Buscar

Regência de Banda, Coro e Orquestra


Prévia do material em texto

REGÊNCIA DE BANDA, CORO 
E ORQUESTRA 
AULA 5 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prof. José Luis Manrique 
 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
Continuando com a diversidade de gêneros musicais e formações 
instrumentais que encontram na prática da regência uma ferramenta 
interpretativa importante, encontram-se as peças vocais corais. Dentro deste 
grande gênero existem muitos subgêneros e estilos enraizados nas diferentes 
culturas, interagindo dinamicamente umas com as outras. Nesta aula, optaremos 
por trabalhar algumas composições da música coral europeia, pelo seu 
significativo protagonismo na história da regência e sua influência nas outras 
culturas irmãs. 
Os fragmentos escolhidos terão uma poética comum que os une ao longo 
da história na proposta da religiosidade cristã, presente na música ocidental. 
Essa poética será a letra litúrgica do cântico do Gloria, que tem seus inícios nos 
primeiros séculos da nossa era e tem inspirado inúmeras composições ao longo 
dos séculos. Essa lírica será recolhida como exemplo concreto nas obras de dois 
compositores: Giovanni Pierluigi da Palestrina e Arvo Pärt. 
Nestas obras musicais do Gloria, suscitadas pelos compositores 
mencionados, estudaremos a análise e a preparação de uma obra vocal, o 
aquecimento e preparação do grupo, a execução de alguns trechos, o 
planejamento de emissão e recepção do capital artístico e, por último, 
avaliaremos e criticaremos os resultados. 
TEMA 1 – ANÁLISE E PREPARAÇÃO DE UMA OBRA VOCAL 
Seguindo o método já adotado, primeiro investigaremos sobre as obras e 
a poética que as une, depois escolheremos as partituras e estudaremos apenas 
os trechos iniciais por atenderem bem aos objetivos pedagógicos desta aula, e 
por último verificaremos as referências interpretativas. 
1.1 Investigar sobre as obras 
O cântico do Glória faz parte da liturgia cristã até nossos dias, ingressando 
ao rito da missa romana no século VI para a festa de Natal (Gelineau, 2013, p. 
85). De caráter cristológico festivo e de inspiração bíblica, o canto começa com 
a aclamação inicial dos anjos que aparece no Evangelho de Lucas 1,14: Gloria 
in excelsis Deo, et in terra pax hominibus bonae voluntatis. O liturgista J.A. 
Jungmann S.J. comenta sobre este trecho: 
 
 
3 
podemos dizer que o canto dos anjos contém não apenas um desejo, 
mas a afirmação de um fato: agora é dada a glória de Deus e paz aos 
seres humanos. [...] não é errado ver comemorado no canto dos anjos 
não aquilo que efetivamente aconteceu, mas o plano de salvação, o 
desígnio, aquilo que deve ser realizado apenas passo a passo: Glória 
seja a Deus nas alturas e paz às pessoas de sua graça. (Jungmann, 
2008, p. 348) 
Jungmann (2008) explica claramente a emoção da letra que pode ser 
interpretada como alegria e esperança, junto com a intencionalidade que este 
canto pretende comunicar. O autor finaliza o comentário com a tradução do 
trecho em questão. Tal sensibilidade foi capturada pelos compositores em 
épocas e contextos distintos, e cada um chegou a resultados sonoros 
diferenciados que marcaram e continuam marcando o desenvolvimento da 
música coral polifônica. 
Para Pierluigi da Palestrina, um dos maiores representantes do 
contraponto do século XVI, a poética da letra levou-o para uma mistura entre a 
escrita homofônica necessária nos textos mais prolixos da missa e a escrita 
contrapontística com clareza em texturas imitativas (Naxus, S.d.). É importante 
mencionar que Pierluigi foi o mestre da Capela de São Pedro no Vaticano, onde 
a prática da época excluía vozes femininas para a execução de obras litúrgicas. 
Segundo as rubricas, a formação vocal com a qual o compositor contava estava 
constituída como segue: “doze cantores: quatro baixos, quatro tenores e quatro 
contraltos (falsetistas), adicionalmente, para a voz chamada soprano, quatro 
eunucos, se for possível encontrar com as devidas habilidades, caso contrário, 
seis meninos” (Sisto V, citado por Milner, 1973, p. 250). Os eunucos são os 
celebres cantores castrati que dominaram a cena musical europeia, 
principalmente italiana, do século subsequente. 
Saiba mais 
Segundo o Dicionário da Academia Francesa, em 1778, um castrato é: 
“aquele que se castrou para que permanecesse com uma voz semelhante à das 
crianças ou das mulheres” (DAF, citado por Barbier, 1989, p. 9). 
Mais recentemente, a mesma poética inspirou ao compositor Arvo Pärt a 
escrever uma nova experiência estética do Gloria. Pärt, nascido na Estônia em 
1935, é um dos maiores compositores de vanguarda do século XX. As obras 
deste compositor vêm sendo marcadas desde 1971 pelas influências da música 
antiga, principalmente canto gregoriano. Em 1976, ele começa a destacar-se 
 
