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FUNDAMENTOS DO DESIGN AULA 3 Profª Shirlei Miranda Camargo 2 CONVERSA INICIAL Nesta aula você vai aprender sobre conceitos importantes que um designer, independentemente da área de atuação, precisa conhecer. Por exemplo, você sabia que a simples escolha equivocada de uma fonte ou cor para um produto ou peça gráfica pode levá-los ao fracasso? E já ouviu falar em ergonomia e usabilidade? Elas justificam a necessidade de um designer conhecer o ser humano e projetar produtos e ambientes, virtuais ou reais, adequados que tragam conforto e segurança para sociedade. E falando em sociedade, está mais do que na hora de nos preocuparmos com os quase 24% da população brasileira que apresentam algum tipo de deficiência e, portanto, clamam pela acessibilidade. Está nas nossas mãos mudar esse triste cenário. CONTEXTUALIZANDO Rio de Janeiro – Há mais de 80 anos no mercado brasileiro, Leite de Rosas é passado de geração em geração [...]. A revolucionária e chamativa embalagem rosa ganhou as gôndolas na década de 1960, quando o braço direito do fundador, Henrique Ribas, assumiu a empresa e optou pelo uso de plástico. Assim, mais barato, o produto se tornou acessível a todas as regiões do Brasil [...]. Apesar de focada apenas no Brasil, Leite de Rosas ganhou mais do que consumidores. Ganhou admiradores e seguidores. De maneira discreta e eficiente a marca ocupa quase todos os estabelecimentos comerciais de produtos de beleza e é presença garantida no banheiro da vovó. Já de sua cor não se pode dizer o mesmo. Nada discreta e, ao contrário, muito impactante, o objetivo de Henrique Ribas era destacar a embalagem de Leite de Rosas nas prateleiras ocupadas, em grande maioria, pelos comuns e sem graça frascos brancos (Terra, 2010) Mesmo assim, recentemente a companhia abandonou a sua principal característica física em nome da inovação. E se arrependeu. A demanda por embalagens modernas e o consequente acompanhamento mercadológico da marca não demorou a iniciar a produção das embalagens roll-on. Porém, a companhia cometeu um grave erro que imediatamente mostrou-se percebido por seus consumidores: o fracasso do produto em embalagem branca. “Quando lançamos o roll-on na cor branca, tivemos vendas entre 15 e 30 mil unidades no mês. Ao mudarmos a cor para o característico rosa, atingimos 100 mil produtos vendidos”, diz Juliana (Terra, 2010) Perceba a importância da cor, pois uma única mudança na embalagem fez com que as vendas da empresa aumentassem de 30 mil unidades/mês para 100 mil unidades/mês! E, assim como a cor, outros aspectos precisam ser considerados no desenvolvimento de um produto, como a ergonomia, a usabilidade, a acessibilidade e até a tipografia, a qual será o primeiro tema desta aula. 3 TEMA 1 – TIPOGRAFIA Segundo Mazzarotto (2018), tipografia se relaciona tanto ao ato de desenhar uma fonte como a fonte em si, e também aos estudos sobre como utilizar essa fonte de forma correta. O autor ainda complementa afirmando que a tipografia é “a evolução do processo milenar da escrita, proveniente da invenção da prensa de tipos móveis – que possibilitou a produção em larga escala” (Mazzarotto, 2018, p. 11). Saiba mais Você deve saber que a prensa móvel foi uma invenção do alemão Gutemberg, no século XV, que mudou o mundo. Saiba mais assistindo ao vídeo a seguir. