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MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO I Débora Bretas Silva Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Identificar os tipos de agregados e aditivos utilizados no concreto. � Descrever a importância do traço, da dosagem e da água para o amassamento no preparo do concreto. � Reconhecer os ensaios tecnológicos utilizados no controle de qua- lidade do concreto. Introdução Os materiais utilizados na fabricação do concreto, assim como suas propor- ções dentro da mistura, influenciam diretamente a qualidade do produto final, o que, por sua vez, afetará a durabilidade do elemento construído. Para definir adequadamente tal proporcionalidade dos materiais, o engenheiro deve, antes de tudo, conhecer a procedência e as proprie- dades dos materiais que está utilizando, para, então, avaliar a necessidade de realizar intervenções, como adicionar aditivos químicos. Neste capítulo, você conhecerá as propriedades de cada um dos principais materiais utilizados na fabricação do concreto e a influência das quantidades em que são empregados nas características do produto final. Além disso, você identificará os ensaios mais comumente realizados para garantir o controle de qualidade. 1 Agregados e aditivos para fabricação do concreto Nos concretos convencionais utilizados nas estruturas, compostos por cimento Portland, água, agregado graúdo e miúdo, contendo ou não aditivos químicos, a pasta (combinação entre cimento e água) é a responsável pelo endurecimento, pelo preenchimento dos vazios existentes entre os agregados e, consequente- mente, pela formação de um elemento sólido; já os agregados são geralmente inertes, ou seja, não influenciam na pega e no endurecimento do cimento. Conforme Neville (2015), pelo fato de comporem aproximadamente 75% do concreto, os agregados têm grande relevância para esse material, tanto do ponto de vista econômico, pelo custo reduzido em relação à pasta, quanto tecnológico, devendo, portanto, ser escolhido de maneira bastante cautelosa. Os aditivos são materiais acrescidos ao concreto durante a etapa de mistura a fim de obter melhores propriedades, como plasticidade, controle do tempo de pega, aumento da resistência, redução do calor de hidratação, etc. Na sequência, avaliaremos mais detalhadamente esses dois elementos, agregados e aditivos, além de seus tipos, características e influências no produto final, o concreto. Agregados Os agregados utilizados na construção civil, em obras de infraestrutura, pavimentação, construção de edificações, saneamento ou outras, consistem em porções de rochas (pedras) fragmentadas em tamanhos apropriados e que apresentam propriedades adequadas para tais empregos. De acordo com Isaia (2010), podemos segmentar as propriedades dos agregados em três grupos distintos: o primeiro se refere às características influenciadas pela porosidade (massa específica aparente, absorção de água, resistência, módulo de elasticidade e sanidade); o segundo às características vinculadas à composição química e mineralógica (resistência, módulo de elasticidade, substâncias deletérias presentes e cargas elétricas); e, por fim, o terceiro grupo corresponde às qualidades ligadas à fabricação e à exposição (tamanho, forma e textura). A amplitude dimensional desses materiais é bastante abrangente, desde blocos grandes com dezenas de centímetros até grãos de apenas alguns mi- límetros. Segundo Neville (2015), aqueles inferiores a 4 mm são comumente denominados agregados miúdos e aqueles com dimensão mínima de 5 mm, graúdos. Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto2 Ainda de acordo com Neville (2015), apesar de a dimensão máxima dos agregados presentes nas misturas de concreto ser bastante variável, em to- das elas se empregam agregados de diversos tamanhos, e a distribuição das dimensões desses materiais leva o nome de distribuição granulométrica. Em situações nas quais há todas as faixas granulométricas, a curva é dita contínua bem graduada; quando existem descontinuidades nessas faixas (i.e., determi- nadas dimensões estão ausentes), denomina-se descontínua; e, quando todos os agregados têm aproximadamente a mesma dimensão, é chamada de uniforme. Nesse sentido, a ABNT NBR 7211:2009 apresenta dois limites da distribui- ção granulométrica para o agregado miúdo (superior e inferior) e, para cada um destes, uma zona utilizável e uma ótima. A norma permite a utilização de agregados miúdos com distribuição