 
4 
pela sua técnica composicional chamada tintinnabuli, que consiste em imitar as 
ressonâncias dos sinos em uma tríade tonal contrastada por uma outra voz 
melódica que se move em grau conjunto ao redor de um tom central (Naxos, 
S.d.). São estes dois traços, o canto gregoriano e o tintinnabuli, que caracterizam 
fortemente o Gloria de Pärt. 
1.2 Escolha da partitura 
Quanto mais antiga uma peça, maior a possibilidade de esta sofrer 
alterações pelos editores de partitura, adicionando ou modificando elementos 
segundo os gostos ou tendências de cada época. Assim, para a escolha de 
edição do Gloria de Pierluigi da Palestrina, será preferível aquela que demonstre 
preocupação em conservar as caraterísticas originais dos manuscritos ou das 
primeiras publicações. Uma edição que cumpre com este requisito é a de Rudolf 
Ewerhart, que não possui marcações de dinâmica comumente adicionadas 
posteriormente pelos editores, mostra as claves antigas de DO no início da 
partitura e utiliza organização de compassos apenas como referência e não 
como regra, como se verifica na Figura 1. 
Figura 1 – Início da partitura de Pierluigi da Palestrina, na edição de Ewerhart. 
 
Fonte: Pierluigi da Palestrina, 1958. 
Para a escolha da edição da obra de Arvo Pärt, a decisão é mais simples. 
O compositor comercializa as partituras oficiais por meio da sua editora 
conveniada Universal Edition. Existem duas versões, uma para coro e órgão e 
 
 
5 
outra para coro e orquestra de cordas. Para o nosso estudo será adequada a 
primeira mencionada. 
1.3 Estudo da partitura 
Como foi verificado na investigação da obra de Pierluigi da Palestrina, a 
música já desde o início apresenta uma primeira parte polifônica até a palavra 
voluntatis para logo em seguida comportar-se de maneira mais homofônica, 
como aparece na Figura 2. Esta segunda parte vem de um costume de canto 
orante do século IV, incentivada no ocidente por Ambrósio de Milan, chamada 
de antifonal, que consiste na separação dos cantores em dois grupos para 
interpretar por turnos um mesmo canto (Dunkle, 2016, p. 1.099). Conscientes 
disso, será oportuno adotar uma distribuição de palco que valorize tal tradição 
antifonal. 
Figura 2 – Início do Gloria de Pierluigi da Palestrina 
 
Fonte: Pierluigi da Palestrina, 1958. 
A prática litúrgica da época pede que a primeira parte do canto seja 
interpretada pelo sacerdote no estilo gregoriano, definindo assim o modo musical 
com a letra: Gloria in excelsis Deo. Um exemplo interpretativo desta parte 
 
 
6 
aparece na Figura 3. Por esse motivo é que a partitura contempla o texto só a 
partir do et in terra pax hominibus. A parte do coro é executada a 4 vozes, onde 
a voz soprano poderia ser interpretada por vozes brancas de meninos, enquanto 
a parte de contralto poderia ser cantada por tenores em falseto, caso for 
desejada uma interpretação histórica. 
Figura 3 – Gloria – Missa de Angelis – canto gregoriano no 5º modo 
 
Fonte: Solesmes, 1979. 
Por ser uma obra polifônica, será conveniente construir uma linha de 
regência com base nas linhas melódicas dos cantores. Também será necessário 
identificar os arcos de frase contidas na trama contrapontística, as quais 
organizarãoas respirações dos cantores naturalmente. Como toda obra vocal, é 
preciso respeitar sua prosódia, a musicalidade própria que cada língua imprime 
na sua fala natural. Na Figura 4, mostra-se esta análise identificando as sílabas 
tônicas. 
Figura 4 – Análise de prosódia do início do Gloria 
 