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v= qz_pQpG056I>. No entanto, a história da tipografia é bem mais antiga. Iniciou quando o homem inventou sinais para traduzir os sons que emitia e mudou o destino da humanidade. Atualmente, as letras estão em todo lugar e seu uso deve ser bem planejado porque pode afetar o resultado final de um material. Veja o exemplo da Figura 1 (a) e (b). Figura 1 – Exemplo de uso de fontes (a) 4 (b) Crédito: Stocker Top/Shutterstock; adaptado de Stocker Top/Shutterstock. Qual dos exemplos anteriores você acha que o uso da fonte está mais adequado? No segundo exemplo (b), a fonte parece antiquada, difícil de ler, e não combina com o restante da composição. Ou seja, com esse simples exemplo é possível notar que a tipografia realmente faz toda a diferença no trabalho final. No entanto, antes de aprender sobre tipografia, é preciso conhecer as estruturas de uma letra, que é formada por ápice, trave, haste, base e serifa (Figura 2). Figura 2 – Estrutura de uma letra Além disso, uma mesma fonte deve apresentar diversas variações em relação a inclinações, largura, tonalidade e uso ortográfico (Collaro, 2007). a. Inclinações: as fontes sem inclinações são chamadas de redondas, e as inclinadas, de itálicas ou grifos. Software & app development 5 b. Larguras: as fontes são classificadas em normais (médias), largas (expandidas) ou estreitas (condensadas). Quanto mais estreita ou mais larga, menor a legibilidade. c. Tonalidade: está ligada à forca da letra e à relação entre a espessura da haste e o espaço interno em branco. A tonalidade normal é chamada de normal (regular) e existe a bold (negrito) com variações extra bold, semibold para os mais espessos e light ou extra light para os mais finos. d. Uso ortográfico: são a caixa-alta (maiúscula) e caixa-baixa (minúsculas), e as versaletes (letras maiúsculas, mas com altura das minúsculas). Saiba mais Você sabe por que se usam esses termos caixa-alta ou caixa-baixa? Acesse o link a seguir e descubra. Disponível em: <http://www.formacerta.com.br/blog/qual-e-a-origem-do-termo-caixa-alta-e- caixa-baixa/> Agora que você aprendeu sobre a estrutura das letras e suas variações, que tal aprender sobre sua origem? Na verdade, a arte influencia fortemente a tipografia de seu tempo, ou seja, a arte influencia o desenho das letras também de determinada época. De acordo com Collaro (2007), para entender a evolução das artes e sua influência nas letras, pode-se utilizar a arquitetura como parâmetro. Veja, de forma resumida, os principais estilos arquitetônicos. • Estilo clássico: predominante na Antiguidade Greco-romana; • Estilo bizantino: inspirado na antiga Constantinopla (Bizâncio); • Estilo românico: dominou a Europa nos séculos XI e XII; • Estilo gótico: prevaleceu na Europa no final da Idade Média (XIII, XIV e XV); • Estilo renascentista: inicia-se no século XV e retoma o uso de elementos do estilo clássico (Barroco). Mais tarde, surgiram outros como o estilo floreal ou liberty, cubista e funcional. Enfim, toda essa evolução estética foi acompanhada pelo desenho das letras também, como veremos a seguir (Collaro, 2007). 6 1.1 Estilos clássicos 1.1.1 Gótico Com a invenção da impressa, o principal estilo utilizado foi o gótico e suas diversas versões, pois era esse o modelo predominante nos manuscritos da época e a tipografia, recém-criada, precisava fixar-se como meio de reprodução. Logo, tentava imitar os textos feitos à mão. Contudo, a legibilidade dos tipos góticos sempre foi contestada, o que ainda era piorado por meio de adornos que dificultavam ainda mais a leitura das páginas. Atualmente, esse estilo de letra ficou restrito a impressos que remontam ao clássico, como diplomas, mensagens e logos que queiram inspirar confiança e tradição (Collaro, 2007). 1.1.2 Românico Esse estilo pode ser subdividido em dois momentos. O românico antigo foi herdeiro da arte romana, criou fontes baseadas nas inscrições das ruínas romanas, com as serifas arredondadas. Ao longo de 200 anos, foram se desenvolvendo e se espalhando até darem origem às fontes conhecidas como Romanas de Transição (Gaspar, 2015) que são fontes serifadas tanto na versão de caixa-alta como em caixa-baixa. A sua principal característica é que, na junção da haste com a serifa, há um angulo arredondado. A diferença de espessura entre hastes também é pouco acentuada (Gaspar, 2015). 