (1969/2003) não afirma que a criança “é” sintoma dos pais, mas que o sintoma da criança “pode” representar a verdade do casal parental, ou seja, que há uma possibilidade de que o sintoma da criança esteja articulado ao sintoma dos pais, mas há também uma possibilidade de que o sintoma da criança seja uma solução particular para responder ao seu lugar no desejo dos pais. É aqui que podemos buscar o sujeito- criança em articulação e desarticulação com a subjetividade dos pais. No sintoma da criança, encontramos a sua subjetividade. Subjetividade essa que se 26 constrói a partir da alienação ao campo do Outro, mas por meio da qual a criança afirma sua singularidade. Mesmo que sejam os pais aqueles que levam a criança à análise, eles não podem “impedir que o analista tome as produções da criança como formações do inconsciente de um sujeito em particular, sem o que não haveria escuta da criança” (PETRI, 2006, p. 92). Assim sendo, os significantes advindos dos pais produzem efeitos na criança, mas ela tem seu modo singular de responder, aderindo e/ou resistindo a esses significantes, ressignificando assim sua posição no discurso dos pais. Nesse sentido, é possível falar de sintoma da criança, no qual ela se implica, e não somente da criança enquanto sintoma dos pais. O sintoma da criança tem relação com a subjetividade dos pais, mas sem se reduzir a ela. Os pais são imprescindíveis para que a criança possa advir como sujeito, para que ela possa ser inserida na ordem simbólica, que lhe dará condições de fazer parte da cultura. A criança, paradoxalmente, se aliena ao campo do Outro, para se afirmar enquanto sujeito. Nesse sentido, ela não é apenas um reflexo do inconsciente dos pais e, por isso, precisa ser escutada como sujeito do próprio discurso. O sujeito-criança entre o sintoma e a fantasia dos pais é o sujeito do próprio discurso que se manifesta quando é escutado. Em outras palavras, quando nos perguntamos sobre como pensar o sujeito-criança em articulação com a subjetividade dos pais, temos como possibilidade de resposta que esse sujeito é aquele que aparece em análise. Porque é na análise que a criança poderá se desvencilhar do sintoma dos pais, construindo o seu próprio. Nesse ponto, consideramos essencial a contribuição de Melanie Klein, pois ela “descobriu que o brincar das crianças era a via régia de acesso ao inconsciente, pois suas brincadeiras, desenhos e histórias fantasiosas podiam ser escutados exatamente como se escutavam associações livres dos pacientes adultos” (FRANÇA, 2006, p. 21). Freud (1908[1907]/1996), no texto Escritores criativos e devaneio já havia destacado o brincar como uma poderosa ferramenta de acesso ao mundo interno da criança. No entanto, foi Melanie Klein quem desenvolveu a técnica da análise de crianças utilizando-se do brincar, tomando por base a experiência do jogo do fort-da, narrado por Freud (1920/2006), em Além do princípio de prazer. Ao adaptar a técnica psicanalítica para a criança, ela “garantiu, pela consideração 27 da análise a partir da constatação da potencialidade de representação do simbolismo lúdico, a entrada efetiva da criança no campo da analisabilidade” (VORCARO, 2004, p. 60-61). A técnica do brincar veio responder à dificuldade de se propor a uma criança pequena que praticasse a associação livre (pressuposto básico que torna possível a análise de um adulto). Assim, impossibilitada por sua lógica precária de expressar verbalmente seus conflitos psíquicos, a criança representaria através das brincadeiras o que um adulto, por exemplo, manifestaria e elaboraria por meio de sua fala. Mas mesmo concordando que crianças não fazem associações livres como os adultos, Klein (1927/1996) levantou a hipótese de que isso acontecia porque a ansiedade impunha uma resistência às verbalizações. Portanto, a representação indireta dos seus conflitos através do brincar expunha a criança a uma cota menor de ansiedade do que aquela vivenciada pelo adulto, em que os conflitos são verbalizados diretamente por meio da fala. Entrementes, ao se submeter à linguagem, a criança não se mantém passiva aos significantes advindos do mundo dos adultos, mas, para isso, é preciso dar a ela a chance de se