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Resumo AP1 – Gestão 2 Texto 1 - POLÍTICAS E GESTÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL: LIMITES E PERSPECTIVAS O texto aborda o cenário político e pedagógico em que se realizam as políticas direcionadas à gestão da educação básica, buscando explicitar concepções, ações e programas governamentais, bem como suas interfaces com a suposta qualidade preconizada para esse nível de ensino no Brasil. O processo educativo é mediado pelo contexto sociocultural, pelas condições em que se efetiva o ensino-aprendizagem, pelos aspectos organizacionais e, consequentemente, pela dinâmica com que se constrói o projeto político-pedagógico e se materializam os processos de organização e gestão da educação básica. Assim, a análise da gestão educacional pode se realizar por meio de vários recortes e planos. Uma perspectiva importante implica não reduzir a análise das políticas e da gestão educacional à mera descrição dos seus processos de concepção e/ou de execução, importando, sobremaneira, apreendê-las no âmbito das relações sociais em que se forjam as condições para sua proposição e materialidade. Para efeito dessa análise, e considerando a especificidade do sistema educacional brasileiro, buscar-se-á apreender as concepções político-pedagógicas que norteiam a ação do governo federal no tocante à proposição de ações e programas implementados, visando à materialização das políticas na área, sem perder de vista que várias outras mediações interferem nesse processo. O presente texto busca, portanto, situar as políticas direcionadas à gestão da educação básica por meio da análise da proposição de ações, programas e estratégias articulados pelo governo federal. Não se objetiva discutir pormenorizadamente os programas e, sim, a lógica presente na proposição e os limites interpostos à sua materialização no âmbito dos sistemas de ensino, especialmente no que concerne aos diferentes pressupostos que norteiam os programas: Plano de Desenvolvimento da Escola, Programa Dinheiro Direto na Escola e Programa Nacional de Fortalecimento de Conselhos Escolares. A gestão como objeto de investigação e ação política A concepção de educação é entendida, aqui, como prática social, portanto, constitutiva e constituinte das relações sociais mais amplas, a partir de embates e processos em disputa que traduzem distintas concepções de homem, mundo e sociedade. A educação é um processo amplo de socialização da cultura, historicamente produzida pelo homem, e a escola, como lócus privilegiado de produção e apropriação do saber, cujas políticas, gestão e processos se organizam, coletivamente ou não, em prol dos objetivos de formação. Sendo assim, políticas educacionais efetivamente implicam o envolvimento e o comprometimento de diferentes atores, incluindo gestores e professores vinculados aos diferentes sistemas de ensino. Dessa forma, a gestão educacional tem natureza e características próprias, ou seja, tem escopo mais amplo do que a mera aplicação dos métodos, técnicas e princípios da administração empresarial, devido à sua especificidade e aos fins a serem alcançados.4 Ou seja, a escola, entendida como instituição social, tem sua lógica organizativa e suas finalidades demarcadas pelos fins político-pedagógicos que extrapolam o horizonte custo-benefício stricto sensu. Isto tem impacto direto no que se entende por planejamento e desenvolvimento da educação e da escola e, nessa perspectiva, implica aprofundamento sobre a natureza das instituições educativas e suas finalidades, bem como as prioridades institucionais, os processos de participação e decisão, em âmbito nacional, nos sistemas de ensino e nas escolas. Nessa perspectiva, a articulação e a rediscussão de diferentes ações e programas, direcionados à gestão educacional, devem ter por norte uma concepção ampla de gestão que considere a centralidade das políticas educacionais e dos projetos pedagógicos das escolas, bem como a implementação de processos de participação e decisão nessas instâncias, balizados pelo resgate do direito social à educação e à escola, pela implementação da autonomia nesses espaços sociais e, ainda, pela efetiva articulação com os projetos de gestão do MEC, das secretarias, com os projetos político-pedagógicos das escolas e com o amplo envolvimento da sociedade civil organizada. Por outro lado, a problematização das condições de formação e profissionalização docentes coloca-se como questão interligada à gestão educacional e, nesse sentido, deve considerar os diferentes fatores que interferem na atuação dos profissionais da educação, bem como possibilitar o acesso a processos formativos que não descurem de uma base sólida de formação, não se reduzindo à disseminação de metodologias e estratégias de aprendizagem. Rever a formação pedagógica requer, portanto, a articulação entre as políticas educacionais e as concepções de formação enquanto processos de construção coletiva. Implica, também, resgatar as experiências implementadas por estados e municípios como passos importantes no fortalecimento das ações do MEC, em apoio às políticas de formação de professores e aos processos de organização, gestão educacional e escolar. Nesse sentido situam-se também as ações voltadas à organização da educação nacional, cujo norte político-pedagógico, no campo e na cidade, deve considerar a riqueza e a diversidade de experiências e as condições e especificidades com as quais se realizam processos formativos para professores e estudantes, considerando a garantia de parâmetros de qualidade e indicando alternativas e perspectivas pedagógicas centradas em uma sólida concepção de educação, escola, cultura e gestão educacional. Ao mesmo tempo, deve-se considerar o papel basilar das políticas de financiamento e regulação da educação, uma vez que os processos de gestão educacional e escolar são fortemente induzidos pela lógica decorrente do financiamento adotado, resultante da caracterização do Estado e da articulação entre as esferas pública e privada. Tais indicadores situam a gestão educacional margeada por fatores intra e extra- escolares. Assim, a democratização dos processos de organização e gestão deve considerar as especificidades dos sistemas de ensino, bem como os graus progressivos de autonomia das unidades escolares a eles vinculados, e buscar a participação da sociedade civil organizada, especialmente o envolvimento de trabalhadores em educação, estudantes e pais. Políticas e gestão da educação básica no Brasil: descontinuidade e centralização A constituição e a trajetória histórica das políticas educacionais no Brasil, em especial os processos de organização e gestão da educação básica nacional, têm sido marcadas hegemonicamente pela lógica da descontinuidade, por carência de planejamento de longo prazo que evidenciasse políticas de Estado em detrimento de políticas conjunturais de governo. Tal dinâmica tem favorecido ações sem a devida articulação com os sistemas de ensino, destacando-se, particularmente, gestão e organização, formação inicial e continuada, estrutura curricular, processos de participação. Desde a redemocratização do país, houve mudanças acentuadas na educação brasileira, com destaque para a aprovação e promulgação da Constituição Federal de 1988, que garantiu uma concepção ampla de educação e sua inscrição como direito social inalienável, bem como a partilha de responsabilidade entre os entes federados