Fonte: Solesmes, 1979. 
O ápice de cada arco estará na sílaba tônica da palavra mais importante 
da frase. A Figura 5 mostra uma possibilidade de interpretação desses 
elementos mencionados, apenas como exemplo e sem descartar outras 
abordagens do mesmo material sonoro. Anotações na partitura serão de suma 
 
 
7 
importância para que o regente oriente aos cantores de forma clara e precisa no 
momento do ensaio. 
Figura 5 – Início do Gloria de Pierluigi da Palestrina com anotações de regência 
 
Fonte: Pierluigi da Palestrina, 1958. 
Referente ao estudo da partitura de Arvo Pärt, mostrada na Figura 6, 
veremos que esta apresenta constantes mudanças de fórmula de compasso. 
Isso faz justiça à tradição gregoriana da qual é devedora e que também está 
presente na obra de Pierluigi da Palestrina, que consiste em utilizar a prosódia 
natural da palavra como elemento rítmico organizador do pulso, ao contrário da 
música métrica que busca encaixar a prosódia das palavras dentro da fórmula 
métrica. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
Figura 6 – Início do Gloria de Arvo Pärt 
 
Fonte: Pärt, 2021. 
Diferentemente do primeiro compositor, Arvo Pärt traduz a poética do 
Gloria numa textura puramente homofônica, mas enriquecida com constantes 
dissonâncias provenientes da técnica composicional utilizada. Observa-se que 
as linhas de contralto e baixo têm uma tendência de movimento em graus 
conjuntos, enquanto soprano e tenor apresentam constantes saltos com base 
em tríades tonais. Assim, nesta primeira parte, desenha-se uma única frase, sem 
necessidade de respirações. 
1.4 Referências interpretativas 
Como referência interpretativa da obra de Pierluigi da Palestrina, 
podemos mencionar a execução da Oxford Camerata por ser um grupo que 
ganhou seu espaço internacionalmente principalmente como representantes da 
música antiga vocal. (Oxford Camerata, 2021). A interpretação deste grupo 
encontra-se no álbum Palestrina: Missa Papae Marcelli/Missa Aeterna Christi 
Munera1. Um elemento que chama a atenção e que não aparece na nossa 
 
1 Esta interpretação está disponível aqui: 
<https://open.spotify.com/album/6tu14dYvtoshR8cOlT2JOZ>. 
 
 
9 
partitura é a sustentação do final da frase bonae voluntatis com uma leve 
suspenção do tempo, antes de atacar a próxima frase. 
No caso da obra de Arvo Pärt, encontramos uma interpretação importante 
na gravação de The Elora Singers, que é um coro profissional de música de 
câmara com nominações para os prêmios Grammy e Juno (Elora Singers, 2021). 
O registro encontra-se no álbum Part: Berliner Messe/Magnificat/Summa2. 
TEMA 2 – AQUECIMENTO E PREPARAÇÃO DO GRUPO 
O aquecimento e a preparação vocal dos cantores são orientados 
normalmente por um treinador vocal dedicado ao grupo, que, em sintonia com o 
regente, prepara uma rotina de acordo com o repertório proposto. Na ausência 
desse profissional, o regente deve estar preparado para assumir a tarefa. Por 
esse motivo, é recomendável que o regente de coro tenha uma experiência 
própria como cantor e consiga auxiliar ao grupo em assuntos de técnica vocal. 
A obra de Pierluigi da Palestrina não apresenta grandes desafios de 
extensão vocal. Nesse sentido, um aquecimento que conte com os elementos 
básicos será suficiente, abrangendo algumas notas a mais da tessitura requerida 
pela composição. 
Saiba mais 
AQUECIMENTO básico - soprano e tenor. Jose Luis Manrique, 11 maio 
2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=kSuj8bttWhg>. 
Acesso em: 22 jul. 2021. 
Não existe nenhum problema em que as vozes agudas sejam de 
mulheres, a questão histórica de interpretação apenas por homens e meninos é 
um dado que pode ser explorado, ou não, como parte do capital artístico que a 
obra carrega. Por outro lado, o dado histórico que parece ser mais acessível 
cotidianamente é a questão do canto antifonal. A partitura mostra claramente as 
linhas de soprano e contralto num grupo e as linhas de tenor e baixo em outro, 
onde a voz de tenor é a mais independente de todas. Na Figura 7, apresenta-se 
uma possibilidade de distribuição vocal, colocando o tenor na ponta direita e 
 