expressar, o que foi feito por Klein, como destaca Corso: “Melanie Klein [...] arrola a produção da criança, documenta seu processo, ressalta seu ponto de vista. Outros antes haviam dado voz à criança propriamente dita, mas foi acima de tudo Klein que acreditou nas suas associações” (CORSO, 1998, p. 114). Portanto, é pelo discurso, que faz laço social, que o sujeito expressa e comunica a sua singularidade. No entanto, no caso da criança, esse discurso não se reduz à palavra falada, mas se estende à brincadeira. Assim considerada em sua particularidade, a criança pode ser ouvida como sujeito do próprio discurso. Discurso esse que colocará em jogo o sintoma “da” criança e não somente o sintoma e o discurso dos pais, dos quais ela “pode” ser o reflexo ou extensão. Quando destacamos que há um sintoma “da” criança e não apenas um sintoma dos pais “na” criança, fazemos isso por acreditarmos que houve uma leitura equivocada do que foi exposto por Lacan (1969/2003) em Nota sobre a 28 criança. No setting analítico, a criança não pode ficar reduzida a um depósito do sintoma dos pais. Esse mau entendimento da teoria lacaniana acerca do sintoma da criança gera concepções equivocadas, como a de Checchinato (2007), que afirma ser necessário tratar apenas os pais, já que eles são a causa do sintoma que a criança apresenta. Se a criança não é a “chave da clínica” (CHECCHINATO, 2007, p. 13), como o autor afirma, então não há psicanálise da criança, apenas psicanálise dos pais. Certamente, a escuta dos pais é imprescindível, pois se eles levam a criança para a análise é porque o sintoma apresentado por ela despertou algo de insuportável neles, quem sabe um enigma cuja resposta, muitas vezes, eles preferem não conhecer. Ouvindoos pais, é possível encontrar qual o lugar ocupado pelo filho nessa relação. Além disso, a transferência, inicialmente, acontece com os pais. Se eles são “descartados” pelo analista, ou seja, se a eles não é oferecido um mínimo de escuta, as chances de a criança ser escutada/analisada se reduzem muito, pois são eles que a levam até o analista. Ressaltamos, assim, que é preciso dispor de certo critério com relação à leitura da Nota sobre a criança, para que não se desconsidere a existência do sintoma “da” criança enquanto uma formação do inconsciente dela, que implica tanto um sentido a ser decifrado quanto uma satisfação pulsional, o que, necessariamente, aponta para a resposta singular da criança àquilo que a afeta. Desconsiderar o sintoma “da” criança é desprezar a contribuição lacaniana da constituição subjetiva, além de ser um retrocesso no que diz respeito à conquista kleiniana, qual seja, a perspectiva de um tratamento psicanalítico possível da criança. O Sintoma Infantil 29 O sintoma na criança é sempre um apelo ao Outro, um pedido de socorro e além disso está imerso em um fantasma familiar. Em “Nota sobre a criança de Lacan (1969/2003), este afirma que o sintoma da criança representa a verdade do par familiar, ou seja, o que há de sintomático na estrutura familiar reflete na criança. Quando o bebê nasce já existem expectativas quanto ao seu futuro, ele realiza a presença do objeto a (objeto de desejo que simboliza a completude) na fantasia materna. Satura o modo de falta específico do desejo da mãe, de forma que esta se distancia de sua própria verdade, a da castração. Em um primeiro momento isto é necessário, mas não deve persistir, a entrada do terceiro termo, o pai, tem que provocar uma separação nessa diade, e colocar o sujeito em sua posição de filho, formando-se então uma tríade. Lacan (1969/2003) já aponta aqui a possibilidade do sintoma somático como tendência desse tamponamento da falta, na forma de uma exigência da criança de ser protegida: A culpabilidade aqui referida é implícita, a doença além de reclamar cuidados é indicadora de uma falta materna. Essa relação dual pode ser entendida como uma tentativa de retorno ao Um, a um momento de gozo do ser, 30 o qual só é subjetivado a posteriore com sua perda, ou seja, com a alienação à linguagem, ao Outro. O sintoma na criança é então segundo Lacan, resultante do fantasma familiar, de uma estrutura precedente ao sujeito. Quando temos um sintoma infantil sem a