granulométrica fora de tais limites, desde que sua aplicabilidade seja comprovada. O Quadro 1 apresenta os percentuais retidos acumulados para cada uma dessas zonas, bem como a abertura das peneiras utilizadas e o módulo de finura. Fonte: Adaptado de Associação Brasileira de Normas Técnicas (2019). Peneira com abertura de malha (ABNT NBR NM ISO 3310-1) Porcentagem, em massa, retida acumulada Limites inferiores Limites superiores Zona utilizável Zona ótima Zona ótima Zona utilizável 9,5 mm 0 0 0 0 6,3 mm 0 0 0 7 4,75 mm 0 0 5 10 2,36 mm 0 10 20 25 1,18 mm 5 20 30 50 600 µm 15 35 55 70 300 µm 50 65 85 95 150 µm 85 90 95 100 Nota 1. O módulo de finura da zona ótima varia de 2,20 a 2,90. Nota 2. O módulo de finura da zona utilizável inferior varia de 1,55 a 2,20. Nota 3. O módulo de finura da zona utilizável superior varia de 2,90 a 3,50. Quadro 1. Limites da distribuição granulométrica do agregado miúdo 3Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto O módulo de finura nada mais é que a somatória das porcentagens retidas acumulada em massa de determinado agregado, tendo como referências as peneiras que compõem a série normal, dividida por 100. Em relação à sua origem ou forma de obtenção, os agregados podem ser divididos em naturais, quando se apresentam na natureza já na forma de agregados (pedregulhos, cascalhos, seixos rolados, areias de rio e de cava), e artificiais, quando necessitam de processos para atingir as caraterísticas de agregado (p. ex., areias e pedras obtidas por processo de britagem de elementos maiores). De acordo com Isaia (2010), comercialmente, as britas (agregados graúdos) recebem a denominação de brita 0 (4,8 a 9,5 mm), brita 1 (9,5 a 19 mm), brita 2 (19 a 25 mm), brita 3 (25 a 50 mm), brita 4 (50 a 76 mm) e brita 5 (76 a 100 mm). A Figura 1 ilustra as mais empregadas na produção do concreto. Por sua vez, as areias (agregado miúdo) recebem denominações distintas conforme sua faixa granulométrica: aquelas com dimensão granulométricas entre 0,15 e 0,6 mm são chamadas de areais finas, entre 0,6 e 2,4 mm areais médias e entre 2,4 e 4,8 mm areias grossas. A forma/textura dos agregados, ou seja, os aspectos geométricos de suas partículas, também têm grande impacto nas propriedades finais do concreto, principalmente quanto à trabalhabilidade. Existem duas possibilidades de classificação quanto às pontas: angulosas ou arredondas; já quanto à forma propriamente dita, pode ser alongada, cúbica ou lamelar (Figura 2). Concretos produzidos a partir de partículas angulosas e lamelares apresen- tam um aspecto mais rugoso, o que dificulta o acabamento; as partículas mais arredondadas e cúbicas promovem uma maior facilidade de bombeamento; e as partículas lamelares podem originar pontos fracos no material por estarem orientados preferencialmente em uma única direção. Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto4 Figura 1. Agregados graúdos comerciais. (a) Brita 0 (pedrisco). (b) Brita 1. (c) Brita 2. Fonte: Adaptada de Bastos (2019). (a) (b) (c) 5Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto Figura 2. (a) Formas dos agregados. (b) Arredondamento. Fonte: Isaia (2010, p. 495). Cúbica Alongada Alongada- -lamelar Lamelar A B C 1,0 0,5 B/A C/B 0 0,5 1,0 0,10 0,20 0,30 0,40 0,60 Sub- angularSub- -redondaAngular Redonda (a) (b) Muito angular No que diz respeito aos agregados miúdos, outras duas grandezas também são muito importantes, o teor de umidade total e o coeficiente de inchamento. Conhecer o teor de umidade da areia é imprescindível para realizar uma dosagem adequada, pois seu desconhecimento pode acarretar o uso excessivo de água na mistura, comprometendo diversas propriedades do material. Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto6 Desse modo, a areia deve ser utilizada completamente seca ou o teor de água ser identificado e descontado do volume total de água utilizada. Outro aspecto importante a observar reside no fato de que, quando a areia está úmida, seu volume aumenta; logo, para confirmar que o volume recebido no canteiro de obras está correto, deve-se realizar o ensaio para determinar o coeficiente de inchamento, que consiste na relação entre o volume úmido e o volume seco da areia, para evitar prejuízos financeiros. Se houver de umidade, pode ocorrer uma reação química expansiva entre o cimento (álcalis) e alguns minerais reativos presentes em alguns tipos de agregados não inertes, que, em razão de suas fontes, denomina-se reação álcali-agregado. Esse tipo