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Inteligência emocional by Daniel Goleman

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Prévia do material em texto

Tradução 
Marcos Santarrita
 
 
 
Copyright © 1995 by Daniel Goleman 
Copyright da Introdução © 2005 by Daniel Goleman
Ilustração do cérebro na página 46 adaptada de Emotional Memory and the
Brain, 
de Joseph E. LeDoux Copyright © 1994 by Scientific American 
Todos os direitos reservados 
Artista: Roberto Osti
Todos os direitos desta edição reservados à 
EDITORA OBJETIVA LTDA. Rua Cosme Velho, 103 
Rio de Janeiro — RJ — CEP: 22241-090 
Tel.: (21) 2199-7824 — Fax: (21) 2199-7825 
www.objetiva.com.br
Título original 
Emotional Intelligence
Capa 
Marcelo Pereira
Tradução do material inédito 
Fabiano Morais
Revisão da tradução 
Ana Amelia Schuquer 
David Neiva Simon
Revisão 
Fátima Fadel 
Izabel Cristina Aleixo 
Domício Antônio dos Santos 
Umberto Figueiredo Pinto 
Damião Nascimento
Conversão para E-book 
Freitas Bastos
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
G58i
Goleman, Daniel
Inteligência emocional [recurso eletrônico] / Daniel Goleman ; tradução
Marcos Santarrita. – Rio de Janeiro : Objetiva, 2011.
recurso digital
Tradução de: Emotional intelligence
Formato: ePub
Requisitos do sistema:
Modo de acesso:
407p. ISBN 978-85-390-0191-0 (recurso eletrônico)
1. Inteligência emocional. 2. Emoções e cognição. 3. Emoções –
Aspectos sociais. 4. Livros eletrônicos. I. Título.
10-5719. CDD: 153.9
CDU: 159.95
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Para Tara, fonte de saber emocional
Sumário
Capa
Folha de Rosto
Créditos
Dedicatória
Introdução Edição Comemorativa de 10º Aniversário
Prefácio à Edição Brasileira
O Desafio de Aristóteles
Por que Este Exame agora?
Nossa Viagem
Parte Um – O CÉREBRO EMOCIONAL
1 Para que Servem as Emoções?
Quando as Paixões Dominam a Razão
Como o Cérebro Evoluiu
2 Anatomia de um Seqüestro Emocional
O Local das Paixões
O Rastilho de Neurônios
A Sentinela Emocional
A Especialista em Memória Emocional
Alarmes Neurais Anacrônicos
Quando as Emoções São “Rápidas e
Malfeitas”
file:///tmp/calibre_4.99.4_tmp_6leh6e2a/vvn35et7_pdf_out/OEBPS/Text/int_emocional_1.xhtml
O Administrador das Emoções
Harmonizando Emoção e Pensamento
Parte Dois – A NATUREZA DA INTELIGÊNCIA
EMOCIONAL
3 Quando o Inteligente É Idiota
Inteligência Emocional e Destino
Um Tipo Diferente de Inteligência
“Jornada nas Estrelas”: A Cognição não
Basta
Existe Vida Inteligente nas Emoções?
QI e Inteligência Emocional: Tipos Puros
4 Conhece-te a Ti Mesmo
Os Apaixonados e os Indiferentes
Um Homem sem Sentimentos
Em Louvor da Intuição
Avaliando o Inconsciente
5 Escravos da Paixão
A Anatomia da Raiva
O “Relax” da Ansiedade: Como? Eu me
Preocupar?
Controle da Melancolia
Repressores: Negação Otimista
6 A Aptidão Mestra
Controle da Impulsividade: O Teste do
Marshmallow
Alta Ansiedade, Baixo Desempenho
A Caixa de Pandora e Polyanna: A Força
do Otimismo
Otimismo: O Grande Motivador
Fluxo: A Neurobiologia da Excelência
Aprendizado e Fluxo: Um Novo Modelo
para a Educação
7 As Origens da Empatia
Como se Desenvolve a Empatia
A Criança Bem Sintonizada
Quanto Custa a Falta de Sintonia
A Neurologia da Empatia
Empatia e Ética: As Raízes do Altruísmo
A Vida sem Empatia: A Mente do
Molestador, a Moral do Sociopata
8 A Arte de Viver em Sociedade
Expresse suas Emoções
Expressividade e Contágio Social
Rudimentos em Inteligência Social
Como Fabricar um Incompetente Social
“A Gente Odeia Você”: No Limite
Brilhantismo Emocional: Relatório de um
Caso
Parte Três – INTELIGÊNCIA EMOCIONAL
APLICADA
9 Casamento: Inimigos Íntimos
O Casamento dele e o Casamento dela: A
Infância de Cada Um
Fendas Conjugais
Idéias Venenosas
Inundação: O Casamento Alagado
Homens: O Sexo Frágil
Um Conselho Conjugal para Ele e para Ela
A Boa Briga
10 Administrar com o Coração
A Crítica é a Tarefa Número Um
Convivendo com a Diversidade
Sabedoria Organizacional e QI de Grupo
11 A Emoção na Clínica Médica
A Mente do Corpo: Como as Emoções
Afetam a Saúde
Emoções Tóxicas: Dados Clínicos
Os Benefícios Clínicos do Otimismo
A Aplicação da Inteligência Emocional na
Assistência Clínica
Por uma Medicina que se Envolva
Parte Quatro – MOMENTOS OPORTUNOS
12 O Ambiente Familiar
O que é Preciso Aprender antes de Entrar
para a Escola
Aprendizagem Emocional Básica
Como Fabricar um Brigão
Maus-tratos: A Extinção da Empatia
13 Trauma e Reaprendizado Emocional
O Horror Congelado na Lembrança
O PTSD como Distúrbio Límbico
Reaprendizado Emocional
Reeducando o Cérebro Emocional
Reaprendizado Emocional e Recuperação
de um Trauma
A Psicoterapia como um Curso Emocional
14 Temperamento Não é Destino
A Neuroquímica da Timidez
Nada me Preocupa: O Temperamento
Animado
Domando a Amígdala Superexcitável
Infância: Momento de Boas Oportunidades
Momentos Cruciais
Parte Cinco – ALFABETIZAÇÃO EMOCIONAL
15 Quanto Custa o Analfabetismo Emocional
Mal-estar Emocional
Domando a Agressão
Escola para Arruaceiros
Prevenindo a Depressão
O Preço da Modernidade: Aumento dos
Casos de Depressão
O Percurso da Depressão nos Jovens
Modos de Pensar Geradores de Depressão
Bloqueando a Depressão
Distúrbios de Alimentação
Rejeitado Pelos Colegas: Evasão Escolar
Treinamento para a Amizade
Bebida e Drogas: O Vício como
Automedicação
Chega de Guerras Isoladas: A Prevenção
para Tudo
16 Ensinando as Emoções
Uma Lição de Cooperação
Um Ponto de Atrito
Post-mortem: Uma Briga que não Houve
Preocupações do Dia
O bê-á-bá da Inteligência Emocional
Alfabetização Emocional nos Centros
Urbanos
Alfabetização Emocional Disfarçada
O Cronograma Emocional
Tudo Tem Seu Tempo Certo
Alfabetização Emocional como Prevenção
Repensando as Escolas: O Ensino pelo Ser,
Comunidades que se Envolvem
Uma Missão Maior para as Escolas
A Alfabetização Emocional Faz Alguma
Diferença?
Caráter, Moralidade e as Artes da
Democracia
Uma Última Palavra
Apêndice A Que é Emoção?
Apêndice B Características da Mente Emocional
Apêndice C O Circuito Neural do Medo
Apêndice D Consórcio W. T. Grant: Ingredientes
Ativos dos Programas de Prevenção
Apêndice E O Currículo da Ciência do Eu
Apêndice F Aprendizado Social e Emocional:
Resultados
Projeto de Desenvolvimento da Criança
Resultados:
Caminhos:
Resultados:
Alunos com Necessidades Especiais:
Melhor Compreensão Emocional:
Projeto de Desenvolvimento Social de Seattle
Resultados:
Programa de Promoção de Competência Social
de Yale-New Haven
Resultados:
Programa de Solução Criativa de Conflitos
Resultados:
Projeto de Melhoria da Consciência Social —
Solução de Problema Social
Resultados:
Agradecimentos
Serviços
Educação
Vida Organizacional
Paternidade
Geral
Notas
Introdução
Parte Um: O Cérebro Emocional
Parte Dois: A Natureza da Inteligência
Emocional
Parte Três: Inteligência Emocional Aplicada
Parte Quatro: Momentos Oportunos
Parte Cinco: Alfabetização Emocional
Introdução 
Edição Comemorativa de 10º
Aniversário
Em 1990, quando era repórter de ciência no The New
York Times, topei com um artigo em uma pequena
revista acadêmica escrito por dois psicólogos, John
Mayer, hoje na Universidade de New Hampshire, e Peter
Salovey, de Yale. Meyer e Salovey apresentaram a
primeira formulação de um conceito que chamaram de
“inteligência emocional”.
Naquela época, a proeminência do QI como critério
de excelência na vida era inquestionável; discutia-se
acaloradamente se ele estava inscrito em nossos genes
ou se era alcançado pela experiência. Porém, eis que
surge, de repente, uma nova forma de pensar sobre os
ingredientes do sucesso na vida. Fiquei entusiasmado
com o conceito, que usei como título deste livro em
1995. Como Mayer e Salovey, utilizei a expressão para
sintetizar uma ampla gama de descobertas científicas,
unindo ramos diferentes de pesquisa — analisando não
só a teoria deles, mas também uma grande variedade de
outros avanços científicos empolgantes, como os
primeiros frutos do campo incipiente da neurociência
afetiva, que explora como as emoções são reguladas
pelo cérebro.
Lembro-me de ter pensado, logo antes deste livro ser
publicado, dez anos atrás, que se um dia eu ouvisse uma
conversaem que dois estranhos usassem o termo
inteligência emocional e ambos entendessem o que isso
significava, eu teria conseguido disseminar o termo de
forma mais ampla na cultura. Mal podia imaginar.
A expressão inteligência emocional, ou sua
abreviação QE, se tornou onipresente, aparecendo em
lugares tão improváveis quanto nas tirinhas Dilbert e
Zippy the Pinhead e na arte seqüencial de Roz Chast na
The New Yorker. Já vi caixas de brinquedos que dizem
aumentar o QE das crianças; pessoas buscando parceiros
às vezes alardeiam a expressão em anúncios pessoais.