entrada do pai, o tratamento parece mais difícil de atingir uma “cura”. Ao passo que se já houver uma tríade, ou seja, uma castração simbólica já efetuada, os sintomas sejam eles quais foram, acham uma maior abertura ao tratamento. Segundo Mannoni (1967) a criança deve passar por conflitos que lhe são necessários. Estes conflitos são identificatórios e não conflitos com o real; e, se o mundo exterior é sentido pela criança como bom ou ruim, sabemos que não se trata de uma situação biológica, ou animal, de luta pela vida, mas de uma situação imaginária, que deve pouco a pouco simbolizar-se. O sintoma na criança se diferencia do sintoma no adulto em alguns pontos, sua estruturação simbólica ainda está em vias de constituição, seu contato com o mundo externo é muito novo e ela depende inteiramente das pessoas a sua volta. A criança está alienada ao Outro e suas escolhas, como ja vimos, são forçadas, ela está a merce do Outro e tudo que ela tem como suporte para entender o que acontece consigo e a sua volta é seu imaginário, é ele que permitirá o intecâmbia entre o simbólico e o real. Para Dolto (1996), quando uma criança apresenta distúrbios, encontramos em sua primeira infância ainda próxima, se pudermos conhecer sua história, os “momentos determinantes dos fracassos da simbolização do desejo ou dos traumas emocionais precoces das quais a angústia é o único testemunho.” (p.256) Essa época infantil do ser humano é onde “se enraízam a saúde, a inteligência e a sensibilidade potencial, juntamente com o esboço arcaico das modalidades do desejo e com as armadilhas em que este esbarra, desde os estágios oral e anal, já linguísticos e já morais, por concernirem ao ser, ao ter e ao fazer” (p.256) No sintoma infantil, temos assim, um trabalho de deciframento do sintoma, não apenas através do atendimento da criança mas também dos pais, da história dessa família que será a base para a criação desta criança. 31 As crianças nascem em contextos familiares característicos e toda a história que será constituída terá os fatos que precederam o seu nascimento e, consequentemente, os que irão acontecer ao longo da sua vida. As singularidades como o sexo, o instante de seu nascimento, situações referentes à gestação e ao parto, o lugar que ocupa em relação a seus irmãos, são dotados de significados para cada um dos pais e marcam um lugar em que a criança responderá a partir de determinada posição (Braeur, 1994). Assim, o filho não é apenas um sucessor, um descendente biológico ou o resultado de uma cópula, feito por um homem e por uma mulher. Ele é de carne, e o mais relevante é que ele é constituído de significantes, "pode ser o filho que eu fui, ou aquele que eu queria ter sido [...] Um filho é mesmo um significante a ser lido". (Bastos, 1999, p.79). Sabemos que o desencadeamento do sintoma pode surgir devido à vivência edipiana e Checchinato (2007) afirma que a lei decorre da função paterna a qual introduz a criança na castração da mãe, retirando esse infante da ordem da natureza e introduzindo-o na cultura. Conforme esse autor, são os pais que podem e devem propiciar o desenvolvimento sadio de seus filhos garantindo e facilitando uma escolha edípica normalizadora. O desdém na relação edípica tem produzido efeitos aniquiladores, pois há pais que se relacionam com seus filhos intimamente; pais que expõem suas vidas íntimas na presença de seus filhos e irmãos que se relacionam sexualmente com irmãos. Assim a desordem edípica impede a identidade subjetiva do sujeito. "O desequilíbrio na relação triangular produz efeitos diversos na identificação sexual ou é origem de patologias graves" (Checchinato, 2007, p.108). Conforme Checchinato (2001), o filho será continuamente vítima e/ou um beneficiário da estrutura psíquica da mãe. Este filho será um substituto do objeto (falo) que falta a essa mãe. A posição da criança como sintoma é devastadora, pois esta responde à falta daquela, ofertando-lhe o corpo para cuidar, entregando-lhe a existência, não arriscando nada que não seja direcionado por ela ou que sem sua proteção é impossível substituir. A criança prolonga sua infantilização e serve como tampão. Desse modo, impede a mãe ter acesso à verdade que