1.1.3 Egípcio As fontes criadas pordesigners italianos a pedido dos ingleses para diferenciar seus produtos na Revolução Industrial foram baseadas no estilo das inscrições egípcias (hieróglifos), que eram esculpidas em pedra (Collaro, 2007). 1.1.4 Lapidário Conhecido pela simplicidade e visibilidade, foram inspirados na escrita fenícia (cuneiforme), que era formada por hastes, sem maiores rebuscamentos (Collaro, 2007). 7 1.1.5 Romântico Este estilo começou a utilizar elementos decorativos e flores. Eram muito focados na estética, mas apresentavam pouca legibilidade. Dele se originou o estilo Floreal (Art Noveau) que tinha inspiração na natureza, nas flores, e também o estilo Liberty, uma estilização do gótico, com formas menos rebuscadas. Contundo, em contrapartida aos exageros desse estilo, surgiram o cubismo e o futurismo, estilos que pregavam a simplificação das formas e romperam em definitivo com os estilos clássicos (Collaro, 2007). 1.2 Nova tipografia Os movimentos cubistas e futuristas trouxeram uma simplificação das formas, rompendo com o desenho clássico das letras. Esses movimentos influenciaram a tipografia, geometrizando suas formas, valorizando as proporções e os espaços em branco. Com isso, surgiu a tipografia, dividida em: • Elementar, que queria romper com o óbvio; • Funcional, que atendia às necessidades do projeto (função); • Moderna, que uniu o avanço tecnológico com mudanças sociais. Resumindo, a fontes estão em todo lugar e seu uso deve ser bem planejado pelos profissionais porque ela será a “voz” de seu trabalho. TEMA 2 – ERGONOMIA É comum já ter se deparado com objetos nada “ergonômicos” no dia a dia. Pense naquela cadeira desconfortável que lhe causa dores nas costas, ou aquela embalagem de suco que derruba seu conteúdo quando está cheia e você vai servir o copo. A ergonomia, conhecida também como “fatores humanos”, se preocupa em conhecer o ser humano para fazer adaptações às suas capacidades e limitações (IIDA, 2018). Ela é uma ciência recente e surgiu como resultado de um trabalho multidisciplinar envolvendo engenheiros, fisiologistas e psicólogos durante a Segunda Guerra (IIDA, 2018). Segundo Falzon (2018), ela foi oficializada em 1957 com a fundação da Associação Internacional de Ergonomia, 8 na Holanda, que tinha como foco a adaptação do ambiente, do trabalho e das máquinas ao ser humano. No Brasil, temos a Associação Brasileira de Ergonomia (Abergo), criada na década de 1980, que adota a seguinte definição para ergonomia: É uma disciplina científica relacionada ao entendimento das interações entre os seres humanos e outros elementos ou sistemas, e à aplicação de teorias, princípios, dados e métodos a projetos a fim de otimizar o bem-estar humano e o desempenho global do sistema. Os ergonomistas contribuem para o planejamento, projeto e a avaliação de tarefas, postos de trabalho, produtos, ambientes e sistemas de modo a torná-los compatíveis com as necessidades, habilidades e limitações das pessoas. (Abergo, 2019) Ergonomia é formalmente definido como o estudo da adaptação do trabalho ao ser humano, em que se entende por trabalho qualquer interação entre o ser humano e uma atividade produtiva de bens ou serviços (IIDA, 2018). Geralmente é associada ao mobiliário e aos objetos chamados de “ergonômicos” (por exemplo, mouses, cadeira) ou doenças do trabalho, como lesão por esforços repetitivos (LER) (Abrahão et al., 2009). No entanto, a