Uma vez, eu encontrei uma piadinha sobre QE no rótulo
de um xampu no meu quarto de hotel.
E o conceito se espalhou pelos cantos mais distantes
do mundo. Contam-me que QE se tornou uma expressão
conhecida em línguas tão distintas quanto alemão e
português, chinês, coreano e malaio (ainda assim, eu
prefiro EI, abreviação em inglês para inteligência
emocional [emotional intelligence]). A caixa de entrada
do meu e-mail tem sempre perguntas, por exemplo, de
um doutorando búlgaro, um professor polonês, um
aluno de graduação indonésio, um consultor de
negócios sul-africano, um especialista em gerenciamento
do sultanato de Omã, um executivo em Xangai.
Estudantes de negócios na Índia lêem sobre QE e
liderança; um CEO na Argentina recomenda o livro que
escrevi posteriormente sobre este tópico. Eruditos
religiosos dentro do cristianismo, judaísmo, islamismo,
hinduísmo e budismo me disseram que o conceito de
QE encontra ressonância em suas próprias crenças.
Mais gratificante para mim foi a maneira como o
conceito foi ardentemente abraçado pelos educadores,
na forma de programas de “aprendizado social e
emocional”, ou SEL (social and emotional learning). Nos
idos de 1995, havia apenas um punhado desses
programas ensinando habilidades de inteligência
emocional a crianças. Agora, uma década depois,
dezenas de milhares de escolas em todo o mundo
oferecem SEL às crianças. Hoje em dia, nos Estados
Unidos, o SEL é requisito curricular em vários distritos, e
até mesmo em estados inteiros, exigindo que os alunos,
da mesma forma que precisam alcançar um determinado
nível de competência em matemática e linguagem,
dominem essas fundamentais aptidões para a vida.
Em Illinois, por exemplo, modelos específicos de
aprendizagem em habilidades de SEL vêm sendo
estabelecidos em todas as séries, desde o jardim-de-
infância até o último ano do ensino médio. Tomando
apenas um exemplo de um currículo notavelmente
detalhado e abrangente, nos primeiros anos do ensino
fundamental, os alunos devem aprender a reconhecer e
classificar com precisão seus sentimentos e como eles os
levam a agir. Nas séries do segundo ciclo fundamental,
as atividades de empatia devem tornar a criança capaz
de identificar as pistas não-verbais de como outra pessoa
se sente; nos últimos ciclos do fundamental, elas devem
ser capazes de analisar o que gera estresse nelas ou o
que as motiva a ter desempenhos melhores. E no ensino
médio, as habilidades SEL incluem ouvir e falar de modo
a solucionar conflitos em vez de agravá-los e negociar
saídas em que todos ganhem.
Ao redor do mundo, Cingapura empreendeu uma
iniciativa diligente no que diz respeito ao SEL, assim
como algumas escolas na Malásia, Hong Kong, Japão e
Coréia. Na Europa, o Reino Unido foi pioneiro, porém
mais de 12 outros países possuem escolas que adotam
QE, da mesma forma que a Austrália e a Nova Zelândia
e, aqui e ali, países na América Latina e na África. Em
2002, a UNESCO deu a partida em uma iniciativa global
para promover o SEL, enviando aos Ministérios da
Educação de 140 países um relatório contendo dez
princípios básicos para a sua implementação.
Em alguns estados norte-americanos e outros países,
o SEL se tornou o guarda-chuva organizador sob o qual
se juntam programas de educação do caráter, de
prevenção à violência, agressão contra colegas e drogas
e de disciplina escolar. O objetivo não é apenas reduzir
a incidência desses problemas entre alunos, mas também
melhorar o ambiente escolar e, em última instância, o
desempenho acadêmico dos estudantes.
Em 1995, esbocei as evidências preliminares que
sugeriam que o SEL era um ingrediente ativo nos
programas que aperfeiçoam a aprendizagem da criança
evitando problemas como a violência. Agora é possível
afirmar cientificamente: ajudar as crianças a aperfeiçoar
sua autoconsciência e confiança, controlar suas emoções
e impulsos perturbadores e aumentar sua empatia resulta
não só em um melhor comportamento, mas também em
uma melhoria considerável no desempenho acadêmico.
Esta é a grande notícia contida em uma metanálise de
668 estudos avaliativos de programas de SEL para
crianças desde a pré-escola até o ensino médio.1 A
maciça pesquisa foi conduzida por Ross Weissberg, que
dirige a Cooperativa de Aprendizado Acadêmico, Social
e Emocional (CASEL, na sigla em inglês) na Universidade
de Illinois, em Chicago — a organização que encabeça o
esforço de levar o SEL às escolas de todo o mundo.
Os dados mostram que os programas SEL geraram
grandes benefícios no desempenho acadêmico,
conforme demonstram os resultados de teste de
desempenho e média de notas. Nas escolas que
adotaram os programas, mais de 50% das crianças
tiveram progresso nas suas pontuações de desempenho
e mais de 38% melhoraram suas médias. Os programas
SEL também tornaram as escolas mais seguras:
ocorrências de mau comportamento caíram em média
28%; as suspensões, 44%; e outros atos disciplinares,
27%. Ao mesmo tempo, a percentagem de presença
aumentou, enquanto 63% dos alunos demonstraram um
comportamento significativamente mais positivo. No
mundo da pesquisa em ciências sociais, estes são
resultados extraordinários para qualquer programa que
se destine a promover mudanças comportamentais. O
SEL cumpriu sua promessa.
Em 1995, também propus que boa parte da eficiência
do SEL veio do seu impacto na modelagem do circuito
neural em desenvolvimento da criança, principalmente
as funções executivas do córtex pré-frontal, que
controlam a memória funcional — o que guardamos na
cabeça durante o aprendizado — e inibem impulsos
emocionais destrutivos. Agora foram encontradas as
primeiras provas científicas preliminares desse conceito.
Mark Greenberg, da Universidade Estadual da
Pensilvânia, co-criador do currículo PATHS (sigla de
Parents and Teachers Helping Students — Pais e
Professores Ajudando Alunos) do SEL, relata não só que
esse programa para estudantes do ensino fundamental
aumenta o desempenho acadêmico, mas também que,
ainda mais significativamente, grande parte da melhora
na aprendizagem pode ser atribuída ao aperfeiçoamento
da atenção e da memória funcional, funções-chave do
córtex pré-frontal.2 Isto sugere veementemente que a
neuroplasticidade — a modelagem do cérebro através de
experiências repetidas — exerce um papel crucial nos
benefícios do SEL.
Talvez minha maior surpresa tenha sido o impacto do
QE no mundo dos negócios, principalmente nas áreas de
liderança e desenvolvimento de funcionários (uma forma
de educação para adultos). A Harvard Business Review
saudou a inteligência emocional como “uma idéia
inovadora, capaz de destruir paradigmas”, uma das idéias
empresariais mais influentes da década.
No mundo dos negócios, este tipo de afirmação,
muitas vezes, não passa de um modismo, sem nenhuma
substância. Porém, neste caso, houve a participação de
uma ampla rede de pesquisadores, garantindo que a
aplicação do QE seja baseada em dados sólidos. O
Consórcio para Pesquisa sobre Inteligência Emocional
em Organizações (CREIO, na sigla em inglês), na
Universidade de Rutgers, foi o pioneiro na catalisação
desse trabalho científico, colaborando com organizações
que vão desde o Escritório de Gerenciamento de Pessoal
do governo federal até a American Express.
Hoje em dia, as empresas de todo o mundo olham
rotineiramente através das lentes do QE para contratar,
promover e desenvolverseus empregados. Por exemplo,
a Johnson & Johnson (outro membro do CREIO)
descobriu que, em filiais do mundo inteiro, os
funcionários que em meio de carreira possuíam um
maior potencial de liderança tinham aptidões de QE
muito melhores do que seus colegas menos promissores.
O CREIO continua auxiliando esse tipo de pesquisa, que
pode fornecer diretrizes baseadas em provas para
organizações interessadas em aprimorar sua capacidade
de alcançar seus objetivos profissionais ou cumprir uma
missão.
Quando Salovey e Mayer publicaram seu artigo
seminal em 1990, ninguém poderia prever como o
campo acadêmico que eles fundaram prosperaria 15
anos depois. A pesquisa floresceu nessa área; enquanto
em 1995 não havia praticamente nenhuma literatura
científica sobre QE, hoje em dia o campo possui legiões
de pesquisadores. Uma pesquisa no catálogo de teses de
doutorado investigando os aspectos da inteligência
emocional revela mais de setecentas escritas até hoje,
com muitas outras a serem entregues — isso sem
mencionar os estudos feitos por professores e outras
pessoas não listados naquele catálogo.3
O crescimento dessa área de estudo deve muito a
Mayer e Salovey que — juntamente com seu colega
David Caruso, um consultor de negócios — trabalharam
incansavelmente em prol da aceitação científica da
inteligência emocional. Ao formular uma teoria da
inteligência emocional cientificamente defensável e
fornecer uma mensuração dessa capacidade na vida real,
eles estabeleceram um impecável padrão de pesquisa
para o campo.
Uma outra fonte importante para a germinação das
descobertas acadêmicas sobre QE foi Reuven Bar-On,
atualmente no Braço Médico da Universidade do Texas,
em Houston, cuja própria teoria de QE — e entusiasmo
dinâmico — inspirou diversos estudos que se utilizam de
uma medida que ele inventou. Bar-on também teve um
grande papel na produção e edição de livros acadêmicos
que ajudaram a dar vulto crítico ao campo, incluindo o
Manual de Inteligência Emocional.
O crescimento do campo de estudos do QE enfrentou
oposições encarniçadas no mundo mesquinho dos
acadêmicos da inteligência, principalmente daqueles que
consideram o QI a única medida aceitável das aptidões
humanas. Não obstante, o campo emergiu como um
paradigma vibrante. Todo modelo teórico relevante,
observou o filósofo da ciência Thomas Kuhn, deve ser
progressivamente revisado e aperfeiçoado na medida em
que suas premissas passam por testes mais rigorosos. No
caso do QE, esse processo parece estar perfeitamente em
curso.