o filho deixa escondida. Mãe e filho convivem de forma sintomática em um jogo de esconde-esconde. A contradição dessa posição de alienação que 32 a criança se constituiu serve de obstáculo para a mãe se deparar com a realidade. Para o autor, a doença do infante manifesta-se através dos sintomas que faz uma denúncia do estado psíquico que decorre de como o sujeito foi concebido, gestado e mantido no decorrer do desenvolvimento (Checchinato , 2007). Para Mannoni (2004), a "doença" do infante faz uma denúncia que traduz nos conflitos dinâmicos característicos dele próprio, diante das exigências do social e do desafio do complexo de Édipo normal, como também pode gerar consequências como uma angústia reativa nos pais que se tornam incapazes de ajudar os filhos devido à inabilidade perante a sociedade. Segundo a autora, a complicação dos filhos rememora as carências, na estrutura edípica, não somente dos pais, mas dos avós, e até mesmo dos bisavós, o que indica uma enorme neurose familiar. A criança em desordem, presentifica um conflito vivo, latente, aceito ou ocultado pelos pais, que podem serdesejos reprimidos de pais não satisfeitos em sua vida conjugal ou mesmo social e que de alguma forma, aguardam de sua cria a cura ou uma forma compensatória para sua derrota. A autora infere que não se perceba que por trás de um sintoma infantil, há alguma desordem familiar. Todavia, não é certo que a essa desordem tenha uma correspondência explícita com os distúrbios expressados pela criança. O que traz prejuízo ao sujeito não é somente o confronto real da criança com a verdade penosa e traumatizante, mas também aquilo que não foi verbalizado de forma clara, possibilitando o seu confronto com a “mentira” do adulto. É o que não foi dito que assume relevância suscitando danos psíquicos. Mannoni menciona a relevância tanto da palavra do pai como da palavra da mãe, especialmente. Além disso, a posição que o pai assume para a criança dependerá do lugar que ele ocupa no discurso materno. A autora evidencia, ainda, como é comum ouvir que toda criança-problema reflete pais-problemas. É difícil não 33 perceber que por trás do sintoma, ocorre desordem familiar. Todavia, não é verdadeiro que essa desordem familiar possua uma relação direta de causa e efeito com os distúrbios da criança. Concluindo, o grande fator prejudicial ao sujeito é a recusa dos pais a enxergarem essa desordem, o empenho deles em palavra, para aí mudar uma complexa situação que muitas vezes escapa à sua consciência (Mannoni, 2004). Para Dolto (2004), a criança é aquela que encarna e presentifica – por meio dos seus sintomas – o resultado de um conflito vivo, familiar ou conjugal, velado e aceito por seus pais. Diz respeito a ela arcar, inconscientemente, com a força das tensões e das interferências provenientes da dinâmica emocional, sexual, inconsciente em ação nos pais, da qual o efeito da contaminação doentia se torna mais intensa na medida em que o silêncio e o segredo são guardados ao seu redor. Por conseguinte, os sintomas infantis de impotência manifestados seriam uma ressonância às angústias ou uma reação às angústias dos pais. Ainda, de acordo com Dolto, existem situações em que a linguagem verbal se torna falha para comunicar alguma coisa e os comportamentos são representativos, sintomáticos, assumindo esta função. A autora não culpa os pais, porém acredita que pais e filhos de tenra idade são participantes de forma dinâmica, indissociados pelas suas ressonâncias libidinais inconscientes. Dolto (2002) também evidencia o primado da palavra e a relevância do “falar à criança”. Assim, confirma a magnitude de “falar a verdade”, uma vez que o silêncio enganador promove a angústia e a verdade, quando dita, possibilita ao sujeito construir-se e humanizar-se. Um dos primeiros acontecimentos para reconhecer o filho enquanto sujeito, portador de sofrimentos, angústias e faltas é exposto por Dolto (1990), através da castração dos próprios pais. 34 Ela coloca a necessidade de levá-los a enxergar no filho um semelhante, um ser humano com inteligência e entendedor das coisas da vida, uma criança portadora de desejos, ao passo que eles não a veem a não ser um corpo que anseia