de reação pode levar ao surgimento de fissuras e deformações estruturais no concreto no estado endurecido. Aditivos Os aditivos consistem em produtos de origem química empregados na fa- bricação de concretos e argamassas visando a aprimorar determinadas pro- priedades, tanto no estado fresco (trabalhabilidade, viscosidade, retenção de água, aceleração ou retardamento do tempo de pega, etc.) quanto endurecido (resistência mecânica, resistência frente à ação do congelamento, fissuração térmica, ataque por sulfatos, reações álcali-agregado, corrosão, etc.). A efe- tividade da sua ação está vinculada a diversos aspectos, como teor utilizado, material cimentício empregado, temperatura do meio e dos materiais usados, energia de mistura, entre outros. Atualmente, existem no mercado diversos tipos de aditivos, cada um dos quais com uma finalidade específica e sendo alguns dos citados pela ABNT NBR 11768-1:2019: o redutor de água tipo 1 (RA1), tipo 1/acelerador (RA1-A) e tipo 1/retardador (RA1-R); o redutor de água tipo 2 (RA2), tipo2/retardador (RA2-R) e tipo 2/ acelerador (RA2-A); o controlador de hidratação (CH); o acelerador de pega (AP); o acelerador de resistência (AR), o incorporador de ar (IA); o modificador de viscosidade retentor de água (MV-RT); e o modificador de viscosidade antissegregante (MV-AS). 7Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto Com frequência, atribui-se aos aditivos redutores de água a denomina- ção de plastificantes ou superplastificantes, os quais apresentam as mesmas propriedades, embora os superplastificantes possibilitem o mesmo efeito com uma dosagem reduzida. Adicionalmente ao efeito principal, os aditivos podem apresentar efeitos ditos secundários, indicados em sua nomenclatura. Por exemplo, um aditivo redutor de água tipo 2/retardador apresenta tanto os resultados de um aditivo redutor de água — elevação do abatimento e da fluidez do concreto sem modificar a quantidade de água utilizada — quanto de um aditivo retardador, isto é, redução do tempo de pega. De acordo com Neville (2015), o principal motivo para utilizar os aditivos refere-se às vantagens físicas e econômicas que eles conferem ao concreto, mesmo que sejam muitas vezes considerados um material complementar na mistura. Um bom exemplo de redução de custos está ligado à mão de obra, visto que, em muitas situações, se pode descartar o adensamento. Contudo, é importante destacar que os aditivos não devem ser utilizados para compensar erros, de misturas incorretas ou mão de obra incorreta durante as etapas de transporte, lançamento e/ou adensamento. O Quadro 2 apresenta os principais tipos de aditivos e suas propriedades fundamentais. Fonte: Adaptado de Associação Brasileira de Normas Técnicas (2019). Aditivo Propriedade Plastificante Diminui o consumo de água e de cimento, além de proporcio- nar maior trabalhabilidade e fluidez para a mistura Superplas- tificante Semelhante aos plastificantes, mas reduz ainda mais o con- sumo de água Retardador Como o próprio termo sugere, retarda o período de pega do concreto, isto é, o seu endurecimento Acelerador Acelera o endurecimento do concreto (antecipa o tempo de pega) Modificador de viscosidade Modifica a viscosidade do concreto, possibilitando a produção de concretos mais fluidos e de fácil bombeamento Incorpora- dor de ar Incorpora microbolhas de ar ao concreto, as quais são estáveis e uniformemente distribuídas no material, o que proporciona uma redução na massa específica desse material Quadro 2. Principais tipos de aditivos Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto8 2 Influência do traço, da dosagem e da água para o amassamento Para compreendermos mais facilmente no que consiste a dosagem dos con- cretos, podemos fazer uma correlação com uma receita de bolo, na qual a proporção de cada ingrediente é fundamental para seu sucesso. Em nosso contexto, a proporção dos materiais utilizados para a produção do concreto leva o nome de traço e pode ser apontada tanto em massa quanto em volume. Existem diversos métodos de dosagem, sendo alguns dos mais conhecidos o método do ACI (American Concrete Institute), baseado nos trabalhos de Abrams (1918) e Powers (1968), e bastante utilizado nos Estados Unidos, o método do Dreux e o de Faury, empregados na França. No Brasil, não há um consenso quanto a melhor maneira de realizar tal dosagem, o que implica o uso de uma variedade de métodos desenvolvidos no país, como o da Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), do