Existem atualmente três modelos principais de QE,
com dezenas de variações. Cada um deles representa
uma perspectiva diferente. O de Salovey e Mayer se
apóia com firmeza na tradição de inteligência concebida
pelo trabalho original sobre QI, de um século atrás. O
modelo trazido por Reuven Bar-On se baseia na sua
pesquisa sobre o bem-estar. E o meu modelo se
concentra no desempenho no trabalho e na liderança
organizacional, misturando a teoria do QE com décadas
de pesquisa sobre a modelação de competências que
separam indivíduos notáveis dos medianos.
Infelizmente, leituras equivocadas deste livro deram
origem a alguns mitos que eu gostaria de esclarecer aqui
e agora. Um deles é a bizarra — embora repetida à
exaustão — falácia de que “o QE é responsável por 80%
do sucesso”. Esta afirmação é absurda.
Essa interpretação equivocada vem do dado que
sugere que o QI é responsável por 20% do sucesso
profissional. O fato de esta estimativa — e é só uma
estimativa — deixar uma grande parcela do sucesso sem
esclarecimento nos obriga a buscar outros fatores para
explicar o restante. No entanto, isto não significa que a
inteligência emocional representa os outros fatores do
sucesso: eles certamente compreendem uma gama muito
ampla de forças — desde a condição financeira e
educação da família em que nascemos, até
temperamento, pura sorte e afins —, além da inteligência
emocional.
Conforme apontam John Mayer e seus colegas: “Para
o leitor ingênuo, trazer à tona a ‘variação não-explicada
de 80%’ sugere que deve haver de fato uma variação até
o momento ignorada que pode prever grandes porções
de sucesso na vida. Embora isso seja conveniente,
nenhuma variação estudada em um século de psicologia
deu uma colaboração tão grande.”4
Um outro equívoco comum se dá através da
aplicação imprudente do subtítulo original do livro —
“Porque ela pode ser mais importante do que o QI” —
em áreas como desempenho acadêmico, onde ele não se
aplica sem as devidas ressalvas. A forma mais extrema
deste equívoco é o mito de que o QE “é mais importante
do que o QI” em qualquer área.
A inteligência emocional prevalece sobre o QI apenas
naquelas áreas “tenras” nas quais o intelecto é
relativamente menos relevante para o sucesso — nas
quais, por exemplo, autocontrole emocional e empatia
podem ser habilidades mais valiosas do que aptidões
meramente cognitivas.
Como se sabe, algumas dessas áreas são
extremamente importantes em nossas vidas. A saúde
vem logo à mente (conforme pormenorizado no Capítulo
11), no sentido de que emoções perturbadoras e
relacionamentos nocivos já foram identificados como
fatores de risco para doenças. Aqueles que conseguem
gerenciar suas vidas emocionais com mais serenidade e
autoconsciência parecem ter uma vantagem clara e
considerável na saúde.
Uma outra área é a do amor romântico e
relacionamentos pessoais (ver Capítulo 9), onde, como
sabemos muito bem, pessoas muito inteligentes podem
fazer coisas bastante idiotas. Uma terceira — embora eu
não tenha escrito sobre ela aqui — se dá nos níveis mais
altos de esforços competitivos, como nos esportes de
âmbito mundial. Neste nível, como me revelou um
psicólogo de esportistas que treina os times olímpicos
dos EUA, todos têm como requisito 10 mil horas extras
de treinamento, de modo que o sucesso depende do
empenho mental do atleta.
Descobertas sobre a liderança nos negócios e nas
profissões pintam um quadro mais complexo (Capítulo
10). A pontuação de QI prognostica muito bem se
podemos arcar com os desafios cognitivos que uma
determinada posição nos oferece. Centenas, talvez
milhares, de estudos demonstraram que o QI prevê quais
níveis uma pessoa pode exercer numa carreira. Isto é
inquestionável.
Porém o QI cai por terra quando a questão é
prognosticar quem, em meio a um grupo talentoso de
candidatos dentro de uma profissão intelectualmente
exigente, será o melhor líder. Isto se dá em parte por
conta do “efeito do andar de cima”: todos aqueles nos
altos escalões de uma determinada profissão, ou nos
níveis superiores de uma grande organização, já foram
peneirados em termos de intelecto e destreza. Nesses
níveis elevados, um QI alto se torna uma habilidade
“liminar”, necessária para simplesmente entrar e
continuar no jogo.
Conforme propus no meu livro de 1998, Trabalhando
com a Inteligência Emocional, as habilidades de QE — e
não o QI ou aptidões técnicas — emergem como a
competência “discriminatória” que prevê da melhor
forma quem dentre um grupo de pessoas muito
inteligentes será o líder mais hábil. Se examinarmos as
competências que as organizações em todo o mundo
determinaram ser as que identificam seus principais
líderes, descobriremos que os indicadores de QI e
aptidões técnicas caem para o final da lista quanto mais
alto for o cargo. (O QI e as aptidões técnicas são fortes
indicadores de excelência em empregos menos
qualificados.)
Desenvolvi esta questão de forma mais abrangente no
meu livro de 2002, O Poder da Inteligência Emocional: a
Experiência de Liderar com Sensibilidade e Eficácia (em
co-autoria com Richard Boyatzis e Annie McKee). Nos
níveis mais altos, os modelos de competência para
liderança consistem geralmente em algo em torno de
80% a 100% de habilidades do tipo QE. Nas palavras do
diretor de pesquisa de uma empresa de seleção de
executivos, “os CEOs são contratados por seu intelecto e
habilidade empresarial — e são despedidospor falta de
inteligência emocional”.
Quando escrevi Inteligência Emocional, vi o meu
papel como o de um jornalista científico cobrindo uma
nova e significativa tendência na psicologia,
particularmente a junção da neurociência com o estudo
das emoções. Porém, na medida em que fui me
envolvendo mais no campo, voltei ao meu antigo papel
de psicólogo para oferecer meus insights sobre os
modelos de QE. Como resultado, minha formulação da
inteligência emocional progrediu desde que escrevi estas
páginas.
Em Trabalhando com a Inteligência Emocional,
propus uma estrutura que reflete como os aspectos
fundamentais do QE — autoconsciência, autocontrole,
consciência social e a habilidade de gerenciar
relacionamentos — se traduzem em sucesso profissional.
Ao fazer isso, peguei emprestado um conceito de David
McClelland, o psicólogo de Harvard que foi meu mentor
na graduação: competência.
Enquanto a inteligência emocional determina nosso
potencial para aprender os fundamentos do autodomínio
e afins, nossa competência emocional mostra o quanto
desse potencial dominamos de maneira que ele se
traduza em capacidades profissionais. Para ser versado
em uma competência emocional como atendimento ao
consumidor ou trabalho em equipe, é preciso possuir
uma habilidade subjacente nos fundamentos do QE,
especificamente consciência social e gerenciamento de
relacionamentos. Mas as competências emocionais são
habilidades aprendidas: o fato de uma pessoa possuir
consciência social e aptidão para gerenciar
relacionamentos não garante que ela tenha dominado o
aprendizado adicional necessário para lidar com um
cliente a contento ou resolver um conflito. Essa pessoa
apenas tem o potencial de se tornar hábil nessas
competências.
Novamente, uma habilidade de QE se faz necessária,
embora não seja suficiente, para manifestar uma
determinada competência ou aptidão profissional. Seria
possível fazer uma analogia cognitiva com um aluno que
possui excelentes habilidades espaciais, mas não
consegue nem aprender geometria, quanto mais se
tornar um arquiteto. Assim, uma pessoa pode ser muito
empática, porém péssima em lidar com clientes — se
não tiver aprendido a competência para o atendimento
de clientes. (Para aquelas almas superdedicadas que
quiserem entender como o meu modelo atual abarca
vinte e poucas competências emocionais dentro dos
quatro grupos de QE, vejam o apêndice de O Poder da
Inteligência Emocional.)
Em 1995, apresentei dados de uma amostragem
nacional, demograficamente representativa, de mais de 3
mil crianças de 7 a 16 anos, avaliadas por seus pais e
professores, demonstrando que no espaço de
aproximadamente uma década, entre meados de 1970 e
meados de 1980, os indicadores de bem-estar entre
crianças americanas sofreram um declínio expressivo.
Essas crianças eram mais perturbadas e tinham mais
problemas, que iam desde solidão e ansiedade até
desobediência e queixas. (É claro que sempre existem
exceções individuais — crianças que crescerão e se
tornarão seres humanos fantásticos —, sejam quais forem
os números gerais.)
Porém, um grupo mais recente de crianças, avaliado
em 1999, parece ter progredido consideravelmente,
mostrando resultados muito melhores do que aquelas do
fim da década de 1980, embora não tenham recuperado
os níveis registrados em meados da década de 1970.5 É
fato que os pais ainda estão inclinados a reclamar dos
filhos de uma forma geral e ainda se preocupam que
seus filhos estejam andando com “más companhias” —
as queixas parecem piores do que nunca. Mas a
tendência é nitidamente ascendente.
Francamente, estou estupefato. Havia conjeturado
que as crianças de hoje seriam vítimas involuntárias dos
progressos econômico e tecnológico, inábeis em QE
porque seus pais passam mais tempo no trabalho do que
as gerações anteriores, porque a mobilidade crescente
cortou os laços com a família mais ampla e porque o
tempo “livre” se tornou estruturado e organizado demais.
Afinal, a inteligência emocional sempre foi
tradicionalmente transmitida nos momentos da vida
cotidiana — com os pais e os parentes, e na desordem
das brincadeiras livres — que os jovens estão perdendo.
E também há o fator tecnológico. Atualmente, as
crianças passam mais tempo sozinhas do que nunca na
história da humanidade, olhando para um monitor. Isso
significa um experimento natural numa escala sem
precedentes. Essas crianças peritas em tecnologia,
quando se tornarem adultas, se sentirão tão confortáveis
com outras pessoas como se sentem com seus
computadores? Em vez disso, desconfio que uma
infância cuja relação seja com um mundo virtual
desprepararia nossos jovens para as relações face a face.
Esses foram meus argumentos. Não aconteceu nada
na década anterior que revertesse essas tendências.
Mesmo assim, ainda bem, as crianças parecem estar se
saindo melhor.
Thomas Achenbach, o psicólogo da Universidade de
Vermont que fez esses estudos, conjetura que o boom
econômico da década de 1990 beneficiou não só os
adultos, como também as crianças; mais empregos e
menos criminalidade resultou em crianças mais bem
cuidadas. Caso haja outra recessão econômica grave, ele
sugere, nós nos depararíamos com uma outra queda
nesse grau de habilidades para a vida das crianças. Pode
ser que sim; só o tempo dirá.