cuidados, mal regrado e falho que precisa ser recondicionado, como se eles tivessem que desempenhar tal função, suscetível de ser realizada e dependente de um fator determinante, independente do tempo. Checchinato (2007) ressalta que a formação da criança é marcada especialmente pela maneira como os pais relacionam entre si. A forma de como um é para o outro deixam marcas indeléveis no inconsciente dos filhos, mas muitos pais disfarçam suas dificuldades no casamento o que leva a delegar o sintoma a seu filho como sendo uma forma de encobrir seus conflitos. Assim, há uma desestruturação em muitas dinâmicas familiares, interferindo de forma negativa e relevante no desenvolvimento dos filhos, os quais são dependentes do par parental, e, mais tarde, essas crianças serão geradoras de outras famílias (Gomes, 1998). Desta forma, na visão de Nominé (1997), para se ter uma família "sadia", é fundamental que cada um de seus membros ocupe seu lugar e que o par parental funcione de forma adequada, pois caso isso não ocorra, o sintoma da criança pode vir a emergir como a verdade do par familiar. Considerações finais: sobre o tratamento psicanalítico com a família 35 Sabe-se que Freud designou a família como a maior coletividade da humanidade. Posteriormente, Lacan apontou o diferencial entre o coletivo e o grupo: no coletivo não há a identificação com o líder, indispensável ao grupo. Sabemos que o cálculo do coletivo leva em conta que, uma pessoa, só pode saber sobre si a partir do outro, e de possibilitar o conhecimento da lógica dessa situação supondo o um-por-um. Assim, delimita-se o campo de trabalho no atendimento com a família: não se dirige ao grupo, à família, mas a sujeitos distintos. A dinâmica transferencial convida o psicanalista a ocupar diferentes lugares, em diferentes momentos, para os sujeitos presentes. Enquanto destinatário de transferência cabe ao analista fazer semblant de falta, necessária a cada um. Uma vez que o trabalho com a família apoia-se nos conceitos fundamentais, inconsciente, transferência, repetição e pulsão, e, se o analista mantém a escuta, operando com o desejo do analista, está de fato comprometido com a ética da psicanálise, mesmo com uma estratégia diferente da análise individual. A família, além de sua tarefa de constituir o sujeito, precisa ajudá-lo a lidar com o mal- estar, permanente produto do “estranho”, do não-todo estrutural do sujeito. Freud (1919/1976,p.177) postula o estranho familiar: “aquela categoria do assustador, que remete ao que é conhecido, de velho, e há muito familiar”. 36 Sua questão pode ser assim formulada: como é possível e, em que circunstâncias, o familiar pode tornar-se estranho e assustador? Para Freud, a resposta está no fato de que o familiar traz, também, algo escondido, oculto, que se mantém fora de vista. Um estranho, nada de novo ou alheio, familiar, há muito estabelecido na mente e dela alienado por meio do processo de recalque. Porém, tal impressão de estranheza manifesta-se na vida cotidiana, na criação estética, quando certos complexos infantis recalcados são abruptamente despertados em diversos temas angustiantes (ROUDINESCO, 2003). A angústia do sujeito, frente ao irrompimento do “Estranho”, do Real, é encontrada na família, em seu ponto vazio, em sua constituição, no não-todo. Isso porque a família, assim como a mulher, por um lado, encontra-se submetida ao que é da ordem do falo, portanto, sujeita à castração. Por outro, ao não-todo fálico. Articulada ao que é do campo do significante, ao que é da ordem da castração, a família institui-se conforme a estrutura do complexo de Édipo, tendo sua origem, suas leis e normas que a ordenem. Mas, justamente no que diz respeito ao que é da ordem do gozo, do pulsional, inarticulável, exige algo que a barre e faça-lhe borda, insurge o “Estranho”, o insuportável. Portanto, a família é uma estrutura ancorada na lógica do não-todo fálico, apresentando em sua estrutura um ponto vazio no qual não há palavra que possa dizê-la toda. Logo, a família tem, em sua base, a falta, falta essa estrutural. Os mitos familiares, as ficções presentes no romance familiar, permitem bordejar esse ponto vazio da estrutura familiar. O que a psicanálise propõe então, introduzindo o conceito de sujeito, é que a família possa ser vista não como uma massa, uma soma de individualidades, mas, sim, como um conjunto aberto, uma coleção de singularidades, em que cada membro possa ser tomado um- a-um. Assim, do ponto de vista da psicanálise, a família deve ser tomada em suas particularidades. Não pensando “A família” como modelo, mas famílias, com suas particularidades de funcionamento. 