e a vinculação constitucional de recursos para a educação. No âmbito das políticas educacionais, destacaram-se, sobremaneira, as modificações de ordem jurídico-institucional. Fica claro o indicador de gestão centralizada e de pouca eficácia pedagógica para mudanças substantivas nos sistemas de ensino, ainda que provoquealterações de rotina, ajustes e pequenas adequações no cotidiano escolar, o que pode acarretar a suspensão de ações consolidadas na prática escolar sem a efetiva incorporação de novos formatos de organização e gestão. Isto não redundou em mudança e, sim, em um cenário de hibridismo no plano das concepções e das práticas que, historicamente, no Brasil, têm resultado em realidade educacional excludente e seletiva. Nessa direção, houve um conjunto de políticas de reestruturação da gestão, organização e financiamento da educação básica. Segundo Cury (2002, p. 197), nos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998; 1999-2002) promoveram-se diversas alterações fortemente marcadas (...) por políticas focalizadoras, com especial atenção ao ensino fundamental, a fim de selecionar e destinar os recursos para metas e objetivos considerados urgentes e necessários. Tais políticas vieram justificadas por um sentido, por vezes satisfatório, do princípio da equidade como se este fosse substituto do da igualdade. Desse quadro, é possível depreender que as políticas focalizadas propiciaram a emergência de programas e ações orientados pelo governo federal aos estados e municípios, destacando-se: a disseminação de Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), a implantação do Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE) pelo FUNDESCOLA, a criação do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e a implementação de uma política de avaliação fortemente centralizada, em detrimento de um sistema que propiciasse a colaboração recíproca entre os entes federados. A rapidez com que se processaram as políticas para a educação básica se deu em função da centralização no âmbito federal. Atualmente a realidade no cenário educacional brasileiro é de desarticulação de experiências e projetos em andamento e para a adoção de medidas ligadas às políticas federais para a educação básica. Na medida em que não se elaborou a lei complementar que definiria o regime de colaboração recíproca entre os entes federados, manteve-se a indução de políticas, por meio de financiamento de programas e ações priorizadas pela esfera federal, e não se adotou o Plano Nacional de Educação (PNE) como referência base para as políticas educacionais. Adicione-se a isso, mais recentemente, a apresentação pelo MEC de um Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), que não contou, na sua elaboração, com a participação efetiva de setores organizados da sociedade brasileira, de representantes dos sistemas de ensino e de setores do próprio Ministério. O PDE apresenta indicações de grandes e importantes ações direcionadas à educação nacional. No entanto, não está balizado por fundamentação técnico-pedagógica suficiente e carece de articulação efetiva entre os diferentes programas e ações em desenvolvimento pelo próprio MEC e as políticas propostas. Tal constatação revela a necessidade de planejamento sistemático, que, após avaliar o conjunto de ações, programas e planos em desenvolvimento, contribua para o estabelecimento de políticas que garantam organicidade entre as políticas, entre os diferentes órgãos do MEC, sistemas de ensino e escola e, ainda, a necessária mediação entre o Estado, demandas sociais e o setor produtivo, em um cenário historicamente demarcado pela fragmentação e/ou superposição de ações e programas, o que resulta na centralização das políticas de organização e gestão da educação básica no país. Trata-se de um cenário ambíguo, no qual um conjunto de programas parece avançar na direção de políticas com caráter inclusivo e democrático, enquanto, de outro lado, prevalece a ênfase gerencial, com forte viés tecnicista e produtivista, que vislumbra nos testes estandardizados a naturalização do cenário desigual em que se dá a educação brasileira. Aliados ao redimensionamento do financiamento da educação básica, destacam-se os planos de educação, notadamente o PNE, os Planos Estaduais de Educação (PEE) e os Planos Municipais de Educação (PME). Se entendidos como planos de Estado, estes deveriam implicar redimensionamento das políticas e gestão e, fundamentalmente, da lógica de financiamento e, portanto, do orçamento público. Tal dinâmica encontra-se desarticulada e associada à lógica de desconcentração que tem marcado a educação nacional. Merece ser destacado, contudo, o esforço desenvolvido para estimular a formação de conselhos, bem como a sua capacitação. Apesar desse cenário de mudanças na área da gestão educacional, vários programas foram mantidos no formato original, destacando-se o Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE). Por outro lado, novos programas foram implantados, a fim de contribuir com os processos de democratização da escola, com destaque para o Programa Nacional de Fortalecimento de Conselhos Escolares. Plano e programas federais em andamento na área de gestão escolar No campo da gestão, três programas traduzem esse movimento ambíguo: O PDE (FUNDESCOLA), PDDE e o Programa Nacional de Fortalecimento de Conselhos Escolares. O FUNDESCOLA é um dos espaços de desenvolvimento de programas do Ministério da Educação, por meio de parcerias com as secretarias estaduais e municipais de educação das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, e tem por objetivo promover um conjunto de ações voltadas para as escolas do ensino fundamental. Tem como meta a busca da eficácia, eficiência e eqüidade no ensino fundamental público, ao focalizar o ensino-aprendizagem e as práticas de gestão das escolas e secretarias de educação. As estratégias descritas no PDE enfatizam o desenvolvimento de ações para aperfeiçoar o trabalho, elevar o grau de conhecimento e o compromisso de diretores, professores e outros funcionários da escola com os resultados educacionais. Na área de gestão, o PDE é um dos programas centrais do FUNDESCOLA, O PDE favoreceu a proliferação de empresas de consultoria e de capacitação docente por meio de cursos previamente montados por elas. Essas empresas fazem, portanto, o trabalho de agenciamento e de planejamento, cabendo à escola a prerrogativa de escolher os cursos com base na oferta das empresas. Essas pesquisas ressaltam a lógica do plano e seu distanciamento dos marcos legais que preconizam o princípio da gestão democrática e dos processos de participação subjacentes a esta, bem como a importância da efetivação de projeto pedagógico pelas unidades escolares. em 2004, foi materializada a transferência da gestão integral do FUNDESCOLA para o FNDE (Dourado, 2004, p. 10). Tal mudança contribui, sobremaneira, para o crescente divórcio entre as ações do Fundo, entre elas o PDE, e as ações e programas da SEB, resultando, em muitos casos, na sobreposição de ações e em planos e programas com concepções político-pedagógicas distintas no âmbito do governo federal. Assim, é fundamental registrar que o FUNDESCOLA desenvolve ações, em especial na área de gestão, sem clara interlocução com as demais políticas das Secretarias do MEC. O PDE, nesse cenário, tem foco e ação político-pedagógica baseados em concepção gerencial, cujo processo ignora o esforço desenvolvido pelo