A hipervelocidade na qual o QE se tornou um tema
importante em inúmeros campos dificulta previsões, mas
deixe-me oferecer algumas idéias do que espero para
essa área no futuro próximo.
Muitos dos benefícios resultantes do desenvolvimento
de capacidades de inteligência emocional foram
destinados aos privilegiados, como executivos de alto
nível e crianças de escolas particulares. É claro que
muitas crianças em bairros pobres também se
beneficiaram — por exemplo, se suas escolas adotaram
o SEL. Porém, quero encorajar uma maior
democratização desse tipo de desenvolvimento de
habilidades humanas, alcançando blocos geralmente
negligenciados, como as famílias pobres (nas quais as
crianças muitas vezes sofrem danos emocionais que
pioram ainda mais a situação delas) e as prisões
(principalmente os delinqüentes juvenis que poderiam se
beneficiar enormemente de habilidades reforçadoras
como controle da raiva, autoconsciência e empatia). Uma
vez ajudados com essas habilidades, suas vidas poderiam
melhorar e suas comunidades se tornariam mais seguras.
Também gostaria de ver um aumento do raio de ação
do próprio pensamento sobre a inteligência emocional,
saltando de um foco nas capacidades do indivíduo para
um foco naquilo que surge quando as pessoas
interagem, seja no caso de um indivíduo para outro ou
em grupos maiores. Algumas pesquisas já parecem ter
dado esse salto, especialmente no trabalho da psicóloga
Vanessa Druskat, da Universidade de New Hampshire,
sobre como grupos podem se tornar emocionalmente
inteligentes. Mas pode-se fazer muito mais.
Finalmente, imagino um dia em que a inteligência
emocional será tão amplamente compreendida que não
será preciso mais discuti-la, pois ela já terá se fundido às
nossas vidas. Nesse futuro, o SEL já será prática padrão
em todas as escolas. Da mesma forma, as qualidades de
QE como a autoconsciência, o gerenciamento de
emoções destrutivas e a empatia serão lugares-comuns
nos locais de trabalho, “qualidades obrigatórias” para ser
contratado e conseguir promoções, e especialmente
necessárias para a liderança. Se o QE se tornar tão
difundido quanto o QI, e tão enraizado na sociedade
como medidor das qualidades humanas, creio que
nossas famílias, escolas, empregos e comunidades serão
todos mais humanos e alentadores.
Prefácio à Edição Brasileira
Escrevi Inteligência Emocional em meio a uma sensação
de crise civil nos Estados Unidos onde há um aumento
crescente dos índices de criminalidade, suicídios, abuso
de drogas e outros indicadores de mal-estar social,
sobretudo entre os jovens. Acredito que o único remédio
capaz de debelar esses sintomas de doença social sejauma nova forma de interagirmos no mundo — com a
inteligência emocional no Brasil me dizem que já há
sinais, nesse país, que apontam para a emergência de
uma alienação e pressão sociais que, se não contidas,
podem levar a colapsos bastante sérios na teia das
relações sociais.
Nos países desenvolvidos, a tendência é para um
individualismo exacerbado, o que acarreta,
conseqüentemente, uma competitividade cada vez maior
— isso pode ser constatado nos postos de trabalho e no
meio universitário. Essa visão de mundo traz consigo o
isolamento e a deterioração das relações sociais. A lenta
desintegração da vida em comunidade e a necessidade
de auto-afirmação estão acontecendo, paradoxalmente,
num momento em que as pressões econômico-sociais
estão a exigir maior cooperação e envolvimento entre os
indivíduos.
Além dessa situação que reflete um mal-estar social,
há indicadores de um crescente desconforto emocional,
sobretudo entre as crianças. Parece-me que a infância —
um período crucial para a formação do adulto —, neste
mundo em que estamos vivendo, deva merecer uma
atenção maior de parte daqueles que são os principais
responsáveis pelas crianças: pais e professores.
Os pais, em nossos dias, exercem sua paternidade
sob tensões e pressões de ordem econômica que não
existiam na época de nossos avós. O que eu proponho é
que esses pais dediquem o tempo que lhes sobra para
ajudar seus filhos a dominarem as habilidades humanas
essenciais que são necessárias, não só para lidar com as
próprias emoções, como para o estabelecimento de
relações humanas verdadeiramente significativas.
Aos professores, sugiro que considerem também a
possibilidade de ensinar às crianças o alfabeto
emocional, aptidão básica do coração. Tal como hoje
ocorre nos Estados Unidos, o ensino brasileiro poderá se
beneficiar com a introdução, no currículo escolar, de
uma programação de aprendizagem que, além das
disciplinas tradicionais, inclua ensinamentos para uma
aptidão pessoal fundamental — a alfabetização
emocional.
O Desafio de Aristóteles
Qualquer um pode zangar-se — isso é fácil. Mas
zangar-se com a pessoa certa, na medida certa, na
hora certa, pelo motivo certo e da maneira certa — não
é fácil.
Aristóteles, 
Ética a Nicômaco
Era verão em Nova York e, naquela tarde, fazia um calor
sufocante, insuportável. As pessoas andavam pelas ruas
mal-humoradas, em visível desconforto. Na avenida
Madison, peguei um ônibus para voltar para o hotel. Ao
entrar, fui surpreendido com a saudação que veio do
motorista: “Oi, como vai?” Esse homem negro de meia-
idade e largo sorriso repetiu a mesma saudação a todos
os outros passageiros que foram entrando ao longo do
percurso no denso tráfego do centro da cidade. Todos,
como eu, se surpreendiam, mas, porque estavam com o
humor comprometido pelas condições climáticas do dia,
poucos retribuíram o cumprimento.
À medida que o ônibus se arrastava pelo traçado
quadriculado do centro da cidade, porém, uma
transformação mágica foi gradativamente ocorrendo.
Para nosso deleite, o motorista encetou um animado
comentário sobre o cenário à nossa volta: havia uma
liquidação sensacional naquela loja, uma exposição
maravilhosa naquele museu, já souberam do novo filme
que acabou de estrear ali na esquina? O prazer dele com
a riqueza de possibilidades que a cidade oferecia
contagiou a todos. Ao descerem do ônibus, as pessoas já
haviam se despido da couraça de mau humor com que
tinham entrado, e, quando o motorista lhes dirigiu o
sonoro “Até logo, tenha um ótimo dia!”, todas lhe deram
uma resposta sorridente.
Há vinte anos a lembrança desse episódio me
acompanha. Quando entrei naquele ônibus da avenida
Madison, eu havia acabado de me doutorar em
psicologia — mas a psicologia da época não dava muita
atenção para uma alteração comportamental que
ocorresse desse modo. A psicologia não conhecia
praticamente nada acerca dos mecanismos da emoção.
Ainda hoje, ao imaginar a possibilidade de os
passageiros daquele ônibus terem propagado pela
cidade aquele vírus de bem-estar, constato que aquele
motorista era uma espécie de pacificador urbano, uma
espécie de mago que tinha o poder de transmutar a
soturna irritabilidade que fervilhava nos passageiros de
seu ônibus, de amolecer e abrir corações.
Em gritante contraste, algumas matérias de jornal
daquela semana:
• Numa escola local, um garoto de 9 anos causa uma
devastação, derramando tinta nas carteiras,
computadores e impressoras, vandalizando um
carro no estacionamento da escola. Motivo: alguns
colegas de classe o haviam chamado de “bebê”, e
ele quis impressioná-los.
• Oito jovens saem feridos porque um encontrão
involuntário, numa multidão de adolescentes
diante de um clube de rap, em Manhattan, leva a
uma troca de empurrões que só termina quando
um dos garotos começa a atirar, com uma pistola
automática calibre 38, contra a multidão. A notícia
observa que, nos últimos anos, tiroteios por
motivos fúteis, mas encarados como atos de
desrespeito, se tornaram cada vez mais comuns em
todo o país.
• No assassinato de crianças de menos de 12 anos,
diz uma notícia, 57% dos assassinos são seus
próprios pais ou padrastos. Em quase metade dos
casos, esses pais alegam que estavam “apenas
tentando disciplinar o filho”. Essas surras fatais
foram provocadas por “infrações” do tipo a criança
ficar na frente da TV, chorar ou sujar fraldas.
• Um jovem alemão é julgado pelo assassinato de
cinco mulheres e meninas turcas, por um incêndio
que provocou enquanto elas dormiam. Membro de
um grupo neonazista, ele diz que não consegue
ficar num emprego, que bebe e atribui o seu azar
aos estrangeiros. Numa voz pouco audível,
argumenta: “Não paro de lamentar tudo o que
fizemos, e me sinto infinitamente envergonhado.”
O noticiário cotidiano nos chega carregado desse tipo
de alerta sobre a desintegração da civilidade e da
segurança, uma onda de impulso mesquinho que corre
desenfreada. Mas o fato é que esses eventos apenas
refletem, em maior escala, um arrepiante desenfreio de
emoções em nossas próprias vidas e nas das pessoas que
nos cercam. Ninguém está a salvo dessa errática maré de
descontrole e de posterior arrependimento — ela invade
nossas vidas de um jeito ou de outro.
A última década tem presenciado um constante
bombardeio de notícias desse gênero, que retratam o
aumento de inépcia emocional, desespero e inquietação
na família, nas comunidades e em nossas vidas em
coletividade. Esses anos têm escrito a crônica de uma
raiva e desespero crescentes, seja na calma solidão das
crianças trancadas com a TV que lhes serve de babá, no
sofrimento das crianças abandonadas, esquecidas ou
maltratadas, ou na desagradável intimidade da violência
conjugal. O alastramento desse mal-estar pode ser visto
através de estatísticas que demonstram um aumento
mundial dos casos de depressão e nos indicadores de
uma repentina onda de agressão — adolescentes que
vão armados para a escola, infrações de trânsito na
estrada que terminam em tiros, ex-empregados
descontentes que massacram antigos colegas de trabalho.
Abuso emocional, drive-by shooting[1] e tensão pós-
traumática entraram no léxico do americano comum na
última década, e o slogan do momento passou do
cordial “Tenha um bom dia” para o petulante “Faça o
meu dia valer a pena”.