Instituto Tecnológico do Estado do Rio Grande do Sul (ITERS), do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e do Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade de São Paulo (CienTec). Independentemente do método utilizado, alguns requisitos fundamentais servem de parâmetro para a definição do traço mais adequado, como a resis- tência mecânica, a trabalhabilidade e a durabilidade almejadas, a forma de transporte (p. ex., se o concreto será bombeado) e os aspectos econômicos. Pelo fato de a dosagem ser utilizada para determinar o traço do concreto, com a dosagem correta, adequam-se as proporções ideais dos materiais para produzir um concreto com as características desejadas no estado fresco e no estado endurecido. Mesmo havendo diversos tipos de dosagens diferentes, o objetivo de todas é basicamente o mesmo, o de fornecer uma combinação adequada entre agregados graúdos, miúdos, aglomerantes, água e, eventual- mente, aditivos. Para realizar a dosagem, são necessários alguns dados de entrada, os quais, mesmo existindo diversos tipos de dosagem, são bastante semelhantes entre si. A resistência característica exigida para o concreto (fck), o fator água/ cimento, o consumo de cimento, o abatimento requerido, o desvio-padrão em função das condições de preparo do concreto, o cimento utilizado, a massa específica dos agregados, o módulo de finura da areia e o diâmetro máximo do agregado graúdo constituem alguns dos dados de entrada comumente utilizados em diversos métodos de dosagem. Um traço é definido por meio das seguintes etapas: 9Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto 1. dados de entrada; 2. método de dosagem; 3. traço. Considerando que cada componente influencia as características do con- creto, é necessário controlar uma série de fatores para conseguir produzir um bom concreto. O uso de agregados de granulometria contínua, por exem- plo, garante uma otimização do preenchimento dos vazios, dando origem a um material menos poroso e com maior capacidade de resistir a esforços. E o emprego de agregados com faixa granulométricacontínua também garante um concreto mais coeso, mais trabalhável e de melhor desempenho, o que leva à necessidade de realizar o estudo da faixa granulométrica. O formato dos agregados também tem grande interferência nas caracterís- ticas do concreto, e, ainda assim, diversos são os métodos de dosagem que não levam em consideração diferenças, por exemplo, entre agregados angulares e arredondados. Como os agregados arredondados apresentam menor atrito entre uma partícula e outra, pode-se dosar com maior facilidade um concreto trabalhável. No entanto, se utilizar para o mesmo traço para agregados angu- lares, a trabalhabilidade do concreto será reduzida. Imagine-se colocando um concreto pouco trabalhável, de baixo abatimento, em um balde, virando-o sobre uma mesa e, ao lado, colocando outro balde com concreto de alto abatimento: ao retirar os baldes que foram virados, você observará que o concreto com abatimento maior terá se espalhado, enquanto o pouco trabalhável ficará em um formato próximo ao do balde utilizado (Figura 3). Nesse sentido, qual seria o melhor concreto para realizar a concretagem de uma viga, de um pilar ou de uma laje, considerando somente essa caracterís- tica? Obviamente, o concreto que apresentou maior mobilidade, pois, assim, não se formarão vazios na estrutura — uma característica influenciada pelo formato do agregado. Figura 3. Influência do abatimento no concreto. Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto10 Ao utilizar agregado angular, é comum que os operários insiram uma maior quantidade de água para melhorar a trabalhabilidade do concreto, o que compreende um erro gravíssimo: o aumento do consumo de água para produção do concreto gera aumento do fator água/cimento, condição que reduz substancialmente a resistência do concreto e, por consequência, a segurança estrutural das edificações. Desse modo, qual seria a solução para utilizar agregados angulares, obter boa trabalhabilidade e garantir que a resistência requerida seja atingida? O uso de aditivos plastificantes constitui a melhor opção para essa situação, a partir do qual se pode aumentar o abatimento do concreto, sua trabalhabili- dade e sua mobilidade sem alterar o fator água/cimento. Outra opção consiste em aumentar o consumo de água e, proporcionalmente, aumentar o consumo de cimento, mantendo-se, dessa maneira, o fator água/cimento e sem reduzir a