ergonomia é muito mais abrangente e pode ser dividida em ergonomia física, cognitiva e organizacional. A ergonomia física estuda a anatomia humana, a antropometria, a fisiologia e a biomecânica. Ela analisa a postura no trabalho, o manuseio de materiais, os movimentos repetitivos, os distúrbios musculoesqueléticos relacionados ao trabalho, a elaboração de projetos de postos de trabalhos, entre outros (Abrahão et al., 2009). No entanto, com a disseminação da informática na década de 1980, surgiram postos de trabalho informatizados e máquinas programáveis, levando a ergonomia a se preocupar com os aspectos cognitivos das atividades (IIDA, 2018). Por isso, a ergonomia cognitiva preocupa-se com os processos mentais (percepção, raciocínio, memória e resposta motora) e seus efeitos nas interações entre o ser humano e elementos de um sistema. Portanto, ela analisa, por exemplo, a carga mental no trabalho, a tomada de decisões, a interação humano-computador, o estresse profissional etc. (Abrahão et al., 2009). Por fim, a ergonomia organizacional cuida da estrutura das organizações, suas regras e processos, e aborda temas como a comunicação, a organização temporal do trabalho, o trabalho em equipe, a cultura organizacional, a gestão da qualidade etc. (Abrahão et al., 2009). 9 A ergonomia se baseia em três princípios básicos: a interdisciplinaridade, a análise das situações reais e o envolvimento dos sujeitos. Interdisciplinaridade é um desses princípios por ser muito difícil ter um profissional que possua todas as competências para realizar uma ação ergonômica. Por isso, o ergonomista (profissional que atua nessa área) deve fazer parte de uma equipe que envolva diferentes profissionais (psicólogos, engenheiros, designers etc.). Também a análise deve ocorrer ante situações reais para verificar como, por exemplo, o trabalhador executa suas tarefas para então estudá-las e indicar possíveis melhorias. Portanto, obviamente, o envolvimento dos sujeitos é fundamental, pois são eles que detêm as competências da realização do trabalho e, por meio da troca de informações é que se possibilitará a compreensão dessas atividades por parte do ergonomista (Abrahão et al., 2009). TEMA 3 – CORES Que nunca ouviu: fulano estava verde de inveja! Ciclano foi um covarde, amarelou! Está tudo azul hoje lá em casa! O uso que se faz das cores na linguagem demonstra o quanto elas fazem parte de nossa vida ao utilizarmos essas expressões sem notar. O poder das cores é tão grande que existe até a cromoterapia, terapêutica que utiliza as cores para curar nossos males por meio da medicina energética. Enfim, a cor tem poderes incríveis! Ela pode modificar, animar e transformar totalmente um ambiente. Quando se usa a cor da maneira correta, você consegue harmonia e equilíbrio em suas composições (Lacy, 1996). Por isso, a psicologia da cor se preocupa em entender a influência que as cores exercem nos seres humanos. Por exemplo, realizaram um experimento em que, em ambientes exatamente iguais, só eram mudadas as cores para analisar a reação das pessoas. Na sala vermelha, as pessoas mal falavam, se sentiam agitadas, inquietas e até oprimidas. Já na sala verde, as pessoas se sentiam aliviadas, conversavam mais entre si, de forma calma, sentiam-se mais tranquilas e isso acontecia mesmo com aquelas que não gostavam de verde (Lacy, 1996). Ou seja, o ser humano pode ter as mais diversas preferências de cor, contudo, é inegável que as sensações transmitidas pelas cores são generalizadas (Collaro, 1996). Inclusive, pesquisas afirmam que 60% da reação de um indivíduo em qualquer situação tem a ver com a cor (Lacy, 1996). 