MEC no apoio técnico e financeiro para a democratização da gestão escolar. O PDDE consiste no repasse anual de recursos por meio do FNDE às escolas públicas do ensino fundamental estaduais, municipais e do Distrito Federal e às do ensino especial mantidas por organizações nãogovernamentais (ONGs), desde que registradas no Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS). Os recursos, oriundos predominantemente do “salário-educação”, são destinados à aquisição de material permanente e de consumo necessários ao funcionamento da escola; à manutenção, conservação e pequenos reparos da unidade escolar; à capacitação e ao aperfeiçoamento de profissionais da educação; à avaliação de aprendizagem; à implementação de projeto pedagógico; e ao desenvolvimento de atividades educacionais. OPrograma opta pela criação de UEX de natureza privada como mecanismo para assegurar maior flexibilidade na gestão dos recursos repassados e ampliar a participação da comunidade escolar nessa mesma gestão. O Programa é abrangente, ao mesmo tempo em que generaliza as UEX para as diferentes redes e sistemas de ensino, padronizando um formato institucional que delega a responsabilidade sobre a gestão dos recursos públicos descentralizados para uma instituição de natureza privada. A análise do PDDE demonstra que sua implementação tem resultado no desrespeito ao pacto federativo, na medida em que o Programa atropela os sistemas de ensino ao redefinir novos formatos de gestão para as escolas públicas. Outro aspecto refere-se à pequena participação da comunidade escolar, pois “o fato do Programa não pressupor para a sua realização a efetiva democratização da gestão da esfera pública fez com que, em muitos casos, fosse pequena a desejada participação da comunidade na operação de recursos repassados. Todos esses indicadores demonstram que as bases político-pedagógicas do PDDE não contribuíram efetivamente para a democratização dos processos de deliberação coletiva e, ainda, restringiram a autonomia à gestão financeira da escola. O Programa Nacional de Fortalecimento de Conselhos Escolares tem por objetivo contribuir com a discussão sobre a importância de conselhos escolares nas instituições e visa, ainda, ao fortalecimento dos conselhos existentes. Os conselhos escolares configuram-se, historicamente, como espaços de participação de professores, funcionários, pais, alunos, diretores e comunidade nas unidades escolares. O Programa foi criado, portanto, pela Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação, mediante a Portaria Ministerial n. 2.896/2004. De acordo com a mesma Portaria Ministerial, tem por objetivos: I - Ampliar a participação das comunidades escolar e local na gestão administrativa, financeira e pedagógica das escolas públicas; II - apoiar a implantação e o fortalecimento de conselhos escolares; III - instituir políticas de indução para implantação de conselhos escolares; IV - promover, em parceria com os sistemas de ensino, a capacitação de conselheiros escolares, utilizando inclusive metodologias de educação a distância; V - estimular a integração entre os conselhos escolares; VI - apoiar os conselhos escolares na construção coletiva de um projeto educacional no âmbito da escola, em consonância com o processo de democratização da sociedade; e VII - promover a cultura do monitoramento e avaliação no âmbito das escolas para a garantia da qualidade da educação. Vale ressaltar que a efetivação dos objetivos preconizados envolve, fundamentalmente, a adesão ao Programa pelos estados e municípios. O programa apresenta-se organizado a partir de cinco eixos iniciais – conselhos escolares, democratização da escola e construção da cidadania; conselho escolar e o respeito e valorização do saber e da cultura do estudante e da comunidade; conselho escolar e o aproveitamento significativo do tempo pedagógico; conselho escolar e a aprendizagem na escola; conselho escolar, gestão democrática da educação e escolha do diretor. Em seguida, o Programa ampliou tais eixos com as seguintes temáticas: conselho escolar como espaço de formação humana; conselho escolar e o financiamento da educação; conselho escolar e a educação no campo; conselho escolar e a relação entre a escola e o desenvolvimento com igualdade social. Além desses núcleos temáticos, contemplou-se a discussão sobre os indicadores de qualidade da educação e os conselhos escolares como estratégia de gestão democrática da educação pública. Em que pese a centralidade conferida a esse Programa, é fundamental destacar que o eixo da gestão democrática e da efetiva participação, bem como a centralidade conferida a órgãos de deliberação coletiva como os conselhos escolares, encontra limites em outros programas do próprio governo federal já analisados. O Programa Nacional de Fortalecimento de Conselhos Escolares constitui-se em avanço importante frente ao pragmatismo das políticas do governo para a gestão escolar. Ao mesmo tempo, ao disputar espaço com programas financiados pelo Banco Mundial, estruturados sob forte égide gerencial, pode vir a ser secundarizado nas políticas e gestão das escolas no país. Tal ambigüidade revela a dificuldade de se efetivar políticas, em âmbito nacional, sem a garantia de relação com os sistemas de ensino e com os profissionais da educação que aí atuam, bem como a adoção de políticas preconizadas por agências e organismos internacionais, sem a devida mediação com o cenário nacional. No Brasil, houve a desconcentração de ações educacionais de forma muito mais efetiva do que a descentralização garantidora de autonomia aos entes federados. Ou seja, o que ocorre é a transferência de competências de um ente federado para outro, resultando na manutenção de ações pontuais e focalizadas de apoio técnico e financeiro, em detrimento de ampla política de planejamento, financiamento e gestão da educação básica. A despeito disso, predominam, no cenário educacional, vários processos de regulação que permeiam o cotidiano dos sistemas de ensino e das escolas públicas, sob a hegemonia da União, por meio da indução de políticas de financiamento de ações e programas governamentais. Paralelamente à regulação nacional, assiste- se, portanto, ao desenvolvimento de processos formais e informais de regulação no nível dos territórios e das organizações (micro-regulação local). A busca por melhoria da qualidade da educação exige medidas não só no campo do ingresso e da permanência, mas requer ações que possam reverter a situação de baixa qualidade da aprendizagem na educação básica, o que pressupõe, por um lado, identificar os condicionantes da política de gestão e, por outro, refletir sobre a construção de estratégias de mudança do quadro atual. Uma educação com qualidade social é caracterizada por um conjunto de fatores intra e extra- escolares que se referem às condições de vida dos alunos e de suas famílias, ao seu contexto social, cultural e econômico e à própria escola – professores, diretores, projeto pedagógico, recursos, instalações, estrutura organizacional, ambiente escolar e relações intersubjetivas no cotidiano escolar. No intuito de melhorar a qualidade da educação brasileira que devem se situar as ações, mediadas por efetiva regulamentação do regime de colaboração entre a União, estados, Distrito Federal e municípios, objetivando, de fato, assegurar um padrão de acesso, permanência e gestão na educação básica, pautado por políticas e ações que promovam a educação democrática e de qualidade social para todos. Texto 2 - POLÍTICA EDUCACIONAL, GESTÃO E APRENDIZAGEM – POR UMA ESCOLA DE QUALIDADE PARA TODOS O que é preciso fazer para termos uma escola de qualidade para todos? Esse é o tema de nossa reflexão. Para desenvolvê-lo partimos de dois pressupostos para uma mudança na situação existente: 1. As políticas de educação devem ser políticas de Estado. Enquanto permanecerem à mercê de governos que vêm e vão, o Brasil continuará reinventando a roda, como tem sido feito desde os primórdios da história da educação. 