Este livro é um guia que se destina a procurar sentido
no que não tem sentido. Na qualidade de psicólogo e,
na última década, de jornalista do The New York Times,
venho acompanhando o progresso dos estudos
científicos sobre a irracionalidade. Dessa perspectiva,
observei duas tendências opostas: uma, que retrata a
crescente calamidade na vida emocional partilhada pelos
indivíduos, e outra, que oferece soluções auspiciosas
para esse problema.
Por que Este Exame agora?
A última década, apesar de todas as coisas ruins que nos
ofereceu, por outro lado assistiu a uma explosão inédita
de estudos científicos sobre a emoção. O que mais
impressionaé que agora podemos ver o cérebro em
funcionamento, graças às novas tecnologias que
permitem a obtenção de imagens desse órgão. Elas
tornaram visível, pela primeira vez na história humana, o
que sempre foi um grande mistério: como atua essa
intricada quantidade de células enquanto pensamos e
sentimos, imaginamos e sonhamos. Essa inundação de
dados neurobiológicos permite que entendamos, hoje
mais do que nunca, como os centros nervosos nos levam
à raiva ou às lágrimas e como partes mais primitivas do
cérebro, que nos incitam a fazer a guerra e o amor, são
canalizadas para o melhor ou o pior. Essa luz sem
precedentes sobre os mecanismos das emoções e suas
deficiências põe em foco alguns novos remédios para
nossa crise emocional coletiva.
Tive de esperar que a pesquisa científica ficasse
suficientemente completa para escrever este livro. Essas
observações vêm com um certo atraso, em grande parte
porque o lugar dos sentimentos na vida mental foi, ao
longo dos anos, surpreendentemente desprezado pela
pesquisa, fazendo das emoções um continente pouco
explorado pela psicologia científica. Essa lacuna
propiciou uma enxurrada de livros de auto-ajuda,
conselhos bem-intencionados baseados, na melhor das
hipóteses, em opiniões clínicas, mas com pouca ou
nenhuma base científica. Agora a ciência pode
finalmente abordar com autoridade essas questões
urgentes e desorientadoras da psique, no que ela tem de
mais irracional, para mapear com alguma precisão o
coração humano.
Esse mapeamento lança um desafio àqueles que são
adeptos de uma visão estreita da inteligência, e que por
isto entendem que o QI é um dado genético impossível
de ser alterado pela experiência de vida, e que nosso
destino é, em grande parte, determinado pela aptidão
intelectual recebida geneticamente. Esse argumento não
considera a questão mais desafiante: o que podemos
mudar para ajudar nossos filhos a se sentirem melhor?
Que fatores entram em jogo, por exemplo, quando
pessoas de alto QI malogram e aquelas com um QI
modesto se saem surpreendentemente bem? Eu diria que
o que faz a diferença são aptidões aqui chamadas de
inteligência emocional, as quais incluem autocontrole,
zelo e persistência, e a capacidade de automotivação. E
essas aptidões, como vamos ver, podem ser ensinadas às
crianças, na medida em que lhes proporcionam a
oportunidade de lançar mão de qualquer que seja o
potencial intelectual que lhes tenha sido legado pela
loteria genética.
Além dessa possibilidade, estamos diante de um
premente imperativo moral. Vivemos um momento em
que o tecido social parece esgarçar-se com uma rapidez
cada vez maior, em que o egoísmo, a violência e a
mesquinhez de espírito parecem estar fazendo apodrecer
a bondade de nossas relações com o outro. Aqui, o
argumento a favor da importância da inteligência
emocional depende da ligação entre sentimento, caráter
e instintos morais. Há crescentes indícios de que
posturas éticas fundamentais na vida vêm de aptidões
emocionais subjacentes. Por exemplo, o impulso é o
veículo da emoção; a semente de todo impulso é um
sentimento explodindo para expressar-se em ação. Os
que estão à mercê dos impulsos — os que não têm
autocontrole — sofrem de uma deficiência moral. A
capacidade de controlar os impulsos é a base da força
de vontade e do caráter. Da mesma forma, a raiz do
altruísmo está na empatia, a capacidade de identificar as
emoções nos outros; sem a noção do que o outro
necessita ou de seu desespero, o envolvimento é
impossível. E se há duas posições morais que nossos
tempos exigem são precisamente estas: autocontrole e
piedade.
NOSSA VIAGEM
Neste livro, eu atuo como um guia numa viagem através
de percepções científicas acerca das emoções, uma
viagem que visa levar maior compreensão a alguns dos
mais intrigantes momentos de nossas vidas e do mundo
que nos cerca. O fim da jornada é entender o que
significa — e como — levar inteligência à emoção. Essa
compreensão, por si só, pode ajudar, em certa medida;
levar a cognição para o campo do sentimento tem um
efeito meio parecido com o impacto causado pelo
observador no nível da física quântica, que altera o que
está sendo observado.
Nossa viagem começa na Parte Um, com as novas
descobertas sobre a arquitetura emocional do cérebro, as
quais explicam aqueles momentos mais desconcertantes
de nossas vidas, quando o sentimento esmaga toda
racionalidade. A compreensão da interação existente
entre as estruturas do cérebro que comandam nossos
momentos de ira e medo — ou paixão e alegria —
revela muito sobre certos hábitos emocionais adquiridos
que solapam nossas melhores intenções, e também sobre
o que podemos fazer para dominar impulsos
destruidores ou que já trazem consigo a própria
destruição. Mais importante ainda, os dados fornecidos
pela pesquisa em neurologia sugerem a existência de
uma boa oportunidade para moldar os hábitos
emocionais de nossos filhos.
A parada seguinte de nossa viagem, a Parte Dois
deste livro, mostra como os dados neurológicos atuam
sobre o instinto básico para viver chamado inteligência
emocional: por exemplo, poder controlar o impulso
emocional; interpretar os sentimentos mais íntimos de
outrem; lidar tranqüilamente com relacionamentos —
como disse Aristóteles, a rara capacidade de “zangar-se
com a pessoa certa, na medida certa, na hora certa, pelo
motivo certo e da maneira certa”. (Os leitores que não
sentem atração por detalhes neurológicos talvez prefiram
passar diretamente para essa parte.)
Esse modelo ampliado do que significa ser
“inteligente” coloca as emoções no centro das aptidões
para viver. A Parte Três examina a importância dessa
aptidão: como esses talentos preservam nossos
relacionamentos mais valiosos, ou como a ausência deles
os corrói; como as forças de mercado que estão
remodelando nossa vida profissional começam a
valorizar a inteligência emocional para um melhor
desempenho no trabalho; como as emoções nocivas são
tão danosas para nossa saúde física quanto fumar
desbragadamente e como o equilíbrio emocional
preserva a nossa saúde e bem-estar.
Nossa herança genética nos dota de uma série de
referenciais que determinam nosso temperamento. Mas
os circuitos cerebrais envolvidos são extraordinariamente
maleáveis; temperamento não é destino. Como mostra a
Parte Quatro, as lições emocionais que aprendemos na
infância, seja em casa ou na escola, modelam os circuitos
emocionais, tornando-nos mais aptos — ou inaptos —
nos fundamentos da inteligência emocional. Isso significa
que a infância e a adolescência são ótimas
oportunidades para determinar os hábitos emocionais
básicos que irão governar nossas vidas.
A Parte Cinco examina que riscos aguardam aqueles
que, ao chegarem à maturidade, não dominam o campo
emocional — como as deficiências em inteligência
emocional ampliam a gama de riscos, desde a depressão
ou uma vida de violência até os distúrbios alimentares e
o vício em drogas. E relata como escolas pioneiras estão
ensinando às crianças as aptidões emocionais e sociais
que elas necessitam para manter a vida em equilíbrio.
Talvez a informação mais perturbadora deste livro
venha de uma maciça pesquisa com pais e professores,
que revela uma tendência mundial da atual geração
infantil de ser mais sujeita a perturbações emocionais
que a geração anterior: mais solitária e deprimida, mais
revoltada e rebelde, mais nervosa e propensa a
preocupar-se, mais impulsiva e agressiva.
Se há um remédio, acho que ele consiste na
preparação de nossos jovens para a vida. Atualmente,
deixamos a educação emocional de nossos filhos ao
acaso, com conseqüências cada vez mais desastrosas.
Uma das soluções é uma abordagem da parte das
escolas em termos da educação do aluno como um todo,
ou seja, juntando mente e coração na sala de aula. Nossa
viagem termina com visitas a escolas inovadoras, que
visam dar às crianças rudimentos da inteligência
emocional. Já antevejo o dia em que o sistema
educacionalincluirá como prática rotineira a instilação
de aptidões humanas essenciais como autoconsciência,
autocontrole e empatia e das artes de ouvir, resolver
conflitos e cooperar.
Em Ética a Nicômaco, inquirição filosófica de
Aristóteles sobre virtude, caráter e uma vida justa, está
implícito o desafio à nossa capacidade de equilibrar
razão e emoção. Nossas paixões, quando bem exercidas,
têm sabedoria; orientam nosso pensamento, nossos
valores, nossa sobrevivência. Mas podem facilmente cair
em erro, e o fazem com demasiada freqüência. Como
observa Aristóteles, o problema não está na
emocionalidade, mas na adequação da emoção e sua
manifestação. A questão é: como podemos levar
inteligência às nossas emoções, civilidade às nossas ruas
e envolvimento à nossa vida comunitária?
 
 
 
 
 
 
 
[1] Rajadas de tiros disparadas de um carro em
movimento. (N. do T.)
PARTE UM
O CÉREBRO 
EMOCIONAL
1 
Para que Servem 
as Emoções?
É com o coração que se vê corretamente; o essencial é
invisível aos olhos.
Antoine de Saint-Exupéry, 
O Pequeno Príncipe
Pensem nos últimos momentos de Gary e Mary Jane
Chauncey, um casal inteiramente dedicado à filha
Andrea, de 11 anos, confinada a uma cadeira de rodas
devido a uma paralisia cerebral. A família Chauncey
viajava num trem da Amtrak que caiu num rio, depois
que uma barcaça bateu e abalou as estruturas de uma
ponte ferroviária, na região dos pântanos da Louisiana.