10 2.1 Influência das cores Segundo Lacy (1996), as cores influenciam as pessoas da seguinte maneira. • Vermelho: cor que chama a atenção, faz a pessoa se sentir ousada, poderosa, mas, em exagero, pode estimular a insensibilidade e até a violência. • Rosa: cor relaxante, mas quando muito clara e usada em exagero, causa cansaço; no entanto, o rosa em tons mais escuros torna as pessoas mais ativas. • Laranja: deixa as pessoas mais confiantes, estimula a criatividade, a comunicação. • Amarelo: ativa a mente para novas ideias e deixa as pessoas mais alertas, mas o amarelo escuro em exagero pode causar pessimismo e negatividade. • Verde: cor do equilíbrio; ajuda a reduzir a tensão e o estresse. • Azul: relaxa, acalma, mas, emexagero, pode causar sonolência. • Violeta: é a cor mais poderosa. Estimula a musicalidade, as artes e também é associada a ideias nobres. • Branco: realça todas as cores. • Preto: é imponente quando usado com outras cores, mas sozinho traz preponderância, insensibilidade. 2.2 Teoria da cor Quando se fala de cores, existem duas linhas de pensamento: as cores- luz, conhecidas como sistema aditivo, e as cores-pigmentos, chamadas de sistema subtrativo. • Sistema aditivo: sistema que emite a luz; é chamado assim porque, se somarmos suas três cores primárias, obteremos o branco. ✓ Cores primárias da luz: vermelho, verde e azul. Por isso, é chamado de RGB (red, green e blue – vermelho, verde e azul) (Rocha, 2018) e está presente em todos os monitores. Quando misturamos essas cores primárias entre si, temos as conhecidas cores secundárias: vermelho + azul = magenta; vermelho + verde = amarelo; verde + azul = ciano. 11 • Sistema subtrativo: é determinado pelos pigmentos/cores que existem na natureza e absorvem a luz. É conhecido por esse nome porque, se somarmos as suas três cores primárias, obteremos o preto, que é a ausência de cor. ✓ Cores primárias de pigmentos: magenta, amarelo e ciano. Esse sistema é chamado de CMY (cyan, magenta e yellow – ciano, magenta e amarelo). Contudo, para que a mistura resultasse realmente no preto, os pigmentos deveriam ser puros (de boa qualidade) e misturados nas proporções perfeitas. Por isso, foi criada uma versão “industrial” desse sistema, o CMYK, em que foi adicionando o preto (“K” de blacK, “preto” em inglês). Essa é uma opção mais barata, pois não necessita de pigmentos puros e mais caros (Rocha, 2018) sendo, portanto, muito utilizados em gráficas e nas impressoras. As cores primárias misturadas também formam as cores secundárias: ciano + magenta = azul; ciano + Amarelo = verde; amarelo + magenta = vermelho. Observe a harmonia natural do sistema: as cores secundárias do sistema aditivo são as cores primárias do sistema subtrativo e as cores secundárias do sistema subtrativo são as cores primárias do sistema aditivo (Unicamp, 2019). 2.3 Círculo cromático As cores, para sua classificação, são dispostas em forma de um círculo. As cores primárias são dispostas em um triângulo e, as secundárias, também em forma triangular, porém na posição contrária às primárias. Nesse conceito, chamamos de cores complementares aquelas que estão em oposição oposta nesse círculo. 12 Figura 3 – Círculo cromático Crédito: Sandy Storm/Shutterstock. Enfim, usar a cor considerando a harmonia e os contrastes de maneira correta poderá levar um produto a alcançar o sucesso pretendido (Collaro, 2007). TEMA 4 – USABILIDADE Até os anos 1970, a ergonomia se preocupava com os aspectos fisiológicos das atividades do trabalho, mas, a partir do momento em que surgiram os sistemas informatizados e automatizados, seu foco foi migrando para os problemas relativos às dificuldades de uso nesse contexto, levando ao surgimento da ergonomia cognitiva (Abrahão, 2012). Como ensina Brandão e Moraes (2006), a ergonomia busca adaptar as tarefas ao ser humano a fim de que este as desempenhe de forma confortável, correta, sem erros (eficácia) e no menor tempo possível (eficiência), resultando em satisfação para o usuário. Ao falar de eficiência, eficácia e satisfação do usuário, estamos falando de uma importante área da ergonomia: a usabilidade (Brandão; Moraes, 2006). 