2. As políticas e práticas de gestão (educacional e) escolar e a formação do educador precisam estar em sintonia com foco permanente na aprendizagem. Segundo a legislação brasileira, a formação de professores e de gestores da Educação Básica é feita em cursos de graduação e de pós-graduação, admitindo-se que professores de Educação Infantil e de séries iniciais do Ensino Fundamental tenham formação de nível médio. De acordo com a LDB, “a formação de docentes para atuar na educação básica far-seá em nível superior, em curso de licenciatura, de graduaçãoplena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal” (Art. 62). A formação de gestores, por sua vez, se enquadra no artigo que trata da “formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica” que deve ser feita “em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional” (Art. 64). Há professores e gestores que não são formados para atuar na escola e no sistema educacional e, no entanto, nele trabalham. Este pode representar um problema para as políticas e práticas de formação, assim como para a gestão escolar. No âmbito da formação de gestores municipais destacaremos o Programa de Apoio aos Dirigentes Municipais de Educação (PRADIME). Na esfera das ações voltadas para a formação de gestores escolares focalizaremos o Programa de Capacitação a Distância para Gestores Escolares (PROGESTÃO), de iniciativa dos Estados, assim como o Projeto Escola de Gestores da Educação Básica (Escola de Gestores), desenvolvido pela União, com apoio de universidades e secretarias de educação. O PRADIME é um programa de grande porte Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), desenvolvido através do Fundo de Fortalecimento da Escola (FUNDESCOLA), cuja origem remonta ao Programa de Apoio aos Secretários Municipais de Educação (PRASEM), concebido no escopo do Projeto Nordeste, em 1998. Trata-se de iniciativa do Ministério da Educação (MEC), em parceria com a União Nacional dos Dirigentes Municipais (UNDIME), direcionada para a formação de gestores municipais das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, com financiamento proveniente do Banco Mundial (BIRD). Tem objetivo de fortalecer e apoiar dirigentes municipais de educação na gestão dos sistemas de ensino e das políticas educacionais, bem como contribuir para o avanço em relação às metas do Plano Nacional de Educação (PNE). Sua missão é promover, em regime de parceria e responsabilidade social, a eficácia, eficiência e equidade no ensino fundamental público nessas regiões, por meio da oferta de serviços, produtos e assistência técnico-financeira inovadores e de qualidade, que focalizam o ensino-aprendizagem e as práticas gerenciais das escolas e secretarias de educação. O PROGESTÃO foi concebido por iniciativa do Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED). Lançado em 2001, até 2006 já havia capacitado mais de 120 mil gestores escolares em 25 estados brasileiros na modalidade de educação a distância. O curso foi organizado em 9 (nove) módulos, elaborados na perspectiva metodológica de solução de problemas. Os temas focalizados pelo curso são: Função Social da Escola, Gestão e Democracia Participativa na Escola, Convivência Democrática: Escola e Comunidade, Projeto Político Pedagógico, Gestão do Processo de Ensino-Aprendizagem, Gestão Democrática e Avaliação Institucional, Gestão Democrática e Gerenciamento dos Recursos Humanos, Gestão Democrática e Gerenciamento Financeiro, Gestão Democrática e Gerenciamento Patrimonial O ESCOLA DE GESTORES é desenvolvido sob os auspícios do governo federal, na modalidade de educação a distância teve início em 2005, com experiência piloto em 10 (dez) estados brasileiros. No ano seguinte foi ampliado, atingindo um contingente maior de usuários. Trata-se de um programa de formação continuada e em serviço, organizado na modalidade a distância, para gestores escolares que se encontram em exercício nas escolas públicas estaduais e municipais do país. Sua preocupação básica é melhorar a formação desses profissionais e, conseqüentemente, a gestão das unidades escolares onde os mesmos atuam e a aprendizagem dos alunos. Foi criado para resgatar o papel efetivo da escola, fazendo da gestão escolar um instrumento de apoio à atuação dos professores em sala de aula e de articulação entre escola e comunidade e contribuindo para a melhoria do padrão de qualidade, eficiência e equidade do ensino público. O projeto compete ao MEC, ao INEP e ao FNDE e envolve as seguintes secretarias: Secretaria de Educação Básica, Secretaria de Educação a Distância e Secretaria de Educação Especial. Os programas de formação continuada de professores, via de regra, são formulados pelas secretarias de educação, tanto na esfera estadual como municipal, visando promover a melhoria da qualidade do ensino. O governo federal também tem desenvolvido iniciativas neste campo, a exemplo do Programa de Formação de Professores em Exercício (PROFORMAÇÃO) e de outras ações mais recentes. O PROFORMAÇÃO foi concebido no âmbito do FUNDESCOLA, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso (1997). É “voltado para a habilitação de professores sem a titulação mínima legalmente exigida” e desde sua origem já formou mais de 30 mil professores de ensino fundamental nos estados do Norte e Nordeste. Com o governo Lula vieram outras iniciativas, dentre elas: o Programa de Formação Continuada de Professores das Séries Iniciais do Ensino Fundamental (Pró-Letramento), o Programa de Formação Inicial para Professores em exercício no Ensino Fundamental e no Ensino Médio (Pró-Licenciatura) e o Programa de Formação Inicial para Professores em Exercício na Educação Infantil (Proinfantil). Os referidos programas têm em comum o objetivo de suprir deficiências na formação dos profissionais das referidas etapas da Educação Básica. Independentemente do viés neo-liberal, denunciado por muitos especialistas da área, os sistemas de avaliação internacionais, nacionais e locais representam uma realidade irrefutável. Por isso mesmo, é oportuno não apenas conhecê-los, como deles extrair lições. Uma discussão oportuna sobre o tema diz respeito às constatações desses estudos sobre países que têm obtido sucesso em avaliações internacionais,. Um dos fatores apontados como requisito para uma educação de qualidade para todos no século XXI, diz respeito à “convicção, a estima e a auto-estima” dos professores no exercício de suas atividades docentes (BRASLAVSKY: 2004, p. 25). Os países bem sucedidos em promover a educação de qualidade para todos “valorizam enormemente a educação de seus povos e sua capacidade de aprendizagem, porém valorizam ainda mais seus professores e professoras. E sua estima é crucial pra que esses professores e professoras possam resolver os problemas que enfrentam nos contextos de imprevisibilidade e adversidade característicos do início do século