2 Esta interpretação está disponível aqui: 
<https://open.spotify.com/album/6fuPR4cMoebcxOoIs3EiQt>. 
 
 
10 
assim permitindo ao baixo por momentos pertencer ao grupo antifonal de 
soprano e contralto. 
Saiba mais 
AQUECIMENTO básico – soprano e tenor. José Luis Manrique, 11 maio 
2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=kSuj8bttWhg>. 
Acesso em: 22 jul. 2021. 
Figura 7 – Possibilidade de distribuição vocal para a obra de Pierluigi da 
Palestrina 
 
Por sua parte, nesta etapa, a obra de Arvo Pärt apresenta condições mais 
complexas mesmo sendo de estilo homofônico. As dissonâncias e relações 
intervalares contidas na peça não fazem parte do repertório coral cotidiano, o 
que pode causar estranhamento numa primeira leitura. Para introduzir aos 
cantores nesta linguagem contemporânea, recomenda-se exercícios que 
contenham intervalos harmônicos de segundas maiores e menores ou inclusive 
a construção progressiva de clusters vocais. Essas práticas exercitarão o ouvido 
dos cantores para treinar a capacidade de afinar nas dissonâncias. Se bem é 
verdade que o trecho inicial não apresenta problemas na extensão vocal, a obra 
possui passagens bastante agudas em diversas vozes, o que demandará um 
aquecimento e direcionamento vocal apropriado que permita atingir tais notas 
preservando a saúde vocal dos cantores. 
É recomendável para as duas obras corais aqui estudadas propiciar 
ensaios de naipe antes de juntar as partes. Nestes ensaios de naipe, assistidos 
por um líder em cada grupo, busca-se afirmar as linhas melódicas, trabalhar 
timbragem de voz, homologar articulações e respirações, entre outras coisas, 
 
 
11 
com base em orientações interpretativas do regente previamente repassadas. O 
organista poderá auxiliar na correpetição das linhas vocais que sejam 
necessárias tanto nos ensaios de naipe como na execução em conjunto a pedido 
do regente. 
Outro ponto importante no caso de preparação de repertório coral são as 
caraterísticas acústicas do espaço de ensaio e apresentação. Por tratar-se de 
música sacra cristã, será conveniente executar as obras nos templos cristãos 
para os quais as composições foram pensadas ou em outros espaços que 
compartilhem algumas similaridades acústicas. Espaços onde a acústica seja 
muito seca serão contraproducentes para esse gênero musical, além de dificultar 
a audição e a afinação entre as vozes. 
TEMA 3 – EXECUÇÃO DE ALGUNS TRECHOS 
O primeiro elemento a ser contemplado antes de uma execução 
polifônica, como é o caso do Gloria de Pierluigi da Palestrina, é termos um 
entendimento da trama contrapontística. Nesse sentido, a construção da linha 
de regência deve destacar os pontos-chave melódicos/rítmicos de forma 
relacional com as outras linhas de voz. O regente deve ser capaz de cantar todas 
as linhas, a de regência e as originais, numa altura conveniente para sua voz, 
mas sem trocar a afinação absoluta. Isso ocasionará que algumas linhas sejam 
oitavadas para cima ou para abaixo, cuidando da saúde vocal dentro dos limites 
do regente. A necessidade de o regente ser capaz de cantar essas linhas não 
tem o intuito de emitir sons musicais junto com o grupo. Essa consciência 
melódica do regente é desejada para poder demonstrar as ideias de 
interpretação durante o ensaio e para utilizá-la como padrão mental com o qual 
o resultado sonoro do grupo será comparado a todo momento. Por outro lado, 
mesmo não emitindo sons, é positivo que o regente reproduza a gestualidade 
labialem fonomímica conforme seja oportuno durante a execução da obra. 
A fórmula de compasso “C” cortado informa uma organização rítmica 
binária, o que encaixa muito bem com a intenção rítmica do tecido vocal, mas 
sem ficarmos presos às barras de compasso. Nesse sentido, a marcação gestual 
em um será bastante adequada, dando maior liberdade, inclusive, para, quando 
for oportuno, trazer algumas caraterísticas do gesto quironômico do canto 
gregoriano que ainda era muito forte na época. 
 