13 Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (2000, p. 3), utilizando por base a ISO 9241-11, do ano de 1998, a usabilidade é a “capacidade de um produto ser usado por usuários específicos para atingir objetivos específicos com eficácia, eficiência e satisfação em um contexto de uso”. De acordo com Dias (2007), a palavra usabilidade começou a ser utilizada na ciência cognitiva e depois passou a ser utilizada pela psicologia e ergonomia, substituindo o termo “amigável” que era utilizado até então. No entanto, a usabilidade atualmente é muito vinculada a questões do mundo virtual. Sob essa ótica, na usabilidade, as competências do usuário são utilizadas para analisar sua interação com a interface. Logo, o computador, como um instrumento de trabalho, é um mediador entre a ação e o objeto do trabalho (Abrahão et al., 2012). Você já ouviu falar de heurística? Ela é uma espécie de simplificação das coisas. Segundo Nielsen (1994, citado por Andrade, 2007), a avaliação heurística é um método fácil, rápido e barato para validar interfaces. É utilizado para encontrar problemas de usabilidade, sendo eles pequenos ou grandes. O próprio Nielsen (Caelum, 2019, p. 86-94) desenvolveu as 10 heurísticas da usabilidade que abordam os principais problemas de usabilidade de uma interface. 1. Visibilidade do status do sistema: O sistema deve informar o que está acontecendo em tempo real para o usuário (por exemplo, a playlist do YouTube, que mostra em qual música está e qual estava antes ou vem depois). 2. Correspondência entre o sistema e o mundo real – O sistema deve “falar” a linguagem dos usuários, com palavras, frases e conceitos usados por eles (por exemplo, símbolo de som no botão para regular o som). 3. Controle do usuário e liberdade – Quando os usuários escolhem alguma função do sistema por engano, vão precisar sempre de uma “saída de emergência” claramente marcada (por exemplo, botões de “editar”, “desfazer” etc.). 4. Consistência e padrões – Manter a consistência e o padrão visual (texto, cor, desenho do elemento, som etc.). 5. Prevenções de erros – Como o Google, que corrige os erros de digitação. 14 6. Reconhecimento, em vez de memorização – O usuário não tem obrigação de decorar o caminho que fez para chegar até determinado lugar. Disponibilize o caminho que o usuário fez para chegar até onde está. Isso é chamado de breadcrumb (ou “migalha de pão”). 7. Flexibilidade e eficiência de uso – O sistema deve ser ágil para usuários avançados (atalhos de teclados, preenchimento automático) e ser fácil de utilizar pelos usuários leigos. 8. Estética e design minimalista – Deixe o seu layout e o conteúdo o mais simples e direto possível, pois toda informação extra (excessos de cores e elementos visuais) pode confundir o usuário. 9. Ajude os usuários a reconhecerem, diagnosticarem e recuperarem-se de erros – As mensagens de erro têm que ser claras e próximas do conteúdo ou da ação que causou o erro (por exemplo, no formulário de cadastro, caso falte algum dado a ser preenchido, deixe bem claro quais campos estão faltando). 