XXI. Não menos importante é o papel desempenhado por gestores. Assim, outro fator indispensável a uma agenda de qualidade é a “capacidade de condução de diretores e inspetores” (Idem, p. 27). Com efeito, “em praticamente todas as pesquisas educacionais sobre a qualidade da educação, constata-se que as características do exercício do papel da direção, e mais especificamente dos diretores e diretoras de escolas, apresentam uma correlação importante com a possibilidade de conduzir instituições adequadas para promover a aprendizagem de qualidade”. Debruçando-se sobre 25 sistemas escolares internacionais, neles incluindo os dez de melhor desempenho, o estudo How the world’s best-performing school systems come out on top, publicado em setembro de 2007, constata que os casos de alta performance têm três características em comum: 1. selecionam as pessoas certas para se tornarem professores; 2. têm êxito na formação de professores eficazes; e, 3. asseguram que o sistema é capaz de oferecer o melhor ensino possível a todas as crianças (Mc Kinsey & Company: 2007, p. 5. Tradução da autora). No Brasil, em que medida podemos afirmar que temos sido capazes de selecionar as pessoas certas para seremprofessore(a)s, torná-lo(a)s docentes eficazes e promovermos o melhor ensino possível para todas as crianças? A honestidade sugere uma resposta negativa às três questões. Nesse sentido, uma pergunta adicional caberia: diante de tais circunstâncias temos chance de reverter tal situação? O caminho trilhado por países que lograram êxito na promoção da escola de qualidade para todos pode ser replicado? A qualidade da docência é determinada não só pela ‘qualidade’ dos professores – embora esta seja claramente fundamental – , mas também pelo ambiente em que esses profissionais atuam. Professores eficazes talvez não atinjam seu potencial em contextos que não ofereçam apoio adequado ou desafios, assim como recompensas suficientes. A literatura internacional e nacional tem mostrado que estamos longe de atingir patamares de desenvolvimento de outros sistemas, até mesmo da América Latina. Recursos incalculáveis têm sido investidos em esforços no sentido de ampliar a oferta de educação e promover a melhoria de sua qualidade. A formação de professores e gestores tem respondido por parcela considerável desses investimentos. Os indicadores sobre qualificação docente nos últimos dez anos revelam expressivo aumento dos níveis de formação do professorado em todo o país. Entretanto, a julgar pelos números, mais formação não tem se traduzido em mais aprendizagem. Isto significa dizer que, na prática, continuamos “reiventando a roda”: as políticas de formação desenvolvidas no período não têm tido êxito em equacionar os problemas de aprendizagem de nossas crianças e jovens. Mesmo investindo um percentual do PIB similar a de países bem sucedidos em educação, o Brasil tem se apresentado resultados que evidenciam o fracasso de suas políticas (VIEIRA; VIDAL, 2007). Assim, é hora de aprender com outras realidades e de incorporar novas alternativas para equacionar velhos problemas. Os exemplos de sistemas eficazes apontam caminhos a considerar. Precisamos de um novo pacto pela educação, como fizeram os pioneiros há 65 anos atrás. Este é um pacto que ultrapassa o compromisso de educadores, ou do governo federal e algumas organizações da sociedade civil. O pacto de que carecemos é um pacto de toda a sociedade. Para que isto ocorra, as políticas e práticas de gestão escolar não podem se ignorar mutuamente, ou passar ao largo da formação de professores. Todo esforço deve convergir para um só alvo: a aprendizagem. Texto 3 - Profissão docente e gestão democrática da educação As reformas educacionais que se iniciaram na década passada no Brasil trouxeram nova regulação das políticas educacionais. Muitos são os fatores que evidenciam isso, dentre eles, destaca-se a centralidade atribuída à administração escolar nos programas de reforma, situando a escola como núcleo do planejamento e da gestão; o financiamento per capita, com a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério – FUNDEF, por meio da Lei n° 9424/96; a regularidade e ampliação dos exames nacionais de avaliação, bem como a avaliação institucional e os mecanismos de gestão escolares que pressupõem a participação da comunidade. Essa nova regulação repercute diretamente na composição, estrutura e gestão das redes públicas de ensino. Trazem medidas que alteram a configuração das redes nos seus aspectos físicos e organizacionais forjando adequações segundo os critérios de produtividade, eficácia, excelência e eficiência, presentes nos programas de reforma. Tais reformas são marcadas pela padronização de processos administrativos e pedagógicos os quais possibilitam baixar custos e redefinir gastos, sem, contudo, abrir mão do controle central das políticas. A flexibilidade presente nesse modelo é colocada em prática mediante a descentralização administrativa que representa a transferência de obrigações dos órgãos centrais às escolas e à municipalização do ensino fundamental. A descentralização financeira que permite à escola maior flexibilidade na gestão e captação de recursos externos e a descentralização pedagógica - elaboração coletiva do Projeto Pedagógico pelo estabelecimento de ensino - são dimensões insdispensáveis desse modelo. A expansão da educação básica realizada dessa forma tem sobrecarregado em grande medida os trabalhadores docentes. Essas reformas têm resultado em reestruturação do trabalho pedagógico proveniente da combinação de diferentes fatores que se fazem presentes na gestão e organização do trabalho escolar, tendo como corolário, maior responsabilização dos professores e maior envolvimento da comunidade. Os professores são, em geral, considerados os principais responsáveis pelo desempenho dos alunos, da escola e do sistema no contexto atual de reformas educacionais e de uma nova regulação educativa. Diante das variadas funções que a escola pública assume, os professores encontram-se muitas vezes diante da necessidade de responder às exigências que estão para além de sua formação. Em numerosos municípios brasileiros em que inexistem postos de saúde, parques de lazer, centros de cultura, entre outros espaços públicos, a escola acaba sendo o único espaço em que os problemas de saúde são minimamente tratados (ou apenas conhecidos) e possibilidade de acesso cultural dos alunos e de toda comunidade. Nessas escolas, os professores se vêem obrigados a desempenhar funções que estão para além de suas capacidades técnicas e humanas. Não encontrando no ambiente escolar, na maioria das escolas públicas brasileiras e, em certa medida latino-americanas, profissionais capacitados a responder a essas exigências, os professores são constrangidos, a buscar respostas para tais demandas. Agora o trabalho docente deve contemplar as atividades em sala de aula, as reuniões pedagógicas, a participação na gestão da escola, o planejamento pedagógico, entre outras atividades. Este quadro de nova regulação educativa no contexto latino-americano tem resultado em significativa intensificação do trabalho; precarização das relações de emprego, mudanças consideráveis nas relações de trabalho que repercutem sobre a identidade e condição docente Os trabalhadores docentes, em muitos países latinoamericanos, estão sujeitos à ampliação da jornada individual de trabalho em razão de assumir mais de um emprego. Um mesmo