37 No atendimento coma família produz-se um campo discursivo com seu encadeamento de significantes, produto e efeito da estrutura familiar. Escuta-se o discurso do Outro, dos pais, que opera transferencialmente. Escuta que se faz de um-a-um. Portanto, a escuta analítica da família pode sustentar-se, legitimar-se e ser formalizada a partir do fundamento mesmo que norteia a práxis psicanalítica: o sujeito do inconsciente. Esse trabalho possibilita, na família, mudanças nos discursos dos sujeitos, ressignificando, reposicionando, enfim, alterando a cadeia de significantes que sustenta a subjetividade dos sujeitos da família. Formalizar o trabalho psicanalítico com a família só é possível na medida em que a cadeia de significantes familiares impõe a missão de possibilitar a abertura do inconsciente, que não é inconsciente coletivo, de forma que a cadeia familiar na qual os sujeitos se apresentam, possa quebrar-se e, libertos os sujeitos da família, possam constituir uma cadeia aberta ao deslizamento dos significantes. O trabalho da psicanálise com a família deve considerar um duplo caminho. Por um lado, como qualquer psicanálise, definir o trabalho com a transferência, e, por outro, a direção do tratamento tendo, por meta, um final. Mas também se faz necessário que se considere a família como uma estrutura da lógica do coletivo, e não como um grupo, mantendo a sustentação de que trabalhamos com a incidência do real, do estranho. Para esse trabalho com a família, é necessário pensar a família como um coletivo e, portanto, na lógica do um-a-um, cada um em relação ao outro, o que possibilita manter no campo da psicanálise e, dessa forma, evitar o aconselhamento ou a pedagogia. Escutar a família psicanaliticamente, na lógica do coletivo, detectar o entrecruzamento dos fantasmas e fantasias e de seus componentes, permite detectar a função de algo residual dentro da família. Na função do resíduo, encontra-se a constituição subjetiva que implica a relação de um desejo “não anônimo”, no qual incide o real, portanto, o mal-estar, o impossível. Nas 38 considerações sobre a família feitas por Lacan no texto Duas notas sobre a criança (1969), ele destaca que a função de resíduo: A escuta psicanalítica com a família inclui o mal-estar, pondo em destaque o que é da ordem da desconstrução. Operando com a demanda na família, criam-se possibilidades de utilização do dispositivo analítico. Esse trabalho com a família é possível por existir a lógica do coletivo, proposta por Lacan, marcando diferença com a lógica do grupo. Na lógica do coletivo, toma-se a família como “conjunto”, que funciona graças ao elemento que lhe é exterior. A família, tomada na lógica do coletivo, vai tratar “um-por-um”, o não-todo, as diferenças. Portanto, não se pode dizer que a clínica com a família ocorre com o grupo, como afirma Freud em Psicologia das massas e análise do ego (1921/1976), mas a psicanálise com a família toma-a na sua dimensão não-toda, do um-por-um, das diferenças, pois cada família tem um conjunto de significantes que determina o dizer de cada sujeito, configurando uma particularidade familiar. Assim, na clínica com a família, deve-se levar em consideração tanto os aspectos do sujeito quanto os aspectos da família, dentro de uma lógica do coletivo. Empreender um atendimento com a família, sob a ética da psicanálise, implica desconstruir certo imaginário familiar, diminuindo seus efeitos, esvaziando fantasias, retificando posições subjetivas e reinscrevendo o sujeito no campo do Outro, também barrado. Tarefa árdua, principalmente porque ainda em desenvolvimento, mas presente em demandas clínicas. 39 REFERÊNCIAS Almeida, A. M. "O Desejo No Neurótico Obsessivo". Psic. Rev. 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