10. Ajuda e documentação – Devemos manter ao alcance do usuário itens de auxílio para determinadas ações (FAQs – Frequently asked questions ou “perguntas mais frequentes”, ou ainda, uma imagem mostrando em que lugar fica o código de segurança do cartão). TEMA 5 – ACESSIBILIDADE No último censo demográfico realizado pelo IBGE, em 2010, cerca de 45,6 milhões de pessoas afirmaram ter algum tipo de deficiência (visual, auditiva, motora ou mental/intelectual), o que representa quase 24% da população brasileira. Contudo, apesar de representarem uma grande parcela da sociedade, essas pessoas não vivem em uma sociedade adaptada (Loschi, 2017). A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), por meio da NBR 9050/04, define acessibilidade como “possibilidade e condição de alcance, percepção e entendimento para a utilização com segurança e autonomia de edificações, espaço, mobiliário, equipamento urbano e elementos”. Ou seja, todas as pessoas têm o direito de ir e vir, devem ter igualdade de oportunidades, de realizar tarefas (profissionais ou pessoais) de maneira autônoma e segura. Nos últimos tempos, houve um grande avanço na busca por acessibilidade nos meios físicos, nos transportes, na comunicação e informação. No entanto, as cidades e os meios digitaisainda não são totalmente adaptados 15 a servir e incluir essas pessoas no seu cotidiano. Fornecer acessibilidade e inclusão é uma questão de ética, reponsabilidade social e, logo, o foco de nós designers também. Ao projetar um produto (digital, impresso ou físico), o designer deve refletir se quem vai utilizá-lo, se ele saberá entender e interagir e se o produto estará adequado à idade, classe social, cultura, experiência etc. (Masetto, 2016). Pensando nisso, na década de 1970, surgiu o conceito de design universal, criado por Ronald Mace (designer, arquiteto e professor), que trazia como ideal a acessibilidade, com a qual todas as pessoas poderiam usufruir dos mesmos produtos. Segundo esse pressuposto, para um projeto ser acessível, ele deve seguir os 7 Princípios do Design Universal (Masetto, 2016). 1. Uso equitativo: o design é útil e vendável a pessoas com diversas capacidades. 2. Flexibilidade no uso: o design acomoda um vasto leque de preferências e capacidades individuais. 3. Uso simples e intuitivo: o uso do design é fácil de compreender, independentemente da experiência, do conhecimento, das capacidades linguísticas ou do atual nível de concentração do utilizador. 4. Informação perceptível: o design comunica eficazmente ao utilizador a informação necessária, independentemente das suas capacidades sensoriais ou das condições ambientais. 5. Tolerância ao erro – o design minimiza riscos e consequências adversas de ações acidentais ou não intencionais. 6. Baixo esforço físico: o design pode ser usado eficiente e confortavelmente e com um mínimo de fadiga. 7. Tamanho e espaço para aproximação e uso: são providenciados um tamanho e um espaço apropriados para aproximação, alcance, manipulação e uso, independentemente do tamanho do corpo, postura ou mobilidade do utilizador. Enfim, como Cristian (2013) alerta: “o profissional da área de design deve ter como princípio base a solução de problemas e a satisfação das necessidades dos usuários, considerando que a adaptação deve ser do objeto ao ser humano, e não o contrário”. 16 TROCANDO IDEIAS Abordamos a importância das cores, das letras, da ergonomia, da usabilidade e da acessibilidade. Agora, reflita se, em algum momento de sua vida, você se deparou com uma dificuldade em relação a um desses quesitos estudados: por exemplo, um rótulo que estava difícil de ler, um produto que não tinha uma “pegada” boa e você o derrubava, ou até mesmo que acabou fazendo você se machucar etc. Com esses novos conhecimentos, você pode fazer uma análise de qual era o real problema que acabou afetando você e, como futuro designer, já estará atento para evitar erros parecidos com os que você sofreu. NA PRÁTICA Nesta aula conversamos sobre a questão de acessibilidade, e você aprendeu a