professor leciona em dois ou até três estabelecimentos distintos, em geral por necessidade de complementação de renda, tendo em vista que os salários do magistério, na América Latina, são baixos comparativamente a outras funções exigentes de formação profissional similar. Por assumir um número considerável de aulas, esses professores acabam por não conhecerem bem a maioria de seus alunos e não encontram tempo para atividades que julgam importantes para o bom desempenho profissional como: preparar aulas, estudar, atualizar-se. (Noronha, 2003). Segundo pesquisa realizada pela CNTE (2003), os professores gastam em média 22 horas mensais em casa com traba lhos de preparação de aulas. Uma outra forma de intensificação do trabalho docente é aquela decorrente também da extensão da jornada de trabalho, porém dentro do próprio estabelecimento escolar em que atua. Trata-se de um aumento das horas e carga de trabalho sem qualquer remuneração adicional. . Tudo isso em um contexto em que, por força da própria legislação e dos programas de reforma, os trabalhadores docentes se vêem forçados a dominarem novas práticas e novos saberes no exercício de suas funções e o domínio de certas competências. A pedagogia de projetos, a transversalidade dos currículos, as avaliações formativas, enfim, são muitas as novas exigências que esses profissionais se vêem forçados a responder. Sendo apresentadas como novidade ou inovação, taisexigências são tomadas pelos docentes muitas vezes como naturais e indispensáveis. Uma das principais mazelas da flexibilidade contida nos processos de reformas tem sido a precarização do trabalho. No caso do magistério, essa precarização aparece sob a forma de contratos temporários de trabalho que não asseguram aos contratados os mesmos direitos e garantias dos trabalhadores efetivos. O aumento dos contratos temporários nas redes públicas de ensino, chegando, em alguns casos, a número correspondente ao de trabalhadores efetivos; o arrocho salarial; ausência de piso salarial; inadequação ou mesmo ausência, em alguns casos, de planos de cargos e salários; a perda de garantias trabalhistas e previdenciárias oriunda dos processos de reforma do Estado têm tornado cada vez mais agudo o quadro de instabilidade e precariedade do emprego no magistério público. O trabalho docente tem se reestruturado, dando lugar a uma nova organização escolar. Contudo, tais transformações, não vieram acompanhadas das adequações necessárias, por exemplo, os professores continuam sendo contratados e remunerados por horas/aula, quando na atualidade se exige deles que participem de atividades para além da sala de aula. Texto 4 - GESTÃO ESCOLAR E DEMOCRATIZAÇÃO DA ESCOLA: DESAFIOS E POSSIBILIDADES DE UMA CONSTRUÇÃO COLETIVA Discussões acerca das políticas educacionais estão cada vez mais presentes no atual momento brasileiro. Este crescimento contínuo iniciou-se principalmente a partir da redemocratização do Brasil, tendo como marco principal a promulgação da Constituição Federal de 1988 e sendo alimentada pelas políticas dos presidentes eleitos até então. A qualidade da educação, por exemplo, é uma das reivindicações que fomentarão diversos programas dos governos que se sucederam. Esta questão, será repetida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº 9.394/96, que “pontua 10 vezes o termo ‘qualidade’, seja como padrão de qualidade, padrão mínimo de qualidade, avaliação de qualidade, melhoria da qualidade, aprimoramento da qualidade e ensino de qualidade”. Paro (2007, p. 43) pontua que a educação de qualidade oferecida nas escolas públicas deve referir-se “à formação da personalidade do educando em sua integridade, não apenas à aquisição de conhecimentos em seu sentido tradicional”. Neste sentido, é necessário que o Estado fomente ações e tenha estratégias para que o ensino desenvolvido nas escolas possa efetivamente ser coerentes e significativos aos educandos. Outra questão que será discutida é a gestão democrática na escola pública, que entra nos textos legais como princípio e algo que é levado em questão nos programas e textos legais. Abreu (2002) salienta que desde o início da década de 1980 o Brasil vem se modificando em relação a consolidação de um Estado Democrático de Direito, que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Neste contexto, houve ampla discussão acerca de temas ligados à descentralização; federalismo e sistemas de ensino. É importante salientar que o debate em relação à descentralização não fica restrito ao Brasil. Arretche (2002, p. 26) traz que “também em países com democracias estáveis, a descentralização aparecia como uma alternativa às estruturas decisórias centralizadoras e instituídas durante a construção dos Estados de Bem-Estar Social, de inspiração keynesiana.” Oliveira (2010) aponta que a descentralização posta tem como eixo principal a flexibilização e a desregulamentação da gestão pública que marcam o discurso também na gestão das redes de ensino em todo o Brasil. Entretanto, a autora adverte que as reformas educacionais dos anos 90 trarão, então, a marca da descentralização que resultou em maior autonomia das escolas, porém teve como contrapartida uma sobrecarga de trabalho administrativo sem a real correspondência em termos de condições de infraestrutura nos estabelecimentos de ensino. Sob o argumento da necessidade de conferir maior autonomia às unidades escolares, os órgãos centrais do sistema acabaram por delegar às escolas muitas das suas rotinas administrativas. Haddad (2008, p. 10) mostra que a primeira metade da década de 1970 é quando o Banco Mundial inicia a cooperação técnica e financeira com o Brasil. A partir de então, notamos diversas dinâmicas a partir dos empréstimos e de sua influência política. O autor destaca ainda que “em 1996, já se discutia o papel estratégico do Banco Mundial ao influenciar as políticas educacionais naquele momento conjuntural em que as políticas neoliberais no Brasil ganhavam fôlego”. As avaliações externas inserem mudanças na forma como os gestores escolares conduzem o cotidiano da escola, de maneira que estes precisam atender as demandas e metas trazidas por tais avaliações. As avaliações são aplicadas pelo governo e os gestores devem encontrar meios, juntamente com os demais atores do cotidiano escolar, para alcançarem melhores resultados. Além disso, existe a demanda de divulgação dos indicadores educacionais como, por exemplo, o IDEB, o qual tem seu índice exposto em muitas portas das escolas públicas brasileiras. A Carta Magna prescreve a gestão democrática do ensino público, ratificada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96, na qual “os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades”. As normas têm como princípios dois elementos: “I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola” e “II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes” (BRASIL, 1996). No discurso sobre democracia que adentram as escolas brasileiras são muitos os elementos que possibilitam a perspectiva democrática, como é o caso da escolha de diretores, em destaque na Conferência Nacional de Educação, no ano de 2010, na qual cita como mecanismo democrático “[...] inclusive eleição direta de diretores e reitores, por exemplo –, para todas as instituições educativas e para os sistemas de ensino; e, ainda, implantar formas colegiadas de gestão da escola, mediante lei específica”. Haddad (2008) pontua que, no Brasil, as reformas