resistência. Contudo, o problema em utilizar a segunda solução é que onera o custo do metro cúbico, uma vez que o cimento é a matéria-prima de maior valor agregado que compõe o concreto. Existem diversos diagramas de dosagem que relacionam a relação água- -cimento com a resistência à compressão, sendo o ideal sempre realizar o próprio diagrama com os materiais que serão utilizados. A Figura 4 mostra um exemplo de diagrama para um cimento desconhecido. Figura 4. Diagrama de dosagem — relação a/c (eixo x) versus resistência à compressão em MPa (eixo y). Fonte: Isaia (2010, cap. 29) 46 44 42 40 38 36 34 32 30 28 26 24 22 20 18 16 14 12 10 0,4 0,42 0,44 0,46 0,48 0,5 0,52 0,54 0,56 0,58 0,6 1 dia 3 dias 7 dias 28 dias 11Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto Como pode ser observado, quanto maior a relação água/cimento, menor será a resistência à compressão. Em um fator a/c de 0,6, a resistência à compressão aos 28 dias será de aproximadamente 28 MPa, enquanto, para um fator a/c de 0,4, a resistência à compressão aos 28 dias será de aproximadamente 43 MPa, o que promove uma diferença de mais de 50% em relação aos 28 MPa. Da análise realizada a partir do diagrama de dosagem exemplificado, também é possível verificar que, se não for corrigida a umidade dos agregados no momento de realizar a mistura, a resistência terá uma redução significativa. Em uma mistura com 100 kg de areia com 7% de umidade, por exemplo, haverá 7 litros de água “extra” no agregado. Considerando que nessa mesma mistura estão previstos 50 kg de cimento Portland e 20 litros de água (fa- tor a/c de 0,4), a resistência esperada aos 28 dias, conforme o diagrama da Figura 5, será de 43 MPa. Se não for corrigida a umidade da areia, ou seja, em vez de adicionar 20 litros de água, forem adicionados 20 litros somados aos 7 litros presentes na areia, o fator água/cimento passará a ser de 0,54, o que, pelo diagrama analisado, provoca uma resistência à compressão de aproxi- madamente 33 MPa. Então, qual seria o procedimento correto? Após verificar que a areia tem 7 litros, o procedimento correto seria reduzir a água adicionada de 20 para 13 litros, mantendo, assim, o fator água-cimento. O estudo da dosagem depende inicialmente da metodologia que será uti- lizada e, depois, de um bom entendimento dos “dados de entrada”, que nada mais são que as características finais que se deseja do concreto, das matérias- -primas que serão utilizadas e do local em que o concreto será produzido. A partir da definição de todos os parâmetros exigidos pelo método de dosagem, define-se o traço, apresentado de diversas formas, como no exemplo dado a seguir. Traço unitário em massa 1,00 : a : b : a/c. onde: � 1,00 — massa de cimento; � a — quantidade de areia em relação à massa de cimento; � b — quantidade de brita em relação à massa de cimento; � a/c — relação água/cimento ou fator água/cimento. Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto12 A partir do traço unitário, determinar a quantidade de materiais é bastante simples: se foi definido um traço 1:2:3:0,4 e se deseja fazer uma mistura a partir de um saco de 50 kg de cimento, basta colocar 50 kg de cimento, 100 kg de areia, 150 kg de brita e 20 litros de água. Como nas obras é comum utilizar volumes no lugar de massa, basta converter os valores para volume a partir da massa unitária no estado solto. Nesse caso, deve-se instruir os operários a não compactar os agregados na padiola (recipiente utilizado na obra para manuseio dos agregados) para que a massa específica não se altere, modificando-se, assim, o volume correto que deveria ser utilizado na mistura. O consumo de cimento, dado de referência importante para as obras, representa quantos quilogramas de cimento são necessários para produzir um metro cúbico de concreto. 3 Controle tecnológico do concreto Os ensaios realizados em concreto têm como finalidades primordiais garantir o controle tecnológico, a fim de evitar futuras manifestações patológicas, e atender às especificações normativas. Independentemente de um concreto dosado em central ou fabricado no próprio canteiro da obra, ele está sujeito a oscilações em sua composição e erros por parte do operador, o que torna imprescindível realizar os ensaios para controle de qualidade a fim de garantir um nível mínimo de aceitabilidade. Podemos dividir o controle tecnológico em três etapas distintas: o controle da matéria-prima [conforme as recomendações da ABNT NBR 12655:2015; o controle de cimento Portland (preparo, controle, recebimento e aceitação); e o controle do concreto no estado fresco e no estado endurecido. Abatimento de tronco de cone (slump test) No estado fresco, o principal ensaio de controle tecnológico que deve ser realizado consiste no abatimento de tronco de cone (ou slump test, como também é conhecido), bastante simples e comumente feito para a aceitação do recebimento de concretos dosados em central quando este chega à obra. 13Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto O slump test indica a consistência do concreto, uma propriedade intrinsica- mente relacionada à sua trabalhabilidade, isto é, sua maior ou menor facilidade de aplicação. Para sua realização, preenche-se uma forma com formato de tronco de cone, como ilustra a Figura 5, utilizando três camadas, recebendo cada uma 25 golpes para seu adensamento. Ao final do preenchimento, a su- perfície da forma é rasada com o auxílio de uma espátula e, então, retira-seo molde gradual e lentamente com movimentos verticais. O valor do abatimento corresponderá à diferença, em milímetros, entre a altura da forma e a altura da amostra de concreto após seu assentamento. Figura 5. Ensaio de abatimento de tronco de cone (slump test). Fonte: Rossi (2019, documento on-line). Os limites aceitáveis variam conforme cada caso e devem ser estipulados pelo engenheiro responsável — os valores de 10 +/– 2 cm e 12 +/– 2 cm são resultados comuns para concretos tradicionais, isto é, a diferença entre a altura da forma e da amostra pode estar, no primeiro caso, entre 8 e 12 cm, e, no segundo, entre 10 e 14 mm. Em situações em que o resultado do Slump está abaixo do estipulado, recomenda-se adicionar água à mistura, e, caso esteja acima do estipulado, significa que o concreto requer um período mais longo de amassamento. Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto14 Conforme a consistência determinada no ensaio de abatimento, o concreto recebe uma classificação, como mostra o Quadro 3. Cada situação exigirá determinado abatimento, e, no caso de concretos muito fluidos, como os autoadensáveis, recomenda-se o ensaio de espalhamento (slump-flow test), que mede a habilidade desse material de fluir sem apresentar segregação e é realizado de maneira distinta da do teste de abatimento. Fonte: Adaptado de Associação Brasileira de Normas Técnicas (2015a). Classe Abatimento mm Aplicações típicas S10 10 ≤ A < 50 Concreto extrusado, vibro prensado ou centrifugado S50 50 ≤ A < 100 Alguns tipos de pavimentos e de elementos de fundações S100 100 ≤ A < 160 Elementos estruturais, com lançamento convencional do concreto S160 160 ≤ A < 220 Elementos estruturais com lançamento bombeado do concreto S220 ≥ 220 Elementos estruturais esbeltos ou com alta densidade de armaduras Nota 1. De comum acordo entre as partes, podem ser criadas classes especiais de consistência explicitando a respectiva faixa de variação do abatimento. Nota 2. Os exemplos deste quadro são ilustrativos e não abrangem todos os tipos de aplicações. Quadro 3. Classes de consistência 15Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto O ensaio de espalhamento avalia a habilidade do concreto autoadensável de fluir de maneira livre e sem apresentar segregação (separação dos materiais). Trata-se de um ensaio razoavelmente simples de executar, podendo sê-lo no próprio canteiro de obras utilizando um único operador para o equipamento. Tanto a base quanto o tronco de cone devem estar úmidos para que não absorvam a água da mistura. Diferentemente do ensaio de abatimento de tronco de cone, no de espalhamento não deve ser realizado nenhum tipo de adensamento além daquele relacionado ao próprio peso do concreto. O espalhamento corresponderá à média das medidas do diâmetro em duas direções distintas. Fonte: Tflowmeter.com (2019, documento on-line). Resistência à compressão O ensaio de resistência à compressão é o mais comumente realizado no con- creto no estado endurecido, relativamente simples de executar e que permite a identificação de outras propriedades correlacionadas. Deve ser realizado em idades específicas de cura do concreto, e a ABNT NBR 5739:2018 apresenta algumas sugestões de prazos (Quadro 4). Em geral, utilizam-se corpos de prova cilíndricos, mas pode-se empregar outras formas desde que sigam normatizações específicas. Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto16 Fonte: Adaptado de Associação Brasileira de Normas Técnicas (2018). Idade de ensaio Tolerância permitida (h) 24 h 0,5 3 d 2 7 d 6 28 d 24 63 d 36 91 d 48 Nota: Para outras idades de ensaio, a tolerância deve ser obtida por interpolação. Quadro 4. Tolerância para a idade de ensaio O ensaio consiste em posicionar o corpo de prova na parte central do prato inferior do equipamento de ensaio e, então, iniciar a aplicação do carregamento até que atinja a ruptura. Com base nessa força máxima aplicada e a área transversal do corpo de prova, calcula-se a resistência à compressão (Figura 6). Figura 6. Ensaio de resistência à compressão. Fonte: Wolenski et al. (2012, documento on-line). 17Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto Segundo o valor de sua resistência à compressão, os concretos utilizados para finalidades estruturais classificam-se em dois grupos: o grupo I, que contempla os concretos com resistência até 50 MPa (C20 a C50); e o grupo II, que se refere aos concretos com resistência entre 50 e 100 MPa (C55 a C100). As amostras para o ensaio de resistência à compressão são coletadas a partir da separação da estrutura em análise em diferentes lotes. O Quadro 5 apresenta os valores máximos para formação de lotes de concreto segundo a ABNT NBR 12655:2015. Fonte: Adaptado de Associação Brasileira de Normas Técnicas (2015b). Identificação (o mais exigente para cada caso) Solicitação principal dos elementos da estrutura Compressão ou compressão e flexão Flexão simplesb Volume de concreto 50 m3 100 m3 Número de andares 1 1 Tempo de concretagem Três dias de concretagemc a No caso de controle por amostragem total, cada betonada deve ser considerada um lote, conforme 6, 2,3, 1. b No caso de complemento de pilar, o concreto faz parte do volume do lote de lajes e vigas. c Este período deve estar compreendido no prazo total máximo de 7 dias, que inclui eventuais interrupções para tratamento de juntas. Quadro 5. Valores máximos para formação de lotes de concretoa Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto18 Ainda, é importante destacar que as amostras que formarão os lotes de concreto deverão ser retiradas de forma aleatória durante a concretagem, para que se obtenham resultados representativos. De acordo com a ABNT NBR 8953:2015, o controle estatístico do ensaio de resistência à compressão pode ser realizado por duas vertentes distintas, isto é, pela amostragem parcial ou total. O cálculo por meio da amostragem parcial consiste em uma estimativa da resistência daquele determinado lote de concreto em análise, caso em que as amostras que compõem o lote são retiradas de betonas distintas, tornando necessárias no mínimo seis amostras representativas para concretos do grupo I e 12 para concretos do grupo II. Para o controle por meio da amostragem total, todas as betonadas devem ser representadas por um exemplar que represen- tará o valor da resistência característica. Um exemplar é composto por duas amostras, sendo o valor final da resistência o maior entre as duas amostras. Módulo de elasticidade (módulo de Young) Basicamente, o módulo de elasticidade estático consiste na relação entre a tensão imposta sobre certo corpo e a deformação que esta tensão provoca nele. O ensaio deve ser realizado conforme as recomendações da ABNT NBR 8522:2017: “Concreto — Determinação dos módulos estáticos de elasticidade e de deformação à compressão”. Similar ao ensaio de compressão simples apresentado anteriormente, nele também são utilizados no mínimo três corpos de prova representativos e um equipamento de ensaio universal (Figura 7). Entretanto realizam-se três carregamentos e descarregamentos sucessivos, e não apenas um único carre- gamento, além do fato de, para aferir as deformações, ser necessário utilizar equipamentos adicionais, que podem tanto ser elétricos (LVDT) quanto me- cânicos (relógios comparadores, extensômetros). 19Agregados, aditivos, traços e ensaios de controle de qualidade do concreto Figura 7. Determinação do módulo de elasticidade. Fonte: Alcantara (2018, documento on-line). ABRAMS, D. A. Design of concrete mixtures: structural materials research laboratory. Chicago: Lewis Institute, 1918 ALCANTARA, M. A. M. Os ensaios mecânicos do concreto: à que eles servem, e o que eles dizem? 2018. Disponível em: https://www.arsaedificativa.com/2018/06/os-ensaios- -mecanicos-do-concreto-que.html. Acessoem: 28 jan. 2020. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 5739:2018. Concreto — Ensaio de compressão de corpos de prova cilíndricos. Rio de Janeiro: ABNT, 2018. 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