importância de os designers se preocuparem com ela. Agora, leia o o artigo “Dez testes rápidos para checar a acessibilidade ao seu website”. Depois, escolha algum site e o analise em relação a esses itens. Disponível em: <https://maujor.com/tutorial/acessibilidade/tentest.php>. Acesso em: 16 ago. 2019. FINALIZANDO Esta aula passou algumas noções básicas de temas que serão aprofundados nas próximas disciplinas. Espera-se que você tenha compreendido a ideia geral desses tópicos e perceba a importância de um designer levar em conta essas preocupações na hora de projetar algo. Tanto as letras como as cores, o formato, a preocupação com quem vai usar esse produto deverão impactar, profundamente, os seus futuros trabalhos. Pense nisso! 17 REFERÊNCIAS ABERGO – Associação Brasileira de Ergonomia. O que é ergonomia. Disponível em: <http://www.abergo.org.br/internas.php?pg=o_que_e_ergonomia>. Acesso em: 15 ago. 2019. ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 9241-11: Requisitos ergonômicos para trabalho de escritórios com computadores: parte 11 – Orientações sobre usabilidade. Rio de Janeiro, 2000. ABRAHÃO, J. et al. Introdução à ergonomia: da prática à teoria. São Paulo: Blucher, 2009. _____. Ergonomia e usabilidade em ambiente virtual de aprendizagem. São Paulo: Blucher, 2012. ANDRADE, A. L. L. Usabilidade de interfaces web: avaliação heurística no jornalismo on-line. Rio de Janeiro: E-Papers, 2007. BRANDÃO, E. R.; MORAES, A. de. Publicidade on-line, ergonomia e usabilidade: o efeito de seis tipos de banner no processo humano de visualização do formato do anúncio na tela do computador e de lembrança da sua mensagem. 400p. Dissertação (Mestrado em design) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006. COLLARO, A. C. Produção gráfica: arte e técnica da mídia impressa. São Paulo: Pearson, 2007. CRISTIAN, L. Design inclusivo: acessibilidade e usabilidade em produtos, serviços e ambientes. Clube do Design, jul. 2013. Disponível em: <https://clubedodesign. com/2013/design-inclusivo-acessibilidade-e-usabilidade-em-produtos-servioes-e- ambientes/>. Acesso em: 15 ago. 2019. DIAS, C. Usabilidade na web: criando portais mais acessíveis. São Paulo: Alta Books, 2007. FALZON, P. Ergonomia construtiva. São Paulo: Bluchered, 2018. GASPAR, M. Famílias tipográficas. Design Culture, 1 abr. 2015. Disponível em: <https://designculture.com.br/familias-tipograficas>. Acesso em: 15 ago. 2019. IIDA, I. Ergonomia: projeto e produção. 3. ed. São Paulo: Edgard Blücher, 2018. 18 LACY, M. L. O poder das cores no equilíbrio dos ambientes. Traduzido por Carmen Fischer. São Paulo: Pensamento, 1996. LOSCHI, M. Pessoas com deficiência: adaptando espaços e atitudes. Agência IBGE Notícias, 20 set. 2017. Disponível em: <https://agenciade noticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/16794-pe ssoas-com-deficiencia-adaptando-espacos-e-atitudes>. Acesso em: 15 ago. 2019. MASETTO, G. Acessibilidade: como o design pode ser a chave para um mundo mais acessível. Design Culture, 9 set. 2016. Disponível em: <https://designculture.com.br/acessibilidade-%C2%AD-como-o-design-pode-ser- a-chave-para-um-mundo-mais-acessivel>. Acesso em: 15 ago. 2019. MAZZAROTTO, M. Design gráfico aplicado à publicidade. Curitiba: InterSaberes, 2018. MINAS GERAIS. Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social. Dicionário de termos técnicos da Assistência Social. Belo Horizonte: Ascom, 2007. Disponível em: <http://aplicacoes.mds. gov.br/sagi/dicivip/pages/index.php?paginaAIncluir=dicivip>. Acesso em: 15 ago. 2019. ROCHA, J. C. Cor luz, cor pigmento e os sistemas RGB e CMY: The additive color model RGB, and subtractive color model CMY). 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