 
12 
Com base no estilo interpretativo do canto gregoriano mais aceito 
universalmente, cada frase melódica individual, analisada previamente na Figura 
5, precisa ter um direcionamento em dinâmica e intenção. Essa forma de 
interpretação consiste em atacar levemente a nota inicial e ir intensificando a 
dinâmica até o ápice para depois decrescer levemente até o final da frase. Tentar 
mostrar todas essas nuanças com o gesto da regência será impossível devido à 
superposição das frases, mas nos ensaios de naipe e gerais podem-se trabalhar 
essas intencionalidades de cada linha de voz separadamente, criando uma 
coesão interpretativa entre os cantores do mesmo naipe. 
Seguindo a tradição, com um gesto sutil podemos indicar o começo da 
frase inicial em gregoriano: Gloria in excelsis Deo, previamente definida para um 
solista que, fazendo o papel histórico do sacerdote, definirá a altura musical da 
interpretação sendo conferida previamente em silêncio com um diapasão. A 
modo de resposta, sem muita espera e com uma preparação gentil, podemos 
marcar na continuação o primeiro tempo da partitura. A contagem em um da 
estrutura binária, dosada com gestos quironômicos leves e traços das 
intencionalidades das frases, será adequada para a textura contrapontística do 
primeiro sistema, ganhando maior unidade e ênfase no laudamus te homofônico 
e desconsiderando a suspensão do tempo presente na gravação de referência. 
Nesse ponto, a periodicidade do pulso convém ser quebrada para marcar a 
entrada do benedicimus te, causando um deslocamento de uma semínima, mas 
que voltará ao curso original no adoramus te. 
Para a interpretação do Gloria de Arvo Pärt, assim como em Pierluigi, é 
também desejado que o regente possa cantar todas as linhas vocais. Nesse 
caso, não será necessário criar uma linha de regência específica por ser uma 
textura homofônica. O gesto deve ser preparado robustamente para atacar em 
forte o início da música. Para a marcação de tempos, será preciso achar um 
equilíbrio entre as convenções gestuais estudadas anteriormente e a prosódia 
das palavras que ocasionam as constantes trocas da fórmula de compasso. O 
primeiro compasso pode ser organizado internamente de forma assimétrica em 
4-2, que, traduzido na marcação gestual, significa: um primeiro tempo no meio 
marcando a cabeça, 3 tempos para dentro do corpo, penúltimo para fora e último 
para dentro. O segundo compasso mantém seu pulso unitário. O terceiro 
compasso sugere um gesto ternário contemplando uma leve acentuação no 
segundo tempo devido à prosódia da palavra. Finalmente, o quarto compasso 
 
 
13 
pode ser organizado em 3-2, com o primeiro tempo no centro, os dois seguintes 
para dentro do corpo, o quarto tempo para fora e no quinto tempo realizar o corte 
de forma orgânica. 
TEMA 4 – PLANEJAMENTO DE EMISSÃO E RECEPÇÃO DO CAPITAL 
ARTÍSTICO 
O presente estudo evidenciou que as duas obras estão intrinsecamente 
interligadas, fazendo parte da mesma tradição musical em épocas diferentes. A 
letra vem do ritual cristão enraizada estilisticamente no canto gregoriano dos 
séculos IV e VI, passando pela polifonia do século XVI e chegando até a música 
coral contemporânea do século XX. 
O programa desse concerto poderia girar em torno dos Gloria de 
diferentes épocas, iniciando com uma interpretação em canto gregoriano e 
adicionando obras de outras épocas com a mesma letra, executadas em ordem 
cronológica. Não estando restritas aos espaços religiosos cristãos, as obras 
mantêm seu valor artístico próprio ocupando um espaço dentro da diversidade 
de expressões culturais da sociedade atual. 
TEMA 5 – AVALIAÇÃO E CRÍTICA DOS RESULTADOS 
 Todos os dados que surgiram da investigação histórica influenciaram, em 
maior ou menor grau, as nossas decisões interpretativas. Quanto mais fundo 
formos na investigação de uma peça, maior será o grau de fruição da arte 
atingido e aproveitado no fluxo de capital artístico, mesmo que em alguns casos 
isto não seja tão evidente. 
Quanto mais afastada esteja uma obra musical da nossa realidade cultural 
e temporal, maior terá que ser o esforço da etapa de investigação. Prova disso 
é a volumosa bibliografia desta aula. Tal esforço implicará entrar nas discussões 
estilísticas, tomando uma posição crítica e optando por soluções apropriadas 
para a execução em nosso entorno. 
Sobre a sustentação de nota da interpretação da Oxford Camerata no 
Gloria de Pierluigi da Palestrina, que não foi acolhida na interpretação desta aula, 
pode ter sido aplicada pelo grupo devido ao costume fraseológico gregoriano de 
finalizar os arcos de frase com figura pontuada. Mas isto, dentro dos alcances 
da presente pesquisa, não implica uma caraterística substancial da interpretação 
 