Quando a água começou a invadir o trem, o casal,
pensando primeiro na filha, fez o que pôde para salvar
Andrea; conseguiram entregá-la, através de uma das
janelas, para a equipe de resgate. E morreram, quando o
vagão afundou.1
A história de Andrea, de pais cujo último ato heróico
foi o de assegurar a sobrevivência da filha, capta um
momento de coragem quase mítica. Sem dúvida, esse
tipo de sacrifício dos pais em benefício da prole é
recorrente na história e pré-história humanas, e inúmeras
vezes mais ao longo da evolução de nossa espécie.2
Visto da perspectiva dos biólogos evolucionistas, esse
auto-sacrifício dos pais está a serviço do “sucesso
reprodutivo” na transmissão dos genes a futuras
gerações. Mas da perspectiva de um pai que, num
momento de desespero, toma uma decisão como essa,
trata-se simplesmente de amor.
Como se fora uma intuição do objetivo e da força das
emoções, esse ato exemplar de heroísmo dos pais atesta
o papel que exercem, na vida humana,3 o amor
altruístico e as demais emoções que sentimos. Isso indica
que nossos mais profundos sentimentos, as nossas
paixões e anseios são diretrizes essenciais e que nossa
espécie deve grande parte de sua existência à força que
eles emprestam nas questões humanas. Essa força é
extraordinária: só um amor tão forte — na urgência de
salvar uma filha querida — foi capaz de conter o próprio
instinto de sobrevivência dos pais. Do ponto de vista do
intelecto, não há dúvida de que o auto-sacrifício desses
pais foi irracional. Sob a ótica do coração, entretanto,
essa era a única atitude a ser tomada.
Quando investigam por que a evolução da espécie
humana deu à emoção um papel tão essencial em nosso
psiquismo, os sociobiólogos verificam que, em
momentos decisivos, ocorreu uma ascendência do
coração sobre a razão. São as nossas emoções, dizem
esses pesquisadores, que nos orientam quando diante de
um impasse e quando temos de tomar providências
importantes demais para que sejam deixadas a cargo
unicamente do intelecto — em situações de perigo, na
experimentação da dor causada por uma perda, na
necessidade de não perder a perspectiva apesar dos
percalços, na ligação com um companheiro, na formação
de uma família. Cada tipo de emoção que vivenciamos
nos predispõe para uma ação imediata; cada uma
sinaliza para uma direção que, nos recorrentes desafios
enfrentados pelo ser humano ao longo da vida,4 provou
À
ser a mais acertada. À medida que, ao longo da evolução
humana, situações desse tipo foram se repetindo, a
importância do repertório emocional utilizado para
garantir a sobrevivência da nossa espécie foi atestada
pelo fato de esse repertório ter ficado gravado no
sistema nervoso humano como inclinações inatas e
automáticas do coração.
Uma visão da natureza humana que ignore o poder
das emoções é lamentavelmente míope. A própria
denominação Homo sapiens, a espécie pensante, é
enganosa à luz do que hoje a ciência diz acerca do lugar
que as emoções ocupam em nossas vidas. Como
sabemos por experiência própria, quando se trata de
moldar nossas decisões e ações, a emoção pesa tanto —
e às vezes muito mais — quanto a razão. Fomos longe
demais quando enfatizamos o valor e a importância do
puramente racional — do que mede o QI — na vida
humana. Para o bem ou para o mal, quando são as
emoções que dominam, o intelecto não pode nos
conduzir a lugar nenhum.
QUANDO AS PAIXÕES DOMINAM A RAZÃO
Foi uma tragédia de erros. Matilda Crabtree, 14 anos,
apenas queria dar um susto no pai: saltou de dentro do
armário e gritou “Buu!”, no momento em que os pais
voltavam, à uma da manhã, de uma visita a amigos.
Mas Bobby Crabtree e sua mulher achavam que
Matilda estava em casa de amigas naquela noite.
Quando, ao entrar em casa, ouviu ruídos, Crabtree
pegou sua pistola calibre .357 e foi ao quarto da filha
verificar o que estava acontecendo. Quando ela pulou
do armário, ele atirou, atingindo-a no pescoço. Matilda
Crabtree morreu 12 horas depois.5
Uma das coisas que adquirimos no processo da
evolução humana foi o medo que nos mobiliza para
proteger nossa família contra o perigo; foi esse impulso
que levou Crabtree a pegar a arma e a vasculhar a casa
em busca de um suposto intruso. O medo levou-o a
atirar antes de verificar perfeitamente no que atirava, e
mesmo antes de reconhecer que aquela voz era a de sua
filha. Reações automáticas desse tipo — supõem os
biólogos — ficaram gravadas em nosso sistema nervoso
porque, durante um longo e crucial período da pré-
história humana, eram decisivas para a sobrevivência ou
a morte. O que há de mais importante a respeito dessas
reações é que foram elas que desempenharam a
principal tarefa da evolução: deixar uma progênie que
passasse adiante essas mesmas predisposições genéticas
— uma triste ironia, se considerarmos a tragédia ocorrida
na família Crabtree.
Mas, embora nossas emoções tenham sido sábios
guias no longo percurso evolucionário, as novas
realidades com que a civilização tem se defrontado
surgiram com uma rapidez impossível de ser
acompanhada pela lenta marcha da evolução. Na
verdade, as primeiras leis e proclamações sobre ética —
o Código de Hamurabi, os Dez Mandamentos dos
Hebreus, os Éditos do Imperador Ashoka — podem ser
interpretadas como tentativas de conter, subjugar e
domesticar as emoções. Como Freud observou em O
Mal-estar na Civilização, o aparelho social tem tentado
impor normas para conter o excesso emocional que
emerge, como ondas, de dentro de cada um de nós.
Apesar dessas pressões sociais, as paixões muitas
vezes solapam a razão. Essa faceta da natureza humana
tem origem na arquitetura básica do nosso cérebro. Em
termos do plano biológico dos circuitos neurais básicos
da emoção, aqueles com os quais nascemos são os que
melhor funcionaram para as últimas 50 mil gerações
humanas, mas não para as últimas 500 — e, certamente,
não para as últimas cinco. As lentas e cautelosas forças
da evolução que moldaram nossas emoções têm
cumprido sua tarefa ao longo de 1 milhão de anos. Os
últimos 10 mil anos — apesar de terem assistido ao
rápido surgimento da civilização humana e à explosão
demográfica de 5 milhões para 5 bilhões de habitantes
sobre a Terra — quase nada imprimiram de novo em
nossos gabaritos biológicos para a vida emocional.
Para o melhor ou o pior, a forma como avaliamos
situações complicadas com que nos deparamos e nossas
respostas a elas são moldadas não apenas por nossos
julgamentos racionais ou nossa história pessoal, mas
também por nosso passado ancestral.Esse legado nos
predispõe a provocar tragédias, de que é triste exemplo
o lamentável fato ocorrido na família Crabtree. Em suma,
com muita freqüência enfrentamos dilemas pós-
modernos com um repertório talhado para as urgências
do Pleistoceno. Esse paradoxo é o cerne de meu tema.
Agir impulsivamente
Num dia de início da primavera, eu percorria de carro
um passo de montanha no Colorado, quando uma
repentina lufada de neve encobriu o veículo alguns
metros à minha frente. Mesmo forçando a vista, eu não
conseguia distinguir nada; a neve em redemoinho
transformara-se numa alvura cegante. Ao pisar no freio,
senti a ansiedade me invadir o corpo e ouvi as batidas
surdas do coração.
A ansiedade transformou-se em medo total. Fui para
o acostamento esperar que a lufada passasse. Meia hora
depois, a neve parou, a visibilidade retornou e segui em
frente, sendo parado uns 100 metros adiante, onde uma
equipe de ambulância socorria um passageiro de um
carro que batera na traseira de outro que andava em
velocidade mais lenta. A colisão havia bloqueado a
rodovia. Se eu tivesse continuado a dirigir na neve que
impedia a visibilidade, provavelmente os teria atingido.
A cautela que o medo me impôs naquele dia talvez
tenha salvado minha vida. Como um coelho paralisado
de terror ao sinal da passagem de uma raposa — ou
como um protomamífero escondendo-se de um
dinossauro predador — fui tomado por um estado
interno que me obrigou a parar, a prestar atenção e a
tomar cuidado diante do perigo iminente.
Todas as emoções são, em essência, impulsos,
legados pela evolução, para uma ação imediata, para
planejamentos instantâneos que visam lidar com a vida.
A própria raiz da palavra emoção é do latim movere —
“mover” — acrescida do prefixo “e-”, que denota
“afastar-se”, o que indica que em qualquer emoção está
implícita uma propensão para um agir imediato. Essa
relação entre emoção e ação imediata fica bem clara
quando observamos animais ou crianças; é somente em
adultos “civilizados” que tantas vezes detectamos a
grande anomalia no reino animal: as emoções —
impulsos arraigados para agir — divorciadas de uma
reação óbvia.6
Em nosso repertório emocional, cada emoção
desempenha uma função específica, como revelam suas
distintas assinaturas biológicas (ver detalhes sobre
emoções “básicas” no Apêndice A). Diante das novas
tecnologias que permitem perscrutar o cérebro e o corpo
como um todo, os pesquisadores estão descobrindo
detalhes fisiológicos que permitem a verificação de como
diferentes tipos de emoção preparam o corpo para
diferentes tipos de resposta:7
• Na raiva, o sangue flui para as mãos, tornando
mais fácil sacar da arma ou golpear o inimigo; os
batimentos cardíacos aceleram-se e uma onda de
hormônios, a adrenalina, entre outros, gera uma
pulsação, energia suficientemente forte para uma
atuação vigorosa.
• No medo, o sangue corre para os músculos do
esqueleto, como os das pernas, facilitando a fuga;
o rosto fica lívido, já que o sangue lhe é subtraído
(daí dizer-se que alguém ficou “gélido”). Ao
mesmo tempo, o corpo imobiliza-se, ainda que por
um breve momento, talvez para permitir que a
pessoa considere a possibilidade de, em vez de
agir, fugir e se esconder. Circuitos existentes nos
centros emocionais do cérebro disparam a torrente
de hormônios que põe o corpo em alerta geral,
tornando-o inquieto e pronto para agir. A atenção
se fixa na ameaça imediata, para melhor calcular a
resposta a ser dada.