ocorridas na década de 1990 são focalizadas não só a partir dos gastos sociais, mas também pela descentralização e pela privatização. O autor salienta que, no caso brasileiro, intensificou-se os serviços educacionais possibilitando a criação de um mercado de consumo, em especial relativo à Educação Superior. Completa informando que “apoiava-se ainda em sistemas de avaliação centralizados, assim como em propostas curriculares nacionais que deveriam orientar a atuação de todo o sistema”. A partir das políticas de avaliação e instituição de um currículo básico, o governo central apostava que a lógica do jogo do mercado poderia fazer com que a população buscasse as escolas mais bem avaliadas para seus filhos, pressionando todo o sistema para melhoria da qualidade, hipótese esta não confirmada. A disputa entre as escolas com melhores rendimentos em provas externas, como o Sistema de Avaliação da Educação Básica que inclui a Avaliação Nacional da Educação Básica (ANEB) e a Avaliação Nacional de Rendimento Escolar (Anresc), notoriamente conhecida no território brasileiro como Prova Brasil é objeto de discussões entre os diretores e a comunidade escolar, que objetivam a qualidade educacional para além de números e dados que fazem parte do ranking entre as escolas. Sobre a indicação do diretor escolar para o cargo, o Observatório do Plano Nacional de Educação mostra em um gráfico que mais de 70% dos municípios brasileiros ainda têm a indicação como forma de seleção dos diretores. A Lei nº 13.005/2014 traz estratégias que vão além da questãoda consulta pública, consta a participação cidadã em grêmios estudantis, fóruns permanentes de educação, em conselhos, como o conselho municipal de educação, conselhos escolares, Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB (CACS), Conselho de Alimentação Escolar (CAE), que visam a decisão coletiva e o acompanhamento das verbas públicas. São ações que visam a democratização das escolas, não deixando exclusivamente nas mãos de secretários de educação e de gestores escolares. Paro (2015, p. 38) destaca que a nomenclatura “diretor escolar” ecoa o peso da palavra, principalmente, “quando se trata de denominar oficialmente, por meio de leis, estatutos e regimentos, aquele que ocupa o cargo mais elevado no interior de uma unidade de ensino”. O autor salienta ainda que a mudança desse nome vai ao encontro com a luta por uma direção democrática, mesmo que sendo considerada como coisa utópica (PARO, 2016). Nesse sentido, encontramos a gestão colegiada como importante instrumento da democracia na escola previsto na LDBEN nº 9394/96, como é o caso dos conselhos escolares, com participação, por meio de representação de pais/responsáveis, alunos, funcionários, professores e a comunidade local, para “decidir sobre os aspectos administrativos, financeiros e pedagógicos. Assim, esse colegiado torna-se não só um canal de participação, mas também um instrumento de gestão da própria escola”. A gestão escolar passa por uma mudança significativa no novo milênio, deixando o diretor de ser o único administrador da escola que obedece às ordens emanadas dos superiores. Destacamos que “não se trata de simples mudança terminológica e sim de uma fundamental alteração de atitude e orientação conceitual Portanto, sua prática é promotora de transformações de relações de poder, de práticas e da organização escolar em si” (LÜCK, 2000, p.15). O projeto político-pedagógico (PPP) é um documento no qual podemos observar o trabalho integrado entre o Coordenador Pedagógico, o Orientador Educacional e o Gestor Escolar, em uma atuação conjunta com professores, alunos, funcionários, pais e comunidade escolar. Embora, historicamente esses profissionais desempenhem funções específicas, mas necessariamente integradas em prol da qualidade educacional, é importante ressaltar que a ação integrada desses diferentes atores na “linha de frente” da unidade escolar em busca da democratização e de maior qualidade da escola propiciam uma maior participação de todos os atores envolvidos. O trabalho integrado da direção, coordenadores pedagógicos, orientadores educacionais e supervisores é de fundamental importância para o sucesso educacional dos educandos. Nessa perspectiva, há necessidade de a equipe técnico-administrativa desenvolverem as suas atividades de forma integrada e também integradora, com ações relacionadas ao apoio ao professor com foco no processo educativo (LÜCK, 2011). No atual cenário educacional urge a necessidade de se pensar uma gestão democrática e participativa, na qual professores, pais, alunos, equipe gestora, funcionários e comunidade local compartilham das decisões dentro da escola na perspectiva da participação, autonomia e descentralização das atividades e decisões escolares. Assim, a função do diretor que ecoa o peso da responsabilidade na nomenclatura que lhe foi auferida durante décadas, precisa ser ponderada, quando na atualidade traz no seu bojo a figura do gestor, que não mais direciona sozinho, mas que gerencia a escola coletivamente, com a participação da comunidade escolar e local em conselhos escolares. O Projeto Político-Pedagógico construído coletivamente, que situa a escola, reflete sobre a história, a filosofia e referências dentro do contexto escolar, além traçar uma diretriz e diagnosticar a realidade que precisa ser pautada com ações que envolvem todos os atores da escola. A discussão por uma escola laica, de qualidade e democrática vai além de ordenamentos legais que abordam a educação, pois trata-se de um processo histórico de lutas e reivindicações dos profissionais da educação e de todos aqueles que são atores da escola pública. Resumo AP2 – Gestão 2 Texto 5 – A Gestão Democrática em Espaços não Formais de Ensino O texto em questão aborda a análise da gestão democrática presente em espaços não formais de ensino, especificamente nas ações educativas oferecidas pela Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) e pelo Instituto Ayrton Senna. O estudo se baseia em reflexões teóricas que enfatizam a dimensão política desses espaços, sem desconsiderar o papel do Estado na educação pública. A pesquisa foi conduzida por meio de abordagem qualitativa, utilizando análise documental e entrevistas com coordenadores pedagógicos das organizações mencionadas. Os resultados indicaram diferenças significativas na compreensão da gestão educacional nas ONGs estudadas. O texto contextualiza a importância da gestão democrática na educação brasileira desde a Constituição de 1988, destacando a transição da administração escolar para a gestão democrática como um processo em constante construção. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) de 1996 reforça esse princípio, incentivando a participação da comunidade na elaboração do projeto político-pedagógico das escolas. Na parte conceitual, o texto explora a educação não formal, destacando seu papel na emancipação dos sujeitos e sua complementaridade em relação à educação formal. Refere-se também ao surgimento das ONGs como importantes atores na oferta de educação no contexto brasileiro, especialmente após as transformações políticas e econômicas da década de 1990. A gestão democrática é analisada sob diferentes perspectivas teóricas, evidenciando a importância da formação de gestores com visão holística e empreendedora. A gestão democrática é entendida como um processo de aprendizado e luta política, não limitado à prática educativa, mas que visa repensar as estruturas autoritárias de poder. No contexto das organizações estudadas, o objetivo principal é identificar se as práticas pedagógicas adotadas contribuem para uma abordagem abrangente da formação do indivíduo, levando em consideração sua dimensão humana, social e singular. A Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) foi fundada em 1961 por indivíduos associados a organizações como Catholic Relief Services (CRS) do Brasil e Caritas Brasileira, embora buscasse independência das igrejas. Surgiu da percepção de que recursos destinados a entidades de base eram desperdiçados devido à falta de assessoria técnica e administrativa. Seu objetivo é contribuir para uma sociedade democrática, com desenvolvimento sustentável, inclusão social, justiça, e sustentabilidade ambiental, além da universalização dos direitos. Recebe financiamento de agências internacionais, empresas e doações individuais, atendendo organizações populares, movimentos sociais, trabalhadores rurais e mulheres. Nos anos 80, a FASE investiu na formação de lideranças para participação em esferas públicas, enfocando não apenas conselhos, mas também audiências públicas. Atualmente, sua atuação é local, nacional e internacional, priorizando três linhas de ação no Rio de Janeiro: identidade e cultura nas cidades, exigibilidade pelo direito à cidade e democratização da gestão das cidades. O Curso de Capacitação de Agentes Sociais e Conselheiros Municipais, oferecido desde 2001, visa formar indivíduos capacitados para atuar em políticas públicas, buscando fortalecer a participação social e a gestão democrática. A FASE enfatiza que sua atuação não visa substituir o Estado, mas complementar suas ações. O Instituto Ayrton Senna (IAS), fundado em 1994, visa promover o desenvolvimentohumano de crianças e jovens de classes menos favorecidas. Seus programas educacionais são realizados em parceria com empresas, governos, escolas, universidades e ONGs, beneficiando milhões de crianças em todo o Brasil. O IAS oferece capacitação aos profissionais envolvidos em seus projetos e prioriza a gestão eficaz do processo de ensino e aprendizagem. O Programa Gestão Nota 10, voltado para gestores educacionais, busca fortalecer a competência técnica das lideranças escolares e melhorar a qualidade da educação, estabelecendo metas e indicadores de desempenho. Apesar de sua ampla adoção como política pública, há críticas quanto à sua abordagem, que prioriza aspectos quantitativos em detrimento da gestão democrática e pedagógica. Em síntese, tanto a FASE quanto o IAS representam iniciativas importantes no campo da educação não formal, visando contribuir para uma sociedade mais justa e igualitária, embora enfrentem desafios e críticas em relação à sua atuação e abordagens. Texto 6 – Limites e Possibilidades da Atuação do Pedagogo em Espaços Não Formais de Ensino: Algumas Questões Para o Debate O texto aborda a atuação do pedagogo em ambientes não escolares à luz das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia, bem como explora o debate sobre a interpenetração dos espaços educativos, especialmente diante do crescimento dos espaços não formais de ensino na sociedade contemporânea. Além disso, discute o Projeto de Lei 5346/2009, que visa regulamentar a profissão do Educador Social, e investiga a preparação do profissional de pedagogia para lidar com a complexidade dos espaços não formais de ensino. O texto inicia situando o leitor no contexto das pesquisas sobre o Terceiro Setor e sua relação com a política educacional brasileira, especialmente no Rio de Janeiro. Destaca estudos anteriores sobre parcerias entre o Terceiro Setor e a esfera pública, além das contribuições das ONGs na educação profissional e no desenvolvimento de competências dos participantes. Aponta a necessidade de avaliar as ações das organizações não governamentais e amplia o escopo das investigações para compreender a atuação do Terceiro Setor na educação. O texto contextualiza a expansão do Terceiro Setor na educação durante os anos 90, em resposta à minimização do papel do Estado na área social. Destaca que, embora algumas ONGs defendam parcerias com o Estado para suprir suas ausências, outras se apresentam como espaços democráticos de participação política, buscando transformar a realidade. Explora-se a interação entre espaços formais e não formais de ensino, destacando diferentes perspectivas de diversos autores. Enquanto alguns veem as parcerias entre o Estado e as organizações sociais como positivas para promover o acesso à educação e a equidade social, outros as criticam por enfraquecerem o papel do Estado e despolitizarem a atuação do Terceiro Setor. O texto analisa as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia, evidenciando uma abordagem restrita da educação, com uma expressiva valorização dos espaços formais de ensino. Destaca-se a necessidade de debater a educação não formal, ausente nas diretrizes, e enfatiza-se a importância de preparar o pedagogo para atuar em espaços não formais, visando à formação integral do ser humano e contribuindo para uma sociedade mais democrática e participativa. O texto aborda os limites e as possibilidades da atuação do pedagogo em espaços não formais de ensino, especialmente focando na Pedagogia Social e na regulamentação da profissão do Educador Social. Inicia-se com uma contextualização da ausência de regulamentação do pedagogo social no Catálogo Brasileiro de Ocupações (CBO) e destaca a falta de exigência de formação específica para ocupações como Educador Social, o que levanta questões sobre a valorização desses profissionais. Em seguida, discute-se o debate sobre a regulamentação da profissão do Educador Social, destacando um projeto de lei que propõe essa regulamentação e a responsabilidade do Ministério da Educação (MEC) nesse processo. O projeto define um amplo espectro de atuação para o Educador Social, mas não menciona requisitos de escolaridade específicos, levantando preocupações sobre a possível desvalorização da formação profissional nesse campo. O texto então apresenta uma análise da atuação do pedagogo em ONGs no Rio de Janeiro, destacando a pesquisa realizada por Pedroza (2013). Essa análise revela que os pedagogos muitas vezes carecem de formação específica para lidar com as demandas complexas dos espaços não formais de ensino, especialmente no Terceiro Setor. Destaca-se a falta de suporte dos cursos de pedagogia para essa finalidade e a necessidade de atualização do currículo para abranger essas questões. Os depoimentos de pedagogos e coordenadores de projetos em ONGs evidenciam a discrepância entre a formação acadêmica e as demandas práticas desses espaços, ressaltando a importância de uma formação mais voltada para a realidade dos espaços não formais de ensino. Além disso, são apontadas dificuldades enfrentadas na elaboração e execução de projetos educacionais, como a falta de recursos financeiros e de uma equipe preparada. Finalmente, nas considerações finais, o texto reforça a importância do debate sobre a formação do pedagogo para atuação em espaços não formais de ensino, destacando a necessidade de uma abordagem mais ampla e integrada que contemple as especificidades desses contextos. Conclui-se ressaltando as possibilidades e os desafios da atuação do pedagogo nesses espaços, enfatizando a importância da formação acadêmica adequada para garantir uma prática profissional eficaz e ética.