 
14 
nesse autor. Pelo contrário, a opção de manter o pulso estável nesta parte 
contribui com intensificar, dentro da poética cristã, a emoção pelo desejo de 
louvar a Deus na irrupção antecipada do Laudamus te. No território interpretativo, 
o regente pode ter uma apreciação pessoal, mas devidamente informada e 
sustentada em função da própria poética da obra. 
NA PRÁTICA 
Da mesma forma que anteriormente, o grande valor destas aulas está em 
fornecer ferramentas e possibilidades gestuais para que o estudante de regência 
inicie uma prática musical adequada e concreta no seu próprio entorno musical. 
No caso de termos um grupo de pessoas interessadas no estudo da regência 
coral, uma prática salutar será dividir a responsabilidade da regência entre os 
membros, assim, enquanto uma pessoa rege, as outras cantam. 
FINALIZANDO 
A regência coral, por estar intrinsecamente ligada à voz e à respiração, 
mantém uma relação diferenciada com as emoções humanas. Por outro lado, a 
gesticulação labial e as expressões faciais resultantes da interpretação também 
contribuem com a comunicação de tais emoções e modificam a sonoridade 
resultante por causa das suas implicações tímbricas. Esta observação precisa 
estar presente tanto nos ensaios como nas apresentações, somando-se a toda 
a preparação técnica abordada durante esta aula. 
 
 
 
15 
REFERÊNCIAS 
ANDERSON, K. About this recording: Palestrina's Missa Aeterna Christi Munera. 
Naxos, S.d. Disponível em: 
<https://www.naxos.com/mainsite/blurbs_reviews.asp?item_code=8.550573&ca
tNum=550573&filetype=About%20this%20Recording&language=English#>. 
Acesso em: 22 jul. 2021. 
BARBIER, P. História dos castrati. São Paulo: Círculo do Livro, 1989. 
DUNKLE, B. P. Enchantment and Creed in the Hymns of Ambrose of Milan. 
New York: Oxford University Press, 2016. (Oxford Early Christian Studies). 
ELORA SINGERS. The Elora Singers. Disponível em: 
<https://www.elorasingers.ca/about/>. Acesso em: 22 jul. 2021. 
GELINEAU, J. Os cantos da missa: no seu enraizamento ritual. São Paulo: 
Paulus, 2013. 
JUNGMANN, J. A. Missarum sollemnia: origens, liturgia, história e teologia da 
missa romana. 5. ed. São Paulo: Paulus, 2008. 
MILNER, A. The Sacred Capons. The Musical Times, v. 114, n. 1561, p. 250-
252, mar. 1973. 
OXFORD CAMERATA. Disponível em: <https://oxfordcamerata.com/about/>. 
Acesso em: 22 jul. 2021. 
PÄRT, A.; EDISON, N. Part: Berliner Messe/Magnificat/Summa. Disponível em: 
<https://open.spotify.com/album/6fuPR4cMoebcxOoIs3EiQt>. Acesso em: 
22/02/2021. 
PÄRT, A. Arvo Pärt: Berliner Messe: for mixed choir or soloists (SATB) and 
organ. Universal Editions, S.d. Disponível em: 
<https://www.universaledition.com/arvo-part-534/works/berliner-messe-1353>.Acesso em: 22 jul. 2021. 
PIERLUIGI DA PALESTRINA, G. Missa Aeterna Christi munera: für 
Vierstimmigen gemischten Chor. Wiesbaden: Breitkopf und Härtel, 1958. 
PIERLUIGI DA PALESTRINA, G.; SUMMERLY, J. Missa Aeterna Christi 
Munera. Disponível em: 
 
 
16 
<https://open.spotify.com/album/6tu14dYvtoshR8cOlT2JOZ>. Acesso em: 
22/02/2021. 
SOLESMES. Graduale Triplex. Paris-Tournai: Desclée, 1979. 
WHITEHOUSE, R. About this Recording. Part: Berliner Messe. Disponível em: 
<https://www.naxos.com/mainsite/blurbs_reviews.asp?item_code=8.557299&ca
tNum=557299&filetype=About%20this%20Recording&language=English>. 
Acesso em: 22 jul. 2021.

Mais conteúdos dessa disciplina