• A sensação de felicidade causa uma das principais
alterações biológicas. A atividade do centro
cerebral é incrementada, o que inibe sentimentos
negativos e favorece o aumento da energia
existente, silenciando aqueles que geram
pensamentos de preocupação. Mas não ocorre
nenhuma mudança particular na fisiologia, a não
ser uma tranqüilidade, que faz com que o corpo se
recupere rapidamente do estímulo causado por
emoções perturbadoras. Essa configuração dá ao
corpo um total relaxamento, assim como
disposição e entusiasmo para a execução de
qualquer tarefa que surja e para seguir em direção
a uma grande variedade de metas.
• O amor, os sentimentos de afeição e a satisfação
sexual implicam estimulação parassimpática, o que
se constitui no oposto fisiológico que mobiliza
para “lutar-ou-fugir” que ocorre quando o
sentimento é de medo ou ira. O padrão
parassimpático, chamado de “resposta de
relaxamento”, é um conjunto de reações que
percorre todo o corpo, provocando um estado
geral de calma e satisfação, facilitando a
cooperação.
• O erguer das sobrancelhas, na surpresa,
proporciona uma varredura visual mais ampla, e
também mais luz para a retina. Isso permite que
obtenhamos mais informação sobre um
acontecimento que se deu de forma inesperada,
tornando mais fácil perceber exatamente o que
está acontecendo e conceber o melhor plano de
ação.
• Em todo o mundo, a expressão de repugnância se
assemelha e envia a mesma mensagem: alguma
coisa desagradou ao gosto ou ao olfato, real ou
metaforicamente. A expressão facial de
repugnância — o lábio superior se retorcendo para
o lado e o nariz se enrugando ligeiramente —
sugere, como observou Darwin, uma tentativa
primeva de tapar as narinas para evitar um odor
nocivo ou cuspir fora uma comida estragada.
• Uma das principais funções da tristeza é a de
propiciar um ajustamento a uma grande perda,
como a morte de alguém ou uma decepção
significativa. A tristeza acarreta uma perda de
energia e de entusiasmo pelas atividades da vida,
em particular por diversões e prazeres. Quando a
tristeza é profunda, aproximando-se da depressão,
a velocidade metabólica do corpo fica reduzida.
Esse retraimento introspectivo cria a oportunidade
para que seja lamentada uma perda ou frustração,
para captar suas conseqüências para a vida e para
planejar um recomeço quando a energia retorna. É
possível que essa perda de energia tenha tido
como objetivo manter os seres humanos
vulneráveis em estado de tristeza para que
permanecessem perto de casa, onde estariam em
maior segurança.
Essas tendências biológicas para agir são ainda mais
moldadas por nossa experiência e pela cultura. Por
exemplo, a perda de um ser amado provoca,
universalmente, tristeza e luto. Mas a maneira como
demonstramos nosso pesar, como exibimos ou contemos
as emoções em momentos íntimos, é moldada pela
cultura, o mesmo ocorrendo quando se trata de eleger
quais pessoas em nossas vidas se encaixam na categoria
de “entes queridos” dignos de nosso lamento.
O prolongado período de evolução em que, por força
das circunstâncias, essas respostas emocionais se
formaram foi, sem dúvida, uma realidade bem mais dura
que a maioria dos seres humanos teve de suportar desde
o alvorecer da história registrada. Foi um tempo em que
poucas crianças sobreviveram à infância e em que
poucos adultos viveram mais do que trinta anos, tempo
em que predadores atacavam a qualquer momento,
tempo em que as condições climáticas determinavam se
iríamos ou não morrer de fome. Mas, com o advento da
agricultura, e até mesmo das mais rudimentares formas
de organização social, as possibilidades de sobrevivência
mudaram de forma extraordinária. Nos últimos 10 mil
anos, quando esses avanços se espalharam por todo o
mundo, reduziram-se significativamente as violentas
pressões que ameaçaram a população humana.8
Mas foram exatamente essas pressões que tornaram
nossas respostas emocionais fundamentais para a
sobrevivência; atenuadas as pressões, a importância das
reações que passaram a fazer parte de nosso repertório
emocional também declinou. Enquanto, no passado
distante, a raiva instantânea funcionava como arma
decisiva para garantir nossa sobrevivência, a eventual
disponibilidade de uma arma para um garoto de 13 anos
pode resultar numa catástrofe.
Nossas Duas Mentes
Uma amiga me falava de seu divórcio, uma dolorosa
separação. O marido apaixonara-se por uma mulher mais
jovem com quem trabalhava e, de repente, anunciaraque ia deixá-la para viver com a outra. Seguiram-se
meses de brigas amargas sobre a casa, dinheiro e
custódia dos filhos. Agora, passados alguns meses, ela
dizia que sua independência lhe agradava, que se sentia
feliz contando apenas consigo mesma.
— Simplesmente não penso mais nele; na verdade,
nem quero saber dele.
Só que, ao dizer isso, de repente seus olhos ficaram
cheios de lágrimas.
Aquele lacrimejar de olhos poderia passar facilmente
despercebido. Mas, por um tipo de compreensão que
acontece através da empatia, os olhos marejados em uma
pessoa indicam que ela está triste, não importa o que
tenha expressado em palavras. A empatia é um ato de
compreensão tão seguro quanto a apreensão do sentido
das palavras contidas numa página impressa. O primeiro
tipo de compreensão é fruto da mente emocional, o
outro, da mente racional. Na verdade, temos duas
mentes — a que raciocina e a que sente.
Esses dois modos fundamentalmente diferentes de
conhecimento interagem na construção de nossa vida
mental. Um, a mente racional, é o modo de
compreensão de que, em geral, temos consciência: é
mais destacado na consciência, mais atento e capaz de
ponderar e refletir. Mas, além desse, há um outro sistema
de conhecimento que é impulsivo e poderoso, embora
às vezes ilógico — a mente emocional. (Para uma
descrição mais detalhada das características da mente
emocional, ver o Apêndice B.)
A dicotomia emocional/racional aproxima-se da
distinção que popularmente é feita entre “coração” e
“cabeça”; saber que alguma coisa é certa “aqui dentro no
coração” é um grau diferente de convicção — tem um
sentido mais profundo —, ainda que idêntica àquela
adquirida através da mente racional. Há uma acentuada
gradação na proporção entre controle racional e
emocional da mente; quanto mais intenso o sentimento,
mais dominante é a mente emocional — e mais
inoperante a racional. É uma disposição que parece ter
tido origem há bilhões de anos, quando se iniciou nossa
evolução biológica: era mais vantajoso que emoção e
intuições guiassem nossa reação imediata frente a
situações de perigo de vida — parar para pensar o que
fazer poderia nos custar a vida.
Essas duas mentes, a emocional e a racional, na
maior parte do tempo operam em estreita harmonia,
entrelaçando seus modos de conhecimento para que nos
orientemos no mundo. Em geral, há um equilíbrio entre
as mentes emocional e racional, com a emoção
alimentando e informando as operações da mente
racional, e a mente racional refinando e, às vezes,
vetando a entrada das emoções. Mas são faculdades
semi-independentes, cada uma, como veremos,
refletindo o funcionamento de circuitos distintos, embora
interligados, do cérebro.
Em muitos ou na maioria dos momentos, essas
mentes se coordenam de forma bela e delicada; os
sentimentos são essenciais para o pensamento e vice-
versa. Mas, quando surgem as paixões, esse equilíbrio se
desfaz: é a mente emocional que assume o comando,
inundando a mente racional. Erasmo de Rotterdam,
humanista do século XVI, escreveu, sob a forma de
sátira, acerca dessa perene tensão entre razão e
emoção:9
Júpiter legou muito mais paixão que razão — pode-se calcular a
proporção em 24 por um. Pôs duas tiranas furiosas em oposição ao
solitário poder da Razão: a ira e a luxúria. Até onde a Razão prevalece
contra as forças combinadas das duas, a vida do homem comum deixa
bastante claro. A Razão faz a única coisa que pode e berra até ficar
rouca, repetindo fórmulas de virtude, enquanto as outras duas a
mandam para o diabo que a carregue, e tornam-se cada vez mais
ruidosas e insultantes, até que por fim sua Governante se exaure,
desiste e rende-se.
COMO O CÉREBRO EVOLUIU
Para melhor entender a enorme influência das emoções
sobre a razão — e por que sentimento e razão entram
tão prontamente em guerra — vejamos como o cérebro
evoluiu. O cérebro humano, com um pouco mais de 1
quilo de células e humores neurais, é três vezes maior
que o dos nossos primos ancestrais, os primatas não-
humanos. Ao longo de milhões de anos de evolução, o
cérebro cresceu de baixo para cima, os centros
superiores desenvolvendo-se como elaborações das
partes inferiores, mais antigas. (O crescimento do
cérebro no embrião humano refaz mais ou menos esse
percurso evolucionário.)
A parte mais primitiva do cérebro, partilhada por
todas as espécies que têm um sistema nervoso superior a
um nível mínimo, é o tronco cerebral em volta do topo
da medula espinhal. Esse cérebro-raiz regula funções
vitais básicas, como a respiração e o metabolismo dos
outros órgãos do corpo, e também controla reações e
movimentos estereotipados. Não se pode dizer que esse
cérebro primitivo pense ou aprenda; ao contrário, ele se
constitui num conjunto de reguladores pré-programados
que mantêm o funcionamento do corpo como deve e
reage de modo a assegurar a sobrevivência. Esse cérebro
reinou supremo na Era dos Répteis: imaginem o sibilar
de uma serpente comunicando a ameaça de um ataque.
Da mais primitiva raiz, o tronco cerebral, surgiram os
centros emocionais. Milhões de anos depois, na
evolução dessas áreas emocionais, desenvolveu-se o
cérebro pensante, ou “neocórtex”, o grande bulbo de
tecidos ondulados que forma as camadas externas. O
fato de o cérebro pensante ter se desenvolvido a partir
das emoções revela muito acerca da relação entre razão
e sentimento; existiu um cérebro emocional muito antes
do surgimento do cérebro racional.
A mais antiga raiz de nossa vida emocional está no
sentido do olfato, ou, mais precisamente, no lobo
olfativo, células que absorvem e analisam o cheiro. Toda
entidade viva, seja nutritiva, venenosa, parceiro sexual,
predador ou presa, tem uma assinatura molecular
distintiva que o vento transporta. Naqueles tempos
primitivos, o olfato apresentava-se como um sentido
supremo para a sobrevivência.
Do lobo olfativo, começaram a evoluir os antigos
centros de emoção, que acabaram tornando-se
suficientemente grandes para envolver o topo do tronco
cerebral. Em seus estágios rudimentares, o centro
olfativo compunha-se de pouco mais de tênues camadas
de neurônios reunidos para analisar o cheiro. Uma
camada de células recebia o que era cheirado e o
classificava em categorias relevantes: comestível ou
tóxico, sexualmente acessível, inimigo ou comida. Uma
segunda camada de células enviava mensagens reflexivas
a todo o sistema nervoso, dizendo ao corpo o que fazer:
morder, cuspir, abordar, fugir, caçar.10
Com o advento dos primeiros mamíferos, vieram
novas e decisivas camadas, chave do cérebro emocional.
Estas, em torno do tronco cerebral, lembravam um
pouco um pastel com um pedaço mordido embaixo, no
lugar onde se encaixa o tronco cerebral. Como essa
parte do cérebro cerca o tronco cerebral e limita-se com
ele, era chamada de sistema “límbico”, de limbus,
palavra latina que significa “orla”. Esse novo território
neural acrescentou emoções propriamente ditas ao
repertório do cérebro.11 Quando estamos sob o domínio
de anseios ou fúria, perdidamente apaixonados ou
transidos de pavor, é o sistema límbico que nos tem em
seu poder.
À medida que evoluía, o sistema límbico foi
aperfeiçoando duas poderosas ferramentas:
aprendizagem e memória. Esses avanços revolucionários
possibilitavam que um animal fosse muito mais esperto
nas opções de sobrevivência e aprimorasse suas
respostas para adaptar-se a exigências cambiantes, em
vez de ter reações invariáveis e automáticas. Se uma
comida causava doença, podia ser evitada da próxima
vez. Decisões como saber o que comer e o que rejeitar
ainda eram, em grande parte, determinadas pelo olfato;
as ligações entre o bulbo olfativo e o sistema límbico
assumiam agora as tarefas de estabelecer distinções entre
cheiros e reconhecê-los, comparando um atual com
outros passados e discriminando, assim, o bom do ruim.
Isso era feito pelo “rinencéfalo”, literalmente, o “cérebro
do nariz”, uma parte da fiação límbica e a base
rudimentar doneocórtex, o cérebro pensante.
Há cerca de 100 milhões de anos, o cérebro dos
mamíferos deu um grande salto em termos de
crescimento. Por cima do tênue córtex de duas camadas
— as regiões que planejam, compreendem o que é
sentido, coordenam o movimento —, acrescentaram-se
novas camadas de células cerebrais, formando o
neocórtex. Comparado com o antigo córtex de duas
camadas, o neocórtex oferecia uma extraordinária
vantagem intelectual.
O neocórtex do Homo sapiens, muito maior que o de
qualquer outra espécie, acrescentou tudo o que é
distintamente humano. O neocórtex é a sede do
pensamento; contém os centros que reúnem e
compreendem o que os sentidos percebem. Acrescenta a
um sentimento o que pensamos dele — e permite que
tenhamos sentimentos sobre idéias, arte, símbolos,
imagens.
Na evolução, o neocórtex possibilitou um criterioso
aprimoramento que, sem dúvida, trouxe enormes
vantagens na capacidade de um organismo sobreviver à
adversidade, tornando mais provável que sua progênie,
por sua vez, passasse adiante os genes que contêm esses
mesmos circuitos neurais. A vantagem para a
sobrevivência deve-se à capacidade do neocórtex de
criar estratégias, planejar a longo prazo e outros artifícios
mentais. Além disso, os triunfos da arte, civilização e
cultura são todos frutos do neocórtex.
Esse acréscimo ao cérebro introduziu novas nuanças
à vida emocional. Vejam o amor. As estruturas límbicas
geram sentimentos de prazer e desejo sexual, emoções
que alimentam a paixão sexual. Mas a adição do
neocórtex e suas ligações ao sistema límbico criaram a
ligação mãe-filho, que é a base da unidade familiar e do
compromisso, a longo prazo, com a criação dos filhos, o
que torna possível o desenvolvimento humano.
(Espécies que não têm neocórtex, como os répteis,
carecem de afeição materna; quando saem do ovo, os
recém-nascidos têm de se esconder para que não sejam
canibalizados.) Nos seres humanos, é o instinto de
proteção que os pais têm em relação aos filhos que vai
assegurar a prossecução de grande parte do
amadurecimento durante a infância, período em que o
cérebro continua a se desenvolver.
À medida que subimos na escala filogenética do réptil
ao rhesus e ao ser humano, o volume do neocórtex
aumenta; com esse aumento, ocorre um incremento de
proporções gigantescas nas interligações dos circuitos
cerebrais. Quanto maior o número dessas ligações, maior
a gama de respostas possíveis. O neocórtex abriga a
sutileza e a complexidade da vida emocional, como a
capacidade de ter sentimentos sobre nossos sentimentos.
Há uma maior proporção de neocórtex para sistema
límbico nos primatas que nas outras espécies — e
imensamente mais nos seres humanos —, o que sugere
que podemos exibir uma gama muito maior de reações
às nossas emoções, e mais nuanças. Enquanto um
coelho, ou um rhesus, possui um repertório bastante
restrito de respostas típicas para o medo, o neocórtex
humano, maior, coloca à nossa disposição um repertório
muito mais ágil — chamar a polícia, por exemplo.
Quanto mais complexo o sistema social, mais essencial é
essa flexibilidade — e não existe nenhuma forma de
organização social mais complexa do que a nossa.12
Mas esses centros superiores não controlam toda a
vida emocional; nos problemas cruciais que dizem
respeito ao coração e, mais especialmente, nas
emergências emocionais, pode-se dizer que eles se
submetem ao sistema límbico. Como tantos dos centros
superiores do cérebro se desenvolveram a partir do
âmbito da região límbica, ou a ampliaram, o cérebro
emocional desempenha uma função decisiva na
arquitetura neural. Como raiz da qual surgiu o cérebro
mais novo, as áreas emocionais entrelaçam-se, através de
milhares de circuitos de ligação, com todas as partes do
neocórtex. Isso dá aos centros emocionais imensos
poderes de influenciar o funcionamento do restante do
cérebro — incluindo seus centros de pensamento.
2 
Anatomia de um 
Seqüestro Emocional
A vida é uma comédia para os que pensam e uma
tragédia para os que sentem.
Horace Walpole
Era uma tarde quente de verão, em 1963, o mesmo dia
em que o reverendo Martin Luther King Jr. fez o discurso
“Eu tenho um sonho” numa marcha pelos direitos civis
em Washington. Naquele dia, Richard Robles, um ladrão
contumaz, acabara de ser posto em liberdade
condicional. Ele havia cumprido a sentença que o havia
condenado a três anos de prisão por mais de cem
invasões de domicílio que perpetrara para sustentar seu
vício em heroína. Robles decidiu fazer outra invasão.
Queria abandonar o mundo do crime, alegou mais tarde,
mas naquele momento estava precisando
desesperadamente de dinheiro para manter a namorada
e a filha deles, uma menina com cerca de 3 anos.
O apartamento que arrombou naquele dia pertencia a
duas moças, Janice Wylie, de 21 anos, pesquisadora na
revista Newsweek, e Emily Hoffert, 23, professora
primária. Embora Robles houvesse escolhido para
arrombar um apartamento num luxuoso bairro de Nova
York por achar que não havia ninguém lá, Janice estava
em casa. Ameaçando-a com uma faca, ele a amarrou.
Quando ia saindo, entrou Emily. Para garantir a fuga,
Robles a amarrou também.
Segundo relatou anos depois, enquanto amarrava
Emily, Janice Wylie disse que ele não sairia impune
daquele crime: ia se lembrar da cara dele e ajudar a
polícia a localizá-lo. Robles, que prometera a si mesmo
que aquele seria seu último arrombamento, entrou em
pânico, perdendo completamente o controle. Num
frenesi, pegou uma garrafa de refrigerante e bateu nas
moças até deixá-las inconscientes; depois, possuído de
raiva e medo, retalhou-as e esfaqueou-as várias vezes
com uma faca de cozinha. Vinte e cinco anos depois, ao
lembrar daquele momento, Robles lamentava:
— Fiquei muito furioso. Minha cabeça explodiu.
De lá para cá, Robles teve muito tempo para se
arrepender daqueles breves minutos de fúria
desenfreada. Enquanto escrevo, ele continua na prisão,
algumas décadas depois, cumprindo pena pelo famoso
“Assassinato das Executivas”.
Tais explosões emocionais são seqüestros neurais.
Nesses momentos, sugerem os indícios, um centro no
cérebro límbico proclama uma emergência, recrutando o
resto do cérebro para seu plano de urgência. O
seqüestro ocorre num instante, disparando essa reação
crucial momentos antes de o neocórtex, o cérebro
pensante, ter a oportunidade de ver tudo que está
acontecendo, e sem ter o tempo necessário para decidir
se essa é uma boa idéia. A marca característica desse
seqüestro neural é que, assim que passa o momento, o
cérebro “possuído” não tem a menor noção do que deu
nele.
Esses seqüestros não são de modo algum incidentes
isolados e horrendos, que levam sempre a crimes brutais
como o Assassinato das Executivas. De forma menos
catastrófica — mas não necessariamente menos intensa
— ocorrem conosco com muita freqüência. Lembrem da
última vez em que vocês “saíram do sério”, explodiram
com alguém — o marido ou filho, ou quem sabe o
motorista de outro carro — a tal ponto que depois, com
um pouco de reflexão e visão retrospectiva, a coisa
pareceu-lhes imprópria. Isso, com toda probabilidade, foi
também um desses seqüestros, uma tomada de poder
neural que, como veremos, se origina na amígdala
cortical, um centro no cérebro límbico.
Nem todos os seqüestros límbicos são aflitivos.
Quando uma piada é muito engraçada, a risada é quase
explosiva — esta é também uma resposta límbica.
Funciona igualmente em momentos de intensa alegria:
quando Dan Jansen, após frustradas tentativas para
conquistar a medalha de ouro olímpica de patinação
(que prometera à irmã agonizante), finalmente ganhou-a
nos 1.000 metros, nas Olimpíadas de Inverno na
Noruega, sua mulher ficou tão emocionada que teve de
ser levada às pressas para a beira do rinque para ser
atendida pelo pronto-socorro médico.
O LOCAL DAS PAIXÕES
Nos seres humanos, a amígdala cortical (do grego,
significando “amêndoa”